Acórdão nº 398/21.7GELLE.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Junho de 2023

Data14 Junho 2023

DECISÃO SUMÁRIA Nada obsta ao conhecimento do recurso, estando correto o efeito que lhe foi atribuído

No exame preliminar verifica-se que a questão a decidir – regularidade da apresentação do requerimento de abertura de instrução – vem sendo decidida de forma uniforme pela jurisprudência dos tribunais[1] (artigo 417.º, § 6.º, al. d) do CPP, pelo que se passa a proferir Decisão Sumária

I - RELATÓRIO a. Notificado da decisão final do Ministério Público no inquérito, AA (com os sinais dos autos), que naquele assume as qualidades de arguido e de assistente, apresentou em Juízo (nessa dupla qualidade) requerimento de abertura de instrução, pugnando pela sua não pronúncia relativamente aos crimes pelos quais fora acusado, e pela pronúncia de BB relativamente aos factos que aquele lhe imputa

Apresentados os autos ao M.mo Juiz do Juízo de Instrução Criminal de Faro, este proferiu o seguinte despacho: «Finda a fase de inquérito foi proferido, a 22.06.2022, despacho de acusação contra AA

Inconformado, veio o arguido requerer a abertura de instrução, apresentando o correspondente requerimento através de correio electrónico e não juntando o respectivo original no prazo legalmente previsto

Cumpre apreciar e decidir

Compulsados os autos constata-se que o arguido, no dia 30 de Junho de 2022, apresentou requerimento de abertura de instrução através de correio electrónico genérico com o recurso ao servidor de correio electrónico da Ordem dos Advogados. Porém, o mesmo não contem qualquer assinatura electrónica avançada nem a aposição de selo temporal por terceira entidade idónea

Sem prescindir, o original do requerimento de abertura de instrução não foi remetido ao tribunal

Ora, reza o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 3/2014 que “em processo penal, é admissível a remessa a juízo de peças processuais através de correio electrónico, nos termos do disposto no artigo 150 n.º 1 al. d) e n.º 2 do CPC e na Portaria n.º 624/2004, de 16/6, aplicáveis por força do disposto no artigo 4.º do CPP.”

Já o artigo 3.º, n.º 4 da Portaria n.º 624/2004, de 16 de Junho, dispõe que “o envio de peças processuais por correio electrónico equivale à remessa por via postal registada, nos termos do n.º 3 do artigo 6.º do DL n.º 290-D/99, de 2/8, bastando para tal a aposição de assinatura electrónica avançada.” e o n.º 6 do mesmo normativo assinala que “A expedição da mensagem de correio electrónico deve ser cronologicamente validada, nos termos da al. u) do artigo 2.º do DL n.º 290-D/99, de 2/8, com a redacção que lhe foi dada pelo DL n.º 62/2003, de 3 de Abril, mediante a aposição de selo temporal por uma terceira entidade idónea.”

Por sua vez, o artigo 10.º da aludida portaria sustenta que à apresentação de peças processuais através de correio electrónico simples ou sem validação cronológica é aplicável, para todos os efeitos legais, o regime estabelecido para o envio através de telecópia

No caso dos autos, conforme se expôs, o requerimento de abertura de instrução foi remetido a juízo por correio electrónico não contendo qualquer assinatura electrónica avançada, gozando, nestes termos do valor da simples telecópia

Tendo enviado o requerimento de abertura de instrução através de correio electrónico, o arguido estava obrigado a enviar o original, no prazo máximo de 10 dias, o que foi preterido, violando-se, assim, o estatuído no art.º 4.º, n.º3 do Decreto-lei n.º 28/92, de 27 de Fevereiro

Sublinha-se que, para o efeito, não se impõe a realização de qualquer convite à junção aos autos dos respectivos originais – veja-se neste sentido, Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 13.04.2021, proc. n.º 914/18.1T9ABF-B.E1, relator: Maria Fernanda Palma, disponível em www.dgsi.pt

Sem prescindir, veio também AA, no mesmo requerimento de abertura de instrução, mas na qualidade de assistente, requerer a pronuncia de BB

Porém, e pese embora o dito requerimento tenha sido enviado, também, através de correio electrónico sem juntar os respectivos originais, violando o estatuído no art.º 4.º, n.º3 do Decreto-lei n.º 28/92, de 27 de Fevereiro, resulta dos autos que o assistente não liquidou a taxa de justiça devida pela abertura de instrução, nos termos do disposto no art 8º nº2 do RCP

Assim, por todo o exposto, atendendo a que o requerimento de abertura de instrução foi apresentado por um meio legalmente inadmissível, não tendo aptidão para desencadear quaisquer consequências jurídicas, decide-se rejeitar tal requerimento, ao abrigo do estabelecido no artigo 287.º, n.º 3, do Código Processo Penal.» b. Não se conformando com esta decisão dela veio recorrer a assistente, formulando deste modo as (desnecessariamente extensas)[2] conclusões da sua motivação (transcrição): «1. O presente recurso tem como objeto o despacho que rejeitou o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo Arguido/Assistente por entender que este é legalmente inadmissível, bem como a admissão da constituição de Assistente, por já constar dos autos uma decisão sobre esta matéria, verificando-se por tal, exceção de caso julgado

  1. Simultaneamente ao Requerimento de Abertura de Instrução, o Recorrente requereu a sua constituição como Assistente, na qualidade de Ofendido

  2. Tal requerimento de constituição de Assistente foi objeto de despacho proferido em 22/10/2022, pelo Juízo Local Criminal de Loulé – Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, admitindo a sua constituição de Assistente, por verificação de todos os pressupostos legais

  3. Deste despacho, foi o Recorrente foi notificado

  4. O Recorrente, não foi notificado de qualquer reclamação ou recurso do mencionado despacho de 22/10/2022 que tenha sido interposto por algum dos sujeitos processuais

  5. Assim, esta decisão transitou em julgado formando caso julgado, nos termos e para os efeitos do disposto na parte final do n.º 1 do artigo 580º do Código Processo Civil (de ora em diante CPC) ex vi artigo 4º do CPP

  6. O objetivo da força e da autoridade do caso julgado é justamente evitar que uma determinada relação jurídica seja apreciada de forma diferente por outra decisão, ferindo assim os valores basilares de um Estado de Direito Democrático como são o da segurança e certeza jurídicas

  7. As decisões ora invocadas são totalmente opostas, contraditórias e incompatíveis entre si

  8. Encontrando-se verificada a exceção de caso julgado, deve o despacho de que ora se recorre ser revogado e substituído por outro que mantenha a decisão proferida em 22/10/2022, admitindo a constituição de Assistente

  9. Entende o Recorrente que mal andou o Tribunal a quo ao rejeitar o Requerimento de Abertura de Instrução apresentado pelo Arguido/Assistente ora Recorrente, nos termos em que o foi

  10. O Requerimento de Abertura de Instrução foi enviado para os serviços da 1ª Secção do DIAP de Loulé, no dia 31 de agosto de 2022, através de correio eletrónico

  11. O Requerimento de abertura de instrução foi enviado em formato PDF com o carimbo e a assinatura manuscrita da Defensora Oficiosa, através do seu endereço eletrónico associado à Ordem dos Advogados

  12. O endereço de correio eletrónico da Ordem dos Advogados é seguro, e dele consta o nome e o número de cédula da Defensora do Arguido

  13. O supra referido correio eletrónico não foi uma mera mensagem de correio eletrónico simples, pois que nele foi aposta a assinatura eletrónica da Defensora do Recorrente

  14. A assinatura eletrónica da Defensora é identificada na folha impressa da mensagem do correio eletrónico a fls. (…), da qual consta “Assinada por: (...)@adv.oa.pt”

  15. Entende o Recorrente que foram cumpridos todos os requisitos legais de forma, tendo o Requerimento de...

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