Acórdão nº 171/22.5T8BCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2023-02-02

Ano2023
Número Acordão171/22.5T8BCL.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães

Apelante: Z... - Sistemas Electrónicos, Lda
Apelado: AA

I – RELATÓRIO

AA, com os demais sinais nos autos, intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra Z... - Sistemas Electrónicos, Lda, também nos autos melhor identificada, pedindo:

i) seja declarada a nulidade do reconhecimento presencial da assinatura do Autor aposta na declaração de denúncia do contrato;
ii) seja declarada válida e eficaz a revogação da denúncia;
iii) subsidiariamente, para a eventualidade, que só por mera cautela se admite, de improcederem os pedidos formulados em A e B, ser declarada a anulação da declaração de denúncia do contrato, por ter sido produzida mediante coacção moral;
iv) seja declarada a ilicitude do despedimento do Autor;
v) seja a Ré condenada a pagar ao Autor:
1) € 9.956,71 de indemnização de antiguidade, sem prejuízo do montante que resultar à data do trânsito em julgado da sentença que vier a ser proferida;
2) € 1.367,86 a título de retribuições intercalares vencidas desde o dia seguinte ao seu despedimento até à presente data, a que acrescem as que se vencerem até à data do trânsito em julgado da sentença que vier a ser proferida;
3) € 485,78 a título de retribuição e subsídio de alimentação, correspondente ao serviço prestado no mês de Outubro de 2021;
4) € 1.500,00 a título de comissões de vendas, respeitante ao ano de 2021;
5) € 480,00 a título da retribuição do remanescente de férias não gozadas e vencidas no dia 1 de Janeiro de 2021, e correspondente subsídio de férias;
6) € 1.867,40 a título da retribuição de férias e respetivo subsídio de férias proporcional ao tempo de trabalho prestado no ano de 2021;
7) € 933,70 a título do subsídio de Natal proporcional ao trabalho prestado no ano de 2021;
8) € 56,56 de juros de mora vencidos;
9) juros de mora vincendos até efetivo e integral pagamento.

Alega para tanto, e em síntese, que o autor foi admitido ao serviço da ré no dia .../.../2016, através de contrato de trabalho escrito, para desempenhar as funções da categoria profissional de engenheiro eletrotécnico, com a retribuição base mensal de € 1.200,00, no ano de 2021, acrescida de comissões, recebendo ainda o montante de € 7,63, a título de subsídio de refeição por cada dia útil de trabalho, com o período normal de trabalho diário de 8 horas, entre as 9-13 e as 14-18 horas.
Mais alega o autor que se manteve ininterruptamente ao serviço da ré até ao dia 11 de Outubro de 2021, já que no dia 30 de Setembro de 2021, pelas 15 horas, a ré, através dos seus advogados, imputou-lhe factos que no entender da ré constituiriam fundamento para participar criminalmente dele e para lhe instaurar um procedimento disciplinar e instou o autor a assinar de imediato uma declaração escrita de denúncia do contrato de trabalho, ao abrigo do disposto no art. 400.º, n.º 1, do Código do Trabalho, previamente elaborada, advertindo-o que caso não a subscrevesse iria ser instaurado procedimento criminal e disciplinar contra a sua pessoa, com imediata suspensão das suas funções; que, surpreendido e perplexo com a situação exposta, o autor solicitou um prazo de 24 horas para refletir sobre o assunto, prazo que não lhe foi concedido.
Apesar das imputações efetuadas serem descabidas, receoso com a iminência de concretização do procedimento penal e disciplinar, e a gravidade das consequências que poderiam advir para a sua pessoa, o autor viu-se obrigado a assinar a referida declaração escrita de denúncia do contrato de trabalho, o que fez contrariado, e com a vontade perturbada pela intimidação de que foi alvo, e que foi compelido, nas mesmas circunstâncias, a permitir que a sua assinatura aposta na declaração de denúncia do contrato de trabalho fosse objecto de reconhecimento presencial por Advogada aí presente, reconhecimento presencial cujo significado e alcance não apreendeu suficientemente, por força do condicionalismo que rodeou a assinatura da declaração de denúncia do contrato de trabalho.
Alega ainda que no dia 6 de Outubro de 2021, para remediar os efeitos perversos da declaração de denúncia do contrato, revogou tal denúncia, mediante carta registada com aviso de recepção, e por carta de 11 de Outubro de 2021, a ré comunicou ao autor que relevou a denúncia do contrato com efeitos a partir do dia 30 de Setembro de 2021, por considerar que a declaração revogatória da denúncia do contrato de trabalho não obedecia aos pressupostos legais, uma vez que a assinatura da denúncia tinha sido reconhecida presencialmente. Alega, ainda, que nos dias 7 e 11 de Outubro de 2021, pelas 9 horas, se apresentou nas instalações da ré, para desempenhar as suas funções, tendo sido impedido de o fazer pelo respectivo sócio-gerente, BB, que lhe recusou a entrada.
Alega por fim que a ré não lhe pagou a retribuição correspondente ao trabalho prestado no mês de Outubro de 2021, nem o valor devido por comissões de vendas, respeitante ao ano de 2021; que no ano de 2021, o Autor apenas gozou dezasseis dias úteis de férias, vencidas no dia 1 de Janeiro de 2021 e que a ré não pagou a retribuição de férias não gozadas, nem o correspondente subsídio; que a ré não pagou ao autor a retribuição de férias proporcional ao tempo de trabalho prestado no ano de 2021 nem o respectivo subsídio, como não pagou o proporcional do subsídio de Natal; e que mercê da revogação da denúncia, o autor devolveu à ré os montantes pagos com o recibo do mês de Setembro de 2021, relativos a férias não gozadas, subsídio de férias e subsídio de Natal.

