Acórdão nº 257/23.9YRLSB-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Julho de 2023

Magistrado ResponsávelLOPES DA MOTA (RELATOR DE TURNO)
Data da Resolução26 de Julho de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I.

Relatório 1. AA, requerido no processo de execução de mandado de detenção europeu em referência, que corre termos no Tribunal da Relação de Lisboa, à ordem do qual se encontra detido, alegando encontrar-se atualmente em prisão ilegal, apresenta petição de habeas corpus, ao abrigo do disposto na al. c), do n.º 2, do artigo 222.º do CPP, nos termos e com os seguintes fundamentos: «Por acórdão datado de 07-06-2023, foi deferida a execução do mandado de detenção europeu para entrega do requerida supra enunciado ao Estado de Membro de Emissão.

O n.º 2 do art.º 29.º da Lei n.º 65/2003, de 23 de agosto, estabelece que a entrega do requerido deve ter lugar no prazo máximo de 10 dias a contar da decisão definitiva de execução do mandado de detenção europeu.

Ora, tendo em consideração que o trânsito em julgado da referida decisão ocorreu no dia 23-6-23, já decorreram os 10 dias previstos para a execução do MDE.

Acresce que, o artigo 29.º n.º 3 da Lei nº 65/2003 estabelece que “Se for impossível a entrega da pessoa procurada no prazo previsto no número anterior, em virtude de facto de força maior que ocorra num dos Estados membros, o tribunal e a autoridade judiciária de emissão estabelecem de imediato os contactos necessários para ser acordada uma nova data de entrega, a qual deverá ter lugar no prazo de 10 dias a contar da nova data acordada.” Ora, decorrido também este prazo não foram realizadas quaisquer diligências com vista a esse fim, já tendo o mesmo sido de igual modo ultrapassado.

Como bem refere o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no âmbito do processo nº08P2911: “A Lei nº 65/2008 estabelece, no seu art. 30º, os prazos máximos de duração da detenção: 60 dias até à prolação da decisão sobre a execução do MDE (nº 1); 90 dias, no caso de recurso dessa decisão; 150 dias, se houver recurso para o TC. Estes são os prazos de duração da detenção, ou seja, os prazos que a detenção não pode exceder até à prolação da decisão sobre a execução do MDE. Após o trânsito dessa decisão, uma nova fase se abre: a da execução do MDE, com a entrega da pessoa procurada (detida ou em liberdade) à entidade emissora do MDE. Para a entrega, um novo prazo é cominado, este previsto no art. 29.º da mesma Lei. Esse prazo é de 10 dias (n.º 2 do referido artigo), podendo ser prorrogado por mais 10 dias, nas circunstâncias indicadas no n.º 3 do mesmo preceito.” Neste momento, ultrapassados todos os prazos, já não poderá o prazo de execução do mde nos termos do art. 29º nº3 da Lei 65/2003.

Leia-se ainda o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no âmbito do processo nº 301/13.8YLSB-A.S1:2 “(….) o prazo máximo de detenção, após a decisão definitiva de entrega, é de 10 ou 20 dias, conforme não se verifique ou verifique o facto de força maior referido no nº 3. É a interpretação que se impõe fazer em face da norma do nº 5 do artº 23º da Decisão Quadro do Conselho, de 13 de junho de 2002 (2002/584/JAI), preceito que prevê os prazos de entrega: «Se, findos os prazos referidos nos nºs 2 a 4, a pessoa ainda se encontrar detida, deve ser restituída à liberdade».

Com base nesta argumentação, o requerido pediu a sua libertação imediata.

Porém, por despacho datado do 17-07-23, decidiu o Exmo. Juiz Desembargador, o seguinte: “Como facilmente se enxerga das ocorrências processuais relevantes acima fixadas só a partir de 14-jul-2023, antagonicamente à narrativa do requerido, é que poderão estar reunidos os requisitos legais que permitirão ao tribunal determinar os exatos termos em que a entrega do requerido às autoridades do reino de Espanha poderá ter lugar, face ao disposto no n.º 3 do referido art. 31.º da Lei n.º 65/2003, de 23-ago.

(…) Com o devido respeito por opinião diversa, afigura-se-nos não ter agasalho na lei ao caso aplicável que o entendimento de que ao proferir a decisão acerca da execução do mandado o tribunal está necessariamente a determinar a entrega do requerido.” Quando o artigo 29º refere que a entrega deve ter lugar no prazo máximo de 10 dias a contar da decisão definitiva de execução do mandado de detenção europeu, está a referir-se precisamente ao trânsito em julgado do acórdão que decidiu o mandado de detenção europeu! Ora, a partir do momento em que a decisão do mandado de detenção europeu transita em julgado, inicia-se a fase de execução do mesmo, com a entrega da pessoa procurada, sendo cominado o prazo previsto no artigo 29º para esse efeito.

Assim, salvo o devido respeito, assim que transitar a decisão do mandado de execução europeu, o tribunal deverá entregar o requerido nos prazos previstos para o efeito, sendo o início desta “fase” automática, como tem vindo a entender o Supremo Tribunal de Justiça.

Como bem ficou decidido no Acórdão datado de 07-07-23, “Com base no supra exposto, acordam os Juízes na ...ª Secção Criminal da Relação de Lisboa, em deferir a execução do presente Mandado de Detenção Europeu para entrega do Requerido AA ao Estado Membro de Emissão.” Ora, é deferida a execução para entrega do requerido! Transitada esta decisão, dá-se início a esta fase, nos prazos do já citado artigo 29º da lei 65/2003, de 23 de agosto.

Já no que toca ao argumento de que “o referido art.31.º da Lei n.º 65/2003, prevê situações que, após ter proferido decisão, o Tribunal pode suspender a entrega do requerido ou determinar apenas a sua entrega temporária, conforme ocorra alguma das situações previstas do nº1 ou do nº3 do aludido art. 31º.” Ora, no caso em concreto não se verifica nenhuma das situações do n.º 3 ou do n.º 1 do artigo 31.º da Lei nº 65/2003, de 23 de agosto, pelo que não se vislumbra o motivo pelo qual se traz esta norma à colação.

Acresce que, havendo a necessidade de solicitar garantias às Autoridades do Reino de Espanha, deveriam estas garantia ter sido requeridas antes da decisão definitiva do mde, caso contrário, sempre haveria o risco de não serem respeitados os prazos de execução previstos na lei.

De igual modo, não se verifica o motivo de força maior previsto no artigo 29º nº 3 da Lei 65/2003, e ainda que se verificasse, já teria sido excedido de igual forma o prazo para entrega do requerido, uma vez que já decorreram mais do que 20 dias desde o trânsito da decisão.

De igual modo, não se verifica o motivo de força maior previsto no artigo 29º nº3 da Lei 65/2003, e ainda que se verificasse, já teria sido excedido de igual forma o prazo para entrega do requerido, uma vez que já decorreram mais do que 20 dias desde o trânsito da decisão.

Como bem refere o Supremo Tribunal de Justiça, é a interpretação que se impõe fazer em face da norma do n.º 5 do art.º 23.º da Decisão Quadro do Conselho, de 13 de junho de 2002 (2002/584/JAI), preceito que prevê os prazos de entrega: «Se, findos os prazos referidos nos nºs 2 a 4, a pessoa ainda se encontrar detida, deve ser restituída à liberdade».

Face a todo o exposto, o arguido encontra-se privado da sua liberdade de forma ilegal.» 2. Como a petição não vinha acompanhada da “informação” a que se refere o n.º 1 do artigo 223.º do CPP, mas apenas de um despacho do Senhor Juiz Desembargador em turno dizendo “Cumpra o n.º 1 do art. 223.º do CPP”, solicitou-se tal informação.

Em resposta, a Senhora Juíza Desembargadora em turno, que lhe sucedeu, remeteu uma “informação” contendo uma síntese da petição do habeas corpus e da “resposta” do Ministério Público e cópia de um anterior despacho de 17.07.2023, do seguinte teor: «O Supremo Tribunal de Justiça veio solicitar ao Tribunal da Relação, com urgência, a informação a que se refere o nº 1 do art.º 223º do CPP, que contem o seguinte: “A petição é enviada imediatamente ao presidente do Supremo Tribunal de Justiça, com informação sobre as condições em que foi efectuada ou se mantém a prisão”.

  1. O requerido, AA, com os demais sinais a fls. 123 dos presentes autos, por acórdão datado de 07.06.2021 foi deferida a execução do mandado de detenção europeu.

    O requerido veio referir que, tendo em consideração que o trânsito em julgado da referida decisão ocorreu no dia 23.06.2023, já decorreram os 10 dias previstos para a execução do MDE.

    E, decorrido também o prazo previsto no artigo 29º, nº 3 da Lei nº 65/2003, não foram realizadas quaisquer diligências com vista a esse fim, já tendo o mesmo sido de igual modo ultrapassado.

    Cita, além de outros, o acórdão do STJ proferido no âmbito do processo nº 310/13.8YLSB-A.S1, referindo o seguinte “(…) o prazo máximo de detenção, após a decisão definitiva de entrega, é de 10 ou 20 dias, conforme não se verifique ou verifique o facto de força maior referido no nº 3, É a interpretação que se impõe fazer em face da norma do nº 5 do art.º 23º da Decisão Quadro do Conselho, de 13 de Junho de 2002 (2002/584/JAI), preceito que prevê os prazos de entrega: “Se, findos os prazos referidos nos nºs. 2 a 4, a pessoa ainda se encontrar detida, deve ser restituída à liberdade”.

    E conclui o arguido que por consideração à violação dos direitos fundamentais do arguido (art.º 18º da CRP), impõem-se que o mesmo seja imediatamente restituído à liberdade.

    Esta é a posição do requerido.

  2. O Exmº Procurador Geral Adjunto, em 17.07.2023 veio a responder, considerando que o requerimento do requerido só pode ter resultado de mero lapso, uma vez que não tem fundamento legal.

    E refere o seguinte: - após ter sido proferida decisão, no dia 21/06/2023 o Mº Pº promoveu que se oficiasse ao Estado de Emissão – Espanha-, paras que, com a máxima urgência, informasse os autos sobre se extaria disposto a garantir a devolução do Requerido a Portugal, para cumprimento de pena de prisão em que eventualmente vier a ser condenado nos processos que ainda tem pendentes no nosso país- art.º 31º, nº 3, da lei nº 65/2003, de 23 de Agosto.

    - a Mmª Juíza deferiu essa promoção e, na sequência do seu cumprimento, apenas em 14/07 as Autoridades Espanholas vêm prestar a garantia que lhes foi solicitada.

    Quer isto significar que só a partir desta data, ao...

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