Acórdão nº 2892/22.3T8CSC.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2024-04-04

Ano2024
Número Acordão2892/22.3T8CSC.L1-2
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados:
I.C. e L.S. propuseram acção declarativa com processo comum contra o condomínio do prédio sito na Rua (…) (representado pela sua administradora, (…), pedindo que a deliberação da assembleia extraordinária de 30/6/2022 seja declarada “nula e anulável (…), por falta de fundamentação e de prova, anulada a Assembleia por convocatória fora de prazo dos autores e anulada a acta lavrada, por da mesma não constar o conteúdo da intervenção do representante dos autores, nem a mesma estar completamente assinada”. Pedem ainda, para o caso de “assim se não entender”, que “deve ser julgado inconstitucional o disposto no nº 2 do art.º 9º do DL 128/2014 de 29/08, na redacção da Lei 62/2018 de 22/08 (…) na interpretação feita pelo acórdão do STJ nº 4/2022 de 22/03/2022, uniformizador de jurisprudência, publicado no DRE – I série de 10/05 (…) por violação do art.º 62º - nº 1, 17 e 18 – nº 2 da Constituição da República Portuguesa”.
Alegam, em síntese, que:
. São proprietários de uma das fracções autónomas do condomínio R., onde iniciaram a exploração da actividade turística de curta duração;
. Solicitaram à administração do condomínio R. que todas as comunicações de assuntos relacionados com o condomínio fossem enviadas por correio electrónico, para o endereço que indicaram, mas a mesma administração convocou uma assembleia extraordinária e não enviou qualquer mensagem de correio electrónico, antes tendo enviado a convocatória por carta depositada na caixa de correio da fracção autónoma, o que os AA. só viram em 8/7/2022, porque residem no estrangeiro;
. A assembleia em questão ocorreu em 30/6/2022 e os AA. estiveram representados na mesma, mas se tivessem sabido da sua convocação com a antecedência que impõe o art.º 1432º do Código Civil teriam estado presencialmente e ter‑se-iam preparado convenientemente para a assembleia;
. A acta da assembleia em questão foi notificada aos AA. sem estar assinada pelos mesmos ou pelo seu representante;
. Da acta da assembleia em questão resultam expressadas por outros condóminos preocupações e reclamações pela utilização da fracção dos AA. para a actividade do alojamento local, mas nada do que é referido na mesma acta e respectiva deliberação está comprovado, não passando da manifestação de má vontade de alguns condóminos relativamente aos AA., e não estando feita prova da prática de quaisquer actos que perturbem a normal utilização do prédio e de actos que causem incómodo e afectem o descanso dos condóminos;
. Da acta da assembleia em questão não consta o conteúdo da intervenção do representante dos AA., pela qual chamou a atenção para a falta de consistência e de prova para a deliberação pretendida tomar.
Citado o condomínio R., veio apresentar contestação onde, em síntese, invocou a excepção dilatória da ilegitimidade passiva e a caducidade do direito de acção dos AA., mais invocando que:
. O pedido de envio de comunicações por correio electrónico não foi apresentado nos termos do nº 2 do art.º 1432º do Código Civil, pelo que a convocatória foi efectuada por via postal registada, nos termos do nº 1 do mesmo art.º 1432º;
. Estando os AA. representados na assembleia de condóminos, existe abuso de direito na arguição da anulabilidade da deliberação aprovada com fundamento na falta da convocatória;
. Da acta da assembleia não carece de constar a transcrição integral de tudo o que aí foi discutido, pelo que a intervenção do representante dos AA. não carecia de ser aí feita constar;
. A falta de assinatura da acta não é motivo de invalidade da deliberação constante da mesma.
Conclui pela procedência das excepções e pela improcedência da acção, com a sua absolvição dos pedidos.
Os AA. exerceram o contraditório quanto às excepções invocadas, concluindo pela improcedência das mesmas e como na P.I.
Em audiência prévia foi anunciado que o mérito da causa iria ser conhecido de imediato, tendo as partes produzido alegações, nos termos e para os efeitos do disposto na al. b) do nº 1 do art.º 591º do Código de Processo Civil.
Seguidamente foi proferido despacho saneador com valor de sentença, aí sendo julgadas improcedentes as excepções da ilegitimidade passiva e da caducidade do direito de acção, e tendo ainda a acção sido julgada improcedente, com a absolvição do condomínio R. dos pedidos formulados.
Os AA. recorrem desta sentença, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem (com excepção dos factos provados na sentença, que serão objecto de enunciação adiante):
A. Nos presentes autos, I.C., e L.S., propuseram acção declarativa comum contra o condomínio do prédio sito na Rua (…) representado pelo seu administrador (…), pedindo que:
a) a deliberação da assembleia extraordinária de 30-06-2022 seja declarada “nula e anulável (..), por falta de fundamentação e de prova,
b) que seja anulada a Assembleia por convocatória fora de prazo e ainda,
c) anulada a acta lavrada, por da mesma não constar o conteúdo da intervenção do representante dos autores, nem a mesma estar completamente assinada”
B. Na sentença recorrida, para além do mais, e no que para este recurso importa decidiu-se:
- Julgar totalmente improcedente a acção;
- Absolver o Réu de todo o peticionado;
- Condenar os A.A. nas custas processuais.
