Acórdão nº 229/23.3JAGRD-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Outubro de 2023

Magistrado ResponsávelCÂNDIDA MARTINHO
Data da Resolução25 de Outubro de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Relatora: Cândida Martinho 1.ª Adjunta: Capitolina Rosa 2.ª Adjunta: Rosa Pinto Acordam, em conferência, os Juízes da 4ª Secção Penal do Tribunal da Relação de Coimbra I.Relatório 1.

… foi submetido a primeiro interrogatório judicial de arguido detido, nos termos do disposto no Artº 141º, do C.P.Penal, o arguido … 2.

Na sequência de tal interrogatório, o Mmº Juiz de Instrução proferiu o seguinte despacho: “O arguido … foi detido pela Polícia Judiciária como suspeito da prática de um crime de homicídio qualificado na forma tentada, previsto nos termos do artigo 14º,22º, 26º, 131º e 132º, nº 1 e nº 2, alínea j), todos do Código Penal, e um crime de detenção de arma proibida e crime cometido com arma, previsto nos termos do 86º, nºs. 1, al. c), nº 2 e nº 3, por referência ao art.º 3º, n.º 4, al. a), todos da Lei 5/2006 de 23 de fevereiro, … I.

Interrogado o arguido e analisados os elementos de prova indicados na promoção do Ministério Público, julgo fortemente indiciados os seguintes factos: 1.O arguido … manteve um relacionamento de partilha de cama, mesa e habitação com AA …, no período compreendido entre 18.03.2023 e 21.06.2023, data em que se separaram; 2.No dia 06.08.2023, … depois da hora do jantar, o arguido dirigiu-se a casa de BB, …, tendo-se ambos envolvido, em circunstâncias e pormenores ainda não concretamente apuradas, numa discussão sobre a relação de cada um deles com AA …; 3. Após, o arguido abandonou o local e dirigiu-se ao posto da GNR de ..., tendo relatado o sucedido, alegando que BB o havia agredido … 4.O arguido após sair das instalações do posto GNR formulou o propósito de tirar a vida de BB e fazendo-se transportar no veículo da marca ..., …, dirigiu-se novamente a casa de BB; 5.Chegado à residência do ofendido, …, retirou do porta-luvas do referido veículo uma pistola da marca ..., transformada para calibre 6.35 mm e introduziu uma munição na câmara, tendo ainda mais 4 munições no carregador; Acto contínuo, 6. O arguido saiu do veículo e dirigiu-se para o alpendre da moradia de BB que tem acesso a uma divisão que serve de cozinha/adega, local onde este se encontrava; 7. O ofendido ao aperceber-se da presença do arguido e que este empunhava uma pistola que apontava na sua direção, tentou fechar a porta da cozinha, tendo sido de imediato impedido pelo arguido, que forçou a abertura da mesma; 8. Enquanto o ofendido tentava fechar a porta da cozinha o arguido tentava abri-la, tendo este logrado introduzir entre a porta que se encontrava semiaberta e o aro da mesma o seu braço direito com o qual empunhava a pistola e efetuou dois disparos na direção do ofendido, o qual se encontrava atrás da porta, que é constituída por vidro fosco na parte superior; 9. O disparo da pistola atingiu o ofendido no terço superior da coxa da perna esquerda, causando, … 10. Após os disparos o arguido abandonou o local imediatamente, tendo escondido a referida arma na parte exterior da moradia do seu irmão.

… II.

Em sede de primeiro interrogatório, tendo o arguido optado por prestar declarações, viria o mesmo a confessar grande parte da factualidade constantes da promoção do Ministério Público, … Na verdade, o arguido apenas se insurgiu quanto aos factos que contendem com o preenchimento o elemento subjectivo do crime de homicídio, na forma tentada, que lhe é imputado, afirmando que em momento algum teve intenção de matar o ofendido.

Como justificação para a sua conduta, afirmou apenas que pretendia causar-lhe medo, uma vez que vinha sendo alvo de ameaças de morte por parte deste (que lhe eram essencialmente transmitidas por terceiros), tudo para que ele o deixasse em paz.

… Salvo devido respeito, a versão apresentada pelo arguido é absurda e desprovida de qualquer sentido de acordo com aquilo que se extrair da análise critica e conjugada de todos os factos objectivos que se mostram fortemente indiciados.

Ninguém para causar medo dirige uma arma de fogo na direcção (ou pelo menos para as imediações) de uma pessoa e efectua dois disparos quando sabe que a mesma está no seu raio de alcance.

… não sabendo em concreto onde ele estava e disparando dois tiros para o interior do edifício (alegadamente para o chão e que o tiro só terá atingido na sequencia de ricochete), não podria deixar de se concluir que, como qualquer cidadão em idênticas circunstâncias, que aqueles tiros poderiam vir a atingir a pessoa que ai se encontrava, conformando-se, ainda assim, com essa possibilidade, o que sempre o faria incorrer numa conduta consentânea com o dolo eventual.

Sem mais delongas, uma vez que a situação em apreço nos parece evidente, não nos restou qualquer dúvida de que o arguido, ao actuar da forma descrita, não teve senão outra intenção que...

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