Acórdão nº 16397/20.3T8PRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 12 de Julho de 2023

Magistrado ResponsávelNELSON FERNANDES
Data da Resolução12 de Julho de 2023
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação / processo n.º 16397/20.3T8PRT.P1 Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho do Porto - Juiz 3 Autora: AA Ré: A... - Associação de Solidariedade Social, Instituição Particular de Segurança Social ______Nélson Fernandes (relator) Rita Romeira Teresa Sá Lopes Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto I - Relatório 1.

AA instaurou ação de condenação emergente de contrato de trabalho com processo comum contra A... - Associação de Solidariedade Social, Instituição Particular de Segurança Social (IPSS), peticionando o seguinte: “A) – ser declarado, ilegal e ilícito, por falta de comunicação prévia e falta de fundamento para a cessação do contrato, o despedimento da Autora, promovido pela Ré, com efeitos a partir de julho de 2020; B) Condenar a Ré, em consequência da ilicitude do despedimento referido em A) supra, no pagamento à Autora das quantias seguintes: a. €316,25 - de compensação devida nos termos do art. 344º, nº 2 do C.T; b. €527,08 – de retribuição do mês de julho de 2020; c. €527,08 – de retribuição do mês de agosto de 2020; d. € 527,08 – de retribuição do mês de setembro de 2020; e. €527,08 – de retribuição do mês de outubro de 2020; nos termos do artigo 393º do C.T.; f. €435,76 – de férias vencidas e não gozadas, desde inicio até termo do contrato; g. €435,76 – de subsídio de férias vencido e não pago, desde inicio até termo do contrato; h. €87,85 – subsídio de natal vencido e não pago, ano de 2019; i. €439, 23 – subsídio de natal vencido e não pago, ano de 2020; Tudo acrescido dos juros, à taxa legal, até efetivo e integral pagamento; C) Condenar a Ré, em consequência do vencimento do processo, no pagamento das custas do mesmo.” Não se logrando acordo na audiência de partes, notificado o Réu, apresentou contestação, excecionando, no que ao presente recurso importa, a incompetência absoluta do tribunal a quo, por infração das regras de competência em razão da matéria.

Com data de 24 de abril de 2022, o Tribunal recorrido proferiu despacho com o teor seguinte: “Considerando a natureza do contrato invocada pela autora, afigura-se-me que se poderá verifica, no caso, a incompetência material deste tribunal.

Assim, determino se notifique a autora para, querendo, se pronunciar quanto a esta questão (artigo 3.º, n.º 3 do CPC).” Pronunciou-se no seguimento a Autora, defendendo que a competência assiste no caso ao Tribunal recorrido.

O Tribunal recorrido, aquando da prolação do despacho saneador, depois de fixar em €8.823,17 o valor da ação, conhecendo da invocada exceção, fez constar do dipositivo o seguinte (transcrição): “Pelo exposto, e ao abrigo das mencionadas disposições, julgo procedente a excepção de incompetência absoluta em razão da matéria, declarando este tribunal incompetente para conhecer do pedido formulado nestes autos, absolvendo a ré da instância quanto ao mesmo.

Custas a cargo da autora, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia - artigo 446.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil.” 2.

Notificada, apresentou a Autora requerimento de interposição de recurso, finalizando as suas alegações com as seguintes conclusões: I. A aqui Autora/Recorrente, intentou, em 08-10-2020, a presente ação declarativa comum contra a Ré/Recorrida, A... – Associação de Solidariedade Social, peticionando, contra esta, entre outros, fosse declarado ilegal e ilícito, por falta de comunicação prévia e falta de fundamento para a cessação do contrato, o despedimento da Autora/recorrente, promovido pela Ré/Recorrida, com efeitos a partir de julho de 2020; II. A Autora/Recorrente é beneficiária da Medida Contrato Emprego-Inserção+, medida promovida pelo IEFP que abrange Desempregados beneficiários do Rendimento Social de Inserção e outros Desempregados elegíveis; III. A Ré/Recorrente é uma Instituição Particular de Solidariedade Social, dedicada a ações de solidariedade e apoio social; IV. No exercício da sua atividade, a Ré/Recorrida, no dia 01 de Novembro de 2019, admitiu ao seu serviço a Autora/Recorrente, por contrato equiparado a contrato de trabalho a termo certo, denominado Contrato EmpregoInserção +, enquadrado nas medidas de promoção de empregabilidade do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP), pelo prazo de 1 ano, com termino previsto em 31 de Outubro de 2020; V. Obrigou-se a Autora/Recorrente, no âmbito do sobredito contrato, a prestar à Ré/Recorrida, enquanto Entidade Promotora Privada de Solidariedade Social, funções inerentes à execução de trabalho socialmente necessário, na área de ESPECIALISTA DO TRABALHO SOCIAL; VI. Mais foi acordado, pelas partes, a remuneração mensal correspondente ao seguinte: a. Uma bolsa mensal de montante igual ao valor do IAS, ou seja, €435,76; b.

Subsídio de alimentação referente a cada dia de atividade, no valor de €4.77/dia; c.

