Acórdão nº 354/21.5PAMGR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Outubro de 2023

Magistrado ResponsávelMARIA JOSÉ GUERRA
Data da Resolução11 de Outubro de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência os Juízes do Tribunal da Relação de Coimbra - RELATÓRIO 1.

…* 1.1.

Realizada a audiência de julgamento, foi proferido acórdão, com data de 23 de março de 2023, do dispositivo do qual ficou a contar, como decidido, o seguinte: “I - Absolver o arguido AA da imputada prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo arteº 21º nº 1 do D.L. nº 15/93 de 22.01, por referência a tabelas I-A e I-C, anexo àquele diploma legal.

II - Condenar o arguido AA pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 21º nº 1 do D.L. nº 15/93 de 22.01, por referência à tabelas I-A e I-C, anexo àquele diploma legal na pena de 5 (cinco) anos e 1 (um) mês de prisão.

III - Absolver a arguida BB da imputada prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 21º nº 1 do D.L. nº 15/93 de 22.01, por referência à tabelas I-A e I-C, anexo àquele diploma legal.

(…) Nos termos do artigo 35.º, n.ºs 1, e 2, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro e do artigo 109.º, n.º 1, do Código Penal, determina-se o perdimento a favor do Estado de todos os objectos relacionados com o tráfico de estupefacientes, apreendidos aquando das buscas realizadas nos presentes autos, incluindo o veículo que os respectivos arguidos utilizavam para a execução das suas actividade de venda de estupefaciente, por terem servido para a prática do crime de tráfico imputado aos arguidos.” * 2.

… interpuseram recurso os arguidos, extraindo da motivação exarada nos recursos por eles apresentados as conclusões que se transcrevem: 2.1 – Do recurso do arguido … 1.ª Entende o arguido que o Acórdão recorrido reclama a superior correção, de Vossas Excelências, porquanto: i. Relativamente ao episodio do dia 19/06/2021, a sua condenação assenta em prova proibida nos termos do n.º 3 do artigo 126º do Código de Processo Penal; ii. Não fez uma correta interpretação da prova globalmente considerada … 2.ª Ora, desde logo, a busca realizada no dia 19/06/2021, deve ser considerada nula por não ter operado dentro daquelas situações excecionais que a lei vem permitir que os OPC’s possam agir por iniciativa própria nos termos do n.º5 do artigo 174º e na al. a) do n.º1 do artigo 251º do Código de Processo Penal, pelo que, por imperativo do chamado efeito à distância, nos termos do artigo 122º, n.º1 do referido diploma legal, ter-se-á de considerar nula a apreensão realizada, por violação do n.º3 do artigo 126º do Código de Processo Penal, configurando prova proibida.

3.ª Efetivamente não havia qualquer flagrante delito, até, pelo menos, à concretização da busca, ou seja, até se iniciar a intromissão para a qual se exige prévia autorização judicial ou consentimento do visado, … 4.ª Depois, apesar de ter havido a suspeita da pratica de um crime de trafico de produtos estupefacientes - criminalidade altamente organizada – não se verificava qualquer perigo para a vida ou integridade física, quer dos próprios, quer de terceiros, pelo que aquela busca não poderá ser validada ao abrigo do al. a) do n.º5 do artigo 174º do Código de Processo Penal.

5.ª Igualmente se diga, no que toca às medidas cautelares e de polícia, previstas nos artigos 248º e seguintes do Cód. do Processo Penal, com especial enfoque para o disposto na al. a) do n.º1 do artigo 251º, em que, concretamente, a situação não cumpria com todos os requisitos legais que validam e permitem que os OPC’s realizem buscas ao veiculo.

6.ª Não se verificava qualquer situação de fuga iminente ou detenção por parte de nenhum dos arguidos, pelo que não estava legitimado ao OPC procederem, por sua livre iniciativa, à busca ao interior do veículo, configurando uma ingerência proibida na esfera de proteção da privacidade dos visados.

7.ª Por fim, a busca só poderia ser legitimada e validada através do consentimento dos visados, o que também não sucedeu.

8.ª Assim, … a mesma configura um meio de obtenção de prova nulo, sendo que, por efeito de contagio, ter-se-á de considerar, igualmente, a apreensão nula, por violação do n.º3 do artigo 126º do Código de Processo Penal, estando perante prova proibida, insuscetível de ser valorada, pelo que deverá o arguido ser absolvido.

9.ª Porem, caso assim não se entenda, sempre se dirá que o Tribunal a quo não dispunha de acervo probatório suficiente capaz de imputar, ultrapassando o mínimo de duvida aceitável, a posse e propriedade daquele produto estupefaciente ao arguido, ora recorrente.

10.ª No cumprimento e para efeitos do preceituado no artigo 412º n.º 3 alínea a) do Código de Processo Penal, o arguido, ora recorrente, considera terem sido incorretamente julgados os pontos 3 e 4 e 13 a 15 da matéria de facto dada como provada no douto acórdão recorrido, que aqui se transcrevem: … 17.ª O Tribunal decidiu, …, condenar o arguido, ora recorrente, pelo que, tal condenação configura uma clara violação da presunção da inocência, nos termos do n.º2 do artigo 32º da Constituição da Republica Portuguesa, devendo neste sentido o arguido de ser absolvido pela pratica do crime ocorrido no dia 19/06/2021.

