Acórdão nº 1170/21.0T8STB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2023-12-07

Ano2023
Número Acordão1170/21.0T8STB.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora

No Juízo do Trabalho de Setúbal, AA demandou AMCOR FLEXIBLES NEOCEL – Embalagens, Unipessoal, Lda., pedindo o pagamento da quantia de € 11.246,67 e juros desde 12.01.2021, em consequência de compensação acordada em pacto de não concorrência, nos termos do art. 136.º n.º 2 al. c) do Código do Trabalho.
Contestou a Ré, afirmando que o pacto de não concorrência previa a possibilidade da empregadora renunciar à obrigação de não concorrência do trabalhador por comunicação dirigida no prazo de 15 dias após a cessação do contrato, e que apesar de ter renunciado a essa obrigação do trabalhador algumas semanas após esse prazo – o contrato cessou a 22.11.2020, a comunicação de renúncia da empregadora data de 14.01.2021 – sempre essa comunicação seria eficaz, tanto mais que o trabalhador não exerceu uma actividade concorrente. Subsidiariamente, o pacto de não concorrência apenas teria produzido efeitos até à data de renúncia, pelo que seria devido o proporcional de € 1.874,45. Finalmente, o trabalhador agiria em abuso de direito, pois não exerceu actividade concorrente.
Após julgamento, a sentença julgou a acção parcialmente procedente e condenou a Ré a pagar ao A. a quantia de € 1.874,45 e respectivos juros.

Desta sentença o A. interpôs recurso e a Ré aproveitou a oportunidade para interpor recurso subordinado.
As conclusões, quer de um, quer da outra, não são, definitivamente, um modelo de capacidade de síntese, como seria exigível que o fizessem, face ao disposto no art. 639.º n.º 1 do Código de Processo Civil.
Visto que não existe qualquer obrigação legal de copiar tais conclusões, mas sim enunciar sucintamente as questões a decidir no recurso – art. 663.º n.º 2 do Código de Processo Civil – aqui se indicam as mesmas.
Quanto ao recurso principal do A.:
1.ª Nulidade da sentença por falta de fundamentação de direito;
2.ª Nulidade da cláusula contratual que permite à empregadora renunciar, unilateralmente, ao pacto de não concorrência, e assim eximir-se à obrigação de pagamento da compensação prevista no art. 136.º n.º 2 al. c) do Código do Trabalho;
3.ª Ineficácia da renúncia operada pela Ré, por extemporaneidade – foi comunicada mais de 15 dias após a cessação do contrato de trabalho, quando o contrato previa que tal só poderia ocorrer nesse prazo.

Quanto ao recurso subordinado da Ré:
1.ª Impugnação da matéria de facto: confissão pelo A. do facto alegado no art. 6.º da contestação;
2.ª O pacto de permanência configura um mecanismo contratual que apenas visa salvaguardar os interesses do empregador, assente na ideia de risco (abstracto) associado à mudança de empregador, pelo trabalhador, no âmbito do mesmo sector concorrencial;
3.ª O pacto de permanência não causou qualquer prejuízo para o A., não devendo, como tal, haver lugar a qualquer compensação;
4.ª A não ser este o entendimento, estaríamos perante um enriquecimento ilegítimo do A., pois estaria a empregadora obrigada a proceder ao pagamento da compensação prevista no pacto de não concorrência, mesmo que depois de ter comunicado ao A. a sua desvinculação, e sem que, para este, tal se traduzisse nalgum tipo de desvantagem;
5.ª A comunicação abdicativa expressa e formal do pacto de não concorrência, determina que a obrigação de não concorrência não chega a produzir qualquer efeito, tendo nesta medida um alcance extintivo ab initio;
6.ª Abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium – pretende o A. obter uma compensação quando não sofreu qualquer desvantagem.

O A. não respondeu ao recurso subordinado.
Nesta Relação de Évora, a Digna Magistrada do Ministério Público produziu parecer, propondo que ao recurso do A. seja concedido provimento.
Cumpre-nos decidir.

Da arguição de nulidade da sentença
Argumenta o A. que a sentença incorreu em nulidade, invocando a sua falta de fundamentação – art. 615.º n.º 1 al. b) do Código de Processo Civil.
Citando Alberto dos Reis[1], “há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto.”
Também Teixeira de Sousa[2] afirma que “esta causa de nulidade verifica-se quando o tribunal julga procedente ou improcedente um pedido (e, por isso, não comete, nesse âmbito, qualquer omissão de pronúncia), mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão. Nesta hipótese, o tribunal viola o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (…). O dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido ou sobre uma dúvida suscitada no processo (...) e apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão (...); a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso, se este for admissível.”
Não sendo exigível que a fundamentação seja longa nem exaustiva, bastando que o Tribunal justifique a sua posição, ainda que se forma concisa ou pouco persuasiva, faz-se notar, de todo o modo, que a sentença recorrida especificou os fundamentos de facto e de direito que justificaram a decisão.
O A. alega que a sentença recorrida não apreciou devidamente a matéria de direito, pois limitou-se a justificar a sua decisão com a letra do pacto de preferência, para afirmar a sua convicção que a recorrida podia, por consagração contratual, fazer cessar o pacto de não concorrência. Não teria, assim, realizado o devido enquadramento jurídico do contrato em causa.
No entanto, a decisão recorrida preocupa-se em analisar a cláusula contratual em discussão nos autos, e a concluir que a empregadora poderia renunciar unilateralmente ao pacto de concorrência.
O que se passa é que o A. discorda da análise jurídica realizada na sentença, mas tal não configura falta de fundamentação, poderá tão só traduzir-se em erro de direito e determinar a alteração da decisão recorrida, mas dessa análise iremos ocupar-nos mais adiante.
Assim, porque a fundamentação de facto e de direito justificativa da decisão consta da sentença recorrida, fica afastada esta arguição de nulidade.

Da alteração da decisão de facto
No seu recurso subordinado,
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