Acórdão nº 122/21.4GDPTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 05-03-2024

Data de Julgamento05 Março 2024
Ano2024
Número Acordão122/21.4GDPTM.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora
I – Relatório
a. No ….º Juízo (1) Local Criminal de …, do Tribunal Judicial da comarca de …, procedeu-se a julgamento em processo comum, da competência do tribunal singular, de AA, nascida a …/…/1950, com os demais sinais dos autos, a quem foi imputada a autoria, na forma consumada, de cinco crimes de injúria, previstos no § 1.º do artigo 181.º do Código Penal (CP)

BB, constituída assistente deduziu também contra a arguida um pedido de indemnização civil pelo qual requereu a condenação da demandada a pagar-lhe 5 000€, a título de danos não patrimoniais causados.

A final o tribunal proferiu sentença, na qual absolveu a arguida da prática de dois crimes de injúria, previstos no artigo 181.º, § 1.º CP, mas condenando-a como autora de três crimes de injúria, previstos no artigo 181.º, § 1.º CP, cada um dos quais na pena de 75 dias de multa à razão diária de 5,50€, e operando o cúmulo jurídico das penas correspondentes aos referidos crimes em concurso, fixou a pena única em 200 dias de multa à razão diária de 5,50€. E julgando o pedido civil parcialmente procedente, mais a condenou a pagar à demandante, a titulo de danos não patrimoniais causados, a quantia de 2 250€ e juros moratórios contados da data da notificação para contestar.

b. Inconformada com essa decisão condenatória, dela recorreu a arguida, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões (2):

«1. O objeto do presente recurso tem como toda a matéria de facto e de direito da sentença proferida nos presentes autos.

2. A Recorrente e Recorrida discordavam relativamente às janelas comuns do prédio, ao nível do terceiro andar, dado que, a Recorrida frequentemente as abria e a Recorrente imediatamente as fechava (artigo 2.º e 15.º, da sentença).

3. Nos termos da sentença, ora objeto de recurso, a Recorrente foi condenada como autora material, de três crimes de injúrias, p. e p. pelo artigo 181.º n.º 1 do CP.

4. O tribunal a quo considerou provado que: “Ao proferir as expressões referidas em 3., 5. e 9. supra, quis AA ofender a honra, nome, reputação e consideração devidas à assistente, o que logrou conseguir, enxovalhando-a e humilhando-a”(facto provado no artigo 14º).

5. Conforme se constata das alegações da Recorrente, a mesma nunca pretendeu humilhar de qual quer modo a Recorrida, agiu apenas de forma impulsiva e explosiva após as provocações efetuadas pela Recorrida nas 3 horas prévias, ao abrir constantemente as janelas após a Requerente as fechar.

6. Bem como, que a Requerente nada tinha contra a Recorrida, não existindo qualquer disputa entre as duas, sendo apenas o único conflito relacionado com a constante abertura das janelas comuns do prédio, por parte da Recorrida (conforme a declaração de CC, 14ª gravação, minuto 05:24).

7. Não podem, assim, restar dúvidas que, das declarações do ofendido, não é possível aferir tais factos.

8. Nesta conformidade, é evidente que das declarações da Recorrida, dos depoimentos das testemunhas ouvidas em audiência e do acervo documental junto aos autos não resulta que: “ (…) quis AA ofender a honra, nome, reputação e consideração devidas à assistente, o que logrou conseguir, enxovalhando-a e humilhando-a”(facto provado no artigo 14º).

9. Assim, o tribunal a quo devia ter julgado como não provado o facto n.º 14, constante da sentença ora objeto de recurso.

10. Pelo que, consideramos, para efeitos da al. a), n.º3, do artigo 412.º do Código de Processo Penal (de ora em diante designado de CPP), que o mesmo foi incorretamente julgado.

11. Depois de uma análise substancial da prova produzida, constatamos que a Recorrente não deu a sua permissão à Recorrida para gravar a conversa de ambas.

12. Por conseguinte, o uso da aludida conversa como meio de prova não é lícito.

13. Veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 25.09.2013, Juiz Relatora Cacilda Sena, Processo n.º 559/12.0JACBR-A.C2:

“7. Nesse sentido, a determinação de uma medida de garantia patrimonial baseada em “reprodução de vozes públicas ou rumores públicos”, constitui método proibido de prova e, por conseguinte, ilegal e nulo, não podendo, ao abrigo do disposto no art.º 130.º do CPP, ser utilizadas.”

14. No que concerne ao meio de prova apresentado e tendo em atenção que o mesmo se demonstrou proibido, sendo utilizado como principal fundamentação da decisão, a sentença é então fundada em provas nulas. Sendo, a mesma consequentemente considerada como um ato inválido, da qual se coloca respetivamente as despesas devidas a cargo do recorrido, pois foi quem deu causa a esta nulidade, neste sentido dispõe os nos 1 e 2, do artigo 122.º do CPP.

15. Assinale-se ainda o pedido de suspensão provisória do processo, da qual necessita da verificação do preenchimento de diversos requisitos para a sua exequibilidade, conforme prevê o n.º1 do artigo 281.º do CPP.

16. Julga-se estarem cumpridos todos os requisitos para pedir a suspensão provisória do processo, ficando apenas em falta a concordância do Requerido quanto à mesma.

17. A Recorrente devidamente identificada vem recorrer da aludida sentença, por entender que a pena que lhe foi aplicada é manifestamente desproporcional e excessiva.

18. É de realçar que a Recorrente foi provocada pela Recorrida, pelo que não se justifica o grau de culpabilidade que lhe foi aplicada.

19. A Recorrente é primária, não registando quaisquer antecedentes criminais.

20. Nessa medida e apenas no que concerne ao quantum da pena aplicada pelo Tribunal a quo à Recorrente, houve, salvo o devido respeito, violação do disposto no artigo 71.º do CP.

21. É de entendimento, que o Tribunal deverá condenar a Recorrente numa pena mais harmoniosa, proporcional e justa face às circunstâncias acima expostas, de acordo com o disposto no artigo 71.º do CP, não devendo compreender uma compensação monetária muito elevada, pois a Recorrente não detém muitas posses financeiras.

Nestes termos e nos melhores de direito que V. Exas. Doutamente suprirão, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, e revogar a aliás douta sentença que condenou a recorrente no pagamento de 1 100€ suspenso na sua execução, por ser desproporcional às finalidades da punição e ser aplicada à recorrente e suspensa na sua execução no tempo que V. Ex.ªs acharem ser conveniente.»

c. Admitido o recurso a assistente respondeu pugnando pela improcedência, concluindo do seguinte modo:

1. Ao contrário do alegado pela recorrente a mesma não exerce um forte juízo de censura do seu comportamento, mas tenta sim desculpabilizar-se com alegações de que foi provocada pela recorrida, o que não oferece qualquer credibilidade, nem resulta provado.

2. Os factos provados do artigo 9 da douta sentença, foram ouvidos por vizinhos.

3. Foram três os crimes de injurias dados como provados e perpetrados em alturas diferentes, o que foi provado também pela prova testemunhal prestada em audiência de julgamento, completamente credível e isenta, que não ofereceu duvidas à Meritíssima Juiz.

4. A recorrente não pede a absolvição da recorrente, mas a diminuição da pena de multa aplicada, o que de todo não se concorda tendo em conta todas as circunstâncias envolventes dos crimes sido devidamente ponderadas conforme dispõe o artigo 71.º, n.º1 do C. P. , pelo o que, deve a pena aplicada ser mantida.

5. No caso dos autos, atentas as exigências decorrentes do critério da culpa, justifica-se a aplicação à arguida uma pena de multa nos moldes em que o foi.

6. Não se entende a referência que a recorrente faz á suspensão provisória do processo, pois que a mesma é completamente extemporânea.

7. Com o devido respeito também não faz sentido o pedido de suspensão da pena de multa.

8. A arguida não demonstrou ter qualquer problema de saúde que a impeça de prestar trabalho comunitário, caso não tivesse possibilidades de pagar a multa.

9. Ao decidir como decidiu, a M.ma Juiz “ a quo “ fez correcta aplicação dos artigos 40.º e 71.º do Código Penal na determinação da medida da pena e todas as circunstancias que permitiram preencher os elementos objectivos e subjectivos dos crimes pelos quais foi condenada a arguida.

Pelo exposto, pugna-se pela improcedência absoluta do recurso interposto.»

d. Também o Ministério Público respondeu pugnando pela improcedência do recurso, concluindo que:

«1. O Tribunal a quo fundamentou adequadamente os factos que julgou provados na decisão de facto.

2. Com efeito, na sentença recorrida o tribunal a quo referiu, especificamente, os elementos de prova em que se baseou para a factualidade provada e enunciada em todos os pontos, dando especial relevância à credibilidade que os depoimentos da assistente e do seu filho, mereceram ao Tribunal, em detrimento das declarações da arguida.

3. Em discordância com o Recorrente, consideramos que a fundamentação factual constante da sentença recorrida. resulta, face á prova devidamente submetida a contraditório, serem seguros os factos dados como provados, incluindo no ponto 14.

4. A assistente, ao ter gravado conversas que a arguida teve consigo, atuou, pelo menos, em Estado de Necessidade (artigo 34.° do Código Penal), não sendo, desta forma, ilícito o facto por si praticado.

5. E ao não ter praticado um facto ilícito, a gravação pode e deve valer como meio (legítimo) de prova, nos termos do disposto no artigo 167.° do Código de Processo Penal.

6. De harmonia com o disposto nos artigos 167.° do Código de Processo Penal e 34.° e 199.° do Código Penal, andou bem o Tribunal “a quo” em tomar como válidas as gravações das conversações em causa, e que serviram para formar a sua convicção.

7. No que toca ao quantum das penas de multa, aplicadas por cada um dos 3 crimes de injúria, considerando os factos apurados, a culpa elevada da arguida e as exigências de prevenção geral (elevadas) e especial (reduzidas), compreende-se que estamos perante um caso que justifica a fixação da pena concreta de cada...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT