Acórdão nº 1428/23.3T8CBR.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 23-02-2024
Data de Julgamento | 23 Fevereiro 2024 |
Ano | 2024 |
Número Acordão | 1428/23.3T8CBR.C1 |
Órgão | Tribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO DO TRABALHO DE COIMBRA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA) |
RELATÓRIO
AA intentou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra o A..., E.P.E pedindo a sua condenação:
-na colocação da autora na 2.ª posição do nível remuneratório 7 da tabela remuneratória única, a que corresponde a retribuição mensal de €789,54 da carreira de assistente técnico, desde 1 de julho de 2018, com as legais atualizações anuais;
- a pagar à autora €7.752,62 a título de diferenças salariais a pagar à autora €7.752,62 a título de diferenças salariais vencidas e as vincendas até efetivo enquadramento remuneratório, acrescidas de juros de mora computados à taxa legal.
Alegou, no essencial, que em 2007 celebrou com o réu um contrato de trabalho por tempo indeterminado para exercício de funções de assistente administrativa e que em 1 de julho de 2018, na sequência da entrada em vigor do Acordo Coletivo de Trabalho celebrado entre o Centro Hospitalar Barreiro Montijo e outros e o SINTAP-Sindicato dos Trabalhadores da Administração e de Entidades com Fins Público, alterou-se o seu posicionamento remuneratório e deveria ter sido reconstituída a sua carreira, o que o réu se recusa a fazer, desconsiderando todo o tempo de serviço que prestou até essa data.
O réu contestou alegando, em síntese, que o acordo coletivo em apreço não estabelece que o período anterior à sua entrada em vigor deve ser avaliado e levado em conta para efeitos da alteração do posicionamento remuneratório da autora.
Realizou-se audiência de julgamento.
Posteriormente, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
“Julgo a ação improcedente e absolvo o A..., E.P.E. dos pedidos formulados por AA.
Custas a cargo da autora (art.º 527.º NCPC).
Registe e notifique.”
Inconformado com esta decisão, a autora AA interpôs recurso, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões que se transcrevem:
(…).
O recorrido apresentou contra-alegações, com as seguintes conclusões:
(…).
O Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que deve o recurso ser julgado improcedente e a sentença ser confirmada nos seus precisos termos.”
A recorrente respondeu a este parecer, concluindo pela procedência do recurso.
O recurso foi admitido.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
OBJETO DO RECURSO
Considerando as conclusões das alegações, as quais delimitam o objeto do recurso sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, a questão a decidir é a seguinte:
1. Se deve ser considerado o tempo de serviço e a avaliação de desempenho da autora anterior à entrada em vigor do Acordo Coletivo de Trabalho celebrado entre o Centro Hospitalar Barreiro Montijo e outros e o SINTAPA, para efeitos da sua reclassificação e de alteração do seu posicionamento remuneratório.
FUNDAMENTOS DE FACTO
O Tribunal de 1ª instância fixou a matéria de facto da seguinte forma:
“Factos provados:
Com relevância para a decisão da causa apuraram-se os seguintes factos:
1.º A autora foi admitida ao serviço do réu, em 2 de abril de 2007, através de contrato de trabalho a termo certo, pelo prazo de um ano, para sob a sua subordinação, direção orientação e fiscalização desempenhar funções inerentes à categoria profissional de assistente administrativo, mediante a retribuição base ilíquida de €743,12, nos termos que constam do documento junto de fls. 11 a 12 cujos dizeres dou por integralmente reproduzidos.
2.º No termo do prazo previsto para a duração do contrato de trabalho referido em 1.º, o mesmo renovou-se por igual período em 1 de abril de 2008 até 31 de março de 2009;
3.º Através de aditamento, o contrato de trabalho referido em 1.º converteu-se em contrato de trabalho sem termo a partir de 1 de abril de 2009, nos termos que constam do documento junto de fls. 12 verso a 13 cujos dizeres dou por integralmente reproduzidos e do qual constam, entre outras, as seguintes cláusulas
4.ª - Remuneração
1. O primeiro outorgante pagará mensalmente ao segundo outorgante, a retribuição (ilíquida) de €683,13 (…);
2. À retribuição referida no número anterior acresce um subsídio de refeição diário, por cada dia completo de serviço, a atribuir nos termos e valores definidos para a Função Pública, sem prejuízo de eventuais alterações decorrentes da entrada em vigor de contratação coletiva;
3. À retribuição referida no número 1 acrescem ainda os subsídios de férias e de Natal calculados nos termos do Código do Trabalho;
4. A retribuição referida no número 1 será atualizada nos termos e valores definidos para a Função Pública, sem prejuízo de eventuais alterações decorrentes da entrada em vigor de contratação coletiva ou da política da empresa.