C. Nulidade por omissão de pronúncia:
D. Os autores na sua petição inicial alegaram a inconstitucionalidade do disposto no nº 2, do art.º 9º do DL 128/2014 de 29/08, na redacção da Lei 62/2018 de 22/08, na medida em que restringe o direito de propriedade, violando o princípio da proporcionalidade, relativamente a outros direitos em conflito, como o direito ao sossego e à privacidade, na interpretação feita pelo acórdão do STJ nº 4/2022 de 22/03/2022, uniformizador de jurisprudência, publicado no DRE – I série de 10/05, de que “no regime da propriedade horizontal, a indicação no título constitutivo, de que certa fracção se destina a habitação, deve ser interpretada no sentido de nela não ser permitida a realização de alojamento local”, por violação do art.º 62 – nº 1, 17 e 18 – nº 2 da Constituição da República Portuguesa.
E. Ora a presente questão apresentada ao Tribunal recorrido foi absolutamente ignorada, não havendo nada na sentença que dê resposta ao caso presente.
F. O art.º 608º, nº 2 do CPC estabelece que: "O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras;”
G. Ora a solução dada a outras questões não prejudicou o conhecimento da inconstitucionalidade levantada, pelo que deveria sim o tribunal recorrido pronunciar-se acerca da questão levantada.
H. Tudo na senda do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no proc.12131/18.6T8LSB.L1.S1de10.12.2020, onde se pode ler: “I -A nulidade por omissão de pronúncia, representando a sanção legal para a violação do estatuído naquele 2, do artigo 608.º, do CPC, apenas se verifica quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre as «questões» pelas partes submetidas ao seu escrutínio, ou de que deva conhecer oficiosamente, como tais se considerando as pretensões formuladas por aquelas, mas não os argumentos invocados, nem a mera qualificação jurídica oferecida pelos litigantes.”
I. A sentença é nula porquanto não se pronunciou sobre o vício da inconstitucionalidade do disposto no nº 2, do art.º 9º do DL 128/2014 de 29/08, na redacção da Lei 62/2018 de 22/08, na interpretação feita pelo acórdão do STJ nº 4/2022 de 22/03/2022, uniformizador de jurisprudência, publicado no DRE – I série de 10/05, por violação do art.º 62 – nº 1, 17 e 18 – nº 2 da Constituição da República Portuguesa.
J. Da matéria de facto, a douta sentença deu como provados os seguintes factos:
K. [ponto 1. dos factos provados]
L. [ponto 2. dos factos provados]
M. [ponto 3. dos factos provados]
N. [ponto 4. dos factos provados]
O. [ponto 5. dos factos provados]
P. [ponto 6. dos factos provados]
Q. [ponto 7. dos factos provados]
R. Por outro lado, foram tidos como não provados os seguintes factos:
S. [ponto A. dos factos não provados]
T. [ponto B. dos factos não provados]
U. [ponto C. dos factos não provados]
V. Quando à matéria de facto, este recurso versará sobre duas questões: a primeira delas:
W. Refere-se na douta sentença recorrida, trazendo à colação normas do Código das Sociedades Comerciais, em que não vislumbramos norma que imponha a possibilidade de recurso aos normativos do direito societário para apreciar a legalidade das deliberações das assembleias de condóminos, o seguinte: “Quanto aos elementos que deverão constar da acta, haverá ainda que atentar no disposto no art. 63.º do Código das Sociedades Comerciais, que por via de interpretação analógica deverá ser aplicado mutadis mutandi às assembleias de condomínio, as quais, atenta a sua natureza, consubstanciam verdadeiras assembleias gerais com similitudes claras com as assembleias das sociedades comerciais.”
X. Ora, salvo o devido respeito, os autores não podem aceitar tal interpretação, por absoluta falta de suporte legal.
Y. Assim, tal como se afirmou no art.º 48 da petição “ depois de se cumprir esta formalidade, é que se poderia avançar para a fase da decisão, pelo que a deliberação tomada é anulável por falta da audiência contraditória dos autores, constituindo tal procedimento violação do disposto no 2, do art.º do DL 268/94 de 25/10, na redacção do art.º da Lei 8/2022 de 10/01.”
Z. Nesta parte, a douta sentença recorrida padece de erro de direito, pelo que com este fundamento, o recurso deverá ser julgado procedente.
AA. Na deliberação impugnada, não se fez prova de qualquer prática de actos que perturbem a normal utilização do prédio e de actos que causem incómodo e afectem o descanso dos condóminos, previstos no nº 2, do art.º 9º do DL 128/2014 de 29/08, na redacção
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT