Acórdão nº 34/13.5TELSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Julho de 2023

Magistrado ResponsávelAGOSTINHO TORRES
Data da Resolução06 de Julho de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo 34/13.5TELSB.L1.S1.

  1. Secção (STJ).

    Revista Excepcional (art. 672º/1-a) e b) do Código de Processo Civil).

    Juiz Conselheiro Relator- Agostinho Torres Juízes adjuntos- António Latas e José Eduardo Sapateiro.

    Tribunal Reclamado- STJ-5ª Secção- Acórdão de 9 de Março de 2023 Reclamantes: “J..., Lda.”; AA; BB.

    * ACORDAM EM CONFERÊNCIA OS JUÍZES NA 5ª SECÇÃO CRIMINAL DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I-Relatório 1.1.

    Por Acórdão de 9 de Março desta 5ª Secção criminal do STJ foi decidido rejeitar o recurso conjunto de revista excepcional cível, interposto pelos arguidos AA, CC e J..., FILHOS, LDª do Ac do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 27 de setembro de 2022 .

    1.2.

    Inconformados com esta última decisão, vieram agora reclamar para a conferência, pedindo: a) Ser reconhecida e declarada a nulidade do acórdão reclamado, por omissão de pronúncia e, em consequência, conhecer-se da nulidade insanável arguida pelos Recorrentes; b) Declarar a verificação de nulidade insanável por violação do juiz natural e determinar a anulação do ato de distribuição visado e do acórdão proferido, em conferência, a 09.03.2023, pelo coletivo de Juízes decorrente da distribuição errónea, ordenando nova distribuição; Subsidiariamente, Ser reconhecida e declarada a nulidade do acórdão reclamado, por omissão de pronúncia e, em consequência, conhecer e declarar a verificação da inconstitucionalidade invocada pelos Recorrentes no seu recurso de revista; Cumulativamente com o pedido formulado em c), d) Reformar o acórdão reclamado, eliminando as referências a qualquer renúncia tácita ao direito de recorrer operada pelos Recorrentes; Cumulativamente com qualquer um dos pedidos, e) Reconhecer e declarar a inconstitucionalidade do artigo 672.º, n.º 1, do CPC, aplicável por força do artigo 4.º do CPP, na interpretação de que a interposição de recurso de revista excecional com fundamento num alegado erro de julgamento decorrente de uma questão de direito invocada pelos recorrentes apenas em sede desse mesmo recurso, não é admissível, sob o argumento de que tal questão de direito representa uma questão sobre a qual o Tribunal a quo não se pronunciou e, em face disso, não há uma “decisão” objeto de recurso, uma vez que tal entendimento representa uma desproporcional e excessiva restrição do direito ao recurso dos Recorrentes, resultando na concomitante violação do direito ao recurso enquanto garantia do processo criminal, ínsito no artigo 32.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa e, em consequência, revogar o acórdão reclamado, proferindo-se nova decisão que admita o recurso de revista interposto pelos Recorrentes.” 1.3.

    Em parecer sobre a dita reclamação, Ministério Público teve a seguinte posição: “Em síntese: Rejeitado o recurso, o Tribunal “a quo” não tem de proferir pronúncia sobre nada que não respeite ao fundamento da rejeição do recurso, salvo sobre vício insanável de que padeça a própria instância recursiva ” (cfr o art. 379º/1-c) do Código de Processo Penal); A entrada em vigor da alteração operada à disposição do art. 213º do Código de Processo Civil pela L-55/2021, de 13/08, ocorrerá, apenas, com a vigência da Portª 86/2023, de 27/03, que a regulamentou; O Acórdão “sub judice” não carece de reforma, pois que não padece de lapso manifesto (cfr, o art. 616º/2 do Código de Processo Civil); A decisão de rejeição do recurso implica a extinção do poder jurisdicional do Tribunal “ad quem” nessa matéria. ” (cfr, o art. 613º do Código de Processo Civil).

    O Acórdão “sub judice”, de rejeição do recurso, não padece de “omissão de pronúncia” ou de “manifesto lapso”, nem é susceptível de revogação pelo Tribunal “ad quem”, motivo por que se p. que seja indeferido o requerido” 1.4.

    Designou-se conferência para apreciação da reclamação, com prévia aposição de vistos.

    Cumpre, assim, apreciar e decidir.

    1. Fundamentação 2.1- Pretendem os reclamantes, agora por ordem de precedência: A) Verem declarada a verificação de nulidade insanável por violação do juiz natural e a anulação do ato de distribuição visado e do acórdão proferido, em conferência, a 09.03.2023, pelo coletivo de Juízes decorrente da distribuição alegadamente errónea, ordenando nova distribuição; B) Ser reconhecida e declarada a nulidade do acórdão reclamado, por omissão de pronúncia e, em consequência, conhecer e declarar-se a verificação da inconstitucionalidade invocada pelos Recorrentes no seu recurso de revista; C) Reformar o acórdão reclamado, eliminando as referências a qualquer renúncia tácita ao direito de recorrer operada pelos Recorrentes; D) Reconhecer e declarar a inconstitucionalidade do artigo 672.º, n.º 1, do CPC, aplicável por força do artigo 4.º do CPP, na interpretação de que a interposição de recurso de revista excecional com fundamento num alegado erro de julgamento decorrente de uma questão de direito invocada pelos recorrentes apenas em sede desse mesmo recurso, não é admissível, sob o argumento de que tal questão de direito representa uma questão sobre a qual o Tribunal a quo não se pronunciou e, em face disso, não há uma “decisão” objeto de recurso, uma vez que tal entendimento representa uma desproporcional e excessiva restrição do direito ao recurso dos Recorrentes, resultando na concomitante violação do direito ao recurso enquanto garantia do processo criminal, ínsito no artigo 32.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa e, em consequência, revogar o acórdão reclamado, proferindo-se nova decisão que admita o recurso de revista interposto pelos Recorrentes.” 2.2 – Conhecendo e decidindo das 4 questões enunciadas 1ª questão- [Nulidade insanável por violação do juiz natural -anulação do ato de distribuição visado e do acórdão proferido, em conferência, a 09.03.2023, pelo coletivo de Juízes decorrente da distribuição errónea, ordenando-se nova distribuição] 1ª1.- Invocando o artigo 119.º, alínea a), do CPP, o artigo 213.º do CPC, aplicável ex vi artigo 4.º do CPP, com a redação dada pelo artigo 2.º da Lei n.º 55/2021, de 13 de agosto, que introduziu mecanismos de controlo da distribuição eletrónica dos processos judiciais e o artigo 204.º, n.º 4, alínea c), do CPC vieram arguir nulidade por força da distribuição operada dizendo: “ (…)apuraram os Recorrentes junto da Secretaria do Tribunal que, não só inexiste qualquer ata que documente as operações de distribuição, em cumprimento do disposto no artigo 204.º, n.º 4, alínea c), como a própria distribuição não terá sido efetuada eletronicamente e nos termos plenos do disposto no artigo 213.º, n.º 3, alínea a), do CPC, com vista a apurar aleatoriamente os juízes-adjuntos de entre todos os juízes da secção competente, sem aplicação do critério da antiguidade ou qualquer outro.

    17. Por sua vez, as modificações decorrentes de tal Lei não estão condicionadas à emissão de qualquer regulamentação da Lei pelo que, sendo de aplicação imediata ao processo penal, nos termos do disposto no artigo 5.º, n.º 1, do CPP, a sua inaplicação configura uma violação das regras legais relativas ao modo de determinar a composição do Tribunal.

    Na verdade, dispõe o artigo 112.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa, que “Nenhuma lei pode criar outras categorias de actos legislativos ou conferir a actos de outra natureza o poder de, com eficácia externa, interpretar, integrar, modificar, suspender ou revogar qualquer dos seus preceitos”.

    Ora, admitir que a eficácia de uma Lei da Assembleia da República esteja por qualquer forma condicionada pela sua regulamentação, daria ao Governo, na prática, o poder de obstar à vigência de uma lei pela sua não regulamentação.

    Com efeito, o legislador definiu expressamente, por via do artigo 3.º da referida Lei n.º 55/2021, de 13 de agosto, que “O Governo procede à regulamentação da presente lei no prazo de 30 dias a contar da data da sua publicação, devendo aquela entrar em vigor ao mesmo tempo que esta”.

    De outro modo, a norma ínsita no artigo 3.º da Lei n.º 55/2021, de 13 de agosto, quando e se interpretada no sentido de que o regime normativo em causa apenas entra em vigor e produz os seus efeitos após a respetiva regulamentação pelo Governo é materialmente inconstitucional, por violação do princípio da hierarquia dos atos normativos que subjaz ao artigo 112.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa.

    Deste modo, na vigência dos artigos 204.º e 213.º do CPC, com a redação dada pela Lei n.º 55/2021, de 13 de agosto, é manifesto que ocorreu uma violação das regras legais relativas ao modo de determinar a composição do Tribunal, porquanto, e de acordo com a informação recolhida junto da Secretaria do Tribunal, não só não foi exarada a ata que permita aos Recorrentes confirmar as operações de distribuição alegadamente realizadas, como o coletivo de Juízes, no que se reporta aos Juízes-Adjuntos, não terá sido objeto de distribuição eletrónica, pública e verificável pelos sujeitos processuais, em violação do disposto nos artigos 204.º, n.º 4, alínea c) e 213.º, n.º 3, alínea a), do CPC.

    A referida violação de normas legais referentes ao modo de determinação da composição do Tribunal importa a verificação de uma nulidade insanável aquando do ato de distribuição irregular, o que determina a sua invalidade, bem como os demais atos que dele dependerem e que puderem afetar: aqui, o acórdão proferido em conferência, a 09.03.2023.

    Em suma, deveria o acórdão proferido ter-se pronunciado sobre a nulidade insanável prevista no artigo 119.º, alínea a), do CPP, declarando a sua verificação e a invalidade do ato de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT