Acórdão nº 1792/22.1GBABF,E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2024-03-19

Ano2024
Número Acordão1792/22.1GBABF,E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora


Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora

Relatório

No Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo Local Criminal de Albufeira – Juiz 3, foi o arguido (A) submetido a julgamento em Processo Abreviado.

Após realização de audiência de discussão e julgamento, o Tribunal, por sentença de 26 de junho de 2023, decidiu:

“A) ABSOLVER o arguido (A) da prática do crime de condução sem habilitação legal de que vinha acusado;

B) CONDENAR o arguido (A) pela prática de um crime de desobediência, previsto e punido pelo art. 152º nº 1 al. a) e nº 3 do Código da Estrada, e arts. 348º nº 1 al. a) e 69º nº 1 al. c) do Código Penal,

I. Na pena principal de 4 (QUATRO) MESES E 15 (QUINZE) DIAS DE PRISÃO, que terá execução em REGIME DE PERMANÊNCIA NA HABITAÇÃO; e

II. E na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor por um ano e três meses.


* * *

No que concerne à EXECUÇÃO DA PENA o Tribunal desde já autoriza a ausência do arguido da residência onde cumprirá a pena, pelos períodos de tempo estritamente necessários:

 Ao cumprimento de horário de trabalho, até ao limite de 8 horas diárias, e respectivas deslocações, até ao limite total de hora e meia em cada dia;

 Para tratamentos médicos urgentes,

 Para comparecer a consultas ou tratamentos médicos agendados;

 Para comparecer a actos judiciais ou diligências policiais para os quais seja convocado;

 Para comparecer a qualquer acto que ocorra sob direcção ou fiscalização da DGRSP para o qual seja convocado;

Determinando-se que as ausências autorizadas respeitantes a tratamentos médicos previsíveis e actos judiciais e policiais ficam dependentes de solicitação prévia pelo arguido aos serviços da DGRSP, solicitação que deverá ser feita com a antecedência necessária para que esta entidade averigue e verifique a necessidade e regularidade da ausência pretendida.”


*

Inconformado com a decisão, o arguido interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões:

1 – (A), arguido devidamente identificado vem recorrer para V.ªs Ex.ªs por entender que a pena que lhe foi aplicada é manifestamente desproporcionada.

2 - Os factos que sobre si recaem foram confirmados pelo arguido que os confessou, de livre e espontânea vontade, colaborou para a descoberta da verdade.

3 - Daí que, ao determinar a medida da pena o douto Tribunal “a quo”, poderia e deveria ter levado em conta a confissão, a contribuição do recorrente para a descoberta da verdade e vontade manifestada pelo arguido em reparar a sua atitude.

4 - Salvo o devido respeito, entende o Recorrente que o Tribunal “a quo” não teve em consideração e em consequência violou os normativos correspondentes à determinação da medida da pena nos termos do disposto no Artigo 71.º do Código Penal.

5 - Na determinação concreta da pena deve o Tribunal atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do arguido e contra ele, designadamente o modo e execução e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao arguido (grau de ilicitude do facto); a intensidade do dolo; os fins ou motivos que determinaram o cometimento do crime e os sentimentos manifestados; as condições pessoais e económicas do agente; a conduta anterior e posterior ao facto e ainda a falta de preparação para manter uma conduta licita, manifestada no facto quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.

6 - O grau de ilicitude não é elevado, é de salientar o facto do recorrente na altura da prática dos factos se encontrar num momento de instabilidade emocional, devido a problemas pessoais e familiares, situação que contribui para a grave situação que atravessa para fazer face as despesas que tem.

7 - É de salientar o facto do Recorrente ser uma pessoa com um nível de auto censura elevado.

8 - À data da prática dos factos, o Recorrente vivia e vive com a sua mulher e seus filhos os quais dependem dele para sobreviver, sendo a principal fonte de subsistência;

9 - Na audiência de discussão e julgamento, mostrou uma postura de humildade e arrependimento sinceros, consternação pela sua conduta e a vergonha provocada nos seus familiares que considera pessoas de bem. Assumiu a gravidade dos factos por si praticados.

10 - Atualmente, o Recorrente, apresenta uma forte censura quanto ao crime que praticou e apresenta-se consciente das consequências que daí advêm, o que mostra a possibilidade de um juízo de prognose favorável à sua reintegração na sociedade.

11 - O Recorrente demonstra sensibilidade à pena aplicada, mas a mesma é demasiado elevada, dado que a mesma se se mantiver, serão quatro pessoas que irão viver para “debaixo da ponte”, uma vez que a pena aplicada pelo Tribunal “a quo” leva a que o ora recorrente seja despedido e, auferindo a sua mulher o ordenado mínimo nacional, não poderão pagar a prestação da casa nem dar uma vida digna aos seus filhos, levando indubitavelmente uma família para a miséria.

12 - Nessa medida e apenas no que concerne ao quantum da pena aplicada pelo Tribunal “a quo” ao arguido, houve, salvo o devido respeito, violação do disposto no Artigo 71.º do Código Penal.

13 - É entendimento do Recorrente que o Tribunal deverá condenar o arguido numa pena mais harmoniosa, proporcional e justa face às circunstâncias acima expostas, de acordo com o disposto no Artigo 71.º do Código Penal, por entender que desta forma se realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, a proteção dos bens jurídicos ofendidos e a reintegração do agente na Sociedade.

Nestes termos,

Deverá ser revogada a douta sentença que condenou o ora Recorrente na pena principal de 4 (QUATRO) MESES E 15 (QUINZE) DIAS DE PRISÃO, que terá execução em REGIME DE PERMANÊNCIA NA HABITAÇÃO e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor por um ano e três meses, por estas serem desproporcionadas às finalidades da punição e ser aplicada ao Recorrente uma pena de multa próxima dos mínimos legais e uma pena acessória de proibição de condução de veículo automóvel substituída pela obrigatoriedade de frequentar um programa de formação numa escola de condução.

Assim, e como sempre, se fazendo a costumada Justiça!

*

O Ministério Público respondeu ao recurso interposto, pugnando pela respetiva improcedência e formulando as seguintes conclusões:

1. O arguido foi condenado pela prática de um crime de desobediência por recusa de submissão ao teste de pesquisa de álcool no sangue enquanto exercia a condução, p. e p. pelo art. 348.º, n.º 1, al. a) e 69.º, n.º 1, al. c) do Código Penal, por referência ao art. 152.º, n.º 1, al. a) e 3 do Código da Estrada, pleitando na alteração da pena de 4 meses de prisão a cumprir em regime de permanência na habitação para pena de multa próxima dos mínimos legais, por ser manifestamente excessiva, e a substituição da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 1 ano e 3 meses por frequência de um programa de formação;

2. As finalidades das penas (na previsão, na aplicação e na execução) são a protecção de bens jurídicos e a integração do agente do crime nos valores sociais afectados, regendo-se por uma finalidade quer de prevenção geral, quer de uma finalidade de prevenção especial;

3. Num caso concreto, a finalidade de tutela e protecção de bens jurídicos há-de constituir, por isso, o motivo fundamento da escolha do modelo e da medida da pena; de tutela da confiança das expectativas da comunidade na validade das normas, e especificamente na validade e integridade das normas e dos correspondentes valores concretamente afectados;

4. Por seu lado, a finalidade de reintegração do agente na sociedade há-de ser, em cada caso, prosseguida pela imposição de uma pena cuja espécie e medida, determinada por critérios derivados das exigências de prevenção especial, se mostre adequada e seja exigida pelas necessidades de ressocialização do agente, ou pela intensidade da advertência que se revele suficiente para realizar tais finalidades;

5. Bem procedeu o Mmo. Juiz a quo na valoração dos concretos factores de escolha e medida da pena, identificando-se quais os que relevam para a culpa e para a prevenção, e tendo em conta a moldura penal abstracta acima referida, quer quanto à pena principal, quer quanto à pena acessória, cujos critérios são os mesmos;

6. In casu, a imagem global do crime perpetrado pelo arguido é grave, a desobediência na submissão às provas de despiste da influência do álcool do caso dos autos ocorreu em sequência a um primeiro teste (qualitativo) do qual resultava indiciado estar o arguido extremamente embriagado quando conduzia e a conduta criminosa do arguido foi impeditiva do apuramento de eventual responsabilidade criminal por condução em estado de embriaguez, o que causa o maior alarme comunitário, não podendo passar a imagem de que este crime compensa, saindo beneficiado quem recusa submeter-se às provas de pesquisa de álcool por comparação a quem cumpre a lei;

7. O grau de ilicitude dos factos elevado, tendo o arguido agido com consciência e dolo directo, o mesmo regista cinco condenações criminais anteriores, uma sem habilitação legal e 4 das quais por crimes de condução de veículo em estado de embriaguez, tendo praticado os presentes durante o período de suspensão da execução da pena de prisão em que havia sido condenado;

8. O arguido demonstra uma completa desconsideração para as consequências de jaez penal que lhe vêm sendo aplicadas e ante a estreita ligação que a concreta desobediência dos autos tem com a segurança rodoviária, não pode deixar de se ver no comportamento sub iudice uma reiteração da atitude de completa apatia e desconsideração do arguido, tantas vezes ocorrida no passado, pelas regras de segurança rodoviárias, que a comunidade tutela criminalmente, sendo a sua personalidade...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT