Acórdão nº 2882/23.9BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 19-03-2024

Data de Julgamento19 Março 2024
Ano2024
Número Acordão2882/23.9BELSB
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I Relatório
J………….., militar da GNR, no âmbito de Providência Cautelar apresentada contra o Ministério da Administração Interna, tendente a que fosse decretada providência cautelar de suspensão de eficácia do ato administrativo que consiste no despacho de 11.07.2023 do Senhor Ministro da Administração Interna, notificado em 20.08.2023 que lhe aplicou, no âmbito do Processo Disciplinar n°……./12.CTLSB, a pena de separação de serviço prevista nos artigos 27° n° 2 alínea e) e 33° do Regulamento de Disciplina da Guarda Nacional Republicana (RDGNR), aprovado pela Lei n°145/99, de 1 de Setembro”, inconformado com a Sentença proferida no TAC de Lisboa em 8 de dezembro de 2023, através da qual foi julgada improcedente a presente Providência Cautelar, veio em 27 de dezembro de 2023 interpor recurso jurisdicional da referida decisão, no qual concluiu:
“a) Dos factos provados na sentença recorrida, resulta que o requerente tem 60 anos de idade, é militar da GNR desde 1986, tendo desempenhado as suas funções com zelo, merecendo até um louvor, tendo sido condenado pro 6 crimes de corrupção passiva, cometidos entre 2012 e 2013.
b) Resulta ainda que é o único sustento do seu agregado familiar composto por si e pela esposa, desempregada.
c) Que pagam um crédito habitação própria permanente e seguro associado, e que se encontram em precária situação económica em virtude da aplicação do ato suspendendo.
d) Resulta ainda que o Tribunal recorrido entende que provavelmente procederá a argumentação do requerente de que o ato suspendendo está ferido de vicio de violação de lei por não lhe aplicar a lei mais favorável, ou seja, o Regulamento Disciplinar da GNR que estava em vigor à data de prática dos factos ilícitos pelos quais foi condenado.- verificado portanto o "fumus boni iuri".
e) Resulta ainda provado que a GNR demorou 9 anos para concluir o processo disciplinar que nessa sequência lhe instaurou.
f) Entendeu o tribunal recorrido estarem verificados o requisitos para que fosse decretada cautelarmente a providência que requereu, de suspensão do despacho do Ministro da Administração Interna que lhe aplicou a pena disciplinar de separação de serviço,
g) contudo, não a decretou!
h) Assim, os fundamentos da decisão estão em contradição com ela, o que se traduz na nulidade da mesma.
i) A pena disciplinar assim aplicada é sentida apenas como vingança da GNR e não Justiça feita...quanto assim é, perde o Estado de Direito democrático, pois é impossível entender a lógica e a Justiça da pena disciplinar aplicada, o que também não é colmatado na sentença recorrida...
j) Por outro lado, não está fundamentada a decisão recorrida no que toca ao prejuízo mais elevado para a GNR do que para o requerente, na medida em a decisão apenas conclui que há um prejuízo maior, sem explicar em que medida ou de que factos retira tais prejuízos agravados,
k) donde se trata de uma decisão nula por falta de fundamentação.
REGRAS JURÍDICAS VIOLADAS:
A) Foi violada a norma plasmada no artigo 120.° n.°1 do CPTA, que manda decretar a providência cautelar sempre que se prove "fumus boni iuri e "periculum in mora', pois que considerando verificados estes requisitos para decretamento da providência cautelar, não a decretou.
B) Foi violada a norma inserida no artigo 615.° n.°1 alínea c) do CPC, que impõe que os fundamentos não estejam em contradição com a decisão, pois que o texto da sentença contradiz a decisão .
C) Foi violada a disposição do artigo 615.° alínea b) do CPC, que manda fundamentar as decisões, pois que a sentença recorrida apenas formula conclusões acerca do maior prejuízo para a GNR da suspensão do despacho de separação de serviço, sem explicar em que factos se funda sobretudo quando a GNR demorou 9 anos para concluir o processo disciplinar.
Nestes Termos e nos melhores de Direito, Requer-se respeitosamente a Vossas Excelências se dignem conceder provimento ao presente recurso, substituindo a decisão recorrida por outra, que suspenda o despacho do Ministro da Administração Interna que aplicou ao requerente a pena disciplinar de separação de serviço.”

O aqui Recorrido/MAI veio apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 11 de janeiro de 2024, sem conclusões. Terminando, afirmando “que a douta sentença recorrida não padece de qualquer vício, designadamente dos que lhe são assacados pelo recorrente.
Nestes termos e nos melhores de direito, sempre com o mui douto suprimento dos Venerandos Desembargadores, deve o presente recurso jurisdicional ser julgado improcedente.”

