Acórdão nº 19477/16.6T8SNT-F.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 31 de Janeiro de 2023
Magistrado Responsável | ANTÓNIO BARATEIRO MARTINS |
Data da Resolução | 31 de Janeiro de 2023 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Processo: 19.477/16.6T8SNT-F.L1.S1 ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I – Relatório Banco Popular de Portugal, SA (BPP) intentou ação especial de insolvência contra AA e esposa, BB, pedindo a decretação da insolvência de ambos.
Regularmente citados, vieram apresentar um plano de pagamentos, sendo o respetivo incidente tramitado por apenso aos autos de insolvência.
Plano de pagamentos que não foi aceite por todos os credores – mereceu a oposição do BPP, da Autoridade Tributária (AT) e da ..., SA – tendo o tribunal decidido não suprir a aprovação destes, não homologando o Plano e declarando encerrado o incidente de aprovação de pagamentos.
Interposto recurso desta decisão, não foi o mesmo admitido.
Em 26/02/2020 a sociedade de titularização de créditos H..., SA veio aos autos informar ter adquirido, por escritura pública de cessão de créditos realizada em 16/11/2018, o crédito do Banco Santander Totta, SA (o qual veio a incorporar o BPP por fusão) sobre os devedores, juntando a correspondente documentação e requerendo a sua habilitação na posição processual daquele, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 42/2019, de 28/03.
Entretanto, em 01/10/2021, foi proferida sentença que declarou a insolvência dos requeridos/devedores AA e BB.
Em 25/02/2022, foi proferido despacho a declarar H..., SA habilitada a prosseguir nos autos de insolvência em substituição do Banco Santander Totta, SA, nos seguintes termos: “Não tendo sido alegada e demonstrando a invalidade do ato de transmissão ou que a mesma foi realizada para tornar mais difícil a sua posição no processo (art.º 356º, alínea a), do C.P.C.), declaro H..., SA habilitada a prosseguir na presente insolvência em substituição do BANCO SANTANDER TOTTA, S.A. relativamente aos créditos identificados como ...97 e todas as garantias acessórias a eles inerentes (cfr. ainda art.º 263º, n.º 1, do CPC, ex vi art.º 17º, n.º 1, do CIRE).”.
Inconformados com a sentença que declarou a insolvência, os requeridos/devedores interpuseram recurso de apelação, recurso que o Tribunal da Relação de Lisboa, por Acórdão de 24/05/2022, julgou totalmente improcedente, confirmando a sentença recorrida.
Ainda inconformados, interpõem agora os devedores/requeridos o presente recurso de revista (tendo em vista, segundo os requeridos/recorrentes, “a anulação do Acórdão recorrido”), dizendo fazê-lo de acordo e nos termos do art. 14.º/1 do CIRE e concluindo do seguinte modo: “(…) 1. Nos termos do disposto nos art.ºs 639.º n.º 3 e 652.º n.º 1 al. a), quando as alegações não respeitarem o disposto no n.º 1 daquele normativo legal, o relator a quem o processo foi distribuído, deve convidar o recorrente a sintetizar as conclusões.
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No entanto, o Tribunal recorrido entendeu que face à natureza urgente dos autos e ao facto de inexistirem dúvidas quanto à questão a decidir, “não dever ter lugar a qualquer despacho convite ao aperfeiçoamento das conclusões”. – acórdão recorrido, pág. 5, in fine.
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Não se discute aqui se as conclusões formuladas pelos Recorrentes nas alegações do recurso interposto da decisão proferida pelo Juiz ... do Juízo de Comércio ... cumprem ou não o ónus de sintetização imposto pelo art.º 639.º n.º 1 do CPC.
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A decisão do TRL recorrida não cumpre o dever de convite ao aperfeiçoamento imposto pelo n.º 3 do mesmo normativo legal.
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Constatando a violação do n.º 1 do art.º 639.º do CPC, estava o relator e, em consequência, o Tribunal recorrido vinculados a dar cumprimento ao n.º 3 do mesmo artigo, ou seja, a convidar os Recorrentes a aperfeiçoarem o seu articulado de recurso.
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Não cabe assim ao Tribunal, de moto próprio e sem previamente dar a oportunidade aos recorrentes de o fazer, decidir das conclusões que estes formularam quais as que devem ser eliminadas de modo a conformá-las ao comando legal do art.º 639.º n.º 1 do CPC.
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A não notificação dos Recorrentes para, se assim o entendessem, aperfeiçoarem o seu articulado de recurso, configura uma omissão de uma formalidade legal que a lei processual civil impõe, sancionada com a nulidade processual, porque se trata de uma irregularidade grave, uma vez que “o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões no mesmo formuladas”.
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A “natureza urgente” do processo de insolvência não permite a postergação dessa formalidade: “a natureza urgente do processo de insolvência só tem efeitos no (arts. 156º, nº3, 162º, nº1 e 138º, todos do CPC)” – Acórdão proferido pelo STJ em 05/07/2016 no proc. n.º 1041/12.0TBGMR-I.G1.S1 9. A possibilidade de as conclusões serem formuladas pelos Recorrentes, e lhe ser dada a oportunidade de corrigirem uma eventual falha na sua sintetização, é fundamental para o cabal exercício do direito de defesa das partes.
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Para além da irregularidade processual que a omissão de tal despacho de convite ao aperfeiçoamento das conclusões representa, acarretando a nulidade de todos os actos posteriores a tal omissão, 11. A consequência do respectivo incumprimento consubstancia também uma restrição desproporcionada do direito de acesso ao direito e aos tribunais (artigo 20.º, n.º 1, da Constituição), inconstitucionalidade que expressamente se invoca.
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Desproporcionada face ao prazo curto que é conferido às partes para aperfeiçoarem as conclusões – cinco dias (n.º 3 do art.º 639.º CPC) – que em nada contende, como se viu, com a natureza urgente do processo de insolvência.
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A decisão recorrida viola assim o...
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