Acórdão nº 139/19.9YHLSB.L1-PICRS de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-02-24

Ano2022
Número Acordão139/19.9YHLSB.L1-PICRS
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam em conferência na Secção da Propriedade Intelectual, Concorrência Regulação e Supervisão:
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No Despacho proferido no dia 09.07.2021 pelo Exmo. Senhor Desembargador Relator com a referência 17199816 (doravante “Despacho Reclamado”), pode ler-se o seguinte:
“No requerimento que antecede, as Recorrentes vieram aos autos revelar ter pago multa em virtude da junção tardia da sua reclamação.
Descobre-se, pois, por esta via que omitiram o cumprimento da sua obrigação de junção do documento demonstrativo desse facto, assim gerando desnecessário processado incidental.
(…)
Custas do incidente pelas Recorrentes, fixando-se a taxa de justiça individual em 2.5 UCs.”
O artigo 9.º da Portaria nº 280/2013 dispõe o seguinte:
“1 - O responsável pelo prévio pagamento da taxa de justiça ou de outra quantia devida a título de custas, de multa ou outra penalidade deve indicar, em campo próprio dos formulários de apresentação de peça processual constantes do sistema informático de suporte à atividade dos tribunais, a referência que consta do documento único de cobrança (DUC), encontrando-se dispensado de juntar ao processo o respetivo documento comprovativo do pagamento.
2 - Nos casos referidos no número anterior, a comprovação do prévio pagamento é efectuada automaticamente por comunicação entre o Sistema de Cobranças do Estado, o sistema informático de registo das custas processuais e o sistema informático de suporte à atividade dos tribunais.”
E foi precisamente isso que as Reclamantes fizeram: no formulário de apresentação da sua Reclamação para a Conferência apresentada no dia 26 de maio de 2021 (referência: 38999144), indicaram, no campo próprio, a referência que consta do DUC relativo ao pagamento da taxa de justiça e da multa devidas.
Logo, estavam dispensadas de juntar aos autos o DUC e o respetivo documento comprovativo de pagamento da multa devida pela apresentação da sua Reclamação para a Conferência quanto à Decisão Sumária proferida pelo Exmo. Desembargador Relator no dia 8 de maio de 2021.
Assim, e contrariamente ao que decorre do Despacho Reclamado, as Reclamantes revelaram, oportunamente e nos termos legais, ter pago multa em virtude da junção tardia da sua reclamação e não omitiram o cumprimento de qualquer obrigação, pelo que é manifesto que não geraram qualquer incidente processual autonomamente tributável.
Consequentemente, acordam em conferência em revogar o despacho que determinou a condenação no pagamento de 2.5 UCs.
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I. RELATÓRIO
MERCK SHARP & DOHME, CORP, MERCK SHARP & DOHME, LIMITED e MERCK SHARP & DOHME, LDA., instauraram acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra GALENICUM HEALTH, SL pedindo a condenação da Ré a:
a) Abster-se de, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, por si ou por terceiro importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer quaisquer medicamentos que contenham a associação de substâncias activas Sitagliptina e Metformina, incluindo, mas não apenas, os que são objecto dos pedidos de AIM melhor identificados no art. 140 da presente petição inicial, enquanto a EP 142357 e/ou o CCP 278 e/ou o CCP 339 se encontrarem em vigor.
b) Abster-se de, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, por si ou por terceiro importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer quaisquer medicamentos que contenham Sitagliptina como substância activa, como única substância activa ou em associação com outras substâncias activas, enquanto a EP 1412357 e/ou o CCP 278 se encontrarem em vigor.
