Acórdão nº 305/21.7T8VPV.L1-5 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-05-03

Ano2022
Número Acordão305/21.7T8VPV.L1-5
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam, em conferência, na 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:


I–Relatório


1.Por decisão do Serviço Coordenador de Transportes Terrestres da Região Autónoma dos Açores, proferida nos processos de contra-ordenação n.ºs 570546, 570516, 570543 e 570522, foi J. , melhor identificado nos autos, condenado pela prática de quatro contraordenações estradais resultantes de condução com excesso de velocidade p. e p. pelo artigo 27.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), 2.º do Código da Estrada, no pagamento de quatro coimas de €120,00 (cento e vinte euros) cada uma e no cumprimento de 30 dias de inibição de conduzir por cada uma das infrações.
Não se conformando com as decisões proferidas, o arguido deduziu impugnação judicial, que que veio a ser julgada improcedente por despacho proferido a 1.02.2022.

2.Inconformado com tal despacho, o arguido interpôs o presente recurso de cuja motivação extrai as seguintes conclusões: (transcrição):
1-A coima já havia sido liquidada, motivo pelo qual o arguido apenas impugnou a aplicação da sanção acessória.
2-Estão preenchidos os requisitos previstos no artigo 141. ° do Código da Estrada para suspensão da execução da sanção acessória de inibição de conduzir.
3-O despacho judicial fez errada interpretação e aplicação dos artigos 141° e 172° do Código da Estrada.
4-A fundamentação do despacho recorrido viola o disposto no artigo 141° do Código da Estrada, pelo que deve o mesmo ser revogado.

Nestes termos e nos melhores de Direito, deve ser dado provimento ao presente recurso e em consequência, por via dele:
a)-Revogar a sentença da 1a Instância, suspendendo-se a execução da sanção acessória de inibição de condução aplicada ao recorrente, uma vez que a sanção acessória aplicada restringe direitos fundamentais (limitações temporárias da capacidade civil de exercício de direitos e proibição de exercer a sua atividade profissional, o que trará graves repercussões económicas sob o património do arguido).

3.O Ministério Público junto da 1ª instância respondeu ao recurso pedindo a sua improcedência, tendo para o efeito formulado as seguintes conclusões: (transcrição)
1-Não resulta dos autos que a coima tenha sido paga voluntariamente.
2-Assim, não estão preenchidos os requisitos previstos no artigo 141. ° do Código da Estrada para suspensão da execução da sanção acessória de inibição de conduzir.
3-Por isso, o despacho judicial não fez errada interpretação e aplicação dos artigos 141° e 172° do Código da Estrada.
4-Não foram violadas quaisquer disposições legais, não merecendo qualquer reparo a sentença recorrida.

4.Neste tribunal, no âmbito da vista prevista no n.º 1 do artigo 416.º do Código de Processo Penal (doravante designado C.P.P.) o Ministério Público pronunciou-se no sentido de que o recurso deve ser julgado improcedente.
5.O recorrente respondeu ao parecer do Ministério Público reiterando o que já havia referido na sua motivação.
6.Efectuado exame preliminar e colhidos que foram os vistos legais, cumpre agora, em conferência, apreciar e decidir, nos termos do art.º 419º, n. º3, alínea c) do CPP.

II–Fundamentação

1.Delimitação do objecto do recurso:
Sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, o âmbito do recurso é dado, nos termos do art.º 412º, nº1 do CPP, pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação nas quais sintetiza as razões do pedido.
Tendo presente as conclusões formuladas pelo recorrente importa apreciar se estão preenchidos os requisitos previstos no artigo 141.º do Código da Estrada para a suspensão da execução das sanções acessórias de inibição de conduzir que foram aplicadas ao recorrente.

2.Apreciação

Questão prévia

Com o seu recurso o recorrente juntou um documento, que é uma declaração da sua entidade patronal quanto às funções que o mesmo desempenha, para prova de que a não suspensão da inibição de conduzir lhe causará prejuízos económicos avultados, facto que alega na sua motivação e na resposta que apresentou ao parecer do Ministério Público.

É de há muito pacífico, na doutrina e na jurisprudência, o entendimento de que os recursos estão configurados no nosso sistema processual penal como remédios jurídicos, visando apenas modificar as decisões recorridas e não criar novas decisões sobre matérias ou questões novas que não foram, nem podiam ter sido, suscitadas ou conhecidas pelo tribunal recorrido.

O objecto do recurso é a decisão proferida, pelo que, para apreciar se esta foi justa ou injusta, não interessa senão comparar a decisão com os dados que o juiz decidente possuía.

Deste modo, “não é possível juntar nas motivações de recurso ordinário novos elementos de prova que não tiverem sido considerados na decisão recorrida” (cf. Prof. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, 2.ª edição, Vol. III. pág. 315).
Como se diz no Acórdão do S.T.J., de 12/10/2011, proferido no processo 484/02.2TATMR.C2.S1 (in www.dgsi.pt):
Após o encerramento do contraditório e a subsequente prolação da sentença, com a fixação da matéria de facto, torna-se inútil e despropositada a apresentação de prova de qualquer natureza, incluindo a documental, tanto mais que nos raros casos em que a lei admite a renovação da prova – artigo 430.º –, como o próprio instituto sugere, o tribunal de recurso limita-se a reanalisar os meios de prova (já) apresentados e produzidos, ou seja, não podem ser requeridos, nem ordenados oficiosamente novos meios de prova, isto é, meios de prova distintos dos apresentados e produzidos na 1ª instância.

Se a Relação atendesse ao documento agora junto e aos factos novos agora invocados, não formularia um juízo sobre a justeza da decisão recorrida, reportada ao tempo em que foi proferida e considerando os elementos então ao dispor do tribunal a quo, mas estaria a proferir decisão nova sobre a questão.

Por conseguinte, não poderá ser atendido o documento junto pelo recorrente nem considerados os novos factos por ele invocados, havendo que apreciar a sua pretensão face ao direito aplicável ao caso e tendo em conta os elementos existentes nos autos aquando da prolação da sentença recorrida e a que o tribunal recorrido teve acesso e examinou. De todo o modo, nunca este tribunal poderia atender aos novos factos uma vez que, tratando-se de matéria contra-ordenacional, o Tribunal da Relação, enquanto tribunal de revista, só conhece de questões de direito (art.º 75º, nº1 do
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