Acórdão nº 1004/07.8TYLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Março de 2010

Data18 Março 2010
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: AGRAVO Decisão: PROVIMENTO Sumário : I - Nada na lei autoriza a que se exija ao Requerente do procedimento cautelar comum que faça prova de que o Requerido não poderá pagar-lhe uma indemnização correspondente ao bem ou direito lesado, sob pena de recusa das providências requeridas, por falta do elemento «dificuldade de reparação».

Se assim fosse, ficariam sem tutela da Ordem Jurídica bens, serviços e direitos de relevantíssimo interesse social, não apenas por dificuldade de tal prova, mas também porque o lesante, em geral, poderia cobrir, mediante uma presumida importância pecuniária e segundo um juízo de probabilidade, todos os prejuízos materiais advenientes da lesão.

II - Pelo contrário, em matéria de direito de patentes industriais não pode ser olvidada especial protecção destas que é estabelecida no artº 101º do CPI, ao estabelecer no seu nº 2 que «a patente confere ainda ao seu titular o direito de impedir a terceiros, sem o seu consentimento, o fabrico, a oferta, a armazenagem, a introdução no comércio ou a utilização de um produto objecto de patente, ou a importação ou posse do mesmo, para algum dos fins mencionados», dispondo, logo no nº 3, que «o titular da patente pode opor-se a todos os actos que constituem violação da sua patente, mesmo que se fundem noutra patente com data de prioridade posterior, sem necessidade de impugnar os títulos, ou de pedir a anulação das patentes em que esse direito se funde»! III - O correcto entendimento será, pois, o de que a providência deve ser decretada, sempre que, se esteja ante uma lesão grave, atenta importância patrimonial ou extrapatrimonial do direito ou do bem que aquele incide (objecto mediato) e que está em risco de ser sacrificado, e não seja razoável exigir que tal risco seja suportado pelo titular do direito ameaçado, na medida em que a reparação de tal dano seja avultada ou mesmo impossível.

IV - Recordemo-nos também de que já no longínquo ano de 1979, ainda à luz do vetusto Código de Propriedade Industrial de 1940, aprovado pelo Decreto nº 30.679 de 24 de Agosto de 1940, este Supremo Tribunal tirou o Assento de 14-03-79, de que foi Relator o Exmº Conselheiro Rodrigues Bastos, assim sumariado: «O direito de explorar o invento que pertence ao titular da patente do processo, nos termos do artº 8º do Código de Propriedade Industrial, é ofendido pela fabricação, manipulação ou venda, por terceiro, em Portugal, de outro produto que contenha, ainda que importado, um princípio obtido pelo processo industrial a que a patente se refere» (Pº 066664, disponível em www.dgsi.pt), entendimento que, a nosso ver, mantém actualidade doutrinária.

Decisão Texto Integral: Acordam no SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Da admissibilidade do presente recurso É sabido que as decisões proferidas em procedimentos cautelares não são, por via de regra, recorríveis para o Supremo Tribunal de Justiça – artº 387º-A do CPC.

Tal regra, todavia, admite uma excepção legal, que é a dos casos em que o recurso é sempre admissível.

É sempre admissível recurso do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro dessa ou de outra Relação sobre a mesma questão fundamental de direito e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, salvo se a orientação nele perfilhada estiver de acordo com jurisprudência já anteriormente fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça (artº 678º, nº 4 do CPC).

Foi com base na invocada oposição entre o decidido no Acórdão da Relação que foi proferido no presente procedimento cautelar e o decidido em outros três acórdãos de Relações diferentes, que as Recorrentes trouxeram o presente recurso de Agravo.

A Recorrida, nas suas contra-alegações sustenta não haver lugar à admissão do presente recurso já que, como tenta demonstrar, não há contradição entre as decisões proferidas nestes autos e as que as Recorrentes juntaram por cópia.

Cumpre decidir Como se sentenciou no Acórdão de 10-07-2008 deste Supremo Tribunal (Relator, o Exmº Conselheiro Salvador da Costa), estar-se-á perante a mesma questão fundamental de direito, grosso modo, quando o núcleo da concernente situação fáctica, face às normas jurídicas aplicáveis, é, em ambos os casos, idêntica (Pº 08B1494, disponível em www.dgsi.pt).

Precisando melhor, no mesmo aresto defendeu-se que se é certo que a verificação da contrariedade de acórdãos não pode ater-se à consideração superficial da factualidade descrita nos acórdãos a comparar, não menos certo é que «tal contradição tem de resultar claramente do confronto entre o acórdão recorrido e o acórdão-fundamento, especificamente considerados, em termos de a sua comparação a revelar, ou seja, que a mesma questão fundamental de direito, baseada em similar núcleo de facto, sob a égide do mesmo quadro normativo tenha sido antagonicamente decidida».

No caso em pauta, as Recorrentes haviam juntado três decisões de diversas Relações diversas da proferida nestes autos, em que entendiam haver oposição de julgados, quanto à questão do periculum in mora, alicerçado na gravidade da lesão e na dificuldade da reparação.

Dado que se tratava de cópias simples e, portanto, sem nota de trânsito certificada, a convite do ora Relator, as Recorrentes elegeram uma delas para a apresentarem, devidamente certificada com a pertinente nota de trânsito em julgado.

Trata-se do Acórdão da Relação de Coimbra de 4-03-2009, proferido em sede de procedimento cautelar comum, em que as recorrentes são as mesmas dos presentes autos, sobre objecto idêntico ao do presente processo, com pedido em tudo idêntico ao aqui formulado e com similar núcleo factual como suporte.

Sobre o requisito do periculum in mora e, designadamente, sobre os seus pressupostos de lesão grave e dificuldade de reparação, o citado acórdão, depois de considerar que a jurisprudência tem entendido que o requerente tem de alegar e provar factos dos quais se possa concluir que a lesão é dificilmente reparável, nota que, segundo o ensinamento de Antunes Varela no seu conhecido Manual de Processo Civil, não é exigível, no âmbito dos procedimentos cautelares e na averiguação dos seus pressupostos, o mesmo grau de convicção que deve existir quanto aos fundamentos da acção principal e, considerando a prova produzida, mormente o pedido de fixação do preço, após a obtenção da AIM e os ditames da experiência comum, entendeu que existia, no caso sobre o qual se pronunciou, fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável por parte das agravantes, por via da receada violação da patente.

Já anteriormente, como melhor se verá mais adiante, onde voltaremos a este pressuposto do aludido requisito do procedimento cautelar comum, havia considerado que «quanto à questão dos prejuízos decorrentes para as agravantes da eventual violação da patente, por parte da agravada, numa primeira aproximação, poderá pensar-se que tudo se reconduzirá à fixação de uma indemnização. Mas esta é uma visão simplista, já que seria muito difícil contabilizar os lucros que as agravantes deixariam de auferir, caso tivessem de enfrentar a concorrência do medicamento que a requerida pretende vir a comercializar, quer por via da diminuição da procura, resultante da existência do novo fármaco, quer pela via da redução do preço induzida pelo facto de o genérico ter de ser 35% mais barato, «ex vi» do art. 9° do Dec.-Lei n° 65/2007, de 14/11 - diploma que regula a fixação do preço dos medicamentos».

Dada a dualidade de soluções jurídicas antagónicas para substratos factuais similares, no mesmo quadro legislativo, está preenchido o requisito de oposição de acórdãos que permite o recurso da decisão proferida nestes autos para este Supremo Tribunal.

Conhecimento «de meritis» RELATÓRIO AA LIMITED, sociedade comercial com sede em K… R…, B…, H… RG …, Inglaterra e BB – PRODUTOS FARMACÊUTICOS LDA, com sede na Rua A… L… B…, n° …, Piso …, Miraflores, Algés, intentaram a presente providência cautelar inominada contra CC – FARMACEUTICA S.A., com sede no O… P… B…, Edifício …, 2710-444, Sintra, requerendo: – a intimação da requerida para que não importe, manipule, embale, coloque em circulação, renda ou ponha à venda, directa ou indirectamente, quer em Portugal quer para exportação, o produto farmacêutico designado por «Olanzapina CC» ou sob qualquer outro nome comercial, contendo a substância activa "Olanzapina" – a intimação da requerida para que não submeta o medicamento Olanzapina CC ou quaisquer outros medicamentos contendo a substancia activa Olanzapina, à aprovação do seu preço junto da Direcção Geral das Actividades Económicas ou, caso entretanto venha a apresentar esse pedido, que o retire; – a intimação da requerida para que não venda ou ceda a terceiros a autorização de introdução no mercado do medicamento «Olanzapina CC», ou quaisquer outras que venham a ser aprovadas, relativas a medicamento contendo a substancia activa «Olanzapina».

Fundamentam a sua pretensão na responsabilização por factos ilícitos resultante da iminente comercialização pela Requerida, sem que esta a tal estivesse autorizada, de um medicamento denominado "Olanzapina CC", alegando que a substância olanzapina se encontra protegida pela patente 97.446 na titularidade da 1a Requerente e da qual a 2a Requerente é licenciada em Portugal, sendo que a referida patente é uma patente de produto e de processo, pelo que a simples comercialização do produto está vedada à Requerida, e invocam a existência de danos causados por tal comercialização, danos esses provocados pela diminuição do seu volume de vendas e pela perda da compensação devida pelas despesas em investigação e promoção dos seus produtos.

Devidamente citada, veio a Requerida deduzir oposição onde, em suma, alega: – que o lançamento do medicamento não é iminente atenta a suspensão do processo de aprovação do preço, razão pela qual inexiste qualquer situação de urgência que justifique a adopção de medidas cautelares; – nulidade da patente 97.446, uma vez que a mesma foi requerida na...

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