Acórdão nº 50/22.6GDGRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Fevereiro de 2023

Magistrado ResponsávelROSA PINTO
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Relatório … 2. Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, a 11.10.2022, decidindo-se: “

  1. Condenar o arguido P como autor material de um crime um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 4 meses de prisão.

  2. Suspender a execução da pena de prisão referida em a) pelo período de 1 (um) ano.

  3. Condenar, também, o arguido P na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados de qualquer categoria, durante o período de 12 (doze) meses … 3. Inconformado com a douta sentença, veio o arguido interpor recurso da mesma, terminando a motivação com as seguintes conclusões: “ … B. O Recorrente não pode concordar com a apreciação da prova realizada, uma vez que o talão produzido pelo alcoolímetro utilizado não revela qual a Taxa de Álcool no Ar Expirado (TAE) apurada, bem como não revela qual o fator de conversão utilizado para produzir o resultado de 2,82g/l de Taxa de Álcool no Sangue.

    1. A Portaria 1556/2007, de 10 de Dezembro, que aprovou o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, determina que a sua regulamentação se aplica a alcoolímetros quantitativos ou analisadores quantitativos.

    2. Nos termos do n.º 2 do artigo 1.º do Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou de substâncias psicotrópicas, aprovado pela Lei n.º 18/2007, de 17 de Maio, determina-se que ‘2- A quantificação da taxa de álcool no sangue é feita por teste no ar expirado, efectuado em analisador quantitativo, ou por análise de sangue’ … E. O aparelho em causa nos presentes autos (Alcoolímetro, para todos os efeitos legais) foi utilizado para medir a concentração de álcool no ar expirado pelo Recorrente, ou seja, a Taxa de Ar Expirado (TAE).

    3. Os alcoolímetros quantitativos indicam sempre e obrigatoriamente a quantidade de álcool presente no ar expirado (TAE), podendo apresentar uma indicação suplementar em grama por litro – g/l, de teor de álcool no sangue (TAS), desde que evidenciem o respetivo fator de conversão, nos termos do artigo 3.º da Portaria 1556/2007, de 10 de Dezembro.

    4. O fator de conversão é de 1 mg de álcool por litro de ar expirado é equivalente a 2,3 g de álcool por litro de sangue, nos termos do n.º 4 do artigo 81.º do Código da Estrada e artigo 4.º da Lei n.º 65/98, de 02 de Setembro.

    5. A quantidade de álcool presente no ar expirado (TAE) e o fator de conversão não estão evidenciados no talão produzido pelo alcoolímetro que serviu para fundar a convicção do douto Tribunal a quo.

      I. A taxa de alcoolemia é um facto sujeito a prova vinculada, na medida em que o resultado suscetível de ser usado para o preenchimento da previsão normativa carece de ser produzido por determinado tipo de aparelho em determinadas condições … … K. O alcoolímetro em causa nos autos não mediu a TAS do Arguido mas antes a TAE do Arguido e, como qualquer aparelho de medição, ao apresentar como resultado final uma medida que não foi aquela que efetivamente mediu terá de proceder a uma operação automática de conversão.

      L. Há dúvida que a TAS do arguido tenha sido apurada pela aplicação do fator de 2.3 previsto no n.º 4 do artigo 81.º do Código da Estrada do C.E. porquanto do talão da máquina não consta nem a TAE nem o fator de conversão que permite apurar a TAS.

    6. Nada nos diz nem resulta dos autos que depois de apurada a TAE do Arguido tenha a mesma máquina procedido à determinação da TAS aplicando o fator de conversão constante da Lei e não qualquer outro.

    7. A menção à TAS é completamente irrelevante porquanto a mesma é facilmente calculada por qualquer ser humano através da indicação da TAE e aplicação do fator de conversão.

    8. É para garantir que a conversão automática da máquina é a realizada através do fator de conversão legal que o Legislador sentiu necessidade de prever EXPRESSAMENTE, que 1) o aparelho indique expressamente a medida de TAE e 2) quando o aparelho proceda à conversão automática para a TAS indique qual o fator de conversão.

    9. É que, como qualquer máquina ou aparelho, a taxa de conversão de uma medida efetivamente medida para outra cujo resultado se pretende apurar dependerá da determinação humana de qual a taxa/fator de conversão que irá presidir à efetiva conversão. Ora, nada garante, porque não consta nem a TAE nem o fator de conversão, que o fator de conversão utilizado pela máquina foi o legal.

    10. Nada garante que a máquina não possa ter sido sujeita a qualquer condicionalismos que alterou o fator de conversão, ou que a mesma não se possa, inclusivamente, ter desregulado ou sofrido uma qualquer anomalia desestabilizadora das caraterísticas de que foi programada e que possa ter conduzido a uma alteração do fator de conversão.

    11. A própria Lei impõe que: 1. Seja apresentado o resultado da TAE; 2. Caso seja, suplementarmente, apresentado a TAS, seja obrigatoriamente indicado o fator de conversão - sem a TAE e sem o fator de conversão, ou seja apenas com a TAS não podemos determinar se a conversão foi bem efetuada.

    12. Pense-se hipoteticamente que basta que o alcoolímetro esteja calibrado ou sofra uma qualquer alteração e que para aplicar uma taxa de conversão faça corresponder 1 miligrama por litro de ar expirado a 5 gramas de álcool por litro de sangue, para que a TAE analisada fosse de 0,51 mg/l de ar e que esse valor de TAE convertido para TAS nos termos do fator de conversão legalmente aplicável correspondesse a apenas 1,173 g/l no sangue – estará calibrado para esse fator de conversão? T. Por isso, sempre a dúvida teria de ser resolvida a favor do Recorrente, em abono da aplicação do princípio do in dúbio pro reu, plasmado na 1ª parte do n.º 2 do artigo 32.º da CRP, impondo-se a sua absolvição e o consequente arquivamento dos autos.

    13. Tudo porque a prova é inválida, por violação conjunta das imposições legais constantes do artigo 3.º da Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro, do n.º 2 do artigo 1.º da Lei n.º 18/2007, de 17 de Maio e do n.º 4 do artigo 81º do Código da Estrada, bem como o artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa.

      Subsidiariamente, caso assim não se entenda, o que por mera cautela de patrocínio se equaciona, V. Na determinação da pena concretamente aplicada, o douto Tribunal a quo não considerou, nos termos do artigo 71.º do Código Penal, todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime, depuseram a favor do Recorrente, nomeadamente as suas condições pessoais e a sua situação profissional.

    14. Foi dado como provado que o Recorrente trabalha em ... e vive na ....

      X. Foi relatado pelo Recorrente em sede de julgamento que o mesmo necessita da carta de condução para as suas deslocações laborais – sendo inclusive um dos requisitos para manter o seu posto de trabalho.

    15. Estes factos não foram considerados na determinação da medida concreta das penas (principal e acessória) e o seu reconhecimento implica necessariamente a redução das exigências de prevenção especial e, por conseguinte, a redução medida da pena concretamente aplicada, nos termos das alíneas d) e e) do n.º 2 do artigo 71.º do Código Penal.

    16. o douto Tribunal a quo deveria ter aplicado uma pena não privativa da liberdade, quer aplicando uma pena de multa quer no que respeita à sanção acessória de proibição de condução de veículos a motor.

      … 4. O Ministério Público respondeu ao recurso interposto pelo arguido, pugnando pela sua improcedência e manutenção integral da sentença recorrida, concluindo que: … 4. O recurso do arguido não merece, salvo o devido respeito, provimento … 6. … não se exige que os alcoolímetros quantitativos, destinados a medir a concentração mássica de álcool por unidade de volume na análise do ar alveolar expirado, exibam o teor de álcool no ar expirado (TAE) acusado, nem que o talão por eles emitido indique esse teor e o respetivo fator de conversão em teor de álcool no sangue (TAS), bastando a exibição e a indicação do valor deste último, resultante da conversão daquele, automaticamente efetuada pelo aparelho.

      7. Por outro lado, na douta sentença recorrida foram devidamente considerados para a determinação do tipo e medida concreta quer da pena principal quer da pena acessória, os factos praticados pelo arguido, as elevadíssimas exigências de prevenção geral, as considerações atinentes ao dolo directo do agente e ao grau elevado da ilicitude da sua conduta, bem como as enormes exigências de prevenção especial que no caso se fazem sentir, atento o facto de o arguido contar com três condenações anteriores pelo mesmo tipo de ilícito.

      8. No caso concreto, as exigências de prevenção geral são altas, atento o grande número de pessoas que persiste em conduzir veículos, na via pública, após ingestão de bebidas alcoólicas, e considerando também o elevado número de acidentes rodoviários que tais condutores, frequentemente, provocam, com graves consequências para a vida e o património de terceiros.

      9. As exigências de prevenção especial de socialização são, por seu turno, elevadas, uma vez que o arguido foi já anteriormente condenado, por três vezes, pela prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez.

      10. As condenações anteriores de que o arguido foi alvo, pela prática do mesmo tipo de crime de condução de veículo em estado de embriaguez, não representaram para si um factor de refreio relativamente à prática de novos e idênticos factos ilícitos típicos, nem foram suficientes para o fazer interiorizar o desvalor da sua conduta.

      … 12. No caso dos autos, uma pena de multa não é suficiente para estabilizar as expectativas da comunidade, na validade e vigência da norma violada, e restabelecer a paz jurídica e não constituem para o arguido uma suficiente censura do facto por si praticado, nem representam para o mesmo uma bastante advertência que o iniba da prática de novos crimes no futuro.

      13. Pelos mesmos motivos, a duração da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor é inteiramente justa e adequada e, por esse motivo, não merece qualquer...

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