Acórdão nº 540/21.8T9STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Outubro de 2023

Magistrado ResponsávelANA BACELAR
Data da Resolução10 de Outubro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação do Évora I.

RELATÓRIO No processo comum n.º 540/21.8T9STR, do Juízo de Competência Genérica ... da Comarca de ..., o Ministério Público acusou: (i) AA, divorciada, sem profissão conhecida, nascida a ... / ... / 1981, na freguesia ... do concelho ..., filha de BB e de CC, residente na Rua ..., ..., em ..., pela prática, em autoria material, de um crime de violência doméstica agravada, previsto e punível pelo artigo 152.º,n.º 1, alínea d), n.º 2, alínea a), n.º 4 e n.º 5, do Código Penal; (ii) DD, divorciado, operador de máquinas, nascido a .../.../1966, na freguesia ... do concelho ..., filho de EE e de FF, residente na Rua ..., em ..., ..., pela prática, em autoria material, de um crime de violência doméstica agravada, previsto e punível pelo artigo 152.º,n.º 1, alínea d), n.º 2, alínea a), n.º 4 e n.º 5, do Código Penal Não foi apresentada contestação escrita.

Realizado o julgamento, perante Tribunal Singular, por sentença proferida e depositada em 4 de julho de 2023, foi decidido: «

  1. CONDENAR a arguida AA, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de violência doméstica agravado, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, alíneas d), n.º 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 8 (oito) meses de prisão.

  2. CONDENAR o arguido DD, pela prática, por omissão, de um crime de violência doméstica agravado, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, alíneas d) e e), n.º 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 10 (dez) meses de prisão.

  3. SUSPENDER a execução da pena identificada em b), pelo período de 2 (dois) anos e 10 (dez) meses, acompanhada de regime de prova.

  4. NÃO APLICAR aos arguidos as penas acessórias previstas no artigo 152.º, n.ºs 4 e 5, do Código Penal.

  5. CONDENAR a arguida AA a pagar a GG a quantia de 5.000,00€ (cinco mil euros) a título de arbitramento oficioso de reparação dos prejuízos sofridos com o crime, ao abrigo do disposto no artigo 21.º da Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro; f) CONDENAR o arguido DD a pagar a GG a quantia de 3.500,00€ (três mil e quinhentos euros), a título de arbitramento oficioso de reparação dos prejuízos sofridos com o crime, ao abrigo do disposto no artigo 21.º da Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro; g) Condenar os Arguidos no pagamento das custas processuais, fixando-se a taxa de justiça individual em 3 (três) UC, sendo a de DD reduzida a metade atenta a confissão integral e sem reservas.» Inconformado com tal decisão, a Arguida AA dela interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [transcrição]: «A. A Arguida não esteve presente na audiência de discussão e de julgamento.

    1. Embora a notificação tenha sido enviada para a morada constante do TIR, a verdade é que, conforme resulta do relatório social e da procuração, a Recorrente já não vive na referida morada, razão pela qual, a Arguida não esteve presente.

    2. Ademais, com os referidos elementos constantes do relatório social era possível ao Tribunal a quo tomar outras diligências destinadas a assegurar a presença da Arguida que seria bastante relevante já que o grande meio de prova utilizado contra a Arguida são as declarações de outro coarguido que confessou.

    3. Não se verifica nos autos que o Tribunal a quo tomou todas as medidas necessárias e legalmente admissíveis para assegurar a comparência da Arguida Recorrente na audiência de discussão e de julgamento, devendo reconhecer-se a presente nulidade invocada, ordenando a repetição da audiência de discussão e de julgamento, realizando, se necessário, todas as diligências destinadas a assegurar a presença da Arguida/Recorrente na referida audiência de discussão e de julgamento, de acordo com o n.º 1 e 2 do artigo 122.º do Código de Processo Penal.

    4. O Tribunal a quo deu como provado os factos 5 a 18, 21 e 22, 24 a 27, resultando dos mesmos a convicção ao Tribunal a quo que a Recorrente deveria ser condenada.

    5. O Tribunal a quo fundamenta os factos provados acima referidos com base, não só mas também, como base nas declarações do coarguido, conforme resulta da sentença recorrida de fls… G. Tendo o Tribunal a quo valorado a confissão do outro coarguido, significa que tal meio de prova não pode valer contra a aqui Recorrente.

    6. Atentas as razões acima invocadas, verifica-se que a confissão do Arguido não pode valer como meio de prova contra a aqui Recorrente e, por conseguinte, a Recorrente foi indevidamente condenada.

      I. Não tendo a Arguida estado presente na audiência de discussão e de julgamento e não tendo o Tribunal a quo cumprido todas as diligências necessárias a assegurar a sua presença, as declarações do outro coarguido não estiveram sujeitas ao contraditório e, por conseguinte, tal meio de prova não pode valer contra a aqui Recorrente.