6.ª Horário de Trabalho
1. A segunda outorgante compromete-se a prestar 35 horais semanais de trabalho ao primeiro outorgante;
(…);
4.º Desde 1 de abril de 2009 até 31 de dezembro de 2019 a autora auferiu ao serviço do réu a retribuição base de €683,13;
5.º Na sequência das atualizações salariais gerais para a função pública, em janeiro do ano 2020 e janeiro do ano 2021, a retribuição base da autora passou de €683,13 para €693,13 e para €703,13, respetivamente;
6.º A autora é sindicalizada no Sindicato dos Profissionais Administrativos da Saúde (SPAS), anteriormente designado por Associação Sindical dos Profissionais da Administração da Saúde (ASPAS);
7.º Em 1 de julho de 2018 entrou em vigor o Acordo Coletivo de Trabalho celebrado entre o Centro Hospitalar Barreiro Montijo e outros e o SINTAP-Sindicato dos Trabalhadores da Administração e de Entidades com Fins Público;
8.º O réu é um dos subscritores do acordo coletivo referido em 7.º;
9.º O acordo coletivo referido em 7.º é aplicável à autora;
10.º Na data da entrada em vigor do acordo coletivo referido em 7.º (1 de julho de 2018) a autora cumpria 35 horas semanais e auferia a mesma remuneração que auferia um assistente técnico com contrato de trabalho em funções públicas (€683,13);
11.º Após a entrada em vigor do acordo coletivo referido em 7.º (1 de julho de 2018) a autora transitou para a carreira de assistente técnico;
12.º e foi posicionada na 1.ª posição remuneratória da carreira/categoria de assistente técnico, nível remuneratório 5, a que corresponde a retribuição base de €683,13;
13.º Para efeitos de alteração do posicionamento remuneratório da autora, o réu não contabilizou o seu tempo de serviço anterior a 1 de julho de 2018;
14.º Nas negociações entre sindicatos e empregadores que antecederam a assinatura do acordo coletivo referido em 7.º, foi discutida a inclusão de uma cláusula de contagem do tempo de serviço anterior à sua entrada em vigor para efeitos de reclassificação e alteração do posicionamento remuneratório dos trabalhadores por ele abrangidos;
15.º A cláusula referida em 14.º não ficou a constar da versão final do acordo coletivo referido em 7.º;
*
Factos não provados:
Provaram-se todos os factos com interesse para a decisão o mérito da causa.
***
À restante factualidade alegada pelas partes não se responde por se tratar de matéria conclusiva ou de direito e ser irrelevante para a apreciação do mérito da causa.”
FUNDAMENTOS DE DIREITO
1. Da reclassificação profissional da autora e do seu posicionamento salarial.
Na sentença recorrida considerou-se: “…do acordo coletivo não decorrem para o réu as obrigações de avaliar o período anterior à sua entrada em vigor e de o contabilizar para efeitos de alteração do posicionamento remuneratório da autora.
Ou seja, até à entrada em vigor do acordo coletivo nenhuma obrigação existia que obrigasse o réu a considerar o tempo de serviço e as avaliações de desempenho da autora.
Esta obrigação só nasceu com o acordo coletivo e mais propriamente com a sindicalização da autora, atento o princípio da filiação consagrado no art.º 496.º, n.º 1 do CT.
E a não ser assim, não deixaria de se estar a aplicar retroativamente um instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, ou seja, a aplicar um regime convencional a um período temporal anterior à data da sua entrada em vigor, sem que o acordo coletivo tenha previsto esta aplicação retroativa.
Refira-se, por último, que este entendimento propugnado pelo tribunal no sentido da aplicação do regime do acordo coletivo apenas para o futuro, não implica um tratamento desigual entre trabalhadores vinculados por contrato individual de trabalho e os vinculados através de um vínculo de natureza público.”
Mais adiante, escreveu-se “Tudo para concluir que, com regime do ACT, se pretendeu colocar todos os trabalhadores abrangidos (com CIT) em igualdade de circunstâncias com os trabalhadores com vínculo público apenas para o futuro, não se mostrando ofendido o princípio da igualdade ao não se levar em conta o tempo de serviço e as avaliações de desempenho, anteriores à data de entrada em vigor do ACT, considerando as diferenças entre os regimes dos trabalhadores com contrato de trabalho em funções e os vinculados através de CIT.
De resto, também não se vislumbra qualquer incumprimento por parte do réu relativamente ao enquadramento profissional e ao reposicionamento remuneratório da autora decorrente do acordo coletivo em análise”.
Sustenta a recorrente que a remissão para o artigo 104.º da Lei n.º 12-A/2008, operada pela cláusula 33.ª do acordo coletivo de trabalho, demonstra inequivocamente que este quis efetivamente equiparar os regimes aplicáveis aos trabalhadores contratados ao abrigo de CIT e trabalhadores contratados ao abrigo de CTFP. Esta norma impõe necessariamente que sejam contabilizadas, para efeitos de alteração do posicionamento remuneratório da Recorrente, de forma ficcionada, as avaliações de desempenho desde o seu início de funções. Mas como o Recorrido não estava obrigado a proceder a tal avaliação até ao ano de 2018, a lei prevê a atribuição de um ponto por cada ano não avaliado, e atingidos que sejam os dez pontos, impõe-se a alteração do posicionamento...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO