Acórdão nº 61/22.1GASRE.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Abril de 2023
Magistrado Responsável | ANA CAROLINA CARDOSO |
Data da Resolução | 12 de Abril de 2023 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
I.
RELATÓRIO 1.
… no processo comum coletivo n.º 61/22.1GASRE, foi decidido (transcrição): 7.1.
Condenar o arguido AA pela prática, como autor material e na forma consumada, de 1 (um) crime de condução perigosa de veículo rodoviário, agravado pelo resultado, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 291.º, n.º 1, alíneas a) e b), 285.º, 294.º, n.º 3, por referência ao artigo 144.º, alínea d), e 69.º, n.º 1, alínea a), todos do Código Penal, em concurso aparente com o crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292.º, n.º 1, do Código Penal, e com as contraordenações estradais previstas e punidas pelos artigos 24.º, n.º 1, e 25.º, n.º 1, alíneas h) e j), do Código da Estrada, numa pena 250 (duzentos e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de 6,50€ (seis euros e cinquenta cêntimos), o que perfaz um quantum de 1.625,00€ (mil seiscentos e vinte e cinco euros), a qual, após desconto de 1 (um) dia de detenção, nos termos do artigo 80.º, n.º 2, do Código Penal, se fixa em 249 (duzentos e quarenta e nove) dias, convergindo na quantia de 1.618,50€ (mil seiscentos e dezoito euros e cinquenta cêntimos); 7.2.
Condenar o arguido AA na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 1 (um) ano, nos termos do artigo 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal.
* 2.
Inconformado com a decisão, dela recorre o arguido AA, formulando as seguintes conclusões: … 3. Da conjugação da prova produzida em julgamento com os restantes elementos de prova considerados, entendeu o Tribunal a quo terem resultado como provados, entre outros, os seguintes factos (seguindo a numeração da sentença): 13. Também em resultado disso, o arguido não adequou a velocidade às condições e traçado da via onde circulava, fez uma aproximação em velocidade excessiva à curva e, em consequência, perdeu o controlo do veiculo que conduzia e fê-lo invadir totalmente a via de trânsito destinada ao sentido contrário.
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Em consequência da conduta do arguido, o veiculo de matricula ..-ED-..
colidiu contra os rails de proteção, após o que embateu com a frente do veiculo de matricula ..-AT-... ...
Tal colisão ocorreu na via destinada ao trânsito do veiculo de matricula ..-AT-..
e BB não teve qualquer hipótese de imobilizar o seu veiculo nem de evitar o embate.
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O embate e as lesões de BB e de CC ocorreram porque o arguido estava sob efeito das bebidas alcoólicas anteriormente ingeridas, conduzia de forma temerária e imprudente, em velocidade inadequada às condições e traçado da via, em resultado do qual perdeu o controlo do veiculo que conduzia e invadiu a via destinada ao trânsito em sentido oposto, ali circulando e atravessando-se à frente do veículo ...
de matrícula ..- A T-...
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No decurso da audiência de julgamento, surgiram duas versões sobre a dinâmica concreta do acidente, uma trazida pelo arguido e outra avançada por BB, condutora da viatura interveniente no acidente com a viatura do arguido, tendo o tribunal optado por aceitar esta.
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As provas deveriam ter sido valoradas de forma distinta, dando como mais credível e verosímil a versão apresentada pelo arguido.
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O arguido referiu que vinha a conduzir de forma tranquila, imprimindo uma velocidade de cerca de 50/60 Km/h ao seu veículo, quando, ao entrar na curva, foi encadeado pelo sol, o que o levou a invadir a faixa de rodagem contrário e a embater, de forma ligeira, no rail de proteção com a parte lateral esquerda da sua viatura, parou cerca de 2 a 3 metros depois do embate e quando olhou para a frente viu aparecer o veículo ..., que veio a embater na parte dianteira direita do seu veículo.
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A testemunha CC, declarou que iam devagar, entretidos na conversa, ligeiramente a subir, quando foram encandeados pelo sol e o carro embateu ligeiramente no rail, pararam cerca de 2 metros mais à frente.
Após, estando o carro do arguido parado, numa fração de segundos, veio um carro direito a eles e embateu-lhes, sendo que, o veiculo do arguido não se moveu donde estava parado, tendo o outro veículo embatido e redopiado.
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Refere ainda a testemunha, que a condutora do outro veículo tinha muito tempo e espaço para evitar o embate.
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São várias e significativas as contradições verificadas entre o depoimento da testemunha BB e da testemunha DD, que corroborou a versão daquela.
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O DD alega que viu o carro da BB quando chegou ao cruzamento perto da escola primária de ... e que foi atrás dela cerca de 300/400m, o que contraria o depoimento da BB, que declarou ter seguido o trajeto da estrada nacional ...41 (será 341), sendo o único ponto de confluência entre os dois trajetos apontados, a rotunda imediatamente antes da ponte sobre o caminho de ferro; 11.A testemunha BB declarou que viu o veículo do arguido quando estaria a meio do tabuleiro da ponte sobre o caminho de ferro, mas já o viu “completamente” na sua faixa de rodagem, enquanto a testemunha DD, que seguiria 4 a 5 metros atrás daquela, e como tal, ainda sem possibilidade de visualizar o carro do arguido, declarou ter visualizado o “despiste para o lado dos rails”.
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A testemunha BB afirmou perentoriamente que, quando avistou a viatura do arguido, já na sua faixa de rodagem, não travou, tendo inclusivamente tirado os pés dos pedais da viatura, enquanto a testemunha DD, que seguia no seu encalço, afirmou que o carro da testemunha BB travou, tendo visto as luzes de travagem (stop) acesas, o que o levou a travar também.
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Incongruências que abalam a credibilidade destas testemunhas e que, incompreensivelmente, não foram sopesadas pelo tribunal a quo na ponderação da decisão tomada.
… 15.No local onde ocorreu o sinistro, a faixa de rodagem tem 7 metros de largura, sendo a largura entre valetas (onde se encontram fixados os rails) de 8,50m.
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Após o sinistro, a viatura do arguido ficou a 2,50 m do eixo da via, sendo que o local provável do embate, dista da valeta esquerda (atendo o seu sentido de marcha) 2,70 m.
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O embate deu-se entre a frente do veículo da testemunha BB e a frente direita do veículo do arguido (e não em toda a frente deste, como se refere na sentença recorrida).
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O veículo do arguido encontrava-se encostado á valeta esquerda (rail), a 2/3 metros para a frente do local onde se encontram vestígios de ter embatido no rail após o “despiste” (tinta amarela e ligeira amolgadela), sendo que o local provável do embate foi identificado logo à frente de onde a viatura se imobilizou.
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Pode conclui-se, com boa dose de certeza, que o veículo do arguido seguia a pouca velocidade, aceitando-se os 50/60 Kms/h indicados pelo arguido.
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Isto porque, o rail onde embateu apenas tem uma pequena amolgadela com vestígios de tinta amarela e o veículo do arguido apenas apresenta ligeiros raspões na parte lateral esquerda e imobilizou-se logo ali, 2 a 3 metros mais à frente do local do embate no rail e junto a este, o que não aconteceria se viesse a circular a grande velocidade.
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Ao contrário do que concluiu a douta sentença recorrida, que o arguido não imprimiu uma velocidade excessiva ao veículo, na aproximação à curva.
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Quanto à questão de saber se o veículo do arguido já se encontrava ou não parado na altura do embate entre as duas viaturas, a versão do arguido é a mais verosímil.
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O embate entre os veículos dá-se não mais que 4 a 5 metros do início do rail (atendendo ao sentido de marcha do veículo do arguido), que fica seguramente a mais de 20 metros do meio do tabuleiro da suprarreferida ponte.
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Desde que a testemunha BB avistou a viatura do arguido até ao embate entre as viaturas, a viatura do arguido avançou 4 a 5 metros, enquanto a viatura da testemunha BB avançou pelo menos 20 metros.
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O arguido e a testemunha CC afirmaram que já estavam parados quando foram embatidos pelo carro da testemunha BB, tendo a viatura ... rodopiado e ficado virada ao contrário, enquanto o ... do arguido se manteve na mesma posição, indiciando, como é da experiência comum, que quem bate num obstáculo imóvel é que se projeta.
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Conclui-se que a viatura da testemunha BB embateu contra a viatura do arguido quando esta já se encontrava parada junto ao rail de proteção da estrada.
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Mas mesmo que assim não fosse, também não se poderá dizer, replicando a posição do tribunal a quo, que o arguido foi o único culpado pela produção do acidente.
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A testemunha BB, ao visualizar, ainda a meio do tabuleiro da ponte sobre o caminho de ferro, o veículo do arguido, estando este já na sua faixa de rodagem e, a mais de 25 metros de distância, optou por não se desviar da sua mão de trânsito, quando não vinha nenhum veículo a ocupar aquela via e tinha inclusivamente espaço entre o ... e o eixo da via.
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Optou por não travar, tirar os pés dos pedais do carro e ir contra a viatura do arguido, quando teria a possibilidade de o fazer no espaço livre e visível à sua frente, evitando assim o embate.
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Ao não tentar evitar o acidente, quando o poderia e deveria ter feito e, a contrário, ao “lançar-se sem controlo” para o mesmo, a testemunha BB, contribuiu, no mínimo, significativamente, com este seu comportamento negligente, para a sua produção.
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Perante este comportamento irresponsável da condutora do veículo ..., torna-se até insignificante saber se o veículo do arguido já estaria parado ou estava em andamento da altura do embate, pois o resultado seria precisamente o mesmo! 32.Comportamento este que o tribunal deveria ter sopesado na atribuição das responsabilidades pela produção do sinistro.
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Tal não implica a completa ausência de responsabilidade do arguido na produção do sinistro, tanto mais que o seu veículo invadiu a faixa de rodagem contrária e que o acidente se verificou nessa mesma faixa de rodagem.
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O que aconteceu por o arguido ter sido encandeado pelo sol e, quando deu por si, já estava junto ao rail da faixa contrária, onde embateu ligeiramente.
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Da pesquisa efetuada pelo OPC responsável pelo inquérito, no local e à hora do acidente, o sol estaria a incidir na horizontal relativamente aos...
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