Acórdão nº 262/20.7PBLMG-C.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 10-04-2024
Data de Julgamento | 10 Abril 2024 |
Ano | 2024 |
Número Acordão | 262/20.7PBLMG-C.C1 |
Órgão | Tribunal da Relação de Coimbra - (VISEU (JUÍZO LOCAL CRIMINAL DE LAMEGO)) |
Adjuntas: João Abrunhosa
Helena Lamas
*
Acordam, em Conferência, os Juízes da 4ªSecção Penal do Tribunal da Relação de Coimbra.
I.Relatório
1.
Nestes autos de processo comum singular com o número 262/20...., do Tribunal Judicial da Comarca de Viseu - Juízo Local Criminal ... - por despacho proferido em 21/1/2023, foi decidido indeferir por intempestivo o pedido de indemnização civil deduzido pela assistente em 18/10/2023.
Tal despacho é do seguinte teor:
“Por intempestivo não se admite o Pedido de Indemnização Cível deduzido pela assistente em 18-10-2023.
Com efeito e como se decidiu no aresto do Tribunal da Relação de Coimbra de 26-04-2017 (Relatora Maria José Nogueira, Processo n.º 44/10.4TASBG-A.C2, disponível em www.dgsi.pt.) que, doravante, seguiremos de perto, é pacífica, na doutrina e jurisprudência, o entendimento que qualifica o requerimento da abertura da instrução apresentado pelo assistente na sequência do despacho de arquivamento do Ministério Público - no campo dos crimes públicos e semipúblicos - como uma verdadeira acusação alternativa, “na qual – desde logo por via do princípio do acusatório e da vinculação temática - tem de constar os elementos descritos nas alíneas b) e c) do n.º 3 artigo 283.º do CPP a saber: A narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada; A aplicação das disposições legais aplicáveis [cf. o artigo 287.º, n.º 2 in fine do CPP], sob pena de, assim não sendo, para além de nulo, constituir motivo de rejeição, por inadmissibilidade legal, da «acusação»”. (…) A configuração de acusação alternativa, de acusação em sentido material, ou seja que não sendo uma acusação em sentido processual-formal, deve constituir processualmente uma verdadeira acusação em sentido material, que delimite o objeto do processo, da acusação que o assistente entende que deveria ter sido produzida, é uma constante na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, objeto de afirmação em vários arestos, como, a título exemplificativo, sucede ainda nos acórdãos de 16.06.2008 (proc. n.º 2050/06 -3.ª), de 25.10.2006 (proc. n.º 3526/06.3.ª)”.
Ora, prevê-se no art. 77.º, n.º 1 do Código de Processo Penal que quando apresentado pelo Ministério Público ou pelo assistente, o pedido é deduzido na acusação ou, em requerimento articulado, no prazo em que esta deve ser formulada.
Destarte julgamos, na esteira do sobredito aresto, que se deve aplicar por analogia o n.º 1 do artigo 77.º do Código de Processo Penal “porquanto dada a natureza de acusação alternativa que reveste o requerimento em questão procedem as razões justificativas daquela disciplina, assim se garantindo a harmonia do sistema”. Donde, “em função da natureza de verdadeira acusação em sentido material que reveste o requerimento de abertura da instrução apresentado, na sequência do despacho de arquivamento [no caso de crimes públicos e/ou semipúblicos], pelo assistente perfilhamos o entendimento de que a lacuna assinalada há-de ser integrada pela aplicação analógica do n.º 1 do artigo 77.º do C. Penal, conduzindo à necessidade do pedido ser deduzido no prazo em que aquele deve ser formulado, o que não havendo sucedido conduz à respetiva extemporaneidade” .
No caso em apreço, o Pedido de Indemnização Cível não foi apresentado no prazo fixado para a entrega do requerimento de abertura de instrução plasmado no art. 287.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, mas só após a prolação do despacho de pronúncia, donde se conclui pela sua manifesta extemporaneidade.
Naturalmente sem embargo da hipótese de arbitramento da reparação oficiosa prevista no art. 82.º A, n.º 1 e n.º 2 do Código de Processo Penal e no art. 21.º, n.º 2 da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro.
Anote nos lugares próprios
(…)”.
2.
Não se conformando com o decidido, veio a assistente interpor o presente recurso, extraindo da motivação as seguintes conclusões (transcrição):
I.A douta decisão recorrida, referente à não admissão do PIC deduzido pela Assistente, aqui Recorrente, proferida por despacho de 21-11-2023, não pode manter-se, pois é atentatória dos elementares princípios de justiça e legalidade.
II. A decisão processual que o Meritíssimo Juiz proferiu no presente processo consubstancia uma decisão injusta, errada e ILEGAL.
III.O presente recurso tem assim por base, a reformulação da decisão, que considerou o PIC deduzido pela Assistente intempestivo.
IV. Não se compreende a interpretação efectuada pelo Mmo. Juiz de Direito.
V. A jurisprudência invocada no douto despacho não permite extrair a conclusão aplicada na decisão recorrida.
VI. Pois, o Requerimento de Abertura de Instrução (doravante RAI) deve ser considerado uma verdadeira acusação, mas só após ser proferido o competente DESPACHO DE PRONÚNCIA.
VII. Esse entendimento em nada conflitua com o art.º 77.º, n.º 1 do CPP, bem pelo contrário.
VIII. O despacho de pronúncia é que limita os factos sobre os quais o Arguido deverá ser julgado.
IX. O Arguido pode ser pronunciado sobre todos, ou apenas alguns os factos constantes do RAI!
X. A instrução – que não foi no caso do presente processo – pode ser requerida pelo Arguido.
XI. A instância (processo), aquando da abertura de instrução, ainda não está estabilizada, por forma a poder-se deduzir o competente PIC.
XII. Que se distingue de uma acusação de natureza particular, pois aí cabe à Assistente delimitar os competentes factos.
XIII. Nesse caso, aos factos que poderão seguir para julgamento estão estabilizados!
XIV. Aqui estamos perante um crime de natureza pública!
XV. A única reacção ao arquivamento era requerer a abertura de...
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