Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 10/2023

Data de publicação16 Novembro 2023
ELIhttps://data.dre.pt/eli/acsta/10/2023/11/16/p/dre/pt/html
Gazette Issue222
SectionSerie I
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo
N.º 222 16 de novembro de 2023 Pág. 114
Diário da República, 1.ª série
SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 10/2023
Sumário: Acórdão do STA de 24-05-2023, no Processo n.º 83/22.2BALSB — Pleno da 2.ª Secção.
Uniformiza-se a jurisprudência nos seguintes termos: «A bolsa atribuída aos auditores
de justiça, em formação no Centro de Estudos Judiciários, nos termos do artigo 31.º,
n.º 5, da Lei n.º 2/2008, de 14.01, não integra o conceito de rendimento para efeitos
de IRS, não estando sujeita a imposto, nos termos do disposto nos artigos 2.º e 2.º-A,
ambos do Código do IRS.»
Acórdão do STA de 24 -05 -2023, no Processo n.º 83/22.2BALSB — Pleno da 2.ª Secção
Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Admi-
nistrativo
1 — Relatório
A DIRETORA -GERAL DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, notificada da Decisão
Arbitral proferida no Processo 418/2021 -T, que correu termos no Centro de Arbitragem Adminis-
trativa (CAAD) e em que é recorrida AA, melhor sinalizada nos autos, não se conformando com o
seu conteúdo, vem dele recorrer para o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do disposto
no artigo 152.º, n.º 1 do CPTA (Código de Processo dos Tribunais Administrativos) e do n.º 2,
do artigo 25.º do RJAT (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, aprovado pelo DL
n.º 10/2011, de 20 de Janeiro), com fundamento em o mesmo se encontrar em contradição com
o Acórdão proferido pelo Tribunal Arbitral, no Processo n.º 272/2021 -T do CAAD, por a decisão
recorrida ter considerado que os valores recebidos pela Recorrida a título de bolsa de formação,
enquanto auditor de justiça, durante todo o período de formação especializada (prevista no n.º 5 do
artigo 31.º da Lei n.º 2/2008, de 14 de Janeiro e constante da cláusula 3.ª do respectivo contrato), não
têm natureza remuneratória que deva qualificar -se como rendimento tributado para efeitos de IRS.
Inconformada, a recorrente DIRETORA -GERAL DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUA-
NEIRA formulou alegações, que terminou com as seguintes conclusões:
A. O presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência tem como objeto a decisão arbitral
que julgou procedente o pedido de pronúncia arbitral (ppa), proferida no processo n.º 418/2021 -T
(cf. doc.... junto), por Tribunal Arbitral em matéria tributária constituído, sob a égide do Centro de
Arbitragem Administrativa (CAAD), na sequência de pedido de pronúncia arbitral apresentado
ao abrigo do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, aprovado pelo Decreto -Lei
n.º 10/2011, de 20 de janeiro, tendo sido notificado por comunicação eletrónica elaborada em
10 -05 -2022 (cf. doc.... junto).
B. A decisão arbitral recorrida colide frontalmente com a jurisprudência firmada na decisão
arbitral, de 29 -12 -2021, proferida no processo arbitral n.º 272/2021 -T, já transitada em julgado
(cf. doc.... junto), a qual constitui decisão fundamento dos presentes autos de recurso.
C. A Recorrente defende, com o devido respeito, que a decisão arbitral, no que respeita à
decisão de mérito, incorreu em erro de julgamento, porquanto o Tribunal arbitral, em contradição
total com a decisão fundamento, considerou que os valores recebidos pela Recorrida a título de
bolsa de formação, enquanto auditor de justiça, durante todo o período de formação especializada
(prevista no n.º 5 do artigo 31.º da Lei n.º 2/2008, de 14 de janeiro e constante da cláusula 3.ª do
respetivo contrato), não têm natureza remuneratória que deva qualificar -se como rendimento tri-
butado para efeitos de IRS.
D. Assim, considerando a jurisprudência invocada, é inteiramente justificado o recurso à
presente via processual para uniformização de jurisprudência, com a consequente anulação da
decisão arbitral e substituição por outra que cumpra o disposto nos artigos 2.º e 2.º -A, ambos do
Código do IRS.
E. In casu, verifica -se uma patente e inarredável contradição quanto à mesma questão fun-
damental de direito, que se prende em saber se os valores recebidos pela Recorrida a título de
bolsa de formação, enquanto auditor de justiça, durante todo o período de formação especializada
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(prevista no n.º 5 do artigo 31.º da Lei n.º 2/2008, de 14 de janeiro e constante da cláusula 3.ª do
respetivo contrato), têm ou não natureza remuneratória que deva qualificar -se como rendimento
tributado para efeitos de IRS, atento o disposto nos artigos 2.º e 2.º -A, ambos do Código do IRS.
F. Estando reunidos os requisitos para que se tenha por verificada a alegada oposição de
acórdãos (na presente situação, decisões), máxime por estar em causa a mesma Requerente
arbitral e a mesma questão controvertida.
G. A decisão arbitral recorrida consignou, como matéria de facto [cf. ponto 10 da mesma,
alíneas a) a l)], em síntese, que a Recorrida foi uma das candidatas a ingressar no 5.º Curso para
os Tribunais Administrativos e Fiscais (TAF), tendo celebrado com o CEJ o contrato de formação a
que se refere o n.º 2 do artigo 31.º da Lei n.º 2/2008, de 14/1, através do qual adquiriu o estatuto
de auditor de justiça; entre janeiro e agosto de 2019 a Recorrida frequentou o 1.º ciclo do curso de
formação teórico -prática e entre setembro e dezembro de 2019 iniciou o 2.º ciclo do curso de forma-
ção; durante o ano de 2019, foram emitidos pelo CEJ à Recorrida recibos referentes ao pagamento
da bolsa de formação prevista no artigo 31.º, n.º 5, da Lei n.º 2/2008, de 14/1, nos quais consta a
referência “CATEGORIA: AUDITOR DE JUSTIÇA”.
H. De seguida, o Tribunal a quo delimita, para o que ora importa, a seguinte questão a deci-
dir (cf. página 9 da decisão): «No caso dos presentes autos, considerando os factos descritos, a
causa de pedir e o pedido formulado, constata -se que o Requerente convoca o tribunal arbitral
para decidir uma questão de direito: saber se os valores recebidos a título de bolsa de formação,
recebida durante a formação de auditor judicial, devem ser ou não considerados como rendimento
para efeitos de incidência de IRS.»
I. Vindo com base em tal factualidade o Tribunal a quo decidir, em síntese, que a bolsa de
formação atribuída aos Auditores de Justiça em formação no CEJ não tem natureza remuneratória,
mas sim compensatória, entendendo que da existência de “um poder de direção por parte do CEJ”
não resulta a caracterização de uma relação de emprego ou exercício de atividade suscetível de
ser enquadrada em alguma das alíneas do artigo 2.º do CIRS, pois, no mínimo, seria necessário,
ainda, que o CEJ usufruísse de vantagens económicas, para que a bolsa recebida devesse ser
tributada em IRS, o que não sucede; pelo que, se conclui na decisão arbitral recorrida que a bolsa
de formação recebida não integra o conceito de rendimento para efeitos de IRS, não estando sujeita
a imposto, nos termos do disposto nos artigos 2.º e 2.º -A, ambos do Código do IRS.
J. E, assim sendo, não acolheu o entendimento vertido na decisão arbitral proferida no processo
n.º 272/2021 -T, que constitui a decisão fundamento do presente recurso, tendo o Tribunal Arbitral
decidido erroneamente quando concluiu que tais rendimentos estão excluídos de tributação.
K. Com efeito, na decisão fundamento consignou -se semelhante factualidade, atento estarmos
perante a mesma Requerente arbitral, e a sua formação no CEJ como Auditora de Justiça após o
ingresso no 5.º Curso para os TAF [cf. ponto 2.1 da matéria de facto da matéria de facto dada como
provada] e, bem assim a mesma questão jurídica a dirimir, isto é, a tributação da bolsa recebida
nesse âmbito.
L. Como se pode ler no ponto 4 do sumário desta decisão arbitral «A atividade exercida pelos
auditores de justiça justifica que as mesmas sejam tributadas em sede de IRS, independentemente
de serem ou não devidas contribuições para a Segurança Social.»
M. Para tanto entendeu, em síntese, que, no caso em concreto, o auditor está mesmo sob a
autoridade ou direção efetiva de uma determinada entidade (sujeito ativo), sendo um dos pressu-
postos para que se verifique a incidência de IRS relativamente aos rendimentos obtidos, importando
ainda notar que a bolsa recebida durante o período da formação representa uma contraprestação
pecuniária, tendo periodicidade mensal, com os pagamentos dos 13.º e 14.º mês, à semelhança
de qualquer trabalhador, o que faz com que esteja sob a alçada do artigo 2.º do CIRS e não na
previsão do artigo 2.º -A, do mesmo diploma.
N. Ou seja, “Estando os auditores a desempenhar funções nos termos daquele regime jurídico,
a bolsa de formação tem natureza de remuneração pecuniária, não tendo por finalidade compensar
o auditor das despesas inerentes à formação mas de o remunerar para função desempenhada.
A quantia atribuída mensalmente ao sujeito passivo está em conexão com o exercício da atividade
profissional. Trata -se de uma atividade remunerada pela contrapartida do serviço prestado.”, não
se podendo, ademais, comparar a bolsa atribuída ao auditor de justiça com outro tipo de bolsa de

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