Acórdão nº 565/21.2GELLE.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 06 de Junho de 2023
Magistrado Responsável | ANA BACELAR |
Data da Resolução | 06 de Junho de 2023 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação do Évora I.
RELATÓRIO No processo comum n.º 565/21.3GELLE do Juízo Central Criminal de Faro [Juiz 2] da Comarca de Faro, mediante acusação pública, foi pronunciado: AA, nascido a 19 de julho de 1959 (…) pela prática, em concurso real e efetivo, de - dois crimes de violência doméstica, previstos e puníveis pelo artigo 152.º, n.º 1, alíneas b) e e), n.º 2, alínea a) e n.º 4, do Código Penal; - um crime de detenção de arma proibida, previsto e punível pelo artigo 86.º, n.º 1, alínea d), por referência aos artigos 2.º, n.º 1, alíneas m), an) e av), 3.º, n.º 2, alínea e), da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro.
O Arguido apresentou contestação escrita, onde nega a prática dos factos que lhe são imputados.
Realizado o julgamento, perante Tribunal Coletivo, por acórdão proferido e depositado em 22 de fevereiro de 2023, foi decidido: «
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Absolver o arguido AA da prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, al. e) e n.º 2, al. a) do Código Penal; b) Condenar o arguido AA pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, al. a) e n.º 2, al. a) do Código Penal, na pena de três anos e seis meses de prisão; c) Condenar o arguido AA pela prática de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo artigo 86º, n.º 1, al. d) da Lei n.º 5/2006, de 23/2, na pena de seis meses de prisão; d) Condenar o arguido AA na pena única de três anos e nove meses de prisão; e) Suspender a execução da referida pena, pelo período de quatro anos, nos termos do disposto no artigo 50.º, n.º 1 e 5 do Código Penal, subordinada a regime de prova, mediante plano de reinserção social a elaborar pela DGRSP, e com sujeição às seguintes regras de conduta: a.
obrigação do arguido, no prazo de 1 mês (a contar do trânsito em julgado), se inscrever e comparecer em consulta de psiquiatria, fim de obter aconselhamento adequado, devendo juntar aos autos, nos 15 dias posteriores, comprovativo do cumprimento; b.
obrigação do arguido iniciar tratamento adequado ao alcoolismo na ETET, ficando obrigado a cumprir o tratamento que lhe for prescrito, com a comparência às consultas determinadas e toma de medicação prescrita, até que lhe seja concedida alta clínica; c.
obrigação do arguido se sujeitar aos exames medicamente prescritos, necessários para execução do tratamento ou para deteção do consumo de bebidas alcoólicas; d.
obrigação de frequência do Programa para Agressores de Violência Doméstica; f) Condenar o arguido AA nas penas acessórias de proibição de uso e porte de armas de fogo, pelo período de quatro anos, bem como de frequência de Programa para Agressores de Violência Doméstica, nos termos do art.º 152º, n.º 4 do Código Penal; g) Declarar perdidas a favor do Estado as armas apreendidas, determinando a sua entrega definitiva à PSP; h) Determinar o levantamento da apreensão do telemóvel do arguido, ficando o mesmo notificado para, no prazo de 60 dias, proceder ao seu levantamento sob pena de, não o fazendo, ser o mesmo declarado perdido a favor do Estado (art.º 186º, n.º 3 e 4 do Código de Processo Penal); i) Alterar o estatuto coativo do arguido, determinando a revogação da medida de obrigação de permanência na habitação bem como de proibição de contactos a que se encontra sujeito, e determinando que aguarde os ulteriores termos do processo sujeito a termo de identidade e residência; j) Ordenar a recolha de amostras de ADN do arguido, a fim de se proceder à sua inserção na base de dados de perfis de ADN em obediência ao disposto no artigo 8.º, número 2, da Lei 5/2008, de 12 de fevereiro; k) Condenar o arguido no pagamento das custas criminais, fixando-se em 3 UC a taxa de justiça, acrescida dos encargos a que a atividade do mesmo houver dado lugar, sendo as custas do enxerto cível fixadas na proporção do respetivo decaimento, e tal sem prejuízo do benefício de apoio judiciário de que beneficia o arguido.
» Inconformado com tal decisão, o Arguido dela interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [transcrição]: «1º - Os depoimentos prestados em sede de produção de prova pelas Testemunhas BB e CC, que estão seriamente incompatibilizados com o pai, ora Recorrente, e com quem não mantêm qualquer relacionamento desde há anos, necessariamente, pela sua parcialidade, não são merecedores de credibilidade, pelo que não deveria o douto Tribunal “a quo” fundar a sua convicção com base, designadamente, nos mesmos.
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- Os depoimentos das Testemunhas DD e EE, que são as únicas pessoalmente conhecedoras de todos os factos, não merecem menos credibilidades do que os demais, pelo que deveriam, tais depoimentos, ter sido valorizados, o que determinará a absolvição, e nunca a condenação na pesada pena que, a considerar-se de condenar, se espera reduzida.
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- As discussões do casal Recorrente e DD, e que, livremente apreciadas, deverão resultar da prova, eram pontuais, sem especial e sentida gravidade, espaçadas no tempo, pelo que dificilmente se pode considerar verificada a prática do tipo do art.º 152.º do CP, que, perante a generalidade dos factos, não deveria ser punido com a excessiva pena única, nem por via do Cúmulo, que temos por indevidamente realizado, com a devida vénia por diverso entendimento.
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- A credibilidade dos depoimentos de Testemunhas que não tiveram conhecimento pessoal de factos, é, necessariamente, menor do que aquelas que os presenciaram, não permitindo a livre apreciação da prova, fundamentar convicção desconforme com o declarado por Testemunhas, em Julgamento.
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- Entre uns depoimentos de Testemunhas que não presenciaram factos, limitando-se a referir que ouviram sons compatíveis com … e a própria “vítima”, que os nega, a este depoimento se deverá conceder credibilidade, assim devendo resultar não provada a matéria imputada na Acusação, para além de que é colmo inocente que, Constitucionalmente, se presume o ora Recorrente.
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- A circunstância de, tanto a DD, como a EE, continuarem a manter bom relacionamento com o Arguido, manifestando desejar continuar a viver com o mesmo, concede especial credibilidade aos seus depoimentos, em prejuízo daqueles que, parciais e incriminatórios, foram prestados pelos desavindos filhos do Arguido.
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- Não resultou provada a dependência do consumo de álcool, por parte do Arguido, o que já resulta dos exames realizados em meio prisional, e resultou provado que a sua saúde, cuja doença lhe perturba o equilíbrio, o impede de o ingerir bebidas alcoólicas, pelo que sempre serão excessivas, quer as condições de suspensão da pena, quer as sanções acessórias.
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- Não tendo resultado provada a data das gravações, para além de se desconhecer que tempo terá mediado entre elas, a que acresce a possibilidade de terem sido “montadas” escolhendo-se “passagens”, não deveriam as mesmas ter sido consideradas na formação da convicção do douto Tribunal “a quo”, o que impede a verificação da prática do tipo.
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- As armas ilegais/proibidas estavam na posse do Arguido a título precário, e pelo mesmo explicado, pelo que, mesmo sendo perdidas (as ilegais, e não todas as apreendidas) não justificam a aplicação de pena superior a 100 dias de Multa, que nunca deverá fazer parte do cúmulo jurídico.
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- Sendo um crime punível com pena de Multa, deverá ser esta a eleita, improcedendo o argumento de que a diversa natureza dos crimes justifica (não justifica, e contraria a Lei) que a pena deva ser de prisão, e fazer parte do Cúmulo Jurídico, aplicando-se uma pena única, o que não corresponde às regras de aplicação de penas, como se espera seja entendimento dessa Veneranda Relação.
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- Sendo as necessidades de prevenção especiais, reconhecidas como medianas, excessiva será a pena parcelar de dois anos de prisão, que também deveria ser mediana, adequada e suficiente, por isso, a reduzir em sede de Recurso, que temos por merecedor de provimento.
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- O mesmo se dirá relativamente ao crime de detenção de arma, punido com pena de Multa, como legalmente imposto, que não deverá ser superior a 100 dias, e não deverá integrar o Cúmulo Jurídico.
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- Para além de excessivas, as penas parcelares, que deverão ser reduzidas, atenta a diversa natureza, não deverão integrar Cúmulo Jurídico, como o aconselha a Lei.
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- A matéria de facto provada, relativamente às condições pessoais do Arguido, da mesma forma que justificam a suspensão da execução de pena, também dispensam a aplicação de condições, para além do regime de prova, e das demais sanções acessórias, entendimento que se espera seja acolhido por esta Veneranda Relação.
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- A circunstância de não estar em causa a utilização de armas de fogo, justifica que não seja imposta a proibição de tal uso, pelo que tal proibição deverá ser revogada, e, independentemente, deverão ser entregues, a pessoa a indicar pelo Arguido, as armas legais, apreendidas, e não declaradas perdidas.
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- Devia, pois, o douto Tribunal “a quo” ter absolvido o Arguido, ora Recorrente, e assim não se entendendo, sempre as penas parcelares se mostram excessivas, e a reduzir, bem como a pena única, resultando incorretamente realizado o respetivo Cúmulo Jurídico, de que não deverá fazer parte a pena que deverá ser de Multa, como se espera seja entendimento desta Veneranda Relação, que concederá provimento ao presente Recurso.
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- Ao decidir diversamente, condenando o Recorrente na pena única que se tem por irregular e injusta, o douto Tribunal “a quo”, para além do Constitucional Princípio “in dubio pro reo”, violou o disposto o disposto nos artigos 40.º, 45.º, 47.º, 70.º, 71.º-2, 152.º do C. Penal, artigo 86.º-1 d) da Lei 5/2006, e 127º e 410º-2 do C. P. P., pelo que, merecendo provimento o presente Recurso, a não se entender dever haver lugar a absolvição, deverá revogar-se o douto Acórdão de Fls, a substituir por outro que condene o ora Recorrente em pena não superior a dois anos de prisão, pela prática do crime de violência...
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