Acórdão nº 090/21.2BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 31 de Maio de 2023

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução31 de Maio de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACÓRDÃO 1. RELATÓRIO 1.1. “Banco 1... S.A. - SUCURSAL EM PORTUGAL”, notificada da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa que teve por objecto mediato a liquidação da Contribuição sobre o Sector Bancário (CSB) do ano de 2020, no valor total de € 406.202,54, intentou, ao abrigo do preceituado no artigo 97.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), a presente Impugnação Judicial.

1.2.

Por sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, a acção foi julgada integralmente procedente e a liquidação anulada com exclusivo fundamento em que se verificava no caso violação do “Direito da União Europeia – violação do direito de estabelecimento e do princípio da não discriminação -, art.ºs 49.º e 18.º do TFUE».

1.3.

Inconformada, a Autoridade Tributária e Aduaneira recorre para este Supremo Tribunal, tendo concluído as alegações apresentadas com as seguintes conclusões: «A.

Vem o presente recurso interposto da Douta sentença proferida pelo Tribunal a quo que julgou procedente a Impugnação Judicial apresentada contra a decisão indeferimento expresso da reclamação graciosa n.º ...93, deduzida contra o ato de autoliquidação da Contribuição sobre o Setor Bancário (CSB) n.º ...93, referente ao ano de 2020, no valor de 406.202,54 €.

B.

Ora, quanto às questões formuladas, decidiu o Tribunal a quo seguir a posição sufragada no acórdão do CAAD n.º 156/2018-T, de 10/05/2019, tendo julgado procedente a impugnação judicial apresentada pela Impugnante, bem como o pedido de atribuição de juros indemnizatórios, com a consequente condenação da Administração Tributária ao seu pagamento, contabilizados desde a data do pagamento até à emissão da nota de crédito, à taxa resultante do n.º 4 do artigo 43.º da LGT.

C.

A Fazenda Pública propugna que o douto Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, por discordar da interpretação que na mesma foi feita do direito aplicável, uma vez que o tratamento dado às sucursais e aos restantes sujeitos passivos da CSB é exatamente igual, como vamos demonstrar.

D.

Assim, salvo o devido respeito, que é muito, pela Decisão exarada pelo Tribunal a quo, não pode a Recorrente deixar de discordar da mesma, pelas razões e com os fundamentos que a seguir se expõem.

E.

A impugnante é uma sucursal de uma instituição de crédito com sede e administração efetiva num estado-membro, que atua em Portugal ao abrigo da liberdade de estabelecimento, nos termos do disposto no artigo 49.º do Tratado Sobre o Funcionamento da UE.

F.

A questão aqui levantada prende-se com a contribuição sobre o setor bancário, a qual foi criada pela Lei de Orçamento de Estado para 2011, porém, com a Lei de Orçamento de Estado para 2016 (Lei n.º 7-A/2016) foi alargada a sua incidência subjetiva também às sucursais de instituições de crédito não residentes, onde se inclui a Impugnante.

G.

Com esta alteração, procurou-se garantir que todas instituições de crédito a operar em Portugal sejam abrangidas dando o seu contributo em paridade, numa lógica de tratamento igualitário de todos os participantes no mercado, independentemente do seu estatuto.

H.

A sucursal de uma empresa estrangeira não tem personalidade jurídica própria, sendo uma extensão da entidade que representa, ou seja, trata-se de um estabelecimento estável, ou uma representação permanente, através do qual é desenvolvida, total ou parcialmente, a mesma atividade da empresa estrangeira.

I.

Esta entidade será tributada em território nacional pelo lucro que é imputável ao estabelecimento estável e, como tal, do ponto de vista contabilístico, deve possuir contabilidade organizada que permita o apuramento do lucro tributável, devendo esta ser centralizada na sucursal, e abranger todas as operações imputáveis a esse estabelecimento estável.

J.

No entanto, importa realçar que a CBS não constitui um tributo sobre o rendimento, mas sim uma contribuição financeira, um tributo de natureza paracomutativa.

K.

A razão de ser da tributação e dos pressupostos da CSB e do IRC é totalmente distinta, sendo diferentes, também, os objetivos inerentes à tributação em cada um destes tributos.

L.

De acordo com o artigo 3.º da Portaria n.º 121/2011, a CSB incide sobre: “a) O passivo apurado e aprovado pelos sujeitos passivos deduzido, quando aplicável, dos elementos do passivo que integram os fundos próprios, dos depósitos abrangidos pela garantia do Fundo de Garantia de Depósitos, pelo Fundo de Garantia do Crédito Agrícola Mútuo ou por um sistema de garantia de depósitos oficialmente reconhecido nos termos do artigo 4.º da Diretiva 2014/49/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, ou considerado equivalente nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 156.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro, dentro dos limites previstos nas legislações aplicáveis, e dos depósitos na Caixa Central constituídos por caixas de crédito agrícola mútuo pertencentes ao sistema integrado do crédito agrícola mútuo, ao abrigo do artigo 72.º do Regime Jurídico do Crédito Agrícola Mútuo e das Cooperativas de Crédito Agrícola, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 24/91, de 11 de janeiro, e republicado pelo Decreto-Lei n.º 142/2009, de 16 de junho; b) O valor nocional dos instrumentos financeiros derivados fora do balanço apurado pelos sujeitos passivos.” M.

Dispõe o artigo 4.º, da Portaria n.º 121/2011, que a quantificação da base de incidência é efetuada da seguinte forma: “1 - Para efeitos do disposto na alínea a) do artigo anterior, entende-se por passivo o conjunto dos elementos reconhecidos em balanço que, independentemente da sua forma ou modalidade, representem uma dívida para com terceiros, com excepção dos seguintes: a) Elementos que, segundo as normas de contabilidade aplicáveis, sejam reconhecidos como capitais próprios; b) Passivos associados ao reconhecimento de responsabilidades por planos de benefício definido; c) Passivos por provisões; d) Passivos resultantes da reavaliação de instrumentos financeiros derivados; e) Receitas com rendimento diferido, sem consideração das referentes a operações passivas; e f) Passivos por activos não desreconhecidos em operações de titularização.”.

N.

Segundo o sentenciado, por se tratar de uma sucursal, não tem personalidade jurídica e, como tal, não tem capitais próprios, o que inviabilizaria a referida dedução.

O.

Ora, determina o artigo 11.º, n.º 2 da LGT, que sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer diretamente da lei.

P.

Com efeito, a delimitação da incidência da CSB o legislador teve em mente e por apoio fundamental as regras contabilísticas.

Q.

Percorrido o Regime da CSB, supra exposto, verifica-se que o que se pretendeu tributar foi o que nas contas dos sujeitos passivos constituem elementos associados a uma mais provável situação de dificuldade de cumprimento de suas responsabilidades.

R.

Na Estrutura Conceptual do SNC, poder ler-se, no ponto 59, que é característica essencial do passivo a de que a entidade tenha uma obrigação presente e que uma obrigação é um dever ou responsabilidade para agir ou executar de certa maneira.

S.

Ao incluir as sucursais aqui em causa entre os sujeitos passivos da CSB, o legislador no referido artigo 3.º n.º 1 alínea a), da Portaria n.º 121/2011, introduziu, entre vírgulas, ao referir-se ao passivo e antes de identificar os elementos a deduzir, assim: «O passivo apurado e aprovado pelos sujeitos passivos deduzido, quando aplicável, dos elementos do passivo que (…)», reconhecendo que podem existir casos em que do passivo nada haverá a deduzir.

T.

Conforme se prevê na alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º do Regime da CSB e nos artigos 3.º, a), e 4.º da Portaria n.º 121/2011, de 30 de março, é àquele passivo, referido no artigo 3.º, a), que depois se vão deduzir elementos que caibam em alguma das alíneas do n.º 1 do artigo 4.º da referida Portaria.

U.

Também o n.º 2 do referido artigo 4.º determina que, também para efeitos do apuramento do passivo referido no artigo alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º, o valor dos fundos próprios há-de calcular-se por apelo ao normativo constante a respeito do Regulamento (UE) ali mencionado.

V.

Ou seja, tudo o que em Portaria o legislador elencou nas alíneas do n.º 1 do artigo 4.º, não pode senão reconduzir-se ao corpo do artigo 3.º alínea a), e, assim, a questão relativa aos capitais próprios fica em certa medida ultrapassada.

W.

Neste sentido, tem relevância para demonstrar o erro de julgamento em que incorre o sentenciado, a decisão do CAAD, no processo n.º 879/2019-T, de 18-08-2021, no que respeita à Contribuição sobre o Setor Bancário, cuja fundamentação se transcreve: «Antes de mais sempre se diga que ao ter escolhido a forma jurídica de Sucursal a Requerente terá ponderado entre as diversas formas possíveis de adoptar para o desenvolvimento do seu negócio em Portugal. E, também, que não estamos a tratar de tributação sobre o rendimento mas sim de um tributo paracomutativo (com uma base de incidência aliás muito específica). Com efeito, a Requerente invoca, por um lado, o Acórdão do TJUE no Caso Brisal92. Como invoca, também, por outro, o entendimento que a Requerida segue em sede de IRC com referência ao tratamento de juros que se vençam em empréstimos concedidos por casas-mãe às Sucursais. Aqui pressupondo, pois, a possível aplicação do mesmo racional. Porém não estamos, insiste-se, em IRC. A razão de ser da tributação (e seus pressupostos), desde logo, como vimos, é totalmente distinta. E os objectivos visados pelo legislador ao tributar aqui são também eles totalmente distintos. Não é convocável, nos termos em que o pretende a Requerente, para esta sede, o que ali refere, como bem se compreende. E mesmo quanto ao Acórdão Brisal sempre se note que no caso o que foi reconhecido foi (em termos aqui muito abreviados e simplificados)...

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