Acórdão nº 1126/19.2T8ACB-A.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 2023-01-24

Data de Julgamento24 Janeiro 2023
Ano2023
Número Acordão1126/19.2T8ACB-A.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO DE COMÉRCIO DE LEIRIA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA)

Apelação n.º 1126/19.2T8ACB-A.C1

Juízo de Comércio de Leiria – Juiz 2

_________________________________

Acordam os juízes que integram este coletivo da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1]:

I-Relatório

AA, casada, contribuinte fiscal n.º ..., residente em Rua ..., ... ...

intentou a presente ação declarativa, com processo comum, contra

L..., Lda, sociedade comercial por quotas, com o número único de matrícula e de identificação de pessoa coletiva ..., com sede em IC ..., Km ..., ..., ... ...

BB e mulher CC, contribuintes fiscais n.ºs ...48 e ...55, respetivamente, residentes em Rua ..., ... ..., e com domicílio profissional em IC ..., Km ..., ..., ... ...

K..., S.A., sociedade comercial por quotas, com o número único de matrícula e de identificação de pessoa coletiva ..., com sede em Rua ..., ... ...

e

C..., Lda., sociedade comercial por quotas, com o número único de matrícula e de identificação de pessoa coletiva ..., com sede em Rua ..., ... ...

pedindo

“1. Ser declarada a nulidade e/ou anulação de todas deliberações sociais tomadas na assembleia geral realizada em 22 de abril de 2019, com as legais consequências;

2. Ser a 3.ª Ré condenada a cumprir a obrigação de entrada junto da 1.ª Ré, no prazo de trinta dias a contar da decisão que vier a ser proferida nestes autos;

3. Ser decretada a destituição com justa causa do 2.º Réu da gerência da 1.ª Ré;

4. Serem os 2.º s Réus, a 3.ª e 4.ª Rés condenadas solidariamente a pagar à sociedade, ora 1.ª Ré, e à Autora, uma indemnização por todos os prejuízos causados, cujo montante, por não ser ainda determinável se relega para execução de sentença;

5. Serem os Réus condenados solidariamente a pagar à Autora a quantia de € 255.482,00 (duzentos e cinquenta e cinco mil quatrocentos e oitenta e dois euros), acrescida dos respetivos juros de mora, vencidos e vincendos, às sucessivas taxas legais aplicáveis, desde 31 de julho de 2016 até integral e efetivo pagamento”.

Invocando a sua qualidade de sócia da Ré L..., Lda, alegou com vista à procedência dos pedidos, em síntese,

- no que atine ao pedido formulado em 1, a falta de cumprimento na convocatória dos requisitos previstos no art. 58.º, n.ºs 1, alínea c) e 4, alínea a), 263.º e 377.º, n.ºs 5, alínea a) e 8 do CSC, a violação do direito à informação previsto nos arts. 214.º e 290.º do CSC e não refletirem as contas apresentadas a realidade económica e financeira da empresa;

- quanto ao pedido referido em 2. a falta de cumprimento pela K..., S.A. da obrigação de realização do capital social que se lhe impunha;

- no que se refere ao pedido referido em 3, um conjunto de procedimentos do gerente da L..., Lda (o R. BB) justificadores, a seu ver, da sua destituição com justa causa;

- quanto ao pedido referido sob o n.º 4, atos praticados pelos RR. BB, CC, K..., Lda. que justificam a atribuição à L..., Lda e à A. de indemnização pelos prejuízos causados

e, finalmente,

- quanto ao pedido enunciado sob o n.º 5, a condenação solidária dos RR. a pagarem à A. o montante indicado), respeitante, segundo se entende, ao crédito que a A. detém sobre a L..., Lda

*

Entretanto, a 7.07.2019, a A., por forma a, por essa via, superar o conflito de interesses entre o R. BB e a Ré L..., Lda que entendia existir, veio requerer a nomeação a esta última de representante especial de entre a lista oficial de revisores oficiais de contas para assegurar a sua representação em juízo, nos termos previstos no artigo 25.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (ref. 6003739).

Foi então que a Sra. Juíza proferiu a 17.07.2019 o seguinte despacho

A A. veio requerer a nomeação de um representante especial à sociedade L..., Lda, alegando que, de acordo com o alegado na petição inicial, existe um claro conflito de interesses entre a sociedade e o seu gerente.

Porém, o conflito de interesses, ressalvada sempre melhor opinião, não se coloca em face do que a A. alega, mas do pedido deduzido em 4).

A A., na qualidade de sócia da sociedade L..., Lda, intentou a presente acção contra L..., Lda, BB, CC, K..., S.A. e C..., Lda. pedindo para, além do mais, que o R. BB seja condenado a pagar à sociedade, L..., Lda, uma indemnização por todos os prejuízos causados, cujo montante, por não ser ainda determinável se relega para execução de sentença, invocando no art. 167º da petição o artigo 77º, nº 1 do CSC.

Estamos, assim, nesta parte, perante uma acção social de responsabilidade proposta por sócio contra gerente com vista à reparação a favor da sociedade do prejuízo que esta tenha sofrido (art. 77º, nº 1 do CSC).

Ora, refere o nº 4 do normativo citado que quando a acção social de responsabilidade for proposta por um ou vários sócios nos termos dos números anteriores, deve a sociedade ser chamada à causa por intermédio dos seus representantes.

