Acórdão nº 313/23.3T9OLH.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2024-02-27

Data de Julgamento27 Fevereiro 2024
Ano2024
Número Acordão313/23.3T9OLH.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora


Nos termos dos artigos 417.º, n.º 6, alínea b), e 420.º, n.ºs 1, alínea b), e 2, do CPP, profere-se a seguinte

DECISÃO SUMÁRIA

I. RELATÓRIO

1. Da decisão

No Processo de Execução custas/multa/Coima n.º 313/23.3T9OLH, do Tribunal Judicial da Comarca Faro, Juízo de Competência Genérica de Olhão - Juiz 2, foi instaurada, pelo Ministério Público, execução por coima no montante de 200 € e custas no valor de 51 €, contra (A).
Tendo o processo sido presente ao Juiz de direito foi proferido despacho judicial com o seguinte teor (transcrição):
“Iniciaram-se os presentes autos executivos com requerimento executivo apresentado pelo Ministério Publico, para cobrança de coima, devida à PSP.
Estabelece o actual art.º 35º do Regulamento das custas processuais (após - Lei n.º 27/2019, de 28/03) o seguinte:
1 - Compete à administração tributária, nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, promover em execução fiscal a cobrança coerciva das custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial.
2 - Cabe à secretaria do tribunal promover a entrega à administração tributária da certidão de liquidação, por via eletrónica, nos termos a definir por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, juntamente com a decisão transitada em julgado que constitui título executivo quanto às quantias aí discriminadas.
3 - Compete ao Ministério Público promover a execução por custas face a devedores sediados no estrangeiro, nos termos das disposições de direito europeu aplicáveis, mediante a obtenção de título executivo europeu.
4 - A execução por custas de parte processa-se nos termos previstos nos números anteriores quando a parte vencedora seja a Administração Pública, ou quando lhe tiver sido concedido apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo.
5 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, a execução por custas de parte rege-se pelas disposições previstas no artigo 626.º do Código de Processo Civil.
Com a actual redacção da sobredita norma, o Ministério Publico no âmbito da jurisdição criminal junto dos Juizos Locais criminais tem competência unicamente para instaurar execução por multa devida nos processos e indemnizações arbitradas aos ofendidos/vitimas dos processos criminais. Todos os demais valores são cobrados pela A.T. após emissão da competente certidão de divida no processo.
É aliás este o entendimento vertido no parecer n.º 27/2020, de 04-10 do Ministério Publico. Fazendo, como se entende, todo o sentido que se o Ministério Publico junto do tribunal não tem competência para cobrar as custas devidas no próprio processo, não poderá executar custas ou coimas devidas em qualquer outro processo de natureza administrativa, junto de qualquer outra entidade.
Em face do exposto, e tendo em conta o objecto da presente execução, constatamos que este Tribunal é absolutamente incompetente, em razão da matéria, para apreciar e a presente acção executiva, a qual entendemos ser da Autoridade Tributária.
A incompetência absoluta em razão da matéria verificada constitui excepção dilatória, de conhecimento oficioso e a todo o tempo, e importa a absolvição do Executado da instância, nos termos do disposto nos artigos 65º, 97º, 98º, 99º e 577º, al. a) do Código de Processo Civil.
Registe e Notifique.
Após trânsito:
-Existindo alguma penhora nos autos proceda ao seu imediato cancelamento.
- Existindo valores pagos proceda notificação do executado com informação dos respectivos valores.
- Remeta os autos à conta.”.

2. Do recurso

2.1. Das conclusões do Ministério Público
Inconformado com a decisão o MP interpôs recurso extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões (transcrição):
“1) O Ministério Público promoveu a execução da coima e custas da entidade administrativa, por não terem sido voluntariamente liquidados os valores em dívida por parte do executado.
2) Para o efeito, o Ministério Público submeteu requerimento executivo que deu origem aos presentes autos.
3) Pelo despacho recorrido, o Tribunal a quo decidiu que é absolutamente incompetente em razão da matéria para apreciar a presente acção executiva, considerando que tal competência recai sobre a AT.
4) O legislador não alterou o disposto nos artigos 61.º, 88.º e 89.º, do RCP, mantendo-se a competência para a execução da coima administrativa não paga junto dos Tribunais.
5) Perante a actual redação do artigo 35.º, do RCP, apenas se considera admissível que a AT tenha competência para a execução das custas da entidade administrativa. No que respeita à coima, o legislador não atribuiu essa competência à AT.
6) Ao julgar que é absolutamente incompetente em razão da matéria para apreciar a acção executiva que deu origem aos presentes autos, com o devido respeito por opinião contrária, o tribunal a quo violou o disposto nos artigos 61.º, 88.º, e 89.º, do RGCO, 35.º, do RCP, e 64.º, do CPC, por força do disposto no artigo 4.º, do CPP.
7) Numa interpretação conforme com o disposto nos artigos antecedentes e demais disposições legais aplicáveis, consideramos que o tribunal recorrido nunca se poderia declarar materialmente incompetente para proceder à execução da coima, por se verificar que o Juízo de Competência Genérica de Olhão, do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, é territorialmente e materialmente para apreciar a presente acção executiva, devendo os autos prosseguir os seus ulteriores termos.
8) Deve, assim, ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, determinando-se, consequentemente, que prossiga a presente execução relativamente à coima aplicada pela entidade administrativa e, eventualmente, relativamente às custas aplicadas pela entidade administrativa, caso se entenda que o Tribunal recorrido é igualmente competente para a sua execução. (…)”.

2.2. Despacho de sustentação
Na instância recorrida o Tribunal sustentou o despacho de rejeição da execução pela seguinte forma:
“Nos termos do disposto no artº 641º do CPC ex vi do art.º 414º, nº4º do C.P.P., procede-se a despacho de apreciação da nulidade invocada nos seguintes termos:
O tribunal proferiu despacho determinando a incompetência absoluta em razão da matéria para o tribunal prosseguir a execução de coimas aplicadas por entidades administrativas.
O despacho proferido já se encontra nas alegações apresentadas pelo Digno Magistrado do Ministério Publico.
Fundamentou o despacho com base na actual redacção do Art.º 35º do Regulamento das Custas processuais e ainda no parecer do MP aí invocado.
Em sede de sustentação do presente agravo cumpre referir o seguinte:
Parecer do Ministério Publico sobre a proposta de Lei nº 149/XIII/4ª GOV enviado em 24.10.2018.
O parecer supra referido sustenta aliás a sua inteira concordância com ser retirada a competência aos tribunais judicias para proceder a cobrança de custas e coimas, manifestando unicamente a sua discordância relativamente a essa competência no que concerne à pena de multa. Aliás e no que concerne ao disposto no art.º 89º do RGCO também o referido parecer contem menção da alteração que deveria ser feita à referida norma.
É certo que o diploma não contempla essa mesma alteração, no entanto uma interpretação sistemática do diploma (conjugada com a lei geral tributária e o código do procedimento e processo tributário) não pode deixar de considerar que a execução por coimas não cabe aos tribunais, mas antes à autoridade tributária
No âmbito aliás deste parecer, e com o intuito de facto delimitar as competências do Ministério Publico no âmbito das execuções de origem penal ou contra ordenacional, foi referido que o art.º 148º do C.P.P.T deveria conter uma alínea c) no seu numero 2º, contendo as coimas emitidas por entidades administrativas.
A referida alínea c) limitou-se a custas, multas não penais e sanções pecuniárias em processo judicial.
Porém a norma constante do nº1, alínea b) da referida norma contempla as coimas aplicadas em decisões e sentenças, onde incluímos obviamente as coimas de entidades administrativas ou as coimas aplicadas em por sentença após recurso de impugnação judicial de decisão administrativa. É aliás tal facto também referido no Parecer do Ministério Publico n.º 27/2020, de 04-10 que refere o seguinte:
1.ª Na sua versão original, o Regime Geral das Contraordenações remetia a execução das custas para o disposto nos artigos 171.º e seguintes do Código das Custas Judiciais, assim atribuindo ao Ministério Público competência para promover a sua execução junto dos tribunais judiciais (artigo 202.º, n.º 2, daquele Código);
2.ª Esta solução, apesar das inúmeras alterações legislativas que enfrentou, manteve-se quase inalterada até a entrada em vigor da Lei n.º 27/2019, de 28 de março, relativa a aplicação do processo de execução fiscal a cobrança coerciva das custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial;
3.ª Com efeito, considerando a natureza tributária das custas e seguindo o exemplo da jurisdição administrativa e fiscal, o legislador inverteu aquele paradigma, remetendo para a execução fiscal a cobrança coerciva das custas fixadas em processo judicial;
4.ª Para esse efeito, a Lei n.º 27/2019, de 28 de março, alterou o Código de Procedimento e de Processo Tributário que passou a dispor que «Poderão ser igualmente cobradas mediante processo de execução fiscal, nos casos e termos expressamente previstos na lei: [...] Custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial [artigo 148.º, n.º 2, alª c)];
5.ª Bem como o artigo 35.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais, que sob a epígrafe «execução», passou a dispor que: «Compete a administração tributária, nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, promover em execução fiscal a
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