Acórdão nº 00733/23.3BESNT de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Novembro de 2023

Magistrado ResponsávelPaulo Ferreira de Magalhães
Data da Resolução30 de Novembro de 2023
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I - RELATÓRIO «AA», nacional da República do Vietname [devidamente identificada nos autos] Autora no processo de Intimação que intentou contra o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras [MAI], na qual formulou pedido no sentido de que o mesmo seja intimado a no prazo de 10 (dez) dias úteis, (i) emitir uma decisão convocando a Requerente para a realização da fase procedimental dos biométricos em Portugal com uma antecedência nunca inferior a 60 dias úteis, (ii) emitir uma decisão convocando os reagrupados familiares para a realização da fase procedimental dos biométricos em Portugal com uma antecedência nunca inferior a 60 dias úteis e (iii) que seja o Director Geral do SEF condenado ao pagamento de uma quantia nunca inferior a EUR 10,00, a título de sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso em relação ao prazo fixado para o cumprimento da sentença, inconformada com a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pela qual foi julgada improcedente a Intimação, e absolvido o Réu do peticionado, veio interpor recurso de Apelação.

* No âmbito das Alegações por si apresentadas, elencou a final as conclusões que ora se reproduzem: “[…] II. CONCLUSÕES 1. O presente recurso jurisdicional é interposto da douta sentença proferida pelo Ilustre Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que considerou o meio processual utilizado – i.e., a Intimação para a Proteção de Direitos, Liberdades e Garantias um meio impróprio improcedendo todo o peticionado por falta de urgência; 2. Ora, na sua interpretação, e salvo melhor opinião que o Venerando Tribunal sempre suprirá, a sentença recorrida padece de um erro de julgamento.

3. Sucumbindo nesse mesmo erro, a sentença ora recorrida, faz uma interpretação errada do pedido feito, bem como, e em especial, do direito aplicável aos factos invocados pelo Recorrente; 4. A sentença recorrida padece de erro de julgamento, de facto e de direito, ao considerar não estar em causa qualquer DLG que fundamente a urgência da emissão de uma declaração ARI.

5. Não se tendo pronunciado, de forma cabal, sobre a violação dos Direitos invocados e importantes ao correto julgamento da lide no seu todo, e que são direitos análogos aos Direitos, Liberdades e Garantias do art. 17º da CRP (não considerando, aliás, aplicável); 6. A Sentença recorrida fixa como factos provados que o ora Recorrente, e a sua família, não residem em Portugal pelo que nunca poderiam ter Direitos, Liberdades e Garantias no caso a proteger; 7. Isto é, salvo melhor opinião, uma errada interpretação do direito vigente e da jurisprudência do Tribunal Constitucional, tendo servido, este, de base para toda a fundamentação erradamente utilizada pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto; 8. Consistindo, evidentemente, numa violação do princípio da igualdade constitucionalmente consagrando (art.º 13.º CRP) onde o tribunal não procede com a intimação por estar em causa, em exclusivo, alguém que não reside em Portugal; 9. Até porque, sempre se diga, a própria jurisdição Portuguesa já considerou o uso da Intimação para a Proteção dos Direitos, Liberdades e Garantias como o meio adequado para a correção deste comportamento do SEF.

10. Em primeiro lugar, resulta evidente que o Recorrente não reside em Portugal (a menos que estivesse em regime de ilegalidade...) mas que o está a tentar fazer há três anos de forma ininterrupta; 11. São três anos a querer mudar-se para Portugal, onde pretende estabelecer a sua vida diária, o Recorrente vê essa mesma possibilidade vedada pela inoperância do SEF; 12. Vendo também vedada, de igual forma, a possibilidade ao Reagrupamento familiar; 13. Ambos, Direitos Liberdades e Garantias que merecem chancela da Constituição da República Portuguesa; 14. De facto, a vida do Recorrente e da sua família está em suspenso, uma vez que a família pretende fixar em Portugal o centro da sua vida social e familiar, com a necessidade de preparar a mudança; a aquisição de habitação própria; a mudança de trabalho e as inscrições nas instituições de ensino; 15. Pelo que, nos termos do art. 90ºA da Lei 23/2007 precisa de, pelo menos, ter apresentado o pedido de ARI para poder entrar em Portugal e ser considerada residente legal e não mera turista, com uma permissão de estada de 90 dias; 16. Daí o recurso à Intimação e não outro meio processual por estar em causa uma violação urgente e atual dos Direitos conjugados consagrados nos art. 53º e 86º do CPA e art. 90º-A da Lei 23/2007 afunilando, destarte, nos arts.º 13; 15; 17 e 20 Constituição da República Portuguesa; 17. Ao decidir em contrário, a Douta sentença recorrida viola o art.º 109º do CPTA e os direitos consagrados nos art.º 53º e 86º do CPA e ar 90º-A da Lei 23/2007; 18. Da violação do disposto no art. 53º do CPA decorre o facto do Recorrente não poder dar início à sua pretensão de obtenção de residência e reagrupamento familiar para a sua família em Portugal; 19. Direito este que vem sendo negado desde Outubro de 2020: o de poder apresentar, tão simplesmente, o seu pedido de ARI e de reagrupamento familiar para a sua família; 20. Efectivamente, só o recurso à Intimação para proteção direitos, liberdades e garantias poderá salvaguardar em tempo útil (ou tão útil quanto possível) os direitos ameaçados, pois caso contrário, a Recorrente ver-se-á privada de apresentar o pedido de residência ARI decorrente do direito previsto no art.º 90ºA da Lei 23/2007 conjugado com o art.º 53º do CPA, de apresentar ao SEF, sem saber quando o poderá fazer; 21. O direito ao agendamento de data para início do procedimento administrativo (com a entrega da documentação e recolha dos dados biométricos) não pode ser decretado a título precário e provisório; fazendo com que os meios de tutela comum não sirvam o desiderato em causa.

