Acórdão nº 19/23.3GCBJA.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Maio de 2023

Magistrado ResponsávelGOMES DE SOUSA
Data da Resolução25 de Maio de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: A - Relatório: Nestes autos de processo comum colectivo supra numerado que corre termos no Tribunal da Comarca de Beja - Juízo Local Criminal de Beja - a Mmª Juíza, por despacho de 13-01-2023 e após primeiro interrogatório de arguido detido, decidiu sujeitar o arguido AA, filho de (…) - nascido em (…) e residente na (…) Cuba, a medida de prisão preventiva.

* Inconformado com aquela decisão dela interpôs o arguido o presente recurso, com as seguintes conclusões: 1. Vem o presente recurso interposto do despacho dos autos n. 19/23.3GCBJA, do Juízo Local Criminal de Beja, Tribunal Judicial da Comarca de Beja, que após primeiro interrogatório judicial, determinou que o arguido devesse aguardar os ulteriores termos processuais em prisão preventiva, por existirem nos Autos fortes indícios de o arguido ter cometido um crime de ofensa à integridade física qualificada, p.p. pelos artigos 145, n. 1, alínea c), e n. 2, 144., alínea a), por referência ao artigo 132, n.2, alínea l), do Código Penal; um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos artigos 145, n. 1, alínea a), e n. 2, 144, alínea a), por referência ao artigo 132, n. 2, alínea l), do código penal; um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 292, n.1, e 69, n. l, alínea a) ambos do Código Penal e um crime de injurias agravado, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 181, n. 1, 184, 188, n.1, alínea a), com referência ao artigo 132, n.2, alínea l), todos do Código Penal.

  1. O despacho recorrido ao aplicar a prisão preventiva à recorrente não obedeceu à excecionalidade da mesma violando, por erro e má interpretação, os artigos 191, nº 1, 193, 202, n° e 204º do Código de Processo Penal bem como os princípios constitucionais da legalidade, da adequação e da proporcionalidade e da presunção de inocência previstos nos artigos 28°, nº 2 e 32°, nº 1 e 2, na medida em que considera inadequada e insuficiente uma medida não detentiva da liberdade.

  2. A fundamentação da desadequação e da insuficiência de outras medidas de coação não obedece a critérios lógico dedutivos nem de razoabilidade nem tem suporte nos elementos de prova coligidos.

  3. Nada de concreto resulta da factualidade indiciada que permita concluir pela verificação de perturbação do inquérito ou de perturbação grave da ordem e tranquilidade públicas, não há perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova, porque ela se encontra protegida nos autos em "segredo de justiça" sendo certo que tais perigos terão que se verificar em concreto, não podendo basear-se em considerações genéricas ou apenas na natureza do crime imputado.

  4. O arguido, no primeiro interrogatório, colaborou com a justiça e esclareceu o tribunal na descoberta da verdade, não tendo, este tribunal, valorado convenientemente, o seu depoimento.

  5. O arguido, e aqui Recorrente, admitiu que entrou em discussão com o Sr. CC agente de autoridade, uma vez que aquele o obrigava a admitir que era ele que conduzia o veículo e não a sua mulher, obrigando-o a realizar do teste quantitativo de álcool, no aparelho de ar expirado.

  6. Acabando ambos por se envolverem fisicamente, em ato continuo o Recorrente foi imobilizado pelos braços pelo agente DD, sendo imediatamente agredido pelo agente CC, e em ato irrefletido e em legitima defesa mordeu a ponta do nariz do agente CC.

  7. Os factos que deram origem a tal envolvimento, não foram sequer considerados pelo douto Tribunal, e ao invés, o que deixa transparecer do douto despacho recorrido, é que o arguido do nada resolveu morder o nariz ao agente.

  8. Tudo porque da versão constante do douto despacho ora em crise, o arguido domina a arte de muay thai.

  9. Tal entendimento, salve o devido respeito, corresponde a um erro grosseiro de avaliação, aliás, o facto de o arguido ter praticado muay thai amador, serviu para no douto despacho fazer dele uma pessoa perigosa, e por sua vez justificar a aplicação da medida de coação mais gravosa.

  10. Ainda assim, não considerou o fato de o arguido ter informado que praticou tal arte num período de cinco anos e que já não pratica há dez anos, desde 2013.

  11. Chegando-se mesmo a afirmar no ponto 19 dos fatos indiciariamente provados que o arguido praticou durante 5 anos e que domina a arte marcial.

