Acórdão nº 277/15.7TELSB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2024-02-06

Ano2024
Número Acordão277/15.7TELSB.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora
Acordam, em conferência, os juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:
Notificados do requerimento acusatório deduzido pelo Ministérios Público, que acusou os arguidos AA, BB, CC, DD, EE, FF e GG, em co-autoria material da prática de 1 (um) crime de fraude fiscal qualificada na forma continuada (previsto e punível pela alínea b) do nº 1 do art.º103º RGIT, por referência ao nº 3 do art.º 104º do mesmo diploma legal e art.º 30º do Código Penal), os arguidos HH e II, em co-autoria material da prática de 1 (um) crime de fraude fiscal qualificada (previsto e punível pela alínea b) do nº 1 do art.º 103º RGIT, por referência à alínea b) do nº 2 do art.º 104º do mesmo diploma legal e art.º 30º do Código Penal), os arguidos JJ e KK, em co-autoria material da prática de 1 (um) crime de fraude fiscal qualificada na forma continuada (previsto e punível pela alínea b) do nº 1 do art.º 103º RGIT, por referência ao nº 3 do art.º 104º do mesmo diploma legal e art.º 30º do Código Penal), as arguidas LL, MM, NN, OO, PP, QQ, RR e SS, da prática de 1 (um) crime de fraude fiscal qualificada na forma continuada (previsto e punível pela alínea b) do nº 1 do art.º 103º RGIT, por referência ao nº 3 do art.º 104º do mesmo diploma legal e art.º 30º do Código Penal) e a arguida TT de 1 (um) crime de fraude fiscal qualificada (previsto e punível pela alínea b) do nº 1 do art.º 103º RGIT, por referência à alínea b) do nº 2 do art.º 104º do mesmo diploma legal e art.º 30º do Código Penal), vieram os arguidos PP, CC, BB, II e TT, requerer a abertura de instrução

No termo da instrução, o Exmº. Sr. Juiz de Instrução por despacho proferido em 13/07/2023, decidiu:

- Nestes termos, não podem os arguidos PP, CC, BB, II e TT ser pronunciados, nesta sede, pela prática dos crimes de fraude fiscal qualificada, p. e p. pela alínea b) do nº 1 do art.º 103º RGIT, por referência ao nº 3 do art.º 104º do RGIT, que lhes foram imputados, por via da nulidade da acusação, dos presentes autos, que expressamente se declara, com os contornos previstos no artigo 122°, do C. P Penal, declarando-se nula a acusação e todos os actos subsequentes á mesma e a ela respeitantes determinando-se a, oportuna, remessa dos autos ao Ministério Público para os efeitos tidos por convenientes. (negrito nosso)

É do último segmento do sobredito despacho que os arguidos PP, CC, BB, II e TT recorrem para esta Relação, formulando, no termo da sua motivação, as seguintes conclusões:

“ A - Vem o presente Recurso interposto da Douta Sentença lavrada nos autos pela Mm.º Juiz “a quo”, pela qual se considera que: «(fls. 8 e 9) “Assim, e por todo o exposto, a acusação terá, efectivamente, que ser considerada nula, por violação do disposto nos artigos 283.º, número 3, al. b), do Código de Processo Penal e 32.º, números 1 e 5, da Constituição da República Portuguesa,

B - Por via da nulidade da acusação, dos presentes autos, que expressamente se declarada, com os contornos previstos no artigo 122.º, do C. P. Penal, declarando-se nula a acusação e todos os actos subsequentes à mesma e a ela respeitantes, determinando-se a oportuna, remessa dos autos ao Ministério Público para os efeitos tidos por convenientes”.

C - Precise-se assim, que é esta última parte do acervo decisório que o presente Recurso versa, tendo em linha de conta, que ao ser declarada (e quanto a nós, muito bem) a nulidade da acusação, não poderia, nem deveria a M. m.ª Juiz a quo, ter decidido (como o fez), i.e. pela remessa dos autos ao Ministério Público e, muito menos, para os efeitos que tiver por convenientes.

D - Em abono da verdade, o presente recurso tem a sua génese no destino a dar ao processo após a declaração de nulidade da acusação por ofensa do ínsito na alínea b) do n.º 3 do art. 283.º do CPP.

E - Consumada a declaração de nulidade da acusação, a M. m. ª juiz a quo, determina a remessa dos autos para o M.P., para os efeitos tidos por convenientes.

F - Desde logo, fica por entender o que entende a M. mª Juiz a quo “por efeitos tidos por convenientes”, e menos se entende, qual a motivação para a remessa dos autos ao M.P.

G - E se a acusação é nula porque – “[(….), apresenta-se totalmente omissa no que respeita à fundamentação necessária que permita aferir-se do percurso cognitivo percorrido pelo Digníssimo Magistrado do Ministério Público, que o levou a concluir da forma que o fez.”, o mesmo se terá de aplicar, mutatis mutandis, quanto à fundamentação (ou falta dela) na parte deste Despacho recorrido.

H - Em abono da verdade, os Recorrentes apenas podem presumir, com base no Despacho Instrutório que a remissão dos autos ao M.P., apenas visa a possibilidade de a acusação ser reformulada.

I - Este é o pensamento que pode ser induzido, pela decorrência lógica do antevertido, no entanto, estamos em crer que é manifestamente insuficiente para se ter por fundamentado.

J - A assim o ser, também esta decisão de que ora se recorre, padece do vício de falta de fundamentação, contrariando o plasmado nos artigos 205.º, n.º 1 da C.R.P. e art. 97.º, n.º 5 do CPP.

L - Neste ponto e tendo sido declarada a nulidade da acusação, coloca-se a questão de saber, se se deve seguir o regime da invalidade previsto no artigo 122.º do CPP ou, em alternativa, trilhar o caminho do arquivamento dos autos.

M – Decorre da jurisprudência maioritária que a consequência perante a declaração de uma acusação nula, por violação dos requisitos necessários para a ter por conforme – os factos essenciais ao preenchimento do tipo legal imputado, ou seja, os essenciais à condenação – passará pelo arquivamento da mesma e ainda, pela preclusão da possibilidade de emergir nova acusação quando não surgem factos novos que a sustentem.

N - Assim o impõe a harmonização do sistema jurídico, porquanto, sendo a fase da instrução facultativa e (diremos nós), saneadora do próprio processo, seria intrinsecamente contraditório, que a declaração de nulidade de uma acusação em sede de julgamento, tenha por consequência o arquivamento do processo (artigo 311.º do CPP), enquanto a mesma declaração de nulidade da acusação em sede de instrução, implicasse resultado diferente, mormente, passando pela possibilidade do Ministério Público prover a alguma correção; ou ainda, formular uma nova acusação.

O – Ademais, segundo o nosso humilde entendimento, a consequência jurídica proposta pela Mm.ª Juiz a quo, entra em conflito com o princípio da igualdade, tendo em linha de conta, que consoante se esteja perante uma situação/direito, de uso facultativo, conferido a favor do arguido – Instrução –, as consequências para a mesma situação são, diametralmente opostas, resultando inadmissível que o Juiz possa ordenar ao Ministério Público os termos em que deve formular acusação.

P - E se assim o é, por maioria de razão não pode o Juiz suprir os vícios de que a acusação padeça, mormente, convidando o Ministério Público a suprir as deficiências da acusação, renovando a violação do princípio da igualdade - i.e., face à nulidade da acusação, o Ministério Público teria uma derradeira hipótese para sanar esse vício, enquanto, por exemplo, o Assistente, colocado em posição semelhante, não poderia beneficiar da mesma prerrogativa.

Q - Acresce que no direito processual penal vigora o princípio da preclusão, pelo que uma vez proferida a acusação, fica precludida a possibilidade de o Ministério Público renovar a prática desse ato.

R - E se V. Exas., Venerandos Desembargadores, assumirem por boa a tese preconizada pelos recorrentes, a consequência a extrair do arquivamento da acusação, terá de abarcar todos os demais arguidos nela contidos, mesmo aqueles, que não requereram a Abertura de Instrução.

S - Por outras palavras, a própria acusação é por si só nula em toda a sua integralidade e plenitude, o que motiva que a declaração de nulidade tenha os mesmos efeitos para todos os arguidos nela contemplados e, não, tão só, aqueles que requereram a abertura da instrução.

T - Neste conspecto, não obstante a nulidade da acusação ter sido requerida por alguns dos arguidos, a mesma aplica-se a todos.

U - Desde logo porque, analisando o teor do despacho de acusação, facilmente se constata que a metodologia é a mesma para cada um dos “casos” nela descritos.

V - Pelo que, a violação do disposto no artigo 283.º, n.º 3, alínea b) do CPP é transversal a toda a narração efetuada na Acusação, razão pela qual, a decisão instrutória declara a nulidade global (e não parcial) da acusação, como aliás, só assim podia suceder.

X - A tudo isto, acresce a proibição da prática de atos inúteis, tendo em linha de conta que como aferido, a acusação não reúne os elementos necessários para ser válida, e deste modo, sempre a consequência seria a absolvição de todos os arguidos nela contemplados.

Z - Face a tudo o que se acabou de expor, deverá a decisão instrutória proferida nos autos ser revogada na parte em que ordenou a oportuna remessa dos autos ao Ministério Público para os efeitos tidos por convenientes, que deverá ser substituída pelo arquivamento dos presentes autos relativamente a todos os arguidos, dando assim cumprimento ao ínsito no n.º 4 do art. 307 do CPP.

Nestes termos e nos mais de Direito e com o sempre Mui Douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e em consequência, revogar a decisão recorrida na parte em que ordenou a oportuna remessa dos autos ao Ministério Público para os efeitos tidos por convenientes, a qual deverá ser substituída pelo arquivamento dos presentes autos relativamente a todos os arguidos.

Pelo que deve ser em conformidade revogada a douta decisão recorrida nesses segmentos e substituída por outra decisão que decida como pedido nos termos deste recurso,

Com o que se fará

Sã, SERENA E OBJECTIVA JUSTIÇA”

O Ministério Público respondeu às motivações de recurso apresentadas pelos Arguidos, pugnando pela improcedência do...

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