Acórdão nº 00912/19.8BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução25 de Março de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I RELATÓRIO 1 . I...., residente na Rua (…), inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF de Braga, datada de 30 de Setembro de 2019, que julgou improcedente a acção administrativa, instaurada contra o INSTITUTO da SEGURANÇA SOCIAL, IP, que finalizava, peticionando em procedência da acção, a anulação do despacho proferido pelo Director de Núcleo do Instituto da Segurança Social, I.P., o qual indeferiu o requerimento que apresentou para atribuição de prestações por morte do beneficiário A...., tendo formulado pedido de condenação à prática de acto devido, consubstanciado no pagamento pelo Réu daquelas prestações, acrescido dos juros de mora.

* Nas suas alegações, a recorrente formulou as seguintes conclusões: "I.

A questão material invocada pela Mmª. Juíza a quo como fundamento da alegada falta de preenchimento dos requisitos dos quais depende a atribuição da pensão requerida pela A., ora recorrente, e para considerar improcedente a presente acção, tem sido alvo de decisões em sentidos opostos, motivo pelo qual se encontra actualmente pendente de apreciação por parte do STA em sede de diversos recursos de revista.

II.

Tratando-se de uma questão manifestamente controversa, que impõe uma pronúncia que permita a desejável uniformização de critérios e decisões e inerente segurança jurídica e tutela dos direitos e legalmente protegidos dos cidadãos, face à pendência dos diversos recursos de revista já admitidos junto do STA e, por isso mesmo, à eminência de apreciação e tomada de posição sobre a matéria, justificar-se-ia aguardar até que a referida Instância profira os respectivos Acórdãos e fixe o sentido em que as normas em discussão devem efectivamente ser interpretadas e aplicadas.

III.

Obviando ao risco de se emitir nova decisão que venha a contradizer o entendimento adoptado pelo STA bem como a um eventual e desnecessário recurso por qualquer das partes para a referida Instância do Acórdão que este Venerando Tribunal viesse a proferir, tudo com os inconvenientes a nível de custos e tramitação processual necessariamente associados, situação evitável através do deferimento da requerida suspensão da instância até que haja efectiva pronúncia do STA na matéria - arts. 269º/1,c) e 272º/1 do CPC, aplicável ex vi do art. 1º do CPTA.

SEM PRESCINDIR: IV.

A Autora fez prova documental da existência da situação de união de facto existente entre si e o falecido A.... - docs. 5, 6, 7, 9, e 12 e 17 juntos com a p.i. - resultando igualmente da factualidade vertida nos itens 13º a 20º da p.i., os quais não foram sequer impugnados pelo R..

V.

A existência de uma situação de união de facto poderia ter sido corroborada pela prova testemunhal apresentada pela A., ora recorrente, caso a mesma tivesse chegado a ser produzida.

VI.

A matéria factual que diz respeito à existência de uma situação de união de facto entre a recorrente e o falecido A.... (itens 13º a 20º da p.i), tendo evidente, manifesta e imprescindível relevância para a boa decisão da causa, deveria ser carreada para o elenco dos factos provados.

VII.

Sendo a prova desses factos admitida por qualquer meio legalmente admissível, nos termos do artigo 2º-A da Lei nº 7/2001, certo é que se estes factos forem dados como provados, provada ficará a existência efectiva de uma situação de união de facto há mais de dois anos entre o falecido A.... e a Autora e ora recorrente e, consequentemente, o direito desta às prestações por morte objecto dos presentes autos.

VIII.

Na medida em que a decisão final proferida pressupõe o prévio conhecimento da questão da efectiva existência e prova de uma situação de união de facto, jamais a decisão recorrida poderia ter sido proferida sem a devida e cabal apreciação da factualidade correspondente, configurando a respectiva omissão erro de julgamento por insuficiência da matéria de facto provada.

IX.

Para o caso de se entender não estar a mesma suficientemente demonstrada, haveria que determinar a produção de prova, ouvindo-se as testemunhas arroladas na p.i., sob pena de nulidade processual, que influi no exame e na decisão da causa, suprível através da baixa do processo à 1ª instância a fim de prolação de despacho destinado a identificar o objecto do litígio e enunciar os temas de prova e a realização da audiência final, seguindo-se os demais termos processuais até final. (arts. 89º-A e 91º do CPTA) - artigo 195º do CPC, ex vi do art. 1º do CPTA.

X.

O raciocínio formulado pela 1ª instância, no sentido de que a separação de pessoas e bens apenas relevaria caso a união de facto fosse com “terceira pessoa”, existindo um alegado casamento não dissolvido, assenta em circunstâncias que não se verificam, procedendo, para além do mais, a uma interpretação da lei que não corresponde à ratio legis nem à letra do regime previsto na Lei 7/2001.

XI.

Ao fazer uma interpretação que não se coaduna com o pensamento legislativo subjacente ao regime aplicável nem encontra na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, a douta sentença recorrida incorreu em patente violação do preceituado no art. 9º do CC, e, simultaneamente, em notório erro de julgamento, violando o disposto nos arts. 1º/1 e 2, 2º/c), 3º/e) e 6º/1 da Lei 7/2001.

XII.

A alegada excepção consagrada pela alínea c) do art. 2º da Lei 7/2001 - casamento não dissolvido - nunca se poderia considerar aplicável à A., ora recorrente, na medida em que a mesma se encontrava separada de pessoas e bens do falecido A...., com quem vivia em união de facto desde 2009, assim se encontrando à data do seu óbito, circunstância que a referida norma expressa e literalmente ressalva da sua aplicabilidade, em absoluto, sem qualquer espécie de requisito ou condição adicional ou sem fazer qualