Acórdão nº 0107/22.3BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Março de 2023

Magistrado ResponsávelANÍBAL FERRAZ
Data da Resolução22 de Março de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa; # I.

HOTEL ... – Sociedade Hoteleira e Turística, S.A., …, com cobertura do disposto pelos artigos (arts.) 25.º n.ºs 2 a 4 e 26.º do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAMT).) e 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), interpôs, para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, recurso, objetivando uniformização de jurisprudência, da decisão proferida, no âmbito de pedido de pronúncia arbitral (“contra a liquidação adicional de IRC n.º 2021..., referente ao exercício de 2017, que deu origem à demonstração de liquidação de juros n.º 2021 ..., e à nota de cobrança n.º 2021 ... com o valor a pagar de € 68.862,56 (doravante “Liquidação Contestada”), pretendendo a declaração de ilegalidade e anulação das mesmas, bem como o reembolso do imposto e juros compensatórios que pagou, no montante total de € 68.862,56, acrescido de juros indemnizatórios.”), formulado no processo nº 2/2022-T, do Centro de Arbitragem Administrativa (caad), que, além do mais, decidiu julgá-lo totalmente improcedente.

Aponta-lhe contradição/oposição, com o decidido no acórdão, do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), datado de 4 de junho de 2020, proferido no processo nº 2742/10.3BELRS.

A recorrente (rte) apresentou alegação, finalizada com as seguintes conclusões: « 1. A decisão do douto Acórdão recorrido, tirada por maioria, versa sobre a manutenção da desaplicação da dedução de uma verba quantificada pela Recorrente, decorrente do abate de um prédio urbano (o HOTEL ..., sito no ...) e correspondente ao seu valor líquido fiscal, constante de uma única linha da sua contabilidade (edifício), por alegado incumprimento do disposto no artigo 31.º-B, nº 3 do CIRC, já que se lê na fundamentação que “não tendo sido dado cumprimento a todos os requisitos constantes na norma atrás mencionada, (n.º 3, alíneas a), b) e c) do artigo 31.º-B do CIRC), a dedução no quadro 07, do modelo 22, não é aceite”.

2. O HOTEL ... era uma icónica unidade hoteleira a funcionar num edifício sito na ... desde meados do Século XX, mas que sofreu inúmeras e sucessivas intervenções ao longo dos anos que acabaram por o tornar inapto para a sua função hoteleira, pelo que após largo debate, foi tomada a decisão de demolir esse edifício, para a construção de um outro, agora funcional, moderno e condizente com as características da cadeia ... procuradas pelos seus Clientes (o que já não se verificava), tendo essa demolição ocorrido entre 2017 e 2018, o que é incontroverso, pois é reconhecido pela AT e é tudo matéria dada por provada nos autos recorridos, tendo sido previamente comprovado pelas autoridades (e.g. camarárias e policiais, de entre outras e por inúmeros documentos contemporâneos da demolição que o atestam e constantes dos autos), pelo que a Recorrente deduziu para apuramento do lucro tributável de 2017, na sua Declaração Anual de Rendimentos de IRC (Mod. 22) desse ano de 2017 (portanto, ainda no decurso das obras de demolição que se prolongaram pelo ano de 2018) o montante correspondente ao valor remanescente do edifício (uma única verba e de um só valor) e que já havia reconhecido na sua contabilidade em 2016, em obediência ao princípio da prudência (tudo matéria assente, jamais controvertida).

3. A AT considera a omissão dos formalismos do dito n.º 3 absolutamente inultrapassável (tornando uma obrigação acessória num requisito essencial e absoluto da quantificação do montante de imposto devido): ou seja, entre aceitar uma dedução por uma perda que reconhece ter existido e que de outro modo aceita que seria dedutível, ou negar essa dedução por ausência de uma obrigação declarativa (superada por outra via), a AT opta por privilegiar a segunda opção (apesar de reconhecer a legitimidade da dedução, não fora a falta de comunicação).

4. Essa opção foi confirmada pela douta decisão recorrida, no que difere de douto Acórdão do TCA Sul e que serve de Acórdão Fundamento ao presente Recurso, que decidiu sobre uma situação em que também não foi cumprida a obrigação de comunicação no prazo de 15 dias antes do abate de ativos, e no qual se julgou, em oposição com a douta Decisão Recorrida que “A não aceitação dos custos relativos a amortizações extraordinárias de bens do ativo corpóreo imobilizado, com base na mera preterição de obrigação de comunicação prévia, no prazo de 15 dias anterior ao abate dos bens, constitui uma consequência excessiva e desproporcionada” e por isso inaplicável, aceitando prova alternativa para a comprovação do gasto fiscal (Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 4 de junho de 2020, proferido no processo n.º 2742/10.3 BELRS).

5. O ato tributário não cuida de saber, não sendo causa da decisão, da eventual não “aceitação” (inviável) do abate do edifício, nem da possível existência de bens recuperáveis, pelo que tais fundamentos, que não seriam válidos, não podem ser invocados para sustentar a douta Decisão Recorrida, já que esse aperfeiçoamento da fundamentação do ato violaria o princípio do contencioso de mera anulação, que possibilita uma confirmação ou anulação, mas não um aperfeiçoamento.

6. Sendo que o ato tributário e a matéria dada por provada confirmam que o abate do edifício foi motivado por “uma série de alterações e acrescentos pontuais” que levaram a constatar “que ao longo dos anos vinha perdendo a coerência arquitetónica e as funcionalidades pensadas para um estabelecimento hoteleiro” razão pela qual a Administração tomou a decisão de o demolir e de construir “…no terreno do HOTEL ..., uma nova unidade hoteleira, totalmente modernizada e à imagem da cadeia de hotéis ...”.

7. O que constitui uma causa de desvalorização prevista no art. 31.º-B, nº 1, até porque a sua enunciação é meramente exemplificativa, pois a provada inaptidão funcional superveniente, por excesso de alterações, que ditou a demolição, em 2017 e 2018, não poderá deixar de ser entendida como conduzindo a uma perda de valor excecional provenientes das “causas anormais” de natureza similar às demais exemplificativamente referidas no nº 3 daquele artigo.

8. Sendo de salientar que o seu nº 1 não é fundamento do ato tributário, mas tão só o seu n.º 3 (“não tendo sido dado cumprimento a todos os requisitos constantes na norma atrás mencionada, (n.º 3, alíneas a), b) e c) do artigo 31.º-B do CIRC), a dedução no quadro 07, do modelo 22, não é aceite.”).

9. Acresce que a Recorrente comunicou o abate á AT, ainda que fora dos termos do art. 33.º do CIRC, pois foi dado por provado que essa informação decorre da sua modelo 22 de IRC de 2017, entregue em 2018, ainda no decurso das obras de demolição que se prolongaram pelo ano de 2018 (“(k) Na declaração de IRC Modelo 22 referente ao exercício de 2017, a Requerente deduziu o valor de € 1.534.192,20 no campo 763 (depreciações e amortizações tributadas em períodos de tributação anteriores – art.º 20.º do DR 25/2009, de 14/9) do quadro 07 “Apuramento do lucro tributável” (cf. Relatório de Inspeção Tributária junto ao processo administrativo e ainda a fundamentação da decisão: “não tendo sido dado cumprimento a todos os requisitos … a dedução no quadro 07, do modelo 22, não é aceite.”).

10. Sendo certo, porém, que não foi por essas razões que o ato tributário censurado recusou a dedução do gasto decorrente da demolição, mas tão somente por falta de comunicação prévia e auto (cfr. pág. 17 da fundamentação do ato tributário).

11. Negação da dedução que viola a presunção de veracidade das declarações dos sujeitos passivos, que apesar de permitir obrigações acessórias para salvaguardar os requisitos materiais de que depende a dedutibilidade dos gastos, não permite desaplicar a dedução se inexistem dúvidas quanto á veracidade desse mesmo gasto (inaptidão funcional seguida de demolição de um edifício e cujo valor líquido fiscal é, igualmente, incontroverso).

12. Como já se entendeu em decisão do CAAD, pois que nela a manutenção do ato tributário aí censurado decorreu, expressamente (apenas), de inexistir " fundamento para afastar a aplicação à situação dos autos das exigências previstas naqueles n.ºs 3 dos artigo 38.º e 31.-B" pois que "a Requerente não apresentou qualquer prova do abate de bens do activo de valores correspondentes aos que contabilizou nos exercícios de 2013 e 2014, referidos nos relatórios das inspecções tributárias". Sendo exclusivamente por essa razão que se negou a dedução do (eventual, mas não provado) gasto. Isto porque se salienta, bem, que ”A razão daquelas exigências formais é a comprovação do abate físico, do desmantelamento, do abandono ou da inutilização dos bens, pelo que será viável uma interpretação restritiva, sempre que seja possível essa comprovação por outras vias.“, salientando-se que essa comprovação alternativa, que seria possível e admíssivel, in casu, e contrariamente ao que aqui ocorre, não foi feita: "No entanto, no caso em apreço, como bem nota a Autoridade Tributária e Aduaneira, nem no procedimento de inspecção nem no presente processo foi feita essa comprovação do abate físico, do desmantelamento, do abandono ou da inutilização dos bens" o que motivou a decisão tirada no Acórdão. – Cf. Decisão Arbitral de 13/03/2019 no processo 549/2018-T do CAAD, na qual foram árbitros Jorge Lopes de Sousa, Jesuíno Alcântara Martins e Jorge Carita, consultada em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?listPageSize=100&listPage=38&id=3970 13. No que difere do caso vertente pois que in casu verificam-se os quatro pressupostos elencados pelo Exmo. Juiz Conselheiro, Professor Doutor Gustavo Lopes Courinha (Manual do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, Almedina, 2019, p. 86): i. Ocorreu um evento que desencadeou a imparidade e que encontra apoio na lista exemplificativa constante da lei: a superveniente inaptidão funcional do edifício; ii. Está demonstrada a necessária relação causal entre o evento e a...

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