Acórdão nº 1621/22.6T8PDL.L1-4 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-03-15

Ano2023
Número Acordão1621/22.6T8PDL.L1-4
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa


1. Relatório


1.1. AAA, patrocinado em juízo pelo Digno Magistrado do Ministério Público, veio intentar a presente acção declarativa de condenação contra BBB., peticionando a declaração de despedimento ilícito e a condenação da Ré no pagamento das retribuições vencidas desde o trigésimo dia anterior à propositura da acção até à sentença (incluindo a retribuição do período de férias, o subsídio de férias e o subsídio de Natal vencidos durante este período), de uma indemnização em substituição da reintegração e dos créditos que menciona, com juros de mora.

Em fundamento da sua pretensão, alegou, em síntese: que foi admitido pela R. 1 de Maio de 2018 para, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, exercer as funções de ‘vigilante aeroportuário’, encontrando-se de baixa médica desde 1 de Julho de 2021; que, caducando o seu cartão profissional a partir de 28 de Setembro de 2021, solicitou a emissão de novo cartão em 26 de Setembro mas, por se encontrar de baixa médica, não foi possível obter a ficha de aptidão, emitida por médico da medicina do trabalho, levando a que este pedido de emissão / renovação do cartão tivesse sido rejeitado; que em 23 de Novembro de 2021, a Ré comunicou-lhe a cessação do contrato, com invocação de caducidade, precisamente por falta de renovação do seu cartão profissional; que a Ré, então, não tinha fundamento para tal, sendo temporário, e não definitivo, o impedimento do trabalhador para a prestação de trabalho (sendo certo que, na altura, estava de baixa médica), pelo que, nestas circunstâncias, este contrato de trabalho cessou por despedimento ilícito; que não lhe foram pagas prestações a título de retribuição de trabalho prestado em dia feriado e a título de retribuição do período de férias e respectivo subsídio relativos ao ano de admissão (2018), e a título de retribuição do período de férias e respectivo subsídio vencidos no ano de 2020.

Na contestação apresentada a R. veio defender-se invocando: que com a caducidade do cartão profissional do Autor, e com a rejeição do pedido de emissão / renovação do cartão pela entidade competente, tinha a Ré razões para considerar que o Autor estava impedido de prestar o seu trabalho, com a consequente caducidade do seu contrato; que comunicou ao Autor essa cessação contratual, por caducidade e que todos os créditos laborais que eram devidos foram liquidados, nada mais sendo de exigir à Ré..
Foi proferido despacho saneador e dispensada a realização da audiência prévia, bem como a enunciação dos temas da prova e procedeu-se ao julgamento.

Foi após proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo:
«Pelo referido, atentas as orientações atrás explanadas, e ponderados todos os princípios e normas jurídicas que aos factos apurados se aplicam, julga o Tribunal a acção parcialmente procedente, nos seguintes termos:
a) declara ilícita, por falta de fundamento, a declaração de caducidade do contrato de trabalho celebrado entre o Autor, AAA, e a Ré, BBB
b) declara ilícito o despedimento do Autor;
c) condena a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 3474,22, a título de compensação por despedimento, com acréscimo das retribuições vencidas desde a presente data até ao trânsito em julgado da sentença (entre elas as prestações devidas a título de subsídio de férias e subsídio de Natal), sem prejuízo do disposto no art. 390°, n° 2, alíneas a) e c), do Código do Trabalho, e com desconto do período durante o qual, desde o trigésimo dia anterior à propositura da acção, o Autor esteja (ou tenha estado) de baixa médica e a receber subsídio de doença, a apurar em sede de liquidação da sentença;
d) condena a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 3460,85, a título de indemnização em substituição da reintegração, com acréscimo, ainda por conta desta indemnização, da quantia a vencer-se desde a presente data até ao trânsito em julgado da sentença;
e) condena a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 349,16, a título de retribuição de trabalho prestado em dia feriado nos anos de 2018 e 2019;
f) condena a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 527,52, a título de retribuição do período de férias e respectivo subsídio relativos ao ano de admissão (2018);
g) condena a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 777,80, a título de retribuição do período de 11 dias de férias e respectivo subsídio vencidos no ano de 2020, relativos ao trabalho prestado no ano de 2019, mas com desconto da prestação compensatória que o Autor eventualmente tenha recebido, da parte da Segurança Social, por conta deste subsídio, no âmbito dos períodos de baixa médica a que esteve sujeito, a apurar em sede de liquidação da sentença;
h) condena a Ré a pagar ao Autor os juros de mora devidos pelas prestações ora fixadas, calculados à taxa legal, vencidos desde a data da citação até definitivo e integral pagamento;
i) absolve a Ré do que mais foi peticionado.
[…]»

1.2. A R., inconformada, interpôs recurso desta decisão, tendo formulado, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões:
(...)

1.3. Respondeu o A., patrocinado pelo Digno Magistrado do Ministério Público, tendo rematado as suas contra-alegações do seguinte modo:
(…)

1.4. O recurso foi admitido com efeito devolutivo.

1.5. Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, foram colhidos os “vistos” e realizada a Conferência.