Para tanto alegam, em suma, que:
- A 1ª autora é titular da EP 1412357, com a epígrafe “beta-aminotetrahidroimidazo (1,2-A) pirazinas e beta-aminatetra-hidrotriazolo (4,3-A) pirazinas como inibidores da dipeptidil-peptidase para o tratamento ou prevenção de diabetes”, sendo as demais autoras licenciadas da 1ª autora;
- A EP 1412357 foi pedida ao Instituto Europeu de Patentes em 05/07/2002;
- A EP 1412357 reivindica a prioridade da patente norte-americana US 303474 P, de 06/07/2001;
- Em Portugal foi apresentada no INPI a tradução em portuguesa do fascículo da Patente em 17/05/2006;
- A EP 1412357 vigorará até 05/07/2022 e tem 30 reivindicações;
- A Sitagliptina é o ingrediente activo que está protegida na EP1412357;
- Também resulta das reivindicações da patente que esta protege a associação da Sitagliptina com Metformina;
- Por outro lado a 1ª autora é ainda titular do CCP 278, sendo as demais autoras suas licenciadas, e o produto abrangido por este CCP é a Sitagliptina;
- O CCP 278 indica a EP 1412357 como a “patente base”;
- Do CCP 278 consta que a primeira autorização de introdução no mercado europeu de um medicamento contendo Sitagliptina como substância activa ocorreu em 21/03/2007;
- O CCP 278 tem uma duração inferior à patente base, pelo que não chegará a vigorar;
- Mas, poderá vir a ser concedida uma extensão pediátrica, podendo, nesse caso o CCP 278 passar a ter uma duração positiva;
- A primeira autora é ainda titular, sendo as demais autoras suas licenciadas, do CCP nº 339, que refere que o produto abrangido é SITAGLIPTINA/(CLORIDRATO) METFORMINA, o qual se encontra protegido na patente base nº 1412357;
- A primeira autorização de introdução no mercado europeu de um medicamento compreendendo a associação de substâncias activas Sitagliptina e Metformina ocorreu em 08/04/2008, na Suiça, a qual produzirá efeitos a partir do dia 06/07/2022 e a sua vigência terminará em 08/04/2023;
- Acresce que ainda poderá vir a ser concedida às autoras uma extensão pediátrica;
- No mercado português os medicamentos de referência que contêm Sitagliptina como única substância activa encontram-se disponíveis na forma farmacêutica de comprimido revestido por película nas dosagens de 25mg, 50 mg e de 100mg e são comercializados sob as marcas Januvia e Xelevia;
- Também se encontram disponíveis no mercado português medicamentos que contêm como substâncias activas Sitagliptina em associação com Metformina, os quais são comercializados na forma farmacêutica de comprimido revestido por película, nas dosagens de 1000 mg+50 mg e 850 mg+ 50 mg sob as marcas comerciais Janumet Efficib e Velmetia;
- A 3ª autora é a titular das autorizações de introdução no mercado de todos os medicamentos de referência contendo Sitagliptina como substância activa (em monoterapia ou em combinação com Metformina) que são comercializados em Portugal pela filial do grupo MSD, a MSD, Lda, entre os quais se encontra o medicamento de referência Januvia (Sitagliptina) e o medicamento Janumet (Sitagliptina e Metformina);
- De acordo com as listas publicitadas no dia 09/03//2019, na pagina electrónica do INFARMED, a ré requereu em 21/02//2019 as Autorizações de Introdução no Mercado dos medicamentos que contêm as substâncias activas «Sitagliptina» e «Metformina» cloridrato, sob a forma farmacêutica de comprimido revestido a pelicula, nas dosagens de 50mg/850 mg e 50mg/1000mg, tendo por medicamento de referência o «Janumet» das autoras;
- Os genéricos GALENICUM contêm necessariamente Sitagliptina como uma das suas substâncias activas e contêm o composto protegido pela EP 1412357 e como tal estão abrangidos, pelo menos, pelas reivindicações de produto 1 a 3, 5 a 10, 14 e 15, 26 e 28 da EP 1412357;
- Os genéricos GALENICUM, os quais indicam Janumet como medicamento de referência e os quais terão, consequentemente, as mesmas indicações terapêuticas, a Sitagliptina compreendida em tais medicamentos será utilizada no fabrico de um medicamento para o tratamento de diabetes mellitus tipo 2, como tal os genéricos GALENICUM estarão abrangisdos, e pelo menos, pela reivindicação 18;
- Os genéricos GALENICUM compreendem a associação de substâncias activas Sitagliptina e Metformina e a reivindicação 30 da EP 1412357 compreende especificamente composições farmacêuticas que contenham a associação de Sitagliptina e Metformina num veículo farmaceuticamente aceitável, ou seja, compreende precisamente medicamentos como os genéricos GALENICUM, pelo que estes estarão abrangidos, e pelo menos, pela reivindicação 30;
- A ré nunca solicitou autorização para explorar, por qualquer meio, as invenções protegidas pela patente e pelos CCPs;
- O eventual lançamento no mercado português dos medicamentos genéricos em causa resultaria em elevados prejuízos para as autoras;
- Os pedidos de AIM e as AIM’s uma vez concedidas, constituem já uma ameaça de violação dos direitos de propriedade industrial de que as autoras são titulares, o que justifica a propositura da presente acção;
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Citada a Ré, a mesma apresentou requerimento a mencionar não pretender contestar, na sequência do que foram dados por confessados os factos alegados pelas Autoras.
Foi proferida sentença que decretou:
“Por todo o exposto, atenta a verificação da excepção inominada de falta de interesse em agir por parte das autoras, absolve-se a ré da instância, nos termos do disposto nos arts. 278º, 1, e), e 577º do CPC.”
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Inconformadas com a sentença, que absolveu a Demandada da instância por considerar verificada a exceção de falta de interesse em agir, vieram as Autoras interpor recurso de apelação, tendo sido proferida decisão singular que julgando totalmente improcedente a apelação, confirmou a sentença recorrida.
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Notificadas, vieram as Apelantes requerer que sobre a matéria da decisão singular recaia Acórdão, nos termos do disposto no artigo 652º, n.º 3 do Código de Processo Civil.
Alegaram, em resumo, em conformidade com as respectivas alegações de recurso, que devem proceder todos os pedidos formulados na petição inicial.
A Apelada pugnou pela improcedência da reclamação.
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Colhidos os vistos legais, cumpre agora, em conferência, apreciar e decidir dos fundamentos do recurso.
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Como se referiu já, inconformadas com a sentença proferida pelo Tribunal Recorrido,
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