Acórdão nº 047/22.6BELLE de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Abril de 2023

Magistrado ResponsávelMARIA DE CÉU NEVES
Data da Resolução13 de Abril de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO 1. RELATÓRIO AA, devidamente identificado nos autos, intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé (TAF), intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias contra a A..., formulando os seguintes pedidos: “Deverá a requerida ser intimada a abster-se de tomar quaisquer medidas para despejar, e ou, tomar posse da habitação nº ...17 ocupada pelo requerente e o seu agregado familiar, com recém-nascido, sob pena da violação do artº 65 da CRP (cfr.doc....).

Além disso, entende o requerente que, a alínea c) do nº 7 do artº 6-E da Lei nº 1-A/2020 de 19 de Março na redacção que lhe foi dada pela mais recente Lei nº 91/2021 de 17 de Dezembro continua aplicável, in casu, a qualquer ato ou procedimento que possa ser colocado em situação de fragilidade por falta de habitação própria ou por outra razão social imperiosa, como é o caso”.

*Por sentença do TAF de Loulé, proferida em 25 de Fevereiro de 2022, foi julgada improcedente a presente intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, absolvendo-se, consequentemente, a entidade demandada do pedido.

*O requerente apelou para o TCA Sul e este, por decisão datada de 17 de Novembro de 2022, negou provimento ao recurso jurisdicional, confirmando a sentença recorrida, com diferente fundamentação.

*O requerente, inconformado, interpôs o presente recurso de revista, tendo na respectiva alegação, formulado as seguintes conclusões: «I A) - O recurso deve ser admitido como revista excepcional, com subida nos próprios autos e efeito devolutivo, por se verificarem os pressupostos que depende a sua admissão como tal, por haver dupla qual, ao recorrente lhe está vedado, ex vi, do nº 3 do conforme, ou seja, o acórdão recorrido confirmou sem qualquer voto de vencido a sentença da 1ª Instância e com a mesma fundamentação jurídica, razão pela artº 671 o recurso de revista normal, com excepção do preceituado no artº 672 onde se enquadra na alínea c) do nº1 do CPC.

  1. - Através das suas alegações, deve dar-se como provado que o recorrente preencheu todos os pressupostos que a lei no artº 672 do CPC, faz depender a admissão desta revista excepcional.

II O ACÓRDÃO FUNDAMENTO ESTÁ EM CONTRADIÇÃO FRONTAL COM O ACÓRDÃO RECORRIDO, razão pela qual deve ser admitido o recurso no Supremo Tribunal Administrativo, ex vi, do preenchimento dos pressupostos do artº 672 nº 1 alínea c) em conjugação com o artº 674 ambos do CPC que, fixa a competência por aplicação do CPC à jurisdição administrativa, nomeadamente ao Supremo Tribunal Administrativo e os fundamentos do recurso que no entender do recorrente é a violação expressa das normas que concretizam o direito fundamental do artº 65 da Constituição da República Portuguesa (nomeadamente a Lei de Bases da Habitação e a sua Regulamentação) e tudo o que ele representa para o cidadão e comunidade jurídica e na certeza do direito, omissão destes normativos e por erro de interpretação e aplicação destes normativos ao caso judice nomeadamente o artº 131 e seguintes do CPTA e por se encontrar o acórdão recorrido em OPOSIÇÃO FRONTAL com o acórdão fundamento, tendo em vista a aplicação e concretização do artº 65 da CRP, através da Lei de Bases da Habitação e a sua regulamentação, tendo em vista a Uniformização de Jurisprudência na aplicação do artº 65 da CRP e a Lei de base de Habitação e regulamentação a caso similares.

Deve ser prolatado acórdão que, considere a revista excepcional (ou mesmo a revista) procedente que revogue quer a sentença, quer o acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, por oposição com o acórdão fundamento, declarando que a ocupação ilícita de prédios/fogos para a habitação, os proprietários só podem ocupar os mesmos prédios, após encaminhamento prévio do agregado alvo de despejo, com efetiva carência habitacional para soluções legais de acesso à habitação, impostos por lei».

*A requerida, contra-alegou, concluindo do seguinte modo: “I.

A matéria referida na conclusão I do Recurso e nas alegações que a precedem, quanto a este tema, é completamente omissa quanto a razões de facto e de direito que devam ser apreciadas no recurso e por tal deve improceder, como acima já alegado, já que os dispositivos nos quais se poderia enquadrar o presente recurso são os já referidos artigos 150 e 152 do CPTA, atento o facto de os artigos do CPC dos quais o Recorrente se socorre só serem aplicáveis aos processos nos tribunais administrativos, supletivamente (artº 1º do CPTA).

II.

Quanto aos pressupostos do nº 1 do artº 150º do CPTA não se encontram devida e claramente enunciados nas alegações da recorrente e por tal deve o recurso improceder nos termos do nº 3 do mesmo artigo.

III.

O vertido na Conclusão II e a esse respeito o disposto nas alegações que a precedem, não enunciam, nem demonstram a contradição de julgados, pelo que, também o recurso há-de improceder, por não se verificarem os pressupostos do artº 152º do CPTA.