O Recurso Jurisdicional apresentado veio a ser admitido por Despacho de 16 de janeiro de 2024, mais tendo sido reafirmado e confirmado o sentido da sentença proferida, atentas as nulidades suscitadas.
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 1 de fevereiro de 2024, veio a emitir Parecer em 6 de fevereiro de 2024 no qual, a final, se pronuncia no sentido de “que deve ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se na íntegra a decisão recorrida, por a mesma não padecer dos vícios que lhe vêm assacados, nem de qualquer outro que cumpra conhecer.”
Com dispensa de vistos prévios (art.º 36º, nº 2, do CPTA), cumpre decidir.

II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, onde se suscita que se afigura que “a sentença enferma da nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão - art° 615°, n° 1, al. c), do Código de Processo Civil”, e que “a sentença enferma da nulidade por falta de fundamentação - art° 615°, n° 1, al. b), do Código de Processo Civil”.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade provada:
“1. Desde 25.10.1986, o Requerente desempenha a atividade de militar da GNR, estando atualmente na situação de reserva fora da efetividade de serviço, adstrito ao Comando Territorial de Lisboa - cfr. fls. 50/51 do PA (parte 1) e por acordo das partes;
2. Em 30.01.2017, foi proferida sentença no âmbito do Processo crime n.° 2100/13.8JFLSB, que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte - Loures, nos termos da qual o Requerente foi condenado: “(...) como autor material, na forma consumada e em concurso real, de seis crimes de corrupção passiva, previstos e punidos pelo artigo 373°, n.° 1, do Código Penal, na pena de dois anos e seis meses de prisão, para cada um dos crimes, não se condenando o arguido na pena acessória de proibição de exercício de funções’"- cfr. fls. 152 a 243 do PA (partes 4 a 6) e por acordo das partes;
3. Em 06.07.2017, foi proferido, em sede de recurso da sentença indicada no ponto anterior, Acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa, que julgou parcialmente procedente o recurso - cfr. fls. 248 a 287 do PA (partes 6 a 7), que ora se extrata parcialmente:
1. Condenar o arguido J……………como autor material, na forma consumada e em concurso real, de 6 (seis) crimes de corrupção passiva, previstos e punidos pelo artigo 373°, na 1, do Código Penal na pena de 2 (dois) anos de prisão, para cada um dos crimes, não se condenando o arguido na pena acessória de proibição de exercício de funções.
2. Operando o cúmulo jurídico das penas parcelares de prisão, nos termos do disposto no art. 77a, nas 1, 2 e 3 do Código Penal, condenar o arguido J…………..na pena única de 5 (cinco) anos de prisão.
3. Suspender a execução da pena aplicada em cúmulo jurídico ao arguido J…………., por igual período de tempo, (art® 50® n® 1 e 5 do cód. penal).
4. Em 05.12.2013, por despacho do Comandante do Comando Territorial de Lisboa foi instaurado processo disciplinar ao Requerente, sob o n.° PD ……./13CTLSB - cfr. fls. 1 do PA (parte 1);
5. O processo disciplinar indicado no ponto antecedente ficou suspenso, entre 03.02.2014 e 20.08.2023, até à extinção da pena aplicada no processo penal - por acordo das partes;
6. Em 06.03.2019, foi elaborado o Relatório Final em sede disciplinar - cfr. fls. 429 do PA (parte 10), cujo teor ora se extrata parcialmente:
III - ACUSAÇÃO
1. Desta forma, foi deduzida Acusação contra o arguido (de fls. 361 a 374), (que, por uma questão de economia processual aqui se dá por integralmente reproduzida, para todos os efeitos legais), na qual foram discriminados os factos que lhe são imputados, qualificados juridicamente na redação do RDGNR-----------------------------------------
2. A sua Ilustre Mandatária, Dra. P………, foi notificada da diligência de Acusação (fls. 359}.-----------------------------------------------------------------------------------
3. O arguido foi notificado desta Acusação e de Informação dos seus direitos e garantias na fase de defesa (fls. 375).----------------------------------------------•—.........
IV - DA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO
1. Ao arguido, para resposta à acusação, foram-lhe atribuídos 20 (vinte) dias, -----
2. O arguido apresentou a Resposta escrita à Acusação, em 15FEV2019, através do seu Mandatário (de fls. 377 a 420),-------------------—-----------------------------------
3. Na Resposta à Acusação, a sua Ilustre Mandatária, requer a reapreciação da prova gravada no julgamento do processo com o NUIPC ……../13.08JFLSB e, substituída a pena disciplinar aplicada (proposta) de separação de serviço, pela de suspensão agravada. Não se entendendo, que deva ser substituída a pena de separação de serviço, pela pena de reforma compulsiva (fls. 397 e 419).-----
4. No dia 22 de Fevereiro de 2019, foram expedidas duas cartas registradas com aviso de receção para o arguido e sua Ilustre Mandatária, com o despacho de indeferimento das diligências requeridas pelos mesmos na fase de defesa do presente PD, nos termos previstas...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT