Acórdão nº 297/21.2PTLSB.L1-5 de Tribunal da Relação de Lisboa, 09-04-2024

Data de Julgamento09 Abril 2024
Ano2024
Número Acordão297/21.2PTLSB.L1-5
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam, em conferência, na 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:


RELATÓRIO


I.1–No âmbito do processo comum singular nº 297/21.2PTLSB, que corre termos pelo Juízo Local Criminal de Lisboa, Juiz 6, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, em 11.10.2023, na ata da audiência de julgamento, foi proferido o seguinte despacho [transcrição]:
“A arguida foi notificada na morada do tir por si indicada, embora carta tenha vindo devolvida, com indicação "não mora nesta morada ", não foi indicada nova morada, considera-se que a mesma se encontra notificada, razão pela qual o TIR foi criado no nosso ornamento jurídico e, assim, entendo o Tribunal que tem que considerar de facto a arguida regularmente notificada.
Uma vez que a mesma falta injustificadamente vai desde já condenada na multa processual que se fixa em 2UC´s (art.º 116º do C.P.Penal) e, quanto ao início da audiência entende-se que a sua presença não se mostra essencial desde o início da mesma, pelo que se dará início à mesma nos termos do disposto no art.º 333º, nº 1 e 2 do C.P.Penal, ficando representada para todos os efeitos legais na pessoa do seu ilustre defensor, com audição das pessoas presentes.”

Posteriormente, em 24.10.2023, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo [transcrição]:
VDecisão
Pelo exposto, o Tribunal decide julgar a acusação parcialmente procedente, por provada, e, em consequência:
1)Absolver a arguida da prática de dois crimes de ameaça agravada, p. e p. pelos arts. 153.º e 155.º n.º 1 alínea c), ambos do Código Penal, nas pessoas dos agentes AA e BB;
2)Condenar a arguida CC, como autora material e na forma consumada, pela prática, em concurso efetivo:
a.- de um crime de injúria agravada, p. e p. pelos arts. 181.º, 182.º e 184.º, todos do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), num total de € 600,00 (seiscentos euros).
b.- de um crime de ameaça agravada, p. e p. pelos arts. 153.º e 155.º n.º 1 alínea c), ambos do Código Penal, na pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), perfazendo a quantia de € 750,00 (setecentos e cinquenta euros).
c.- de um crime de dano qualificado, p. e p. pelo art.º 213.º n.º 1 alínea c) do Código Penal, na pena de 50 (cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), totalizando a quantia de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros).
d.- de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art.º 143.º n.º 1 do Código Penal, na pena de 200 (duzentos) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), o que perfaz a quantia de € 1.000,00 (mil euros)
3)Operando o cúmulo jurídico das penas parcelares, condeno a arguida na pena única de 400 (quatrocentos) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), num total de € 2.000,00 (dois mil euros).
4)Condena-se a arguida no pagamento das custas e encargos do processo, fixando a taxa de justiça em 2 UC’s.
5)Condena-se a arguida a pagar ao demandante Estado Português/Polícia de Segurança Pública a quantia de € 128,50 (cento e vinte e oito euros e cinquenta cêntimos), a título de danos patrimoniais sofridos, acrescidos de juros legais de 4%, desde a data da notificação do pedido de indemnização civil (31 de Outubro de 2022) até efetivo e integral pagamento;
6)Condena-se a arguida a pagar à demandante ... a quantia de € 707,51 (setecentos e sete euros e cinquenta e um cêntimos), a título de indemnização pelos serviços hospitalares e de saúde prestados à ofendida DD, decorrentes da conduta ilícita da arguida, acrescida de juros à taxa legal de 4%, contados desde a data da notificação do pedido de indemnização civil (18 de Março de 2023) até efetivo e integral pagamento;
7)Condeno a arguida nas custas dos pedidos de indemnização civis, atento o seu vencimento nos mesmos. (…)”
*

I.2–Recursos das decisões

Inconformada com o despacho proferido a 11.10.2023 dele recorreu a arguida CC com os fundamentos expressos na motivação da qual extraiu as seguintes conclusões [transcrição]:
“Conclusões:
(a)- A Arguida invocou, na audiência do passado dia 11.10.2023, que não encontrava notificada para a audiência, contudo foi determinado o prosseguimento dos autos, decisão da qual se apresenta recurso.
(b)- A Arguida entende que a decisão de prosseguir os autos viola o artigo 113º do Código de Processo Penal conjugado com o artigo 48º dos direitos fundamentais da União Europeia.
(c)- Tais direitos também estão consagrados no artigo 32º da Constituição da República Portuguesa.
(d)- Ou seja, resulta dos autos, que a Arguida não recebeu a notificação para a audiência de discussão e julgamento.
(e)- Não obstante as presunções existentes na legislação, a Arguida não recebeu a carta, até porque ficou demonstrado pelo depoimento da alegada vitima que a Arguida já não reside na morada do TIR.
(f)- A Arguida não conseguiu apresentar os seus argumentos no julgamento, visto que desconhecia a sua existência.
(g)- Pelo que se terá que considerar que o TIR não é algo absoluto, sob pena de colocar em causa os direitos de defesa dos arguidos.
(h)- Assim sendo, sempre se dirá que a decisão de prosseguir com o julgamento com a evidência de que a Arguida não rececionou a notificação para a morada do TIR, viola os artigos 113º do CPP conjugado com os artigos 48º dos Direitos Fundamentais da União Europeia e artigo 32º da Constituição da República Portuguesa.
(i)- Porquanto, desde já se requer a revogação do douto despacho que ordenou o prosseguimento dos autos e a sua substituição por um despacho que ordene a notificação da Arguida da data da audiência de julgamento, sendo declarados nulos todos os actos praticados após o despacho recorrido”.

Não se conformando igualmente com a sentença proferida nos autos dela interpôs também a arguida recurso, com os fundamentos expressos na motivação da qual extraiu as seguintes conclusões [transcrição]:
“Conclusões:
a)- A Arguida não se conforma com a douta sentença proferida, nos seguintes termos:
b)- O Tribunal considerou provada a matéria constante dos pontos 1 a 21 da matéria de facto, contudo não teve a possibilidade de estar presente no Tribunal, por falta de notificação, o que violou o artigo 113º do CPP.
c)- Acresce ainda que não foi feita prova em audiência dos pontos 1 a 21 da matéria de facto dada como provada.
d)- Efectivamente demonstrar que não foi feita prova suficiente é impossível demonstrar através das transcrições dos depoimentos.
e)- A jurisprudência tem entendido que cumpre ao recorrente invocar a matéria incorrectamente julgada e demonstrar em que termos.
f)- No entanto, não vislumbramos como é possível transcrever o que não foi referido....
g)- Entendemos que a prova efectuada em audiência foi absolutamente insuficiente, porquanto deverá ser revogada.
h)- Considera a Arguida que foi violado o artigo 127º do CPP na análise da prova.
i)- Porquanto, desde já se requer a revogação da douta sentença, sendo a mesma substítuida por um acórdão que absolva a arguida.
j)- Caso assim não se entenda, sempre se dirá que a pena única de 400 dias de multa viola o nº 1 do artigo 77º do Código Penal.
k)- Atentas as penas aplicadas o cúmulo poderia ser aplicado entre 200 dias e 520 dias de multa.
l)- Entende a Arguida que a pena única não deverá exceder os 300 dias de multa à taxa diária de 5 €, sendo excessiva a pena única aplicada, requerendo-se a sua redução.
Porquanto, desde já se requer a revogação da douta sentença, sendo a mesma substítuida por um Acórdão que absolva a arguida.
Caso assim não se entenda, entende a Arguida que a pena única não deverá exceder os 300 dias de multa à taxa diária de 5 €, sendo excessiva a pena única aplicada, requerendo-se a sua redução.”
*

Os recursos foram admitidos nos termos do despacho proferido a 12.12.2023.
*

I.3Respostas ao recursos

Efetuada a legal notificação veio o Mº Público responder o recurso intercalar, apresentando as seguintes conclusões [transcrição]:
“CONCLUSÕES
1.A arguida e ora recorrente prestou Termo de Identidade e Residência nos autos, tendo indicado a morada para onde pretendia ser notificada a partir daquela data;
2.A arguida não indicou qualquer nova morada aos autos, bem sabendo que as notificações lhe iriam ser feitas para a morada por si indicada aquando da prestação de Termo de Identidade e Residência.
3.Acresce que a arguida foi notificada, para a referida morada, do despacho que designou data para a realização do julgamento;
4.Se a arguida optou por alterar a sua residência e não comunicar ao Tribunal essa alteração, como lhe era legalmente imposto, assumiu a mesma o risco adveniente desse incumprimento, não podendo agora pretender tirar benefícios do mesmo.
5.Sobre a arguida recaía a obrigação de comunicar ao tribunal qualquer alteração da morada, pelo que o incumprimento dessa obrigação tornou válida a sua notificação por via postal simples na morada que indicou, mesmo que tenha deixado de aí residir.
6.Bem andou o Tribunal ao determinar a realização do julgamento, porquanto a arguida estava regularmente notificada para estar presente na audiência;
7.Entende-se, assim e em suma, que não merece o despacho recorrido qualquer censura, pelo que deverá o recurso interposto ser julgado totalmente improcedente, e o despacho recorrido ser mantido nos seus exactos termos.
Assim farão, V. Exas. a esperada e costumada JUSTIÇA!”

Respondeu igualmente o Mº Público ao recurso interposto da sentença condenatória proferida, apresentando as seguintes conclusões [transcrição]:
“CONCLUSÕES
1.A arguida e ora recorrente prestou Termo de Identidade e Residência nos autos, tendo indicado a morada para onde pretendia ser notificada a partir daquela data;
2. A arguida não indicou qualquer nova morada aos autos, bem sabendo que as notificações lhe iriam ser feitas para a morada por si indicada aquando da prestação de
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