Acórdão nº 29712/22.6T8LSB.L1-7 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-11-21

Data de Julgamento21 Novembro 2023
Ano2023
Número Acordão29712/22.6T8LSB.L1-7
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:


I–RELATÓRIO:


CAI, Unipessoal, LDA., E – SOCIEDADE DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO, S.A., e I - FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO, instauraram o presente procedimento cautelar de suspensão de deliberação de assembleia de condóminos, com pedido de inversão do contencioso, contra Condomínio ____, representado pela respetiva Administração, B, LDA., pedindo, pelas razões invocadas no requerimento inicial:
- que «se determine a suspensão da execução da deliberação tomada no âmbito do Ponto 2. da Ordem de Trabalhos da Assembleia Geral de 08.11.2022 que aprovou o orçamento para 2022»;
- que «se dispense as REQUERENTES do ónus de propositura da ação principal, nos termos do artigo 369.º do CPC, uma vez que com a matéria adquirida no presente procedimento é possível formar convicção segura acerca da existência do direito acautelado»;
- que «seja o REQUERIDO citado urgentemente assim evitando o risco de execução da deliberação cuja suspensão aqui se requer, o que prejudicaria o efeito útil do presente procedimento cautelar».
Concluso o processo à senhora juíza a quo, foi proferido despacho liminar do qual consta, além do mais, o seguinte:
«(...)
O procedimento cautelar, sendo carecido de autonomia e de natureza instrumental, é dependência da causa que tenha por fundamento o direito acautelado, nos termos do artigo 364º, n.º 1 do Código de Processo Civil.
No caso sub judice, o presente procedimento cautelar é preliminar da ação de impugnação ou anulação de deliberação de assembleia de condóminos, relativamente à qual vigora um regime especial de legitimidade passiva previsto no artigo 1433º, n.º 6 do Código Civil.
De acordo com este preceito legal, “a representação judiciária dos condóminos contra quem são propostas as ações compete ao administrador ou à pessoa que a assembleia designar para esse efeito”.
Tal significa que a legitimidade passiva na ação de impugnação de deliberação e, por conseguinte, no presente procedimento cautelar, radica, não no condomínio, mas sim nos próprios condóminos que, tendo estado presentes ou representados na assembleia em que foi votada a deliberação, votaram favoravelmente à sua aprovação, devendo os mesmos ser representados judiciariamente pelo administrador do condomínio ou por pessoa que a assembleia designar para esse efeito (neste sentido, Acordão do Supremo Tribunal de Justiça de 06/11/2008, processo n.º 08B2784, Acordãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 12/02/2009, processo n.º 271/2009-6 e de 23/04/2020, processo n.º 27383/19.6T8LSB.L1-8, Acordãos do Tribunal da Relação do Porto de 27/01/2011, processo n.º 2532/08.3TBVCD.P1, de 04/10/2012, processo n.º 1371/11.9TJPRT.P1, de 08/03/2016, processo n.º 1440/14.3TBSTS.P1 e de 24/03/2022, processo n.º 1257/19.9T8PVZ.P1, Acordão do Tribunal da Relação de Évora de 17/10/2013, processo n.º 7579/11.0TBSTB.E1 e Acordãos do Tribunal da Relação de Guimarães de 24/11/2016, processo n.º 130/15.4T8MTR.G1, de 09/03/2017, processo n.º 42/16.4T8VLN.G1 e de 28/01/2021, processo n.º 235/17.7T8EPS.G1, todos in www.dgsi.pt).
Seguimos assim o entendimento perfilhado, entre outros, no Acordão do Tribunal da Relação do Porto de 08/03/2016, onde se lê: “Sendo a personalidade judiciária atribuída ao condomínio restrita às ações que se inserem nos poderes do administrador (artigo 12º, alínea e) do Código de Processo Civil), prevendo a lei substantiva que este seja demandado nas ações respeitantes às partes comuns (artigo 1437º, n.º 2 do Código Civil), aludindo o n.º 6 do artigo 1433º do Código Civil aos condóminos contra quem são propostas as ações, em nenhum preceito se referindo expressamente a legitimidade passiva do condomínio para as ações de impugnação de deliberação da assembleia de condóminos, essa legitimidade radica nos condóminos, embora a sua representação em juízo caiba ao administrador ou à pessoa que para o efeito a assembleia designar” (vide processo n.º 1440/14.3TBSTS.P1, in www.dgsi.pt).
No Acordão do Tribunal da Relação do Porto de 04/10/2012, lê-se ainda o seguinte: “dificilmente se compreenderia que havendo conflito de interesses entre os condóminos, os que votaram a deliberação e os que com ela não concordam, pudesse ser acionado o condomínio, que engloba todos os contitulares da propriedade horizontal (vide processo n.º 1371/11.9TJPRT.P1, in www.dgsi.pt).
Em suma, o presente procedimento cautelar não deveria ter sido proposto contra o requerido Condomínio, ainda que representado pela respetiva administração, mas sim contra todos os condóminos que votaram favoravelmente a deliberação alegadamente inválida, uma vez que só estes serão prejudicados com a decisão, em caso de suspensão e/ou anulação da deliberação em apreço.
Verifica-se assim uma exceção dilatória de ilegitimidade passiva, que in casu não é sanável mediante a intervenção principal provocada dos sujeitos em falta1, conduzindo forçosamente ao indeferimento liminar da presente providência cautelar.
Nos termos do artigo 590º, n.º 1 do Código de Processo Civil, o juiz pode, em lugar de ordenar a citação, indeferir liminarmente o requerimento inicial no procedimento cautelar, quando ocorram, de forma evidente, exceções dilatórias insupríveis e de que o juiz deva conhecer oficiosamente, tal como sucede no caso em apreço.
Face ao exposto, nos termos das disposições legais supra citadas, indefiro liminarmente o requerimento inicial do presente procedimento cautelar especificado de suspensão de deliberação da assembleia de condóminos deduzido pelas sociedades CAI, Unipessoal, Lda, com sede na Rua ____, E – SOCIEDADE DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO, S.A., com sede na Rua ____, e I – Fundo de Investimento Imobiliário Fechado, representada pela sociedade I – Sociedade Gestora, S.A., com sede ____, contra o Condomínio ____, representado pela respetiva administração, a sociedade B, Lda, com sede na Avª ____, n.º ...-E, ...º direito, em L____.»
*

Inconformadas, as requerentes apelaram desta decisão concluindo assim as respetivas alegações:
«I.-O aresto decisório aqui em crise indeferiu liminarmente o requerimento inicial de procedimento cautelar especificado de suspensão de deliberação da assembleia de condóminos, intentado pelas REQUERENTES, por entender que estamos perante uma exceção dilatória de ilegitimidade passiva.
II.-As RECORRENTES intentaram o referido procedimento cautelar contra o CONDOMÍNIO ____, representado pela respectiva Administração, B, LDA.
III.-O Douto Tribunal a quo entendeu que o procedimento cautelar devia ter sido proposto contra “todos os condóminos que votaram favoravelmente a deliberação alegadamente inválida”.
IV.-Fundamenta a sua tese no artigo 1433º, n.º 6 do Código Civil segundo o qual “a representação judiciária dos condóminos contra quem são propostas as acções compete ao administrador ou à pessoa que a assembleia designar para esse efeito”.
V.-Alega que apenas os condóminos que votaram a favor da deliberação são prejudicados com a decisão, em caso de suspensão e/ou anulação da deliberação em apreço.
VI.-As ora RECORRENTES não se conformam com a decisão proferida!
VII.-O artigo 1437º do Código Civil consagra a capacidade judiciária do condomínio, ao estabelecer a susceptibilidade de o administrador, seu órgão executivo, estar em juízo em representação daquele. Daí que o n.º 6 do artigo 1433º do Código Civil deva ser interpretado em conformidade com a actualidade e não á luz da legislação em vigor à data em que foi redigido.
VIII.-Ora, cabendo ao administrador executar as deliberações da assembleia de condóminos, nos termos do artigo 1436º, al. i) do Código Civil, cabe-lhe igualmente justificar a existência, a validade e a eficácia dessas mesmas deliberações, em representação do condomínio.
IX.-Esta solução, como refere o Professor Miguel Mesquita é a que permite um exercício mais ágil do direito de acção, pois que os “pressupostos processuais não devem servir para complicar, desnecessariamente, o conhecimento do pedido e a resolução dos litígios, finalidades precípuas do processo civil.
X.-Este entendimento é acolhido pelo Supremo Tribunal de Justiça ao referir no Acórdão de 04.05.2021 que “Se ao administrador compete executar as deliberações da assembleia de condóminos, nos termos do art.º 1436.º, al. h), do Código Civil), por igualdade de razão, cumpre-lhe sustentar a existência, a validade e a eficácia dessas mesmas deliberações, em representação do condomínio. Concluímos, assim, com o devido respeito por outros entendimentos, que a legitimidade passiva na ação de impugnação de deliberação da assembleia de condóminos, compete ao condomínio, representado pelo administrador”.
XI.-No mesmo sentido entendeu o Tribunal da Relação de Lisboa no processo n.º 2131/21.4T8AMD.L1-2, datado de 27.10.2022 e o Supremo Tribunal de Justiça no processo n.º 7888/19.0T9LSB.L1.S1 em 25.05.2021 ao referir que “A ação de impugnação das deliberações da assembleia de condóminos deve ser intentada contra o condomínio, que será representado pelo seu administrador ou por quem a assembleia designar para esse efeito, e não contra os condóminos que aprovaram a deliberação.”
XII.-Conclui-se, portanto, pela legitimidade passiva do Condomínio ____, representado pela sua administração, nos presentes autos.
XIII.-O recurso per saltum consiste na faculdade concedida aos recorrentes que impugnam a decisão da 1.ª Instância de pedir, no acervo conclusivo da sua alegação, que o recurso suba imediatamente ao Supremo Tribunal de Justiça, sem que tenha de transitar por apelação.
XIV.-Os requisitos de admissão do recurso são elencadas nas quatro alíneas do n.º 1 do artigo 678.º do Código de Processo Civil, a saber: i)- o valor da causa ser superior à alçada da Relação; ii)- o valor da sucumbência ser superior a metade da alçada da Relação; iii)- suscitarem-se apenas questões de direito; iv)- não estar em causa
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