18.ª No limite, o Tribunal deveria ter-se situado na duvida e em cumprimento do principio do in dúbio pro reo, absolver, igualmente, o arguido da pratica de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21º do Decreto-Lei n.º15/93, de 22 de janeiro, ocorrido no dia 19/06/2021.

… 20.ª E mais, ainda que se admita, por mera cautela e dever de patrocínio, que o produto estupefaciente era, efetivamente do arguido, o Tribunal a quo também não dispunha de qualquer elemento que colocasse o arguido na posição de vendedor, …, pelo que, apenas poderia o Tribunal a quo condena-lo pela mera posse e jamais como vendedor, diminuindo-se assim a intensidade da ilicitude e da culpa.

21.ª No que toca ao episodio do dia 26/10/2021, no cumprimento e para efeitos do preceituado no artigo 412º n.º 3 alínea a) do Código de Processo Penal, o arguido, ora recorrente, considera terem sido incorretamente julgados os pontos 7, 10 e 12 a 15 da matéria de facto dada como provada no douto acórdão recorrido, que aqui se transcrevem: … 30.ª Pelo que, deveria o Tribunal a quo situando-se na duvida e em cumprimento do principio in dúbio pro reo absolver o arguido da pratica de um crime de tráfico de estupefacientes, eventualmente ocorrido no dia 26/20/2021.

31.ª Posto isto, admitindo que Vossas Excelências apenas acompanhem parcialmente o nosso entendimento, julgando improcedente a invalidade invocada e a impugnação de toda a matéria de facto que determina a absolvição do arguido, somos a ponderar o seguinte quadro: Vossas Excelencias dão como provado o episodio do dia 19/06/2021 e absolvem o arguido do crime do dia 26/10/2021; Vossas Excelências absolvem o arguido do crime do dia 19/06/2021 e dao como provado o episodio do dia 26/10/2021 ou Vossas Excelências , acompanham a posição do Tribunal a quo e dao como provados os dois episódios.

32.ª Considerando as duas primeiras hipóteses, sempre se dira que Vossas Excelências deverão alterar a qualificação jurídica do crime imputado, enquadrando-o à luz do artigo 25º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, como tráfico de menor gravidade, encontrando-se preenchidos os requisitos cumulativos essenciais.

… 41.ª Parece-nos, então, concluindo nesta parte, que, quer Vossas Excelências deem como provados os factos ocorridos no dia 19/06/2021 e absolvam o arguido dos factos ocorridos no dia 26/10/2021 ou caso contrario, deem como provados os factos ocorridos no dia 26/10/2021 e absolvam o arguido dos factos ocorridos no dia 19/06/2021, em qualquer uma destas hipóteses, estamos, pois, perante factos que, pese embora, ao nível do tipo, preencham os elementos objetivo e subjetivo do crime de tráfico de estupefacientes, espelham, todavia, uma ilicitude nitidamente diminuída face ao tipo base e, portanto, apenas enquadrável na previsão privilegiada do art. 25º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, ou seja, no crime de Tráfico de Menor Gravidade, devendo, por consequência a pena aplicada ser reduzida.

42.ª Contudo, admitindo que Vossas Excelências em nada acompanhem todo o entendimento sufragado ao longo das presentes motivações de recurso, o que não estamos de todo em crer, sempre se dirá, salvo melhor opinião e o douto suprimento de Vossas Excelências, que o Tribunal recorrido, na determinação da medida concreta da pena, foi excessivamente castigador, ultrapassando a medida da culpa.

43.ª Salvo melhor opinião e o douto suprimento de Vossas Excelências, na operação de fixação da pena, não pode olvidar-se que o grau de culpa do recorrente, aquando da participação do crime, revela-se manifestamente atenuado, pois estão em causa apenas e só dois episódios e somente um único ato de tráfico.

44.ª Apesar da sua notória ilicitude, a verdade é que o arguido apenas colocou produto estupefaciente em circulação uma única vez, aquando do episodio do dia 26/10/2021, pelo que a violação dos bens jurídico protegido foi apenas integralmente violado nessa circunstância.

… 54.ª Com efeito e ressalvado o doutíssimo suprimento de Vossas Excelências, entendemos, assim, apresentar-se cabalmente evidenciada uma prognose social favorável, que deve conduzir a que o Tribunal corra um risco prudente, um risco moderado, na convicção de que os momentos vividos pelo arguido em contacto com o sistema de justiça, aliados à ameaça de uma pena de prisão serão suficientes para realizar os fins das penas e mantê-lo afastado da criminalidade.

… * 2.2.

Do recurso da arguida … “1ª … mal o Tribunal a quo quando declarou perdido a favor do Estado o veiculo de marca ..., com matricula ..-DB-.., bem como do telemóvel de marca ..., modelo ..., com IMEI ...75, porquanto não ficou demonstrada qualquer relação de causalidade adequada entre o uso daqueles objetos e a pratica do crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 21º, n.º1 do Decreto-Lei 15/93 de 22 de janeiro, caraterizando-se tal declaração de forma injustificada, desadequada e...

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