Como se anota no Ac. do STJ de 3.05.00, Tomo II, CJ, 2000, o art. 77º do Código das Sociedades Comerciais concede aos sócios que reúnam as condições aí referidas, legitimidade para instaurarem a acção social proposta pelos sócios - acção social ut singuli.

A acção social uti singuli aí prevista é subsidiária da acção prevista no art. 75º (acção social da sociedade) uma vez que só pode ser proposta, nos termos do art. 77º, nº 1, quando a acção não tenha sido proposta pela sociedade, ou por a respectiva assembleia geral não ter deliberado nesse sentido, ou por ter deixado decorrer o prazo de seis meses sobre a deliberação sem propor a acção.

O direito de acção é concedido aos accionistas não só para defesa do interesse da sociedade, mas sobretudo para tutela de um interesse próprio, que indirectamente lesado, por a sociedade não intentar a acção social ut universi.

Trata-se de acção social e não de acção pessoal porque os sócios vão pedir a condenação do gerente na indemnização dos prejuízos causados à sociedade e não directamente a eles próprios.

Portanto, é uma acção social da iniciativa de algum ou alguns dos sócios que aproveita, directamente, à sociedade e, por via disso, aproveita, indirectamente, a todos os sócios e não apenas àqueles que a propuseram.

A doutrina aceita que se trata de uma acção de natureza sub-rogatória indirecta ou oblíqua.

E como se trata de uma acção social de algum ou alguns dos sócios, naturalmente que proposta no interesse da sociedade, e de uma acção sub-rogatória, natural é que a lei exija a intervenção desta na acção à semelhança do que se passa com qualquer acção sub-rogatória.

Por isso é que o nº 4 do art. 77º impõe - "deve" - o chamamento da sociedade à causa.

Estamos, assim, perante um caso de litisconsórcio necessário activo imposto por lei, cuja violação determina ilegitimidade activa nos termos do nº 1 do art. 33º do Código de Processo Civil.

Deste modo, antes de mais, ao abrigo do art. 6º, nº 2 do CPC, convido a A. a, em dez dias, providenciar pelo suprimento da excepção dilatória referida, recorrendo ao incidente processual adequado.

*

Respondendo a esse convite a A. veio, por requerimento entrado a 25.07.2019, suscitar o incidente de intervenção principal provocada da sociedade L..., Lda (ref. 6053869).

*

No seguimento, a Sra. Juíza proferiu, a 16.09.2019, despacho com o seguinte teor (ref. 91748138)

A A. veio, na sequência do despacho proferido em 17.07.2019, requerer a intervenção principal provocada da sociedade L..., Lda para intervir na causa como sua associada.

Impunha-se neste momento dar cumprimento ao disposto no art. 318º, nº 2 do CPC.

No entanto, como o Réu BB ainda não foi citado para a acção e a intervenção da sociedade é exigida por lei (art. 77º, nº 4 do Código das Sociedade Comercias) importa concluir, ao abrigo do disposto no art. 3º, nº 3 e 6º do CPC, pela manifesta desnecessidade de audição do R. para admitir a intervenção da sociedade.

Decidindo:

No despacho de 17.07.2019 consta:

“ A A., na qualidade de sócia da sociedade L..., Lda, intentou a presente acção contra L..., Lda, BB, CC, K..., S.A. e C..., Lda. pedindo para, além do mais, que o R. BB seja condenado a pagar à sociedade, L..., Lda, uma indemnização por todos os prejuízos causados, cujo montante, por não ser ainda determinável se relega para execução de sentença, invocando no art. 167º da petição o artigo 77º, nº 1 do CSC.

Estamos, assim, nesta parte, perante uma acção social de responsabilidade proposta por sócio contra gerente com vista à reparação a favor da sociedade do prejuízo que esta tenha sofrido (art. 77º, nº 1 do CSC).

Ora, refere o nº 4 do normativo citado que quando a acção social de responsabilidade for proposta por um ou vários sócios nos termos dos números anteriores, deve a sociedade ser chamada à causa por intermédio dos seus representantes.

Como se anota no Ac. do STJ de 3.05.00, Tomo II, CJ, 2000, o art. 77º do Código das Sociedades Comerciais concede aos sócios que reúnam as condições aí referidas, legitimidade para instaurarem a acção social proposta pelos sócios - acção social ut singuli.

A acção social uti singuli aí prevista é subsidiária da acção prevista no art. 75º (acção social da sociedade) uma vez que só pode ser proposta, nos termos do art. 77º, nº 1, quando a acção não tenha sido proposta pela sociedade, ou por a respectiva assembleia geral não ter deliberado nesse sentido, ou por ter deixado decorrer o prazo de seis meses sobre a deliberação sem propor a acção.

O direito de acção é concedido aos accionistas não só para defesa do interesse da sociedade, mas sobretudo para tutela de um interesse próprio, que indirectamente lesado, por a sociedade não intentar a acção social ut universi.

Trata-se de acção social e não de acção pessoal porque os sócios vão pedir a condenação do gerente na indemnização dos prejuízos causados à sociedade e não directamente a eles próprios.

Portanto, é uma acção social da iniciativa de algum ou alguns dos sócios que aproveita, directamente, à sociedade e, por via disso, aproveita, indirectamente, a todos os...

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