Cumpre decidir.
2. Objecto do recurso
Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente – artigo 684.º, n.º 3 do Código de Processo Civil aplicável “ex vi” do art. 1.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo do Trabalho – as questões essenciais que se colocam à apreciação deste tribunal consistem em saber:
1.ª- se a matéria de facto deverá alterar-se nos termos propugnados pela recorrente;
2.ª- da verificação da caducidade do contrato de trabalho;
3.ª- caso não se considere que o contrato de trabalho cessou por caducidade, mas por despedimento ilícito, da parametrização da indemnização devida.

3. Fundamentação de facto
3.1. A apelante impugna a decisão de facto fixada na 1.ª instância no que diz respeito à decisão negativa do tribunal a quo quando considerou não provado que:
a) a Ré tenha notificado o Autor para comparecer a um ‘exame de medicina do trabalho’;
b) o Autor tenha recusado comparecer a esse exame por estar em lay-off;
(…)
Em suma, o tribunal a quo interpretou os elementos probatórios disponíveis, conjugou-os entre si e analisou-os de uma forma lógica e plausível, de acordo com as regras da experiência, e a prova indicada pela recorrente nas suas alegações, uma vez reapreciada, não impõe a prolação de uma decisão diversa da recorrida quanto aos pontos de facto que impugnou.

3.2. Os factos materiais relevantes para a decisão da causa foram fixados pela sentença recorrida nos seguintes termos:
«[...]
1. Desde 1 de Maio de 2018, e mediante acordo escrito ajustado entre as partes, AAA encontrava-se admitido ao serviço de BBB para, no interesse e sob as ordens, direcção e fiscalização desta última, exercer as funções de ‘vigilante aeroportuário’ (APA-AERO).
2. Prestando a sua actividade, nos termos definidos no número anterior, por períodos diários de 8 horas, num total de quarenta horas semanais, de segunda-feira a domingo, em regime de turnos rotativos, diurnos e nocturnos.
3.Mediante uma retribuição base mensal no valor de € 777,80, com acréscimo de subsídio de alimentação, no valor diário de € 6,00.
4. Consta dos considerandos deste acordo escrito:
III. A actividade de segurança privada está actualmente regulada pela Lei 34/2013, de 16 de Maio;
IV. Para o exercício das suas funções, o Segundo Contratante deve ser titular de cartão profissional emitido pela direcção nacional da PSP;
V. A emissão do cartão profissional, mencionado no considerando anterior, está condicionada à comprovação do cumprimento dos requisitos enunciados no art. 22° da Lei n° 34/2013, de 16 de Maio”.
5. E consta da cláusula 9ª deste acordo escrito:
1.O presente contrato de trabalho fica condicionado à verificação por parte do Segundo Contratante, dos requisitos enunciados nos considerandos III, IV e V.
2. No caso do Segundo Contratante não reunir qualquer um dos requisitos enunciados no art. 22° da Lei n° 34/2013, de 16 de Maio, impedindo a emissão do respectivo cartão profissional para o exercício da actividade de segurança privada emitido pela Direcção Nacional da PSP para o exercício de funções de segurança, será declarada a nulidade do presente contrato, produzindo o contrato efeitos em relação ao tempo durante o qual esteve em execução.
3. No caso do cartão profissional ser retirado ao Segundo Contratante, nomeadamente por se verificar a impossibilidade superveniente de reunir os requisitos enunciados no art. 22° da Lei n° 34/2013, de 16 de Maio, será determinada a caducidade do presente contrato de trabalho”.
6. Nos termos definidos nos números anteriores, o Autor exerceu funções nos seguintes dias feriados:
a) 1, 21 e 31 de Maio, 10 de Junho, 15 de Agosto, 5 de Outubro, 1 de Novembro, 1, 8 e 25 de Dezembro de 2018;
b) 1 de Janeiro, 19, 21 e 25 de Abril, 1 de Maio, 5 de Outubro, 1 de Novembro, 1 e 8 de Dezembro de 2019.
7. Em Julho de 2018, a Ré entregou ao Autor a quantia de, pelo menos, € 179,60, a título de ‘retribuição de trabalho em dia feriado’.
8. Em Abril, Junho e Dezembro de 2019, a Ré entregou ao Autor as quantias de, pelo menos, € 28,26 + € 18,84 + € 37,68, a título de ‘retribuição de trabalho em dia feriado’.
9. O Autor esteve de baixa médica:
a) em datas não concretamente determinadas de Janeiro de 2019;
b) em datas não concretamente determinadas de Julho, Agosto e Setembro de 2019;
c) de 1 de Julho até, pelo menos, 19 de Novembro de 2021.
10. O cartão profissional de segurança privada do Autor, com o n° 090452091, tinha validade até 28 de Setembro de 2021.
11. Pelo menos em 26 de Setembro de 2021, o
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