Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 800/2023

Data de publicação20 Dezembro 2023
ELIhttps://data.dre.pt/eli/actconst/800/2023/12/20/p/dre/pt/html
Gazette Issue244
SeçãoSerie I
ÓrgãoTribunal Constitucional
N.º 244 20 de dezembro de 2023 Pág. 75
Diário da República, 1.ª série
TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 800/2023
Sumário: Pronuncia-se pela inconstitucionalidade da norma constante do artigo 2.º do Decreto
n.º 91/XV, da Assembleia da República (Regula o acesso a metadados referentes a
comunicações eletrónicas para fins de investigação criminal), publicado no Diário da
Assembleia da República n.º 26, 2.ª série-A, de 26 de outubro de 2023, procedendo à
segunda alteração à Lei e enviado ao Presidente da República para promulgação como
lei, na parte em que altera o artigo 4.º da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, conjugado com
o artigo 6.º da mesma lei, quanto aos dados previstos no n.º 2 do mencionado artigo 6.º;
não se pronuncia pela inconstitucionalidade das demais normas cuja apreciação foi
requerida.
Processo n.º 1130/23
Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional
I. Relatório
1 — O Presidente da República requereu ao Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no
n.º 1 do artigo 278.º da Constituição da República Portuguesa (doravante, CRP) e dos artigos 51.º,
n.º 1 e 57.º, n.º 1, ambos da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei da Organização, Funcionamento
e Processo do Tribunal Constitucional, adiante designada por LTC), a «apreciação da conformidade
com a mesma Constituição das seguintes normas constantes do Decreto n.º 91/XV da Assembleia
da República, recebido e registado na Presidência da República, no dia 2 de novembro, para ser
promulgado como lei:
— A norma constante do artigo 2.º, na parte em que altera o artigo 4.º da Lei n.º 32/2008, de
17 de julho;
— A norma constante do artigo 2.º, na parte em que altera o artigo 4.º quando conjugado com
o artigo 6.º da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho;
— A norma constante do artigo 2.º, na parte em que altera o artigo 9.º da Lei n.º 32/2008, de
17 de julho».
O referido Decreto n.º 91/XV da Assembleia da República, publicado no Diário da Assem-
bleia da República n.º 26, 2.ª série -A, de 26 de outubro de 2023, cujas normas são assim
submetidas à apreciação deste Tribunal, em processo de fiscalização preventiva da constitu-
cionalidade, «Regula o acesso a metadados referentes a comunicações eletrónicas para fins
de investigação criminal, procedendo à segunda alteração à Lei n.º 32/2008, de 17 de julho,
que transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2006/24/CE, do Parlamento Europeu
e do Conselho, de 15 de março, relativa à conservação de dados gerados ou tratados no
contexto da oferta de serviços de comunicações eletrónicas publicamente disponíveis ou de
redes públicas de comunicações, conformando -a com o Acórdão do Tribunal Constitucional
n.º 268/2022, e à décima segunda alteração à Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, que aprova a
Lei da Organização do Sistema Judiciário».
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2Normas sindicadas
O artigo 2.º do Decreto n.º 91/XV, da Assembleia da República, de onde constam as normas
sindicadas, tem o seguinte teor:
«Artigo 2.º
Alteração à Lei n.º 32/2008, de 17 de julho
Os artigos 2.º, 4.º, 6.º, 7.º, 9.º, 15.º, 16.º e 17.º da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, alterada pela
Lei n.º 79/2021, de 24 de novembro, passam a ter a seguinte redação:
Artigo 4.º
[...]
1 — Os fornecedores de serviços de comunicações eletrónicas publicamente disponíveis ou
de uma rede pública de comunicações devem conservar, nos termos previstos na presente lei, em
Portugal ou no território de outro Estado -Membro da União Europeia, as seguintes categorias de
dados:
a) [...]
b) [...]
c) [...]
d) [...]
e) [...]
f) [...]
2 — [...]
3 — [...]
4 — [...]
5 — [...]
6 — [...]
7 — [...]
Artigo 6.º
Período e regras de conservação
1 — Para efeitos da finalidade prevista no n.º 1 do artigo 3.º, as entidades referidas no n.º 1
do artigo 4.º devem conservar, pelo período de um ano a contar da data da conclusão da comuni-
cação, os seguintes dados:
a) Os dados relativos à identificação civil dos assinantes ou utilizadores de serviços de comu-
nicações publicamente disponíveis ou de uma rede pública de comunicações;
b) Os demais dados de base;
c) Os endereços de protocolo IP atribuídos à fonte de uma ligação.