IV.

Os fundamentos da decisão do Acórdão recorrido são em suma, que não estamos, ainda, perante um procedimento coercivo de despejo, nem se encontram nos autos reunidos os requisitos para que a situação do Recorrente seja de “ efectiva carência habitacional” e, mesmo que tal resultasse dos autos, não poderia produzir o resultado pretendido pelo aqui Recorrente que era: ficar com o direito àquela especifica habitação; sendo que, o acima disposto neste ponto, não é posto em crise no recurso interposto, que se restringirá ao alegado nas alegações e conclusões do mesmo.”*O “recurso de revista” foi admitido por acórdão deste STA [formação a que alude o nº 6 do artº 150º do CPTA], proferido em 09 de Fevereiro de 2023.

*O Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artº 146º, nº 1 do CPTA, pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso.

*Sem vistos, por não serem devidos.

*2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. MATÉRIA DE FACTO A matéria de facto assente nos autos, é a seguinte: «1.

O prédio urbano correspondente ao artigo matricial ...32 da freguesia e concelho ..., sito na Rua ..., é propriedade do Município ..., estando destinado a habitação social sujeita a regime de custos controlados – cfr. caderneta predial, a págs. 52 a 54 do suporte digital dos autos; 2.

O Município ... concedeu a "Gestão Manutenção e Reabilitação dos Imóveis destinados a Arrendamento Social e Habitação Social", à Sociedade A... – cfr. contrato programa, a págs. 55 a 61 do suporte digital dos autos; 3.

Por ofício da sociedade A..., de 04 de Maio de 2021, foi AA informado, “na qualidade de Ocupante sem Título da Hab. 317, sita na ..., Rua ... em …, para entrega voluntária do local arrendado, por caducidade do contrato de arrendamento por morte do primitivo arrendatário BB nos termos seguintes: 1. Por ofício ...69 enviado em 22/10/2018 foi notificado do Indeferimento da Transmissão de arrendamento por morte de BB. 2. Em 26/12/2018 deu entrada de requerimento de audiência de interessados. 3. Em 09/04/2019, por ofício ...62 foi notificado, da decisão instrutória que manteve a decisão de Indeferimento do pedido de Transmissão de Arrendamento por morte, notificação recebida pelo mandatário de V/Exa em 11/04/2019. 4. Esta decisão foi alvo de providência cautelar, intentada por V/Exa em 16/07/2019, junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, processo que correu termos sob o n° 480/19.0BELLE, - outros procedimentos cautelares, unidade orgânica 1. 5.

Foi proferida sentença pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, em 09/12/2020 indeferindo a pretensão de V/Exa, e em consequência julgou improcedente a providencia cautelar, decisão que transitou em julgado em 29/12/2020, conforme documento em anexo. (cfr doc 1). 6. Assim, e tendo sido julgada improcedente a providência cautelar, e a sentença transitado em julgado em 29/12/2020, da qual V/Exa foi notificado, a decisão de Indeferimento da Transmissão de arrendamento tornou-se definitiva, não havendo lugar a transmissão de arrendamento, o mesmo cessou por caducidade por morte do primitivo arrendatário BB. 7. Tendo cessado o contrato de arrendamento, pode ser desde já considerado ocupante sem título qualquer ocupante da habitação, tal como foi comunicado na notificação recebida por V/Exa aquando da decisão do Indeferimento da Transmissão de Arrendamento, sendo que o prazo de 60 dias concedido para entrega voluntária da habitação já expirou há multo, sem que tenha v/Exa procedido à entrega voluntária da habitação. 8. Uma vez que não procedeu à entrega da habitação voluntariamente até à presente data, notificamos V/Exa de que deverá proceder voluntariamente à desocupação e entrega da habitação, no prazo de I5 (quinze) dias, deixando-a livre de pessoas e bens, devendo proceder à entrega das chaves no .... Caso não seja cumprida voluntariamente a desocupação e entrega do local, seremos obrigados a prosseguir com as diligências e procedimentos tendentes ao despejo nos termos do previsto no artigo 35° e 28° Lei 81/2014 de 19 de Dezembro, atualizada pela Lei 32/2016 de 24 Agosto. 10. Se aquando do acesso à habitação pelo senhorio, subsequente a qualquer caso de cessação do contrato, houver evidência de danos na habitação, de realização de obras não autorizados ou de não realização de obras exigidas ao arrendatário nos termos da Lei ou do contrato, o senhorio tem o direito de exigir o pagamento das despesas por si efetuadas com a realização das obras necessárias para reposição da habitação nas condições iniciais, nos termos do disposto no artigo 27° da Lei 81/2014 de 19 de Dezembro, atualizada pela Lei 32/2016 de 24 Agosto. 11. Nos termos do artigo n° S do 28 da Lei 32/2018 de 24 de agosto, quaisquer bens móveis deixados na habitação, após qualquer forma de cessação do contrato e tomada de posse do senhorio, são considerados abandonados a favor deste, caso não sejam reclamados no prazo de 60 dias, podendo deles dispor de forma onerosa ou gratuita, sem direito a...

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