Acórdão nº 25397/09.3YYLSB-A.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2024-03-21

Ano2024
Número Acordão25397/09.3YYLSB-A.L1-2
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa os Juízes Desembargadores abaixo identificados


I. Relatório


Na presente execução, sob a forma de processo comum ordinário para pagamento de quantia certa, em que figuram, como Exequente, …, e, como Executados, …, foi penhorada, em …, parte da pensão auferida pela Executada …, com início dos descontos em dezembro de 2022, prolongando-se depois pelos meses seguintes, até perfazer o total da quantia exequenda, acrescida das despesas da execução.
*

Inconformada com tal penhora, veio a Exequente requerer o seu levantamento, com fundamento na impenhorabilidade da sua pensão, atento o disposto no art.º 738.º, n.º 3 do Código de Processo Civil.

Para tanto, e em síntese, alegou o seguinte.
Em 09-01-2023, foi notificada da penhora da sua pensão, com descontos a partir de dezembro de 2022 e pelos meses seguintes, até perfazer o total da quantia exequenda, acrescida das despesas da execução.
Aufere uma pensão de velhice no valor mensal de € 555,78, acrescida, nos meses de julho e de dezembro de cada ano, de um montante adicional de igual quantitativo, nos termos do art.º 41.º do D.L. n.º 187/2007, de 10/05.
Nos termos do art.º 738.º, n.º 1, do CPC são impenhoráveis dois terços da parte líquida dos vencimentos, salários, prestações periódicas pagas a título de aposentação ou de qualquer outra regalia social, seguro, indemnização por acidente, renda vitalícia, ou prestações de qualquer natureza que assegurem a subsistência do executado.
Tal impenhorabilidade, nos termos do n.º 3 do art.º 738.º do CPC, tem como limite máximo o montante equivalente a três salários mínimos nacionais à data de cada apreensão e como limite mínimo, quando o executado não tenha outro rendimento, o montante equivalente a um salário mínimo nacional.
Não há fundamento para afirmar que os montantes adicionais pagáveis aos pensionistas em julho e dezembro têm, para efeitos do art.º 738.º do CPC, natureza diferente das pensões de reforma.
Assim, para aferir da impenhorabilidade dos montantes por si auferidos a título de subsídio de férias e de Natal, sendo que recebe uma pensão de montante inferior ao salário mínimo nacional, o cálculo deverá ser efectuado pelo montante global dos seus rendimentos, onde se incluem tais subsídios, e dividi-lo por doze.
Efetuando a multiplicação de € 555,78 por 14 prestações mensais, tal operação perfaz o valor de 7.808,92€.
Ao dividir esse valor de 7.808,92€ por 12, temos o valor de 650,74€.
É evidente, pois, que o valor anual que aufere, quando dividido por 12, é manifestamente inferior ao salário mínimo nacional de 760€.
A penhora da sua pensão é, por conseguinte, ilegal, nos termos dos n.ºs 1 e 3 do artigo 738º do CPC.
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O Exequente opôs-se a tal pretensão da Executada, batendo-se pela manutenção da penhora efetuada nos autos.
Alegou, para tanto, e em síntese o seguinte.
A penhora da pensão da Executada verificou-se em 09/01/2023, sendo que, na mesma data, foi expedida notificação desse ato à mesma.
Nessa notificação, o agente de execução informou a Executada, na pessoa do seu ilustre mandatário, sobre o fundamento da mesma, designadamente:
- Nos termos do disposto nos artigos 784º e 785º do Código Processo Civil (CPC), fica pela presente notificado na qualidade de mandatário da executada … para, no prazo de 10 (dez) dias deduzir, querendo, oposição à penhora dos bem(s) identificado(s) em anexo, com algum dos seguintes fundamentos:
a.-Inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos ou da extensão com que ela foi realizada;
b.-Imediata penhora de bens que só subsidiariamente respondam pela dívida exequenda;
c.-Incidência da penhora sobre bens que, não respondendo, nos termos do direito substantivo, pela dívida exequenda, não deviam ter sido atingidos pela diligência.
(…)
Não sendo deduzida oposição, não havendo fundamento de suspensão ou não sendo paga a dívida, os bens penhorados serão vendidos ou adjudicados, para pagamento da dívida e eventuais créditos que sejam reclamados.

Sucedeu que, somente a 10/02/2023, a Executada apresentou junto dos autos um mero “Requerimento para outras questões”, onde requereu o “levantamento da penhora”, sendo que nele começou por confirmar, no artigo 1.º, que “Em 09.01.2023 a ora executada foi notificada da penhora sobre a sua Pensão”.