Tendo-se realizado audiência de partes, malogrou-se, nessa sede, a conciliação entre elas.

Notificada para o efeito, a ré apresentou contestação, admitindo a existência do contrato de trabalho, a remuneração e as suas componentes, e o horário de trabalho alegado.
Refutou, contudo, as pretensões contra si formuladas, alegando/sustentando, em resumo, que, apesar de esclarecido sobre a situação, foi o autor que na reunião de 30 de setembro de 2021, em que estavam presentes os Advogados da ré, tomou livremente a opção de denunciar o contrato de trabalho, tendo até aceite ver a sua assinatura reconhecida.
Alega que o autor, confrontado com factos que sabia irem dar origem a um procedimento disciplinar, optou por denunciar o contrato de trabalho, tendo, posteriormente dado o dito por não dito, inviabilizando, deste modo, que a ré pudesse instaurar um procedimento disciplinar e, eventualmente, consumar um despedimento por justa causa, atuação que só poderá ser descrita como abuso de direito e que deve o autor ser condenado enquanto litigante de má-fé em indemnização a favor da Ré.
A ré aproveitou ainda para se opor, fundamentando, por entender impossível a manutenção do vínculo laboral, a uma, eventual, reintegração.
Concluiu, pugnando pela respectiva absolvição.

O autor apresentou resposta em que, no fundamental, reafirma a posição já vertida no articulado inicial, rebatendo que esteja a agir em abuso de direito.

Prosseguindo os autos, veio a realizar-se a audiência final e, após, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:

“Pelo exposto, julgo a ação parcialmente procedente e:
I) Declaro ilícito o despedimento do A. AA.
II) Condeno a Ré Z... - Sistemas Electrónicos, Lda a pagar ao A. AA as retribuições que deixou de auferir desde 30 dias antes da propositura da acção (17.12.2021), à razão de € 1.200,00/mês até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento, sem prejuízo das eventuais deduções nos termos do artigo 390º, nº 2 do CT.
III) Condeno a Ré Z... - Sistemas Electrónicos, Lda a pagar ao A. AA a indemnização prevista no artigo 391º do CT correspondente a 30 dias de retribuição base, por cada ano completo ou fracção de antiguidade à razão de €1200/mês até ao trânsito em julgado da decisão, e que se cifra no montante de € 7,500,00.
IV) Condeno a Ré Z... - Sistemas Electrónicos, Lda a pagar ao A. AA a quantia de € 3.739, 88 (458,78 +480,00 +1867,40 +933,70) a título de créditos salariais: retribuição, férias não gozadas, férias e proporcionais de subsidio de férias e de natal.
V) Juros vencidos, à taxa legal de 4%, contados desde o dia seguinte à decisão de despedimento até efectivo e integral pagamento,
absolvendo no mais peticionado.”

Inconformada com esta decisão, dela veio a ré interpor o presente recurso de apelação para este Tribunal da Relação de Guimarães, apresentando alegações que terminam mediante a formulação das seguintes conclusões (transcrição):

“I. Não ficou provado o Autor tenha sido alvo de qualquer intimidação ou coação por parte da Ré ou dos seus mandatários, pelo contrário, o próprio Autor declarou que os mandatários da Ré foram cordiais e simpáticos.
Mais declarou que se ausentou da sala pelo tempo que entendeu tendo voltado posteriormente para assinar a revogação com contrato de trabalho por iniciativa sua!
II. Ficou provado que o douto Tribunal a quo desconsiderou os testemunhos produzidos pelas testemunhas da Ré meramente por preconceito relativamente à profissão de Advogado.
III. salvo o devido respeito por melhor opinião em contrário, andou mal o Tribunal a quo ao concluir que o reconhecimento presencial da assinatura do A. na denúncia do contrato de trabalho, porque não foi feita notarialmente, mas perante advogado, não obsta à revogação, pelo A., dessa denúncia, pelo que nada o impedia de a revogar!
IV.A faculdade de os Advogados poderem fazer reconhecimentos presenciais e autenticações resulta expressamente do preâmbulo do o Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de março, sendo o objetivo do legislador ao introduzir no ordenamento jurídico tal possibilidade foi o de no domínio da autenticação e do reconhecimento presencial de assinaturas em documentos, permitir que tanto os notários como os advogados, os solicitadores, as câmaras de comércio e...

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