21. Ainda para mais, diga-se, quando está em causa a flagrante violação de Direitos, Liberdades e Garantias do Recorrente; 22. Parecendo resultar que tal só pode ser efetivado se for reconhecido o carácter urgente da sua violação, e o que tal acarreta, entendendo que a sua efetivação só é possível com recurso à Intimação para Proteção direitos, liberdades e garantias; 23. Conforme decidido em Douta Sentença proferida nos autos de Intimação para proteção direitos, liberdades e garantias que correram termos na 1ª UO do TAF Porto, Proc. 8/22.5BCPRT,“ ...se está previsto o direito a uma decisão é o dever da Administração se pronunciar sobre todos os assuntos da sua competência que lhe sejam apresentados e, nomeadamente, sobre os assuntos que aos interessados digam diretamente respeito (Cfr art. 13º do CPA), a situação escrita corresponde a uma denegação desse direito e ao defraudar desse dever por constituir um obstáculo de facto a que os interessados apresentem sequer os seus “assuntos” à Administração”; [Negrito e Sublinhado Nosso] 24. O recurso ao uso da Intimação para proteção direitos, liberdades e garantias é o meio idóneo para condenar o SEF a adotar uma conduta (o agendamento) que vem sendo negada à Recorrente, não sendo viável o recurso a outro meio processual, sob pena de ainda daqui a cinco anos (e para quem já esperou três não é um prazo impossível de imaginar..), o seu direito consagrado no art.º 86º e art.º 53º do CPA e o seu Direito a apresentar pedido de ARI ainda estar por exercer; 25. Enfermando em absoluto erro toda a sedimentação de fundamentação quando considera que o Recorrente, e a sua família, por não residirem em Portugal, não carecem de proteção da Constituição da República Portuguesa; 26. Sendo que a própria Constituição, e o Tribunal Constitucional em jurisprudência emanada, consideram que o art.º 17.º da CRP se aplica, de igual forma, a casos como aqueles que estamos em apreço; 27. Incorrendo o Tribunal Recorrido na violação clara e flagrante do escopo do art.º 13.º da CRP por considerar que a intimação não é o meio processual idóneo por se tratar de um não-residente em Portugal.

28. Bem assim também fazendo uma má interpretação aquando da denegação de utilização das proteção previstas na Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), e na Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH); 29. Pelo que estão amplamente violados os arts. º 13.º; 15.º; 17.º e n.º 5 do art.º 20.º da Constituição da República Portuguesa; 30. Estando, de facto, em questão a violação de não um, mas vários Direitos, Liberdades e Garantias estabelecidos na CRP; 31. Pelo que deve a douta sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue procedente o pedido de intimação do SEF a agendar data para a entrega do pedido de ARI e de reagrupamento familiar e recolha dos dados biométricos.

TERMOS EM QUE DEVERÁ SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO RECURSO E REVOGADA A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA E SUBSTITUÍDA POR OUTRA QUE ADMITA A INTIMAÇÃO PARA PROTEÇÃO DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS COMO MEIO PROCESSUAL IDÓNEO E, EM CONSEQUÊNCIA, SER O RECORRIDO E DEMAIS FAMÍLIA SER CHAMADOS PARA A RECOLHA DOS DADOS BIOMÉTRICOS EM PORTUGAL.

[…].” ** O Recorrido não apresentou Contra Alegações.

* O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso interposto, fixando os seus efeitos.

** O Ministério Público junto deste Tribunal Superior emitiu parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, em suma, no sentido de ser negado provimento ao recurso, e de ser confirmada a Sentença recorrida.

*** Com dispensa dos vistos legais [mas com envio prévio do projecto de Acórdão], cumpre apreciar e decidir.

*** II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações - Cfr. artigos 144.º, n.º 1 do CPTA, e artigos 639.º e 635.º n.ºs 4 e 5, ambos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigos 1.º e 140.º, n.º 3 do CPTA [sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem deva conhecer...

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