Acórdão nº 11187/18.6T9PRT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 15-03-2023

Data de Julgamento15 Março 2023
Ano2023
Número Acordão11187/18.6T9PRT.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo n.º 11187/18.6T9PRT.P1
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Acordam em audiência no Tribunal da Relação do Porto:
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1-RELATÓRIO
No processo comum n.º 11187/18.6T9PRT do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo Local Criminal do Porto - Juiz 2, após julgamento foi proferida sentença que condenou a arguida AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de desobediência, p. e p. pelo art.º 348º, nº1, b), do Código Penal, na pena de oitenta dias de multa à taxa diária de cinco euros e cinquenta cêntimos, no montante total de €440,00.
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Não se conformando com esta sentença, a arguida recorreu para este Tribunal da Relação, tendo requerido a realização de audiência nos termos do artigo 411º, n.º 5 do CPP e concluído a sua motivação nos termos seguintes (transcrição):
«Conclusões:
1º - Questão Prévia – da não digitalização da sentença e falta de termo de depósito da Sentença na secretaria.
2º - Já foi ultrapassada, na nossa óptica, pelo depósito da mesma na secretaria a 26/08/2022, e o prazo corre a partir de 1/09/2022.
3º - Contudo, por cautela de mandato oficioso, e caso o Relator não acompanhe a nossa óptica, mantemos as nossas alegações e o tribunal violou o art.º 372º n.º5 e o art.º 373º n.º2 do CPP.
4º - Tal omissão constituiu um incumprimento de Lei, face ao o direito ao recurso consagrado no artigo 32.º, n.º 1 da CRP contar o prazo inexoravelmente a partir da data da leitura sem depósito
5ª – Pelo que é inconstitucional a norma do art.º 411º n.º 1 al., b) do CPP, em conjugação com os arts.º 372º n.º5 e o art.º 373º n.º2 do CPP quando interpretada no sentido de o prazo de recurso se contar a partir da publicação da sentença em audiência pública em não a partir da data do termo lavrado de depósito, por violação do direito do arguido ao recurso positivado no art.º 32º n.º1, 2ª parte da CRP.
6ª – Recurso da matéria de facto nos termos do art.º 412º n.º 3 als., a) e b) do CPP, a aqui conclui que que no segmento da Sentença dos factos provados ou não provados na douta Sentença foram incorrectamente julgados:
7ª – Em 27/02/2019 a testemunha inspector da PJ BB disse em sede de inquérito:
“No decorrer da diligência foi ainda explicado à Arguida o porquê do arresto e por ela nada foi dito à data do arresto e desconhece o Depoente se a mesma se opôs ao arresto, conforme notificação junta a fls., 61 verso e 62 dos Autos”.
Sublinhado nosso.
8ª – Inversamente, a testemunha na audiência de julgamento quando perguntado pelo defensor se a aqui A., terá dito algo sobre o arresto afirmou o seguinte:
“terá dito qualquer coisa, mas não me recordo” vd., 5 ficheiro de som de 11:00 a 11:15”.
9ª – São declarações contraditórias visto que é distinto declarar em inquérito que a A., nada ajudou na questão e depois vir apontar que afinal, falou, mas não se recorda do que foi dicto.

10ª – De modo que, o Tribunal fundamentou em grande parte da sua decisão de condenação e sobretudo medida da Pena no ponto que a arguida na data do arresto nada disse nem ajudou as autoridades a melhor resolver as questões dos veículos, a diferença entre o que a testemunha disse em inquérito e em julgamento é deveras importante.
11ª – A aqui A., conclui por uma existência de dúvida insanável que deveria ter sido dissipada pelo Tribunal, ou ter concluído favoravelmente em favor da A., IN DUBIO PRO REO, e deve ser assente na matéria de facto que a mesma ajudou as autoridades.
12ª – Deve, nos termos legais, então, ser alterada a matéria de facto pela Relação para que conste a testemunha BB referiu que a A., falou/esclareceu sobre a questão dos veículos só não se lembra exactamente das suas palavras.
13ª - Também deve ser alterada a matéria de facto No ponto 4 da matéria considerada provada pelo Tribunal onde consta a conclusão que: No acto de penhora foi ainda a arguida advertida que os bens penhorados ficavam à sua guarda e que deveria apresentá-los quando tal lhe fosse ordenado.
14ª Diversamente, os veículos foram arrestados e não penhorados.
15ª – Nos termos do preceituado no art.º 412º n.º3 al., a) e b) a A., do CPP concluí que este ponto foi mal julgado: as concretas provas estão no processo anexo n.º 2554/13.2TAMAI em sede de prova documental e nas declarações da testemunha BB que confirma um arresto e nunca aponta numa Penhora.
16ª -Visto eu a matéria civilmente é pertinente, deve ser alterada a matéria de facto para:
No acto de penhora – alterado para acto de arresto - foi ainda a arguida advertida que os bens penhorados - alterado para arrestados ficavam à sua guarda e que deveria apresenta los quando tal lhe fosse ordenado.
17ª – De modo que deve ser concluído que existe uma contradição insanável da matéria facto provada “a arguida falou” e fundamentação e a decisão a arguida não ajudou as autoridades nem assumiu as suas responsabilidades nem sequer interiorizou o seu comportamento, – 410º n.º2 al., b) CPP.
18ª - Sendo inconstitucional a interpretação do art.º n.º 127º, 348º de declarações contraditórias de uma testemunha sem que o Tribunal conclua in favore do A. Por violação do in dubio pro reo, art.º 32.º, n.º 2, 1.ª parte, da CRP e o princípio constitucional da presunção de inocência.
19ª - Retira-se da leitura de Sentença que cabe à A., a prova de que à data da notificação do arresto e/ou da notificação da cominação de que o incumprimento da entrega dos veículos e da sua posse ou não posse, com a respectiva comissão de crime de desobediência. Vd., página 9, penúltimo e último parágrafos.
20ª – Tal conclusão não é compartilhada pela A, pois que consultados os autos em anexo, do processo n.º 2554/13.2TAMAI fl., 311, a meritíssima juiz de Direito de Instrução a Drª CC do j4 do TIC do Porto, face aos mesmos veículos despacha o seguinte:
“Se ainda na posse dos arguidos” Referindo-se ao arresto ordenado ao GRA.
21ª – Fazendo-nos concluir que a prova da posse é das autoridades policiais/judiciais.
22ª – A juíza CC do j4 do TIC do Porto ordenou ao GRA a descoberta – não concretizada em sede de prova em julgamento - se os veículos estão na posse dos arguidos, incluindo a aqui Recorrente, e o GRA não demonstrou tal posse.
23ª – Atente-se no sentido do Ac., da TRG de 11/03/209, consultável in dgsi.pt, do relator Fernando Monterroso, proc., n.º 5/12.9PABRG.P1
I – O crime de desobediência por o agente ter omitido uma conduta imperada, pressupõe a prova de que estava em condições de cumprir a ordem dada.
II – Sendo o arguido acusado da prática de um crime de desobediência por não ter entregue uma arma numa esquadra da PSP, é requisito da condenação que conste da acusação que, no prazo que lhe foi concedido, tinha a arma em seu poder, ou algum facto de que resulte que podia dispor da arma para efectuar a entrega.
Sublinhado e negrito nosso.
24ª – De igual modo neste aresto na sua fundamentação está a seguinte fundamentação:
“Pois bem, para a condenação pelo crime imputado não basta a prova de que o arguido não entregou a arma e os documentos. É necessário, igualmente, que o se prove que o arguido tinha a arma e os documentos em seu poder. Ou, pelo menos, algum facto de que inevitavelmente resulte que podia dispor deles para efetuar a entrega.
A imputação de que o arguido tinha a arma e os documentos em seu poder, ou, pelo menos, de que podia dispor deles para os entregar, é «facto» que não consta da acusação e tinha de constar, pois a ela compete a alegação e prova de todos os elementos constitutivos do crime. Não contendo a acusação factos suficientes para a condenação do arguido, não pode o tribunal, sob pena de violação da estrutura acusatória do processo penal, alargar a investigação a outros factos que permitam a condenação.
É que a acusação fixa o objeto do processo, traçando os limites dentro dos quais se há-de desenvolver a atividade investigatória e cognitória do tribunal. Trata-se de uma decorrência do princípio do acusatório que, nos termos do art.º 32 nº 5 da Constituição, estrutura o processo penal. A acusação deverá conter a «narração» de todos os factos que fundamentam a aplicação ao arguido da pena – art.º 283 nº 3 al. b) do CPP.
Porém, repete-se, não é esse o ponto decisivo, mas a circunstância de, consistindo a desobediência na omissão de um comportamento, ter de constar da acusação factos que permitam o juízo de que o arguido estava em condições de não omitir a conduta que lhe foi ordenada. No caso, a alegação de que tinha a arma em seu poder, ou acesso a ela para a entregar.
25ª - Consultada a acusação pública, não estava descrito que a arguida tinha os veículos em seu poder, na data em que foi constituída fiel depositária ou nada a que foi instada a entregar os veículos, e se na Sentença está – ainda que tacitamente, como se concluí dos últimos parágrafos da pág., 9 - há alteração dos factos não comunicados à A., vd., 358º CPP.
26ª – Isto é, para haver crime de desobediência teria que ser feita a prova da posse dos mesmos e não foi quer em inquérito quer posteriormente.
27ª – No que concerne à utilização do despacho do j4 central criminal que comina com o crime de desobediência, à aqui A.
28ª – Consagra o conteúdo do art.º 355º n.º do CPP que não pode valorado como prova a prova que não tivesse sido examinada em julgamento.
29ª - Ora tal despacho não foi examinado em julgamento, não consta nas actas nem nas gravações.
30ª – Como tal não pode ser valorado numa condenação. Mormente ponto 6 da matéria de facto provada, último parágrafo da página 5 e 1º parágrafo da página 9, em sede de fundamentação da Sentença.
31ª - Vd., ac., 125/22 que declarou inconstitucional
Julgar inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.ºs 1 e 5, conjugado com o artigo 18.º, n.º 2, ambos da Constituição, a norma extraída dos artigos 355.º, n.ºs 1 e 2, e 356.º, n.º 9, aplicável ex vi do disposto no n.º 3 do artigo 357.º, todos do Código de Processo Penal, na interpretação segundo a qual podem valer em julgamento as declarações do arguido a
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