Acórdão nº 9/23.6GATND.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Outubro de 2023

Magistrado ResponsávelPAULO GUERRA
Data da Resolução25 de Outubro de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

RECURSO nº 9/23.6GATND.C1 Processo Sumário Crime de violação de imposições, proibições ou interdições Crime de falsificação de documento Impugnação da matéria de facto Perfectibilização dos crimes Medida da pena Juízo de Competência Genérica ...

Tribunal Judicial da Comarca de Viseu Acordam, em conferência, na 5ª Secção - Criminal - do Tribunal da Relação de Coimbra: I - RELATÓRIO 1.

A CONDENAÇÃO RECORRIDA … por sentença datada de 30 de Março de 2023, foi decidido «condenar o arguido … 1) Pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de violação de imposições, proibições ou interdições, previsto e punido pelo artigo 353º do Código Penal, na pena de 8 (oito) meses de prisão.

2) Pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelo artigo 256º, nº1, alíneas d) e e)[1] do Código Penal, na pena de 12 (doze) meses de prisão.

3) Em cúmulo jurídico … na pena única de 1 (um) ano e 3 (três) meses de prisão efetiva»[2] 2.

O RECURSO Inconformado, o arguido … recorreu da sentença, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): «1. O tribunal “a quo” procedeu a uma apreciação arbitrária da prova, fazendo uso da mera impressão gerada no seu espírito; 2. Os pontos 7); 8;) 10); 11); 12); 13) e 14) da sentença devem ser dados como não provados; 3. O conhecimento dos meios de prova e do processo dedutivo são absolutamente necessários para poder avaliar-se da correcção da decisão sobre a prova dos factos, … 4. O Tribunal faz, salvo o devido respeito por melhor e douta opinião, um raciocínio ilógico, irracional ou absurdo, em manifesto prejuízo do arguido.

  1. O Tribunal ignora por completo a informação prestada pelos serviços do IMT 6. Da informação prestada pelo IMT resulta que os pedidos online são realizados por “qualquer aparelho electrónico”, mais informando que “não é possível ao IMT identificar o aparelho a partir do qual é realizado o pedido”, afirmando que “através deste meio (online) podem ser efectuados por qualquer pessoa”.

  2. Ora, não resulta dos autos, qualquer prova concreta neste particular aspecto que possa concluir que tenha sido o arguido o autor daquele pedido.

  3. Jamais a conduta perpetrada no IMT preenche o conceito de documento exigido para a consumação do crime de falsificação e documento, p.e p. pelo artigo 256º, nº1 do CP.

  4. De acordo com o artigo 255 do CP documento é … 10. O Artigo 256º do CP visa a acção de quem tem o domínio de facto ou de direito sobre a produção do documento, e não a mera declaração de factos falsos para que constem de documento elaborado por outrem.

  5. A criminalização está restringida aos documentos que comportem declarações de factos falsos e juridicamente relevantes como não sucede no caso sub judice 12. a ser verdade que a conduta (entenda-se pedido online de renovação da carta de condução) foi efectuado pelo recorrente, o comportamento do arguido nunca integraria o cometimento do crime de falsificação de documento ou de uso de documento falsificado.

  6. À data da pratica dos factos, corria já termos na ANSR o processo de cassação do título de condução pertencente ao arguido sob o nº831/2021, pelo que o efeito útil daquele pedido, seria NULO e de NENHUM EFEITO.

  7. Não retirava o arguido qualquer vantagem naquela declaração.

  8. A declaração inverídica feita ao IMT Online não é suscetível de integrar a prática de um crime de falsificação de documento do artigo 256º do C.P, o documento não exibe qualquer aspecto suscetível de revelar falsidade material nem intelectual, pois não foi forjado nem alterado nem apresenta uma desconformidade entre o que foi declarado e o que está documentado.

    … 17. Não se encontra provado o preenchimento do elemento subjectivo do tipo de crime p e p no artigo 353º do CP 18. Foi o arguido quem se dirigiu, naquele dia e hora, às instalações da GNR … conduzindo o veículo automóvel ligeiro de passageiros.

  9. Foi o arguido que entregou duas cartas de condução, uma das quais, emitida pelas autoridades do Luxemburgo, sendo ilógico e irracional este comportamento, para alguém que sabia estar proibido de conduzir.

  10. No momento da fiscalização, os Senhores militares, já sabiam que a carta do arguido se encontrava apreendida à ordem de Processo Judicial, … 21. Em tribunal, explicou também o arguido que o erro se deveu ao facto constante naquela sentença, quando ali se descrevia um facto provado com a informação “proibição de conduzir veículos automóveis pelo período de 16 (dezasseis) meses”.

    … 23. Deveria resultar dos factos provados o erro sobre a ilicitude e a falta de consciência da ilicitude, e em consequência, deve dar-se com não provados os factos 11) e 14) da sentença.

    … 27. Não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito de formação da convicção, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência. (nº1 do art. 355º do CPP) … 29. A pena de prisão efectiva de um ano e três meses aplicada é manifestamente excessiva, desajustada e desproporcional; … 31. O Tribunal ao aplicar a pena de prisão e verificando que a mesma não era superior a dois anos de prisão deveria ter aplicado o regime mais favorável ao arguido nos termos do disposto no art. 2º, nº 4, do CP.

    … 37. Não se compreende nem se aceita que o Mmo. Juiz a quo, não tivesse optado, nem pela suspensão da pena, nem admitindo sequer o seu cumprimento em regime de permanência na habitação. (artigo 43º do CP) … 41. O artº 370º do C.P.P. diz que “o tribunal pode solicitar a elaboração do relatório social”, a realização do relatório social é essencial para uma correcta aplicação da eventual sanção.

  11. O tribunal “a quo” não pode aferir da possibilidade da suspensão da execução da medida de prisão sem mandar realizar relatório social, pois, só através de relatório social o tribunal consegue obter uma visão actualizada da personalidade, condições de vida do arguido, para efeitos do artº 50º do C.P.

  12. Ao não realizar o relatório social, o tribunal recorrido esgota a possibilidade para suspensão da execução da pena, ferindo os direitos de defesa do arguido, violando assim o Tribunal recorrido, nesta parte, o artº 50º do C.P. e o Artº 370º do C.P.P., e ainda interpretou o artº 32º, nº 2, da C.R.P. de modo inconstitucional.

    … 3.

    O Ministério Público respondeu ao recurso, … 4.

    Admitido o recurso e subidos os autos a este Tribunal da Relação, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se … 5.

    Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal (doravante, CPP), foram colhidos os vistos, após o que foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419º, nº 3, alínea c) do mesmo diploma.

    II – FUNDAMENTAÇÃO 1. Poderes de cognição do tribunal ad quem e delimitação do objecto do recurso … Assim, são apenas estas as questões a decidir por este Tribunal: · Existe algum vício processual pelo facto de não ter sido pedida a realização de relatório social, nos termos do artigo 370º do CPP? · Há algum erro de julgamento quanto aos factos nºs 7, 8, 10, 12, 13 e 14? · Deveria ter sido dado como provado o facto enunciado na Conclusão 44º da Motivação de Recurso? · Há erro de subsunção do comportamento do arguido ao crime de falsificação de documento, p. e p. pelo artigo 256º, nº 1, alíneas d) e e) do CP? · Inexiste dolo no comportamento do arguido no que tange à prática do crime p. e p. pelo artigo 353º do CP? · Medida da pena principal - deveria ter sido aplicada ao arguido uma pena de prisão menos severa (eventualmente substituída por uma pena suspensa na sua execução ou pela pena do artigo 43º do CP)? 2.

    DA SENTENÇA RECORRIDA 2.1.

    O tribunal a quo considerou provados os seguintes factos, com interesse para a decisão deste recurso (transcrição): «1) Por decisão datada de 13 de novembro de 2020, proferida no âmbito do processo comum singular nº 25/20...., que correu termos neste tribunal, confirmada pelo Tribunal da Relação de Coimbra em 07.04.2021, transitada em julgado, foi o arguido … condenado, em cumulo jurídico na pena de 9 (nove) meses de prisão, a ser cumprida no domicilio com recurso a vigilância eletrónica, … 2) Ao abrigo do preceituado no artigo 69º, nº 1, do Código Penal, foi ainda o arguido … condenado na pena acessória de proibição de conduzir veículos automóveis pelo período de 2 (dois) anos.

    3) O arguido procedeu à entrega da carta de condução em 13.04.2021, por intermédio da sua companheira … 4) Por força da identificada sentença, o arguido ficou impedido de conduzir veículos a motor entre o dia 13.04.2021 e o dia 13.04.2023.

    5) No dia 9 de janeiro de 2023, pelas 14H30, o arguido … conduziu o veículo automóvel ligeiro de passageiros … pela Rua ..., em ... quando foi intercetado pelos militares da GNR.

    6) A solicitação dos militares da GNR, o arguido apresentou duas cartas de condução, uma emitida pelas autoridades do Luxemburgo e outra emitida pelas autoridades Portuguesas, com o nº ...54, emitida em 12.05.2021.

    7) O arguido, depois de ter entregue a carta de condução para cumprimento da pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor, ou seja, em 10.05.2021, solicitou, por intermédio do IMTOnline (pedido nº ...68) 2ª via da carta de condução nº...54, tendo alegado “extravio da carta de condução anteriormente emitida”.

    8) Mais declarou sob compromisso de honra que “o documento ora requerido não se encontra apreendido quer por decisão judicial ou administrativa quer por autoridade fiscalizadora, comprometendo-me a entregá-la de imediato, caso a venha a recuperar”.

    9) O arguido … conduziu o veiculo automóvel na via pública, encontrando-se proibido por sentença judicial de conduzir veículos motorizados.

    10) O arguido … solicitou a emissão de 2ª via da carta de condução, bem sabendo que a mesma se encontrava apreendida no processo comum singular nº 25/20...., para cumprimento da pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor.

    11) O arguido … desrespeitou uma proibição que lhe...

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