  12. Concluímos com toda a certeza que a prática desportiva de artes marciais, não faz dos seus praticantes potenciais criminosos, sob pena de interpretação discriminatória relativamente a outros atletas.

  13. O arguido não é uma pessoa violenta, ao contrário do que se pretende demonstrar, não tem nada averbado no seu registo criminal, 15. O arguido encontra-se familiar, social e profissionalmente inserido.

  14. É motorista de pesados por conta de outrem, vive com a sua companheira, as suas duas filhas menores e a enteada.

  15. Sendo ele o único sustento da família.

  16. Foi a primeira vez que o arguido se viu perante uma situação destas, não tendo aquele por hábito ver se envolvido em desacatos, discussões, violência,...

  17. Pois caso assim fosse, o seu registo criminal espelharia essa situação, nem tão o Recorrente beneficiou de qualquer suspensão provisória de processo.

  18. A aplicação da medida mais gravosa de coação, prisão preventiva, vem deixar o arguido numa situação muito frágil, sendo este o único sustento do seu agregado familiar, e não tendo mais nenhum rendimento, não trabalhando não aufere qualquer vencimento.

  19. Além do mais, o arguido não representa perigo, nem em razão da natureza e das circunstâncias do crime e da sua personalidade, uma vez que não se pode avaliar uma pessoa pela prática de um ato isolado, ocorrido num determinado contexto.

  20. Por tudo o que ficou exposto, e que correspondem a fatos provados, de onde é que resulta "que o carater do arguido não é conforme às regras basilares do direito... e a sua personalidade é impulsiva, violente e perigosa."? 23. Mais ainda, por tudo o que ficou exposto, e de toda a prova recolhida, de onde é que resulta "...ficou privado de importante órgão e desfigurado de forma grave e permanente."? 24. Tal conclusão prematura consta dos fatos indiciariamente provados no seu n.9, sem que tenha por base qualquer meio de prova que a sustente.

  21. Em termos de prova indiciária não pode haver juízo de inferência, sem que estejam demonstrados os fatos que servem de suporte necessário a essa inferência.

  22. Quanto ao juízo de inferência é imperioso que seja razoável, que não seja arbitrário, absurdo e infundado, o que não se verificou no caso concreto.

  23. 0 Despacho recorrido justifica a aplicação da medida de coação de prisão preventiva com o perigo de perturbação do decurso do inquérito e, nomeadamente, perigo para a conservação ou veracidade da prova, e perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime e da personalidade do arguido, de continuação da atividade criminosa e perturbação grave da ordem e a tranquilidade públicas, nos termos das alíneas b) e c) do art. 204 do CPP.

  24. Para que se verifiquem os perigos previstos nas alíneas b) e c) do artigo 204., do CPP, exige-se uma verificação concreta dos referidos perigos que, no caso, podem ser prevenidos, designadamente, através de apresentações periódicas às autoridades policiais, nomeadamente PSP, nos termos do art. 198. CPP.

  25. A aplicação da referida medida seria adequada e suficiente para satisfazer as exigências cautelares que se fazem sentir, no entanto, tal possibilidade nem sequer foi equacionada pelo douto tribunal.

  26. Na verdade, nada de concreto resulta da factualidade indiciada que permita concluir pela verificação de perturbação do inquérito ou de perturbação grave da ordem e tranquilidade públicas, não há perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova, porque ela se encontra protegida nos autos em "segredo de justiça".

  27. Sendo certo que tais perigos terão que se verificar em concreto, isto é, deverão decorrer da factualidade indiciariamente apurada, não podendo basear-se em considerações genéricas ou apenas na natureza do crime imputado.

  28. O despacho recorrido ao aplicar a prisão preventiva ao arguido não obedeceu à excecionalidade da mesma violando, por erro e má interpretação, os artigos 1919, n9 1, 1939, 2029, n9 1, e 2049 do Código de Processo Penal bem como os princípios constitucionais da legalidade, da adequação e da proporcionalidade e da presunção de inocência previstos nos artigos 28°, n9 2 e 32°, n9 1 e 2.

  29. Pelo que deve a medida de prisão preventiva imposta ao arguido ser imediatamente revogada e substituída por outra, de carácter menos gravoso, que satisfaça as exigências de necessidade, adequação e de proporcionalidade a que se reporta o artigo 193. do CPP...

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