Acórdão nº 3671/22.3T9CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Outubro de 2023

Magistrado ResponsávelJOÃO ABRUNHOSA
Data da Resolução25 de Outubro de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Relator: João Abrunhosa 1.º Adjunto: Maria de Fátima Sanches Calvo 2.º Adjunto: Rosa Pinto Nos presentes autos de recurso, acordam, em conferência, os Juízes da 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: No Juízo de Instrução Criminal de Coimbra, … decidiu-se não pronunciar a Arg.

[1] …, nos seguintes termos: “...

I –No termo do presente inquérito, após a prática de diversos atos, o M.º P.º proferiu despacho de arquivamento[2], nos termos do disposto no artigo 277º n.º1 do Código de Processo Penal, dizendo que entende que existe prova bastante de não se ter verificado o crime de subtração de menor p. e p. pelo art. º 249º n.º 1 al. a) do Código Penal, na medida em que os factos denunciados, de facto, ocorreram, mas, embora sejam típicos, gozam de uma causa de exclusão da culpa.

* Notificado do arquivamento, veio o assistente requerer a abertura da presente instrução, … * … * III- A instrução visa, no presente caso, apurar se dos elementos constantes dos autos, designadamente daqueles que foram colhidos na sequência das diligências instrutórias levadas a cabo, resultam ou não indícios suficientes de a arguida ter cometido factos constitutivos de responsabilidade criminal, maxime subsumíveis ao tipo legal que vem indicado.

Em conformidade com o disposto no n.º1 do art.308º do CPP, … Nesta perspectiva, importará, desde logo, definir aquilo que, no sentido que interessa à disposição do n.º1 do art. 308º do CPP e, portanto, que é suposto pelo juízo subjacente à decisão de pronunciar, se há-de entender por indícios suficientes.

Para efeitos de dedução de acusação pública no termo do inquérito, considera a lei suficientes os indícios dos quais resulte uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena ou uma medida de segurança.

Tal fórmula, expressamente consagrada no n.º2 do art.283º do CPP, representa uma adesão expressa ao entendimento que, na ausência de uma norma positiva de idêntico teor, vinha sendo doutrinal e jurisprudencialmente firmado no domínio da lei processual de 29.

Entendia-se, com efeito, que os indícios seriam bastantes quando lhes correspondesse “um conjunto de elementos convincentes de que o arguido praticou os factos incrimináveis que lhe são imputados”.

Por indícios suficientes eram, neste sentido, entendidos todos os “vestígios, suspeitas, presunções, sinais, indicações, suficientes e bastantes para convencer de que há crime e de que é o arguido responsável por aquele”.

Para a pronúncia, porém, - entendia-se ainda -, não sendo embora necessária uma certeza da existência da infracção, “os factos indiciários devem ser suficientes e bastantes por forma que, logicamente relacionados e conjugados, formem um todo persuasivo de culpabilidade do arguido, impondo um juízo de probabilidade do que lhe é imputado” (cfr., por todos, Ac da Relação de Coimbra de 31 de Março de 1993, CJ, T.II, pg.65).

Seguindo a definição proposta pelo Prof. Germano Marques da Silva - Curso de Processo Penal, V.III, pg.181 e ss., obra que citamos e que passamos a acompanhar - indícios, no sentido em que o conceito é utilizado pela lei processual, são meios de prova, enquanto causas ou consequências, morais ou materiais, recordações e sinais do crime. Nas fases preliminares do processo, como é o caso da instrução, não se visa alcançar a demonstração da realidade dos factos, mas antes, e tão-só, indícios, sinais de que um crime foi cometido por determinado agente.

As provas recolhidas nestas fases não constituem, nesta perspectiva, pressuposto da decisão de mérito mas de mera decisão processual quanto à prossecução do processo até à fase de julgamento. Para a pronúncia, como para a acusação, a lei não exige a prova no sentido de certeza moral da existência do crime, bastando-se com a existência de indícios, de sinais dessa ocorrência.

Necessário é, porém, que os mesmos sejam de modo a sustentar um juízo favorável à existência de uma possibilidade razoável de o crime ter sido cometido pelo arguido. Só assim serão tidos por suficientes, com as todas as consequências legais.

Deste modo, e porque no juízo de quem acusa, tal como no de quem pronuncia, deverá estar sempre a necessidade de defesa da dignidade da pessoa humana, tal possibilidade razoável tem que surgir como mais positiva do que negativa: o juiz só deve pronunciar o arguido quando, através de um juízo objectivo fundamentado nos elementos de prova recolhidos nos autos, forma a sua convicção no sentido de que é mais provável que o arguido tenha cometido o crime do que não o tenha cometido. Ou, utilizando agora as expressivas palavras do Prof. Figueiredo Dias, quando, já em face da prova recolhida, seja de considerar altamente provável a futura condenação do acusado ou, em todo o caso, esta surja mais provável do que a sua absolvição (cfr. Direito Processual Penal, V.I, 1974, pg.133).

Em caso de pronúncia, todos os elementos constitutivos do tipo legal de crime hão-de figurar no despacho de forma clara e explícita, o que significa, em suma, que a decisão instrutória apenas conhecerá tal sentido se os autos contiverem matéria indiciária suficiente que lhes sirva de suporte fáctico.

Apoiados, pois, nestas conclusões doutrinais e jurisprudenciais, analisemos o caso a que se reportam os presentes autos.

Ora, na realidade, ainda que se entendesse que existem indícios suficientes da prática pelo arguido dos factos descritos no RAI, a verdade é que tais factos não integram a prática de um crime de subtração de menores, p. e p. pelo art. º 249º n.º 1 al. a) do Código Penal que o assistente imputa à arguida.

Efetivamente, lê-se em tal normativo o seguinte: “1 — Quem: a) Subtrair menor; (…) é punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias. 3 - O procedimento criminal depende de queixa .

De acordo com Almeida Costa, in “Comentário Conimbricense do Código Penal”, parte especial, Tomo II, edição de Dezembro de 1999, página...

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