2 — Os dados de tráfego e de localização são conservados pelas entidades referidas no
n.º 1 do artigo 4.º pelo período de três meses a contar da data da conclusão da comunicação,
considerando -se esse período prorrogado até seis meses, salvo se o seu titular se tiver oposto
perante as referidas entidades à prorrogação dessa conservação.
3 — Os prazos de conservação previstos no número anterior podem ser prorrogados por
períodos de três meses até ao limite máximo de um ano, mediante autorização judicial, requerida
pelo Procurador -Geral da República, fundada na sua necessidade para a finalidade prevista no
n.º 1 do artigo 3.º
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4 — A prorrogação do prazo de conservação referida nos números anteriores deve limitar -se
ao estritamente necessário para a prossecução da finalidade prevista no n.º 1 do artigo 3.º, devendo
cessar logo que se confirme a desnecessidade da sua conservação.
5 — As entidades referidas no n.º 1 do artigo 4.º não podem aceder aos dados aí elencados
salvo nos casos previstos na lei ou definidos contratualmente com o cliente para efeitos emergentes
das respetivas relações jurídicas comerciais.
6 — A autorização judicial a que se refere o n.º 3 compete a uma formação das secções
criminais do Supremo Tribunal de Justiça, constituída pelos presidentes das secções e por um
juiz designado pelo Conselho Superior da Magistratura, de entre os mais antigos destas secções.
Artigo 9.º
[...]
1 — [...]
2 A autorização prevista no número anterior só pode ser requerida pelo Ministério
Público.
3 — [...]
4 — [...]
5 — [...]
6 — [...]
7 — Sem prejuízo do disposto no número seguinte, o despacho que autoriza a transmissão
dos dados referentes às categorias previstas no n.º 1 do artigo 4.º é notificado ao titular dos dados
no prazo máximo de 10 dias a contar da sua prolação.
8 — Se, em inquérito, o Ministério Público considerar que a notificação referida no número
anterior comporta risco de pôr em causa a investigação, dificultar a descoberta da verdade ou
criar perigo para a vida, para a integridade física ou psíquica ou para a liberdade dos participantes
processuais, das vítimas do crime ou de outras pessoas devidamente identificadas, pode solicitar
ao juiz de instrução criminal que protele a notificação, a qual é realizada logo que a razão do pro-
telamento deixar de existir ou, o mais tardar, no prazo máximo de 10 dias a contar da data em que
for proferido despacho de encerramento desta fase processual.
9 — A transmissão dos dados referentes às categorias previstas no n.º 1 do artigo 4.º a auto-
ridades de outros Estados só pode ocorrer no âmbito da cooperação judiciária internacional em
matéria penal, de acordo com as regras fixadas na respetiva lei e desde que esses Estados garantam
o mesmo nível de proteção de dados pessoais vigente no território da União Europeia.».
3Parâmetros da constitucionalidade invocados
O requerente invoca no seu pedido, em termos expressos, «a importância de garantir a cer-
teza jurídica em tão delicada e controversa matéria», pretendendo ver confrontadas as normas
sindicadas com os números 1 e 4 do artigo 35.º e o n.º 1 do artigo 26.º, em conjugação com o n.º 2
do artigo 18.º; e o disposto no n.º 1 do artigo 35.º e do n.º 1 do artigo 20.º, em conjugação com o
n.º 2 do artigo 18.º, todos da Constituição da República Portuguesa.
4Fundamento do pedido
Os fundamentos apresentados no pedido para sustentarem as dúvidas quanto à constitucio-
nalidade das normas impugnadas articulam -se, como dito, com o desiderato de garantir a certeza
jurídica nesta matéria, convocando expressa e diretamente a jurisprudência afirmada no Acórdão
n.º 268/2022 deste Tribunal Constitucional.
É o seguinte o conteúdo do pedido:
«[...]
1.º
Pelo Acórdão n.º 268/2022, o Tribunal Constitucional decidiu pronunciar -se pela inconstitu-
cionalidade das normas constantes do artigo 4.º da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, conjugada
com o artigo 6.º da mesma lei, por violação do disposto nos números 1 e 4 do artigo 35.º e do
n.º 1 do artigo 26.º, em conjugação com o n.º 2 do artigo 18.º, todos da Constituição, e da norma

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