Pagamento de despesas de transporte, entre a residência e o local de atividade, no montante de €15,00/mês (correspondente ao passe mensal); VII. As sobreditas funções eram exercidas, pela Autora/recorrente, num período normal de trabalho, ou seja, das 09:30h às 19:00h, com intervalo para almoço, das 12:30 às 14:00h; VIII. Salvo melhor opinião, e ao contrário do entendimento explanado na sentença recorrida, defende a Autora/Recorrente que o contrato, objeto dos presentes, denominado “contrato de emprego-inserção+”, independentemente da sua função social, assemelha-se a um contrato de trabalho – seja na remuneração dependente da atividade desenvolvida, seja na subordinação jurídica existente.

  1. O artigo 11º do Código de Trabalho, com a epígrafe “Noção de contrato de trabalho”, define contrato de trabalho como aquele pelo qual uma pessoa singular se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob a autoridade destas. Ou seja, segunda esta norma, o contrato de trabalho reconduz-se a três elementos essenciais: a atividade (manual ou intelectual), a retribuição e a subordinação jurídica.

  2. A propósito destes contratos é defendido pelo TRP, datado de 10-07-2019, no proc. 1942/18.2T8VNG.P1, disponível para consulta em: http://www.dgsi.pt/ jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/a18af9e2f37f0f6980258450003683f0?OpenDocument cujo sumário se transcreve: I - Havendo nos contratos de emprego-inserção uma dependência funcional e uma relação jurídica de subordinação por parte do seu beneficiário em relação à entidade promotora na prestação do trabalho socialmente necessário, podemos considerar que existe uma relação laboral sui generis.

    II - Sendo o beneficiário de tais contratos de emprego-inserção um trabalhador por contra de outrem em sentido lato, o sinistro ocorrido na execução desse contrato deve ser considerado como um acidente de trabalho, sendo os juízos do trabalho os competentes para conhecer das suas consequências. (sublinhado e negrito nosso); XI. A Autora/Recorrente subscreve tal entendimento, pois, resulta evidente que no âmbito do contrato de emprego Inserção +, a Autora, prestou ou seu trabalho por conta de Ré/Recorrida, que não deixa de ser uma entidade privada sem fins lucrativos, encontrando-se a Autora/Recorrente, no tempo em prestou trabalho, na dependência económica da Ré/Recorrida, que lhe pagava a retribuição mensal/Bolsa e demais componentes retributivas, beneficiando e/ou tirando proveito a Ré/Recorrida dessa prestação de trabalho da Autora/Recorrente, controlando, ademais, a Ré/Recorrida essa efetiva prestação de trabalho da Autora/Recorrente; XII. No mesmo sentido, indicam-se os seguintes acórdãos, cujos sumários se transcrevem: - TRP, 23-11-2020, proc. 4627/19.9T8MAI.P1; O Tribunal do Trabalho é materialmente competente para a apreciação das questões relativas ao contrato de emprego-inserção +, celebrado nos termos da Portaria nº 128/2009, de 30 de Janeiro.

    - STJ, 23-11-2021, 181/19.0T8BGC.G1.S1 Os Tribunais do Trabalho são materialmente competentes para apreciar um acidente ocorrido no exercício de funções, ao abrigo de um contrato-emprego-inserção+, na medida em que o regime previsto na Lei n. º 98/2009, abrange o trabalhador por conta de outrem de qualquer atividade, seja ou não explorada com fins lucrativos, devendo sempre que a referida lei não imponha entendimento diferente presumir-se que o trabalhador está na dependência económica da pessoa em proveito da qual presta serviços.

  3. Assim, e entendendo-se, como entende a Autora/Recorrente, que o contrato-emprego-inserção +, deve ser visto como um contrato de trabalho atípico, são os Tribunais de Trabalho os materialmente competentes para apreciar as questões relativas a tais contratos, como é a questão dos presentes autos; XIV. A Meritíssima Juíza a quo, na sentença recorrida, considerou, erradamente, o decidido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16/12/2020 (publicado em www.dgsi.pt), que se transcreve “Os contratos de “emprego – inserção” e «emprego - inserção +» disciplinados na Portaria n.º 128/2009, de 30 de janeiro, titulam as relações jurídicas entre a entidade promotora – no caso dos autos o Município Réu e o trabalhador - e enquadram a prestação de trabalho levada a cabo, com a definição do complexo de direitos e obrigações das partes.

    (….) É líquido que o regime de cessação do contrato de trabalho emergente dos artigos 338.º e ss. do Código de Trabalho nada tem a ver com estes contratos, o que é questão completamente diversa do enquadramento jurídico do acidente de trabalho ocorrido na sua execução, matéria a que se refere o acórdão dos Tribunal dos Conflitos proferido no referido processo n.º 015/17, de 19 de outubro de 2017 e outra jurisprudência daquele Tribunal invocada nos autos.

    O que se torna evidente é que os contratos em causa, face ao regime que resulta da mencionada Portaria e dos regulamentos emitidos pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional, nos termos do seu artigo 17.º, titulam relações jurídicas enquadradas pelo Direito Administrativo, que por tal motivo devem ser consideradas como relações jurídicas...

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