    7. Do demais acervo probatório não resulte nenhuma outra que possa ser valorada contra a aqui Recorrente, considerando que as demais testemunhas não têm qualquer conhecimento direto dos factos.

    8. As outras duas testemunhas não tiveram qualquer conhecimento direito dos factos dados como provado em 5 a 18, 21 e 22, 24 a 27, motivo pelo qual, é evidente o erro de julgamento e, por conseguinte, os referidos factos dados como provados, devem ser dados como não provados quanto à aqui Recorrente.

      L. Por fim, sem prejuízo da nulidade insanável invocada, verifica-se que não existe prova bastante e que possa ser valorada como meio de prova que pudesse determinar que os factos provados 5 a 18, 21 e 22, 24 a 27 fossem dados como tal, bem como não existem meios de prova suficientes para que se conclua que a Arguida/Recorrente praticou o crime em causa.

    9. Razão pela qual, deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que determine a absolvição da Recorrente ou, em alternativa, determinar a repetição da audiência de discussão e de julgamento.

    10. A Recorrente não reside nem contacta com o outro coarguido nem com o ofendido.

    11. A aqui Arguida é primária e não tem qualquer reincidência criminal.

    12. As filhas de Recorrente, conforme resulta do relatório social, não merecem cuidados especiais, sendo bem tratadas e estão estáveis e, por conseguinte, o risco de reincidência.

    13. Assim, para efeitos de determinação da execução da pena deve atender-se ao momento presente e não ao da alegada prática dos factos, estando evidenciado que a Recorrente encontra-se ressocializada e sem qualquer risco de cometer qualquer crime.

    14. Deve atender-se, ainda, que a Recorrente toma conta de uma filha menor que precisa da sua presença, quer para alimentar-se, educar-se e proporcionar o melhor possível uma infância saudável.

    15. Caso contrário, não só a vida da Recorrente está destruída, como se destrói a vida de uma criança que perde a mãe por muitos anos, sobretudo quando iniciará a entrada na vida adolescente que é, notoriamente, uma fase decisiva na formação de qualquer jovem.

    16. Face a todo o exposto, admitindo-se a manutenção da condenação, o que por mera hipótese académica se coloca, sempre deverá a pena ser suspensa na sua execução e/ou substituída por outra de permanência em habitação ou a prestação de trabalho em favor da comunidade.

      Assim, nestes termos e nos demais de direito que V. Exa., doutamente suprirá, deve dar provimento ao presente recurso e, em consequência, determinar a revogação da sentença recorrida e substituir por outra que absolva a Recorrente ou que determina a repetição do julgamento atenta a nulidade invocada por violação do disposto no n.º 1, 2 e 4 do artigo 333.º e artigo 344.º do Código de Processo Penal e, em último cenário, mantendo-se a condenação, deve a mesma ser suspensa na sua execução e/ou substituída por outra medida não privativa da liberdade.

      » O recurso foi admitido.

      Na resposta que, sem conclusões, foi apresentada pelo Ministério Público, junto do Tribunal recorrido, concluiu-se pela improcedência do recurso.

      Enviados os autos a este Tribunal da Relação, a Senhora Procuradora Geral Adjunta emitiu o seguinte parecer [transcrição]: «Concordamos e damos por reproduzidos os argumentos aduzidos na decisão impugnada, bem como na Resposta à Motivação de Recurso apresentada pela nossa Exma. Colega junto do Tribunal de 1.ª Instância, entendendo que o Recurso não merece provimento, devendo ser confirmada a decisão impugnada.» Observado o disposto no n.º 2 do artigo 417.º do Código de Processo Penal, nada mais se acrescentou.

      Efetuado o exame preliminar, determinou-se que o recurso fosse julgado em conferência.

      Colhidos os vistos legais e tendo o processo ido à conferência, cumpre apreciar e decidir.

      II.

      FUNDAMENTAÇÃO De acordo com o disposto no artigo 412.º do Código de Processo Penal e com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19 de outubro de 1995[[1]], o objeto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraiu da respetiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.

      As possibilidades de conhecimento oficioso, por parte deste Tribunal da Relação, decorrem da necessidade de indagação da verificação de algum dos vícios da decisão recorrida, previstos no n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal, ou de alguma das causas de nulidade dessa decisão, consagradas no n.º 1 do artigo 379.º do mesmo diploma legal.

      [[2]] Posto isto, e vistas as conclusões dos recursos, a esta Instância são colocadas as questões: - da nulidade prevenida na alínea c) do artigo 119.º do Código de Processo Penal; - da impossibilidade de valoração, em julgamento, das declarações prestadas pelo coarguido DD; - da desadequação, por excesso, da pena e seu modo de cumprimento.

      û Na sentença recorrida foram considerados como provados os seguintes factos [transcrição]: «1 – GG, nasceu a .../.../2004 e é filho de DD e de HH, sendo que estes últimos se encontram separados pelo menos desde 17.01.2008.

      2 – Os arguidos, AA e DD, casaram a 12 de janeiro de 2011.

      3 – O referido casal...

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