Acórdão nº 13738/15.9T9PRT-G.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2024-02-21

Data de Julgamento21 Fevereiro 2024
Ano2024
Número Acordão13738/15.9T9PRT-G.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. n º 13738/15.9T9PRT-G.P1
*
1). Relatório.
A..., Ldª, B..., Ldª e C..., Unipessoal, Ldª, todos com os sinais nos autos, interpuseram o presente recurso relativamente ao despacho proferido em 03/11/2023 pelo J4 do Juízo de Instrução Criminal do Porto que decretou o arresto preventivo de bens e direitos pertencentes ao mesmo arguido nos termos dos artigos 10.º, n.º 3 e 4, da Lei n.º 5/2002, de 11/01 e 228.º, do C. P. P..
Em síntese, os arguidos pugnam que:
“CONCLUSÕES:

1. O douto despacho impugnado decretou o arresto dos bens das Recorrentes A..., Lda, B..., Lda, para garantia da perda das vantagens por elas auferidas com a suposta prática dos crimes por que estão acusadas,

2. quantificando essas vantagens nos valores constantes do quadro n° 2 do requerimento formulado para o efeito pelo Requerente MINISTÉRIO PÚBLICO.

3. Nem nesse nem em outro dos quadros que suportam o pedido da providência consta sequer o nome dessas Recorrentes nem, muito menos, o valor que quantifique a alegada vantagem por elas obtido.

4. Falta, por isso, quanto a elas, um requisito essencial da providência do arresto - qual seja a determinação do valor da vantagem cuja restituição se promove.

5. Ao ordenar o arresto dos bens dessas Requerentes, o douto despacho violou o disposto, entre outros, no artº 228°, 1, CPP, pelo que deve ser revogado.

6. O valor da vantagem supostamente auferida pelos Recorrentes com a alegada prática dos crimes sub judice foi fixada pelo douto despacho com base na acusação e no requerimento da providência de arresto formulado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO - no valor bruto do preço auferido pelas Recorrentes sociedades como contrapartida dos serviços que prestaram, bens que forneceram e obras que executaram ao Município ....

7. Nesse cálculo da suposta vantagem, o douto despacho, na peugada da acusação e do requerimento de arresto, desconsiderou em termos absolutos o custo suportado pelos Arguidos para a obtenção dos bens e execução dos serviços, obras e empreitadas que forneceram ao Município ....

8. A quantificação do valor da vantagem cuja restituição se pretende garantir é, por isso, arbitrária, porquanto apenas pode ser declarada perdida a vantagem do crime que represente a valorização líquida do património do Arguido, a diferença entre o que tem e o que teria se não tivesse cometido o ilícito.

9. Ao ordenar o arresto dos bens dos Recorrentes para garantia daquele valor bruto, o douto despacho ofendeu o disposto nos artºs 110°, 1, b), CP, e 227°, 1, b), e 228°, 1, CPP, pelo que deve ser revogado.

10. O conjunto normativo integrado pelos artºs 110°, 1, b), CP, å 227°, 1, b), å 228°, 1, CPP, interpretado no sentido de que, na perda
clássica, a vantagem do facto ilícito a declarar perdida (e o arresto dos bens do arguido destinado a acautelar a satisfação dessa perda) devem medir-se pelo seu valor bruto, sem considerar os valores despendidos pelo Arguido para a respetiva obtenção, é inconstitucional, por violar os princípios da adequação e justa medida ou proporcionalidade consagrado, ia., na segunda parte do n° 2 do art° 18°, CRP.

11. O douto despacho em mérito, repercutindo o requerimento e promoção do MINISTÉRIO PÚBLICO que deferiu, não enuncia concretamente quaisquer factos que justifiquem o justo receio de perda da garantia patrimonial que visa acautelar.

12. Essa omissão que consubstancia uma efetiva falta de fundamentação verifica-se tanto no concernente ao arresto para acautelar a perda clássica, quanto no que se destina a acautelar a perda alargada (artº 7º da Lei nº 5/2002, de 11 de janeiro).

