Acórdão nº 166/22.9YHLSB-A.L1-PICRS de Tribunal da Relação de Lisboa, 2024-04-10

Data de Julgamento10 Abril 2024
Ano2024
Número Acordão166/22.9YHLSB-A.L1-PICRS
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na Secção de Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. RELATÓRIO
Na acção «declarativa de condenação» que constitui o processo principal, em que são Demandantes BRISTOL-MYERS SQUIBB HOLDINGS IRELAND UNLIMITED COMPANY, SWORDS LABORATORIES e BRISTOL-MYERS SQUIBB FARMACÊUTICA PORTUGUESA, S.A., todas com os sinais identificativos constantes dos autos, e Demandada a Sociedade PENTAFARMA – SOCIEDADE TÉCNICOMEDICINAL, S.A., neles melhor identificada, foi proferida decisão com o seguinte conteúdo:
Em consonância, nos termos dos artigos 299.º, n.º 1, e 306.º, n.º 1,do CPC e do artigo 829.º-A, n.ºs 1 e 3, do Código Civil, fixa-se à presente acção o valor processual de € 31 320 000,00 (trinta e um milhões e trezentos e vinte mil euros).
Descrevendo o percurso que conduziu à sua prolação, o Tribunal «a quo» inscreveu no relatório de tal decisão:
No despacho de 30-05-23, consignou-se, na parte aqui pertinente:
“Nos termos do n.º 1 do artigo 299.º do CPC, na determinação do valor da causa, deve atender-se ao momento em que a acção é proposta, excepto quando haja reconvenção.
Por sua vez, o artigo 306.º, n.º 1, do CPC estabelece que compete ao juiz fixar o valor da causa, sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes.
Conforme escreve Salvador da Costa – cf. «Os Incidentes da Instância», 2014, 7.ª edição, p. 59 –, anotando este preceito legal e comparando o actual regime com o anterior: «As partes indicavam frequentemente para a causa valor desconforme com a utilidade económica do pedido e a lei e, não raro, o juiz não proferia o respectivo despacho de fixação do valor da causa, desvirtuando-se, por via disso, o regime de admissibilidade dos recursos e a própria obrigação de pagamento da taxa de justiça.
A referida alteração visou obstar, além do mais, às mencionadas consequências. Agora, independentemente da posição das partes relativamente ao valor da causa, tem o juiz de o fixar, podendo para o efeito, nos termos dos artigos 308.º e 309.º, ordenar determinadas diligências.
Assim, o acordo tácito ou expresso das partes quanto ao valor processual da causa já não releva com vista à sua fixação, antes se impondo, sempre, ao juiz, a verificação da sua conformidade com os factos e a lei.» (sic)
Tudo visto, é ostensivo que o valor da causa aceite pelas partes não é minimamente fidedigno em face dos interesses económicos de largas dezenas de milhões de euros que são alegados na petição inicial, mormente nos artigos 138.º e seguintes desta peça processual, em que as autoras declaram que a média das vendas diárias do ELIQUIS® nos anos 2016, 2017 e 2018 foi de 92.053 € (noventa e dois mil e cinquenta e três euros).
Por conseguinte, e previamente à prossecução dos autos, considerando que o valor da acção e da reconvenção inicialmente atribuído pelas partes não retrata minimamente a realidade e os interesses económicos que ambas pretendem fazer valer nos autos, notifiquem-se as mesmas para se pronunciarem sobre o(s) critério(s) que reputam mais adequado(s) à fixação do valor da causa – podendo fazê-lo separada ou conjuntamente –, desde já se consignando que o Tribunal poderá recorrer, caso assim o entenda necessário, aos mecanismos previstos nos artigos 308.º e 309.º do CPC. Prazo: 12 dias.”
Cumprido o contraditório – cf. artigo 3.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (CPC) – as partes vieram pronunciar-se da seguinte forma:
1. As autoras, através do requerimento com a referência n.º 112102, aduzem que invocaram os direitos de propriedade industrial emergentes da Patente Europeia n.º 1427415 (EP ‘415) e do Certificado Complementar de Proteção n.º 456 (CCP 456), tendo indicado como valor da causa o montante de € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo). Em sede de reconvenção, a ré peticionou a declaração de nulidade da EP ‘415, tendo atribuído à reconvenção o mesmo valor.
Mais indica que ambas as partes indicaram aquele valor porquanto, nos termos do disposto no artigo 303.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC), as acções sobre o estado das pessoas ou sobre interesses imateriais consideram-se sempre de valor equivalente à alçada da Relação e mais (euro) 0,01. Prosseguindo que a “dimensão eminentemente imaterial dos direitos de propriedade industrial (emergentes, inter alia de patentes) tem sido amplamente reconhecida e destacada pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores”, dando como exemplos os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, 26-02-2015 (Processo n.º 1288/05.6TYLSB.L1.S1) e de 18-03-2010 (Processo n.º 1004/07.8TYLSB.L1.S1) e do Tribunal Constitucional n.º 123/2015.
Referem, complementarmente: “Para mais, os referidos valores de vendas foram indicados com o propósito único de ajudar este Tribunal a determinar um valor suficientemente dissuasor para efeitos de fixação de uma sanção pecuniária compulsória, sendo que em nada se relacionam com os pedidos concretamente formulados pelas Autoras – que se destinam à somente proibição de exploração de medicamentos genéricos –, nem com o pedido formulado pela Ré – que se destina à declaração de nulidade dos direitos de propriedade industrial invocados nos presentes autos.”
De harmonia, “(…) na perspetiva das Autoras, não há que recorrer aos critérios gerais previstos nos artigos 296.º e seguintes do CPC e, consequentemente, averiguar da eventual “utilidade económica imediata do pedido”, como sugerido pelo Tribunal no Despacho a que ora se responde, desde logo porque há uma regra no CPC que fixa precisamente um valor específico sempre que as causas visem interesses imateriais (independentemente de outras dimensões que esses mesmos interesses E, concluem: “Nestes termos, e atendendo que tanto à ação como à reconvenção em causa nos presentes autos se aplica o mesmo critério especial previsto no artigo 303.º, n.º 1, do CPC, requerem as Autoras que este Tribunal fixe o valor total da causa em 60.000,02€ (sessenta mil euros e dois cêntimos).”
2. A ré, por requerimento com a referência n.º 112100, aduz que “as autoras pretendem fazer valer nos autos os direitos de propriedade industrial decorrentes do certificado complementar de proteção n.º 456 (‘CCP’456’), apresentando a data de vinte (20) de maio de 2026 como a estimada para o respetivo limite de vigência, constituindo, pois, a defesa de tais direitos o objeto da ação tal como proposta pelas autoras.” E, prossegue, “em termos práticos, as autoras pretenderão evitar, com a ação em presença, incorrer em (alegados) ‘(…) prejuízos financeiros (…)’ decorrentes da diminuição do período de exclusivo conferido pelo CCP’456.”
A ré, aventa, depois, o seguinte critério para a fixação do valor da causa: “Tomando em linha de conta, por um lado, a regra geral consagrada no n.º 1 do artigo 296.º do código de processo civil (‘CPC’), nos termos da qual o valor da causa será o representativo da utilidade económica imediata do pedido formulado, e, por outro, o critério especial previsto no 2 artigo 301.º, n.º 1, do CPC, que prevê a determinação do valor da causa com recurso ao valor do ato jurídico, dir-se-ia, prima facie, que a utilidade económica dos pedidos (o inicial, formulado pelas autoras, e o posterior, deduzido pela ré-reconvinte) seria determinada pelo valor económico do título de propriedade industrial em causa nos autos – o CCP’456 – e do correspondente período de exclusivo.”
Porém, após tecer algumas considerações sobre a matéria de facto a debater, acaba por considerar que “não é conhecida e/ ou possível de conhecer, no momento atual, a real utilidade económica do pedido, porquanto a ré não praticou qualquer ato tendente à exploração económica do(s) medicamento(s) genérico(s) objeto dos pedidos de AIM identificados nos autos. Por conseguinte, não existem elementos, nos autos ou além destes, que permitam atribuir à causa outro valor distinto do indicado pelas
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