Acórdão nº 25668/22.3T8LSB-B.L1-8 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2024-01-11

Ano2024
Número Acordão25668/22.3T8LSB-B.L1-8
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na 8ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa



A [ Maria ….] intentou procedimento cautelar de arrolamento dos bens comuns do casal, como incidente da acção de divórcio, ex vi art. 409 CPC, contra B [ Fernando ….] .

Por decisão datada, de 22/8/23, foi decretado, com dispensa do contraditório, o arrolamento dos bens comuns do casal – imóveis, recheio da casa, veículos automóveis, acções, contas bancárias - cfr. fls. 32 e sgs.

Na sequência da notificação efectuada pelo Tribunal - arrolamento de 520.000 acções representativas do capital social (52% do capital social) da sociedade e a conta de financiamentos obtidas através de accionistas constante no balanço e contas da sociedade, no exercício de 2021 cujo saldo era de € 3.178.440,00 - a Sociedade Comercial ----- S.A., informa que o requerido é titular do valor das acções, constituindo as mesmas bens próprios do requerido, o aumento da sua participação adveio de doação de seu pai e irmão e que a conta de financiamentos obtidos através de accionistas, em 25/8/23, era de € 1.518.632,57 – fls. 39/40.

Na resposta a requerente impugnou o alegado – fls. 41 e sgs.

Em 25/9/2023, foi proferido despacho que indeferiu o requerido com fundamento no facto de que tendo sido decretado o arrolamento não é esta a sede para prestação de contas e/ou discussão sobre se os bens arrolados são ou não próprios e/ou comuns ou fazer o trato sucessivo da sua titularidade e/ou valores eventualmente objecto de alteração/movimentação, ordenando a efectivação do arrolamento nos termos decretados mediante o seu averbamento no registo comercial, ordenado que, face à acção de divórcio, o arrolamento da conta dos suprimentos fosse fixada à data, de 31/10/22, notificando-se a sociedade comercial – fls. 49.

Inconformada, a sociedade apelou formulando as conclusões que se transcrevem:
A.–No presente procedimento cautelar de arrolamento, o Requerido é accionista e presidente do Conselho de Administração da ora Recorrente.
A Recorrente não é parte na causa, mas tem legitimidade para recorrer ao abrigo do disposto no artigo 631/2 CPC.
B.–O primeiro contacto da Recorrente com os presentes autos deu-se por notificação datada, de 25.08.2023, com a ref.ª 428155379, recebida pela ora Recorrente, em 28.08.2023, pela qual foi notificada de que as acções detidas pelo Requerido e representativas do seu capital social e a conta de financiamentos obtidos através de acionistas constante no balanço e contas da Recorrente ficavam arroladas à ordem do Tribunal, ficando a Recorrente depositária da(s) do arrolamento [sic] nos termos do art. 781/5 do Código de Processo Civil”. A Recorrente foi ainda notificada para fazer as declarações que entendesse quanto ao direito do Requerido e ao modo de o tornar efectivo.
C.–Em 06.09.2023, a Recorrente respondeu à notificação recebida, por requerimento submetido através do sistema CITIUS (ref.ª 46423662), tendo informado os autos, inter alia, de que a conta de financiamentos obtidos através de accionistas tem, por referência à data de 25.08.2023, o valor de € 1.518.632,57 (um milhão, quinhentos e dezoito mil seiscentos e trinta e dois euros e cinquenta e sete cêntimos) (…).”
D.–Em 21.09.2023, a Requerente do arrolamento, ora Recorrida, respondeu ao requerimento da Recorrente, por requerimento com a ref.ª 46571576, no qual requereu que seja feito o Registo Comercial do presente procedimento cautelar na …..SGPS, SA junto da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa”, bem como que “seja ordenada a fixação do valor da conta de financiamentos obtidos pelos accionistas, com referência às contas da ….. SGPS, SA no 1º semestre de 2022, ou seja, a 30-06-2022, contas fechadas e auditadas pelo Revisor Oficial de Contas” e que “seja ordenada a descrição dos valores e destino dos movimentos da referida conta, desde 30-06-2022 até à data de 31-10-2022, data da entrada em juízo da acção de divórcio por parte do Requerido, fixando-se o valor exacto da conta a essa data de 31-10-2022 (…)”.
E.–Na medida em que estes pedidos a afectam directamente, a Recorrente respondeu, por requerimento de 04.10.2023 (ref.ª CITIUS 46700303), no qual fez notar que os mesmos são desprovidos de base legal.
F.–Em 25.09.2023, foi proferido o despacho recorrido, por via do qual o Tribunal a quo ordenou o averbamento do arrolamento no registo comercial da Recorrente e fixou o arrolamento da conta de suprimentos à data, de 31.10.2022, mais tendo ordenado a notificação da Recorrente para o efeito.
G.–A Recorrente tem legitimidade para recorrer, ao abrigo do disposto no artigo 631/2 CPC, já que é prejudicada pela decisão, porquanto foi ordenado o averbamento do arrolamento no seu registo comercial”, para além do que a Recorrente foi nomeada pelo Tribunal como depositária das acções do Requerido e da conta de financiamentos (cfr. notificação datada de 25.08.2023), mas não está em condições de cumprir o arrolamento, nos termos impostos pelo despacho recorrido, no que toca à conta de financiamentos, já que, de acordo com este despacho, o arrolamento deve abranger o saldo existente em data anterior à da sua notificação para o arrolamento, sendo que a Recorrente não pode ficar depositária de um valor que já não existia nas suas contas à data em que foi notificada para o arrolamento, da mesma forma que não pode ser acusada de incumprir o arrolamento decretado pelo Tribunal.
H.–No mais, o presente recurso é admissível por dois motivos: (i) por estarmos perante uma decisão proferida depois da decisão final, como decorre do artigo 644/2 al. g), do CPC – embora a Recorrente não tenha sido notificada e não conheça o teor da decisão final, do despacho recorrido consta a menção a que a sentença foi proferida a fls. 58-62 dos autos; e (ii) por estarmos perante uma decisão cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil, como decorre do artigo 644/2 al. h), do CPC – de facto, ainda que se entenda que não estamos perante uma decisão proferida depois da decisão final, porquanto a sentença de arrolamento foi proferida sem audiência do Requerido e, como tal, caso o mesmo deduza oposição após ser notificado para tal, será proferida nova decisão (cfr. artigos 366/6 e 372/3 do CPC), a verdade é que o presente despacho é que pode ser considerado prejudicial aos interesses da Recorrente, sendo certo que a Recorrente pode nem sequer ser notificada da nova sentença, já que não é parte na causa.
I.–O despacho recorrido violou o disposto no artigo 3/1 do Código do Registo Comercial (“CRC”), já que a titularidade de acções representativas do capital social de uma sociedade anónima e respectivas vicissitudes e ónus não estão sujeitos a registo comercial. Apenas estão sujeitos a registo os factos relativos às sociedades comerciais elencados no referido artigo, sendo que, de acordo com o seu nº 1, al. f), só está sujeito a registo o arrolamento de quotas, e não o arrolamento de acções.
J.–A Recorrente tem outros accionistas, sendo o Requerido detentor de acções representativas de apenas 52% do seu capital social, e não de 100% do referido capital social, pelo que nem se compreende como poderia ser efectivado o arrolamento mediante o seu averbamento no registo comercial”.
K.–O despacho recorrido violou também o disposto nos artigos 403, 406, 408 e 780 CPC, já que extravasou o âmbito da providência cautelar de arrolamento ao fixá-la com efeitos retroactivos e ao mandar notificar a Recorrente em conformidade, uma vez que a Recorrente não tem qualquer poder ou responsabilidade sobre os montantes reembolsados ao seu accionista em data
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