13. No caso vertente, não foi fixada aos Recorrentes nenhuma medida de caução, pelo que, quanto à perda clássica, o Requerente MINISTÉRIO PÚBLICO estava vinculado a
alegar factos que permitissem sustentar o periculum in mora - artº 228°, 1, CPP.

14. Factos que o douto despacho também não elenca admitindo, mas firmemente sem conceder, que o Juiz pudesse suprir ex officio tal deficiência.

15. Sobre a perda alargada, dispõe claríssimo o nº 2 do artº 10º, da Lei nº 5/2002, de 11 de janeiro, que o arresto apenas pode ser decretado ºquando se verifique cumulativamente a existência de fundado receio de diminuição de garantias patrimoniais e fortes indícios de prática do crimeº.

16. O douto despacho recorrido violou, portanto, o disposto nos artºs 228°, 1, CPP, e 10°, 2, da Lei nº 5/2022, de 11 de janeiro, pelo que deve ser revogado.

TERMOS EM QUE,
revogando o douto despacho recorrido e ordenando o levantamento do arresto dos bens dos Recorrentes, farão Vossas Excelências a habitual justiça!º
*
Respondeu o M.º P.º junto do tribunal recorrido pugnando pela improcedência do recurso por, em resumo:

“1.Por decisão judicial de 3/11/2023 foi determinado o arresto preventivo dos bens e direitos das sociedades B..., Lda., A... e C..., Unipessoal, Lda.
2.É desta decisão que vêm as sociedades arguidas B..., A... e C... apresentar recurso, alegando em síntese: 1) não terem sido liquidadas quaisquer vantagens quanto àquelas sociedades arguidas, 2) o critério do cálculo das vantagens é ilegal porque diz respeito ao valor das adjudicações e não considera o custo de aquisição e execução dessas obras, 3) inexistir a alegação de factos concretos que fundamentem o justo receio da perda de garantia patrimonial.
3.Ora, nos autos principais, em 26/11/2023, foi proferida acusação contra, entre outros, os arguidos AA, BB e CC e as sociedades arguidas recorrentes B..., Lda. e C..., Unipessoal, Lda., sendo que aqueles dois primeiros agiram em nome próprio e em nome, em representação e no interesse destas sociedades arguidas, pela prática dos seguintes crimes:
94) DD, EE, AA, BB e FF, em co-autoria e na forma consumada, 1 crime de falsificação de documento p. e p. pelos artigos 14.% n.° 1, 26.°, 28.°, n.° 1, 30.°, n.° 1, do Código Penal, e artigos 255º', al. a), e 256.º, n.° 1, al. a) e d), 4, do Código Penal, e artigos 1.°, 2.°, 3.°, n.° 1, al. I), 5.° da Lei n.° 34/87, de 16 de Julho, sendo a sociedade B... penalmente responsável por este crime, nos termos da mesma norma e dos artigos 11.°, n.º 1 e 2, al. a), 90.°-A e 90.°-G a 90.°-M, do Código Penal.
(...)
112) AA e BB, em co-autoria e na forma consumada, 2 crimes de recebimento ou oferta Indevidos de vantagem p. e p. pelos artigos 14º, n.° 1, 26.°, 28.°, n.° 1, 30.°, n.º 1, 372.°, n.° 2, e 374. °-A, n.° 4, do Código Penal, sendo a sociedade B... penalmente responsável por estes crimes, nos termos das mesmas normas e dos artigos 11ºn.° 1 e 2, al. a), 90.°-A e 90.°-G a 90.°-M, do Código Penal.
118) GG, HH, AA e BB, em co-autoria e na forma consumada, 1 crime de fraude na obtenção de subsídio ou subvenção, p. e p. pelos artigos 2.° e 36.°, n.°s 1, als. a) e c), 2, 5, al. a), e 8, do DL n.° 28/84, de 20 de janeiro.
119) A sociedade B... é criminalmente responsável pela prática de 1 crime de fraude na obtenção de subsídio ou subvenção, p. e p. pelos artigos 3.°, 7.°, 8.°, 9." e 36.°, n.°s 1, als. a) e c), 2, 5, al. a), e 8, do DL n.° 28/84, de 20 de Janeiro.
120) A sociedade C... é criminalmente responsável pela prática de 1 crime de fraude na obtenção de subsídio ou subvenção, p. e p. pelos artigos 3.°, 7.°, 8.°, 9.° e 36.°, n.°s 1, als. a) e c), 2, 5, al. a), e 8, do DL n.° 28/84, de 20 de Janeiro.
121) GG, HH, AA e BB, de 1 crime de branqueamento, p. e p. à data da prática dos factos pelo artigo 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3, do Código Penal, e atualmente pelo artigo 368.°-A, n.° 1, al. k), n.°s 3 e 4, do mesmo Código.
122) A sociedade B... é criminalmente responsável pela prática de 1 crime de branqueamento, p. e p. pelos artigos 11ºn. 1 e 2, al. a), e 368.°-A, n.°s 1, 2 e 3, do Código Penal à data da prática dos factos e, atualmente, pelo artigo 368.°-A, n.° 1, al. k), n.ºs 3 e 4, do mesmo Código.
123) A sociedade C... é criminalmente responsável pela prática de 1 crime de branqueamento, p. e p. pelos artigos 11ºn.s 1 e 2, al. a), e 36S.°-A, n.°s 1, 2 e 3, do Código Penal à data da prática dos factos e, atualmente, pelo artigo 368.°-A, n.° 1, al. k), n.ºs 3 e 4, do mesmo Código.

4. Conforme resulta também da acusação, os arguidos AA, BB e CC foram ainda acusados pela prática dos crimes de prevaricação e participação económica em negócio a seguir referidos, relativos à celebração de contratos entre as sociedades B..., A..., Lda. e C..., Unipessoal, Lda., que aqueles representavam, com o Município ..., em violação das regras de contratação pública, tendo sido no património destas sociedades que se refletiram os lucros obtidos com a celebração dos contratos referidos na acusação e que, assim, foram as beneficiárias da prática dos crimes imputados aos seus legais representantes:
(…)
2)GG, DD, EE, AA e BB, em co-autoria e na forma consumada, 8 crimes de prevaricação, p. e p. pelos artigos 14.°, n.° 1, 26.°, 28.°, n.° 1, 30.«, n.° 1, do Código Penal e artigos 1.°, 2.°, 3.°, n.° 1, al. i), e 11." da Lei n.° 34/87, de 16 de julho.
3)GG, DD, EE, AA e BB, em co-autoria e na forma consumada, 8 crimes de participação económica em negócio, p. e p. pelos artigos 14.°, n.° 1, 26.°, 28.°, n.° 1 30 ° n.° 1, do Código Penal, e artigos 12.°, 3.°, n.° 1, al. i), e 23.°, n.° 1, da Lei n.° 34/87, de 16 de julho. '
4)GG, DD, EE, AA, BB, CC, II, JJ e KK, em co-autoria e na forma consumada, 1 crime de prevaricação, p. e p. pelos artigos 14.°, n.° 1, 26.°, 28.°, n.° 1, 30.°, n.° 1, do Código Penal e artigos 1.°, 2.°, 3.°, n.° 1, al. i), e 11.° da Lei n.° 34/87, de 16 de julho.
5)GG, DD, EE, AA, BB, CC, II, JJ e KK, em co-autoria e na forma consumada, 1 crime de participação económica em negócio p. e p. pelos artigos 14.°, n.° 1, 26.°, 28.°, n.° 1, 30 ° n ° 1, do Código Penal, e artigos 1.°, 2.°, 3.°, n.° 1, al. i), e 23.°, n.° 1, da Lei n.° 34/87, de 16 de julho. '
6)GG, DD, EE, AA, BB, LL e MM, em co-autoria e na forma consumada, 2 crimes de prevaricação, p. e p. pelos artigos 14.°, n.°
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