Acórdão nº 168/22.5GCODM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Novembro de 2023

Magistrado ResponsávelMOREIRA DAS NEVES
Data da Resolução07 de Novembro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

I – Relatório a. No Juízo Local Criminal de … procedeu-se a julgamento em processo abreviado de AA, nascido a …/…/1988, cidadão brasileiro, titular da autorização de residência n.º …, com os demais sinais dos autos, a quem foi imputada a autoria, na forma consumada, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto nos artigos 292.º, § 1.º do Código Penal, com referência ao artigo 69.º, § 1.º al. a) do mesmo código; e uma contraordenação prevista no artigo 4.º, § 1.º e 3.º do Código da Estrada

Teve lugar a audiência e a final o tribunal proferiu sentença oralmente, cujo dispositivo ficou registado em ata e a fundamentação registada em áudio, condenando-se o arguido como autor de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto nos artigos 292.º, § 1.º e 69.º, § 1.º al.

  1. CP, na pena de 6 meses de prisão suspensa na sua execução por 1 ano, na pena acessória de 1 ano e 3 meses de proibição de conduzir e numa coima que se fixou em 1 000€

    b. Inconformado com a condenação e com a medida das penas (principal e acessória de proibição de conduzir veículos) e com o montante da coima, o arguido apresenta-se a recorrer, sintetizando-se as conclusões da respetiva motivação, nos seguintes termos (1): 1. A sentença recorrida é nula por falta de fundamentação, quer de facto quer de direito pois dela não consta a enumeração dos factos provados e não provados, bem como a respetiva motivação, como impõem os artigos 374.º, n.º 2 e 379.º, n.º 1, alínea a) do CPP

    1. Nulidade da prova (artigo 153.º n.º 2 alienas a) a d) do CE) - O agente autuante não comunicou devidamente as sanções ao arguido

      - não foi feito o teste qualitativo obrigatório, nem o mesmo consta dos autos, pelo que deve o Tribunal oficiar as autoridades no sentido de virem aos autos provar a elaboração de tal teste

    2. O arguido solicitou contraprova e a mesma foi recusada por parte do agente de autoridade, o que consubstancia uma nulidade da prova nos termos do artigo 153.º do CP

      - a Guarda Nacional Republicana não possuía outro aparelho alcoolímetro para a realização da contraprova

      - O que obrigava o arguido a ir fazer o teste de análise de sangue

      - O agente violou ainda ao artigo 154.º do CE ao não referir o período de 12 horas sem poder conduzir

    3. O facto de não estar provado que existiu um 1.º teste qualitativo para a deteção da presença de álcool no sangue determina a nulidade de todo o processado

    4. A acusação nada refere quanto à aprovação do aparelho alcoolímetro pelo IPQ, nem é referido também a última verificação periódica, desconhecendo-se se a mesma foi ou não efetuada, nem ainda referência à homologação do aparelho alcoolímetro. O que constitui nulidade da prova

    5. Não pode o arguido ser condenado pela contraordenação pois a mesma não está provada, inclusive os próprios agentes disseram que o arguido parou no local mais seguro! 7. Deve a pena de prisão de 6 meses, suspensa na sua execução ser revogada

    6. A medida da pena acessória é excessiva. c. Admitido o recurso o Ministério Público respondeu pugnando pela sua improcedência, sintetizando-se a sua posição deste modo: «i. Não se verificou qualquer nulidade da sentença, por não ter sido aplicada pena detentiva da liberdade em processo abreviado (acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 28-03-2023, processo 2776/22.5GBABF.E1)

      ii. A não realização de teste qualitativo obrigatório para a deteção da presença de álcool no sangue não acarreta qualquer nulidade, de prova ou outra

      iii. Não existe qualquer violação do preceituado no artigo 126.º do CPP

      iv. O arguido admitiu os factos passíveis de consubstanciar a prática do crime de condução sob efeito do álcool, havendo prova pericial relativamente ao quantitativo de álcool no sangue que aquele apresentava

      v. O arguido tem o português por língua materna e foi notificado dos seus direitos e deveres, bem como da possibilidade de realizar contraprova e da proibição de conduzir nas 12 horas subsequentes, como resulta de documento por si assinado constante nos autos, inexistindo qualquer nulidade

      vi. Inexiste nulidade da prova que levou à condenação pela contraordenação imputada na acusação pública

      vii. As penas e a coima aplicadas não merecem qualquer censura, sendo proporcionais à gravidade dos factos e adequadas à censura que a conduta merece, sendo condizente com as necessidades de prevenção geral e especial que cabem ao caso sem, contudo, ultrapassar o limite da culpa do agente

      viii. A sentença do Tribunal a quo não enferma de qualquer vício, desmerecendo censura, devendo, portanto, ser confirmada in totum.» d. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Ministério Público junto desta instância emitiu douto parecer, secundando o que consta da resposta ao recurso, acrescentando com detalhe e clareza as razões que sustentam a manutenção do decidido na 1.ª instância

      e. Cumprido o disposto no artigo 417.º, § 2 do CPP, nada se acrescentou. Efetuado exame preliminar e colhidos os vistos legais, cumpre agora, em conferência, apreciar e decidir. II – Fundamentação A. O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (artigo 412.º, § 1.º CPP) (2)

      Em conformidade com esta orientação normativa, a motivação do recurso deverá especificar os fundamentos e enunciar as respetivas conclusões, deduzidas por artigos, nas quais o recorrente resume as razões do seu pedido, de forma a permitir que o tribunal superior apreenda das razões da sua discordância em relação à decisão recorrida

      Neste contexto constatamos serem as seguintes as questões que cumpre apreciar e sobre as quais importa decidir: i) Nulidade da sentença (374.º, § 2.º e 379.º, § 1.º, al.

  2. CPP); ii) Nulidade das provas (ausência de teste qualitativo e aparelho medidor não homologado); iii) Impugnação da decisão de facto; iv) Inverificação da contraordenação; v) Excessividade das penas. B. Da sentença recorrida Na 1.ª instância julgaram-se provados os seguintes factos, baseados nas seguintes provas: (3) «(…) Resultaram provados os seguintes factos

    Que no dia 25-12-2022, pelas 05h25m, na estrada nacional …, km 105/80, na via pública, o arguido conduzia o veículo automóvel de matrícula …, tendo-lhe sido dada ordem de paragem pelos militares de GNR em serviço, devidamente fardados, fazendo uso do colete refletor e lanterna com cone de sinalização

    Não obstante ter visualizado tal ordem de paragem e que a mesma era emanada pelos militares da GNR em serviço, o mesmo não acatou tal ordem e prosseguiu com a marcha do veículo determinando a necessária perseguição daqueles a este

    O arguido só parou o veículo vários quilómetros à frente, no parque do supermercado …, em …

    O arguido conduzia o referido veículo automóvel com uma taxa de álcool no sangue de pelo menos 2,45 g/l, corresponde à taxa de 2,58 g/l registada

    Agiu o arguido com o propósito concretizado a obstar a que os referidos militares da GNR cumprissem as suas funções e, nomeadamente, a de consumarem a ordem de paragem do veículo conduzido e o autuarem

    Bem sabia o arguido antes de iniciar a sua condução que havia previamente ingerido bebidas alcoólicas em quantidade tal que não só não lhe permitia a condução do veículo em segurança na via pública, como também lhe conferia uma taxa de álcool no sangue superior a 1,2 g/l e que tal constituía taxa crime

    Agiu livre, voluntária e conscientemente, sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas, não se abstendo, porém, de as prosseguir

    Ainda, o arguido foi condenado por sentença transitada em julgado em 6/11/2020, neste Juízo de Competência Genérica de …, no processo 125/20.9…, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 75 dias de multa, na taxa diária de 6,50 €, num total de 437,50€, e na pena acessória de inibição de condução por 4 meses e 15 dias

    Ainda, que o arguido trabalha como auxiliar de bate-chapas, é solteiro, aufere o salário mínimo nacional, tem como despesas 250€ de renda, o quinto ano de escolaridade, não tem outros bens imóveis à exceção de um carro, paga 50,00 € de despesas de saúde

    A motivação dos factos resultou, por um lado, das declarações do arguido que não nos mereceram credibilidade, tendo relatado que não viu sinal de paragem dos militares, e que, mais tarde, apenas se lembra que os militares que lhe disseram que não ia dar em nada

    Admitiu, no entanto, ter bebido cerveja e alguns shots. Portanto, no que toca à taxa, pese embora não a admita, certo que admitiu que consumiu álcool, referiu estar também há cerca de 3 anos e 4 meses em Portugal, e também ainda que ninguém lhe explicou que poderia fazer a contraprova

    O seu depoimento não nos mereceu credibilidade, quer da análise direta do mesmo, prestado de maneira pouco espontânea, estudada, e até porque o próprio, na própria maneira como descreve os factos, não são de molde a ser credíveis e, sobretudo, não podemos também deixar de considerar que a taxa registada nos autos não era certamente de modo a ver que o arguido estivesse no seu melhor estado de atenção, sendo também que admitiu beber cerveja e shots, um conjunto de bebidas que só, das regras de experiência comum, não são aptas a deixar o arguido no melhor estado de atenção

    Pese embora não nos pareceu sequer que fosse esse o caso quanto a pura e simplesmente ter omitido a ordem ou sequer pura e simplesmente negligência na sua condução

    Por outro lado, valorámos ainda também neste conspecto os depoimentos de BB, militar da GNR, que referiu ter dado ordem de paragem, estando os 2 militares apeados. Confirmou também nos autos de folhas 6, 7, 8 e 11, de maneira que nos pareceu credível e espontânea, e referiu que fizeram um teste qualitativo e depois um teste quantitativo

    CC, também Militar da GNR, também descreveu estar na fiscalização. Que o colega deu ordem de paragem e que este não obedeceu e pensa que terá… E que o mesmo terá parado...

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