Perante este quadro, é possível concluir que: (i) o requerimento em causa não configura o meio adequado de reação, pois não equivale a uma oposição à penhora (em consignação com o disposto nos artigos 784.º e 785.º do CPC); (ii) é extemporâneo, atendendo à data da notificação da penhora e a data da sua apresentação; (iii) não foi liquidada taxa de justiça, nos termos da Lei 7/2012Regulamento das Custas Processuais Taxa de Justiça – Tabela II – Oposições à execução ou à penhora/embargos de terceiro.
Por isto, impõe-se o desentranhamento do requerimento da Executada e o indeferimento do requerido pela mesma.
Sem prejuízo, a penhora não é ilegal, porquanto é passível de ser objeto de penhora 1/3 do vencimento líquido, ou o seu remanescente, salvaguardando sempre o salário mínimo nacional, bem como os subsídios de férias e de natal.
Por outro lado, as penhoras de vencimentos/pensão abrangem todas as partes dos rendimentos da executada: subsídios de férias, subsídios de Natal, subsídios de alimentação, tendo sempre a devedora que ficar com, pelo menos, um salário mínimo nacional.
E foi o que sucedeu nos autos, em que a Executada auferiu € 555,78 de pensão de velhice, mais € 555,78 de 13.º mês, mais € 29,00 de actualização extraordinária, isto é, o equivalente a € 1.140,56, sendo que, por isso, foi-lhe descontada a importância de € 380,18, recebendo a mesma o valor líquido de € 760,38.
Assim, sendo o salário mínimo nacional, em Dezembro de 2022, de € 705,00, ficou este salvaguardado, não havendo fundamento para o levantamento da penhora.
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Por despacho proferido em 15 de novembro de 2023, o tribunal a quoacolheu a pretensão da Executada, ordenando, consequentemente, o imediato levantamento da penhora que incidia sobre a sua pensão e a imediata devolução à mesma de todas e quaisquer quantias que, a esse título, lhe tenham sido apreendidas.
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Inconformado com tal decisão, dela veio o Exequente interpor o presente recurso, formulando as seguintes conclusões, que se transcrevem:

- Ocorreu penhora sobre a pensão auferida pela Executada …, conforme auto de penhora junto aos autos pelo Sr. Agente de Execução em …, sob a ref.ª …;
- Na mesma data, foi expedida “notificação ao executado após penhora”, sob a ref.ª … .
- Na aludida notificação, o Sr. Agente de Execução informou a Executada, na pessoa do seu I. Mandatário, sobre o fundamento da mesma, designadamente:
“Nos termos do disposto nos artigos 784º e 785º do Código Processo Civil (CPC), fica pela presente notificado na qualidade de mandatário da executada IP..... para, no prazo de 10 (dez) dias deduzir, querendo, oposição à penhora dos bem(s) identificado(s) em anexo, com algum dos seguintes fundamentos:
a.- Inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos ou da extensão com que ela foi realizada;
b.- Imediata penhora de bens que só subsidiariamente respondam pela dívida exequenda;
c.- Incidência da penhora sobre bens que, não respondendo, nos termos do direito substantivo, pela dívida exequenda, não deviam ter sido atingidos pela diligência.
(…)
Não sendo deduzida oposição, não havendo fundamento de suspensão ou não sendo paga a dívida, os bens penhorados serão vendidos ou adjudicados, para pagamento da dívida e eventuais créditos que sejam reclamados.”

- Sucede que, somente a 10/02/2023, a Executada apresentou junto dos autos um mero “Requerimento para outras questões”, sob a ref.ª …, onde requereu o “levantamento da penhora”.
- Nesse mesmo requerimento, a Executada começa por confirmar que “Em 09.01.2023 a ora executada foi notificada da penhora sobre a sua Pensão” (artigo 1.º do requerimento supra referido).
- Perante este quadro, é possível concluir que:
1.–O requerimento apresentado pela Executada não se configura o meio adequado de reação, pois não equivale a uma oposição à penhora (em consignação com o disposto nos artigos 784.º e 785.º do CPC);
2.–A resposta apresentada é, indubitavelmente, extemporânea, atendendo à data em que se considera notificada (09-01-2023) e a data em que se manifesta (10-02-2023), passados que estavam os 10 dias fixados pelo legislador (conforme dispõe o n.º 1 do artigo 785.º do CPC);
3.–Não foi liquidada taxa de justiça, nos termos da Lei 7/2012Regulamento das Custas Processuais Taxa de Justiça – Tabela II Oposições à execução ou à penhora/embargos de terceiro.
- Face ao circunstancialismo relatado, requer-se, desde já, a V. Exa. que determine o desentranhamento do requerimento apresentado pela Executada, improcedendo na totalidade o requerido pela mesma.
- Ainda assim, e por mera cautela do dever de patrocínio, cumpre sublinhar que a penhora ocorrida não é ilegal, porquanto, é passível de ser objeto de penhora 1/3 do vencimento líquido, ou o seu remanescente, salvaguardando sempre o salário mínimo nacional, bem como, os subsídios de férias e de natal.
- Mais se diga, as penhoras de vencimentos/pensão abrangem todas as partes dos rendimentos da executada: subsídios de férias, subsídios de Natal, subsídios de alimentação, tendo sempre a devedora que ficar com, pelo menos, um salário mínimo nacional.

- Em consonância com este entendimento, veja-se o acervo jurisprudencial:
“I- A impenhorabilidade de 2/3 do vencimento/pensão mensal auferida pelo executado destina-se a assegurar um montante mínimo necessário à sua subsistência condigna.
II- Constituindo os subsídios de férias e de natal prestações adicionais à retribuição mensal, é admissível a penhora da parte que exceder o valor correspondente ao salário mínimo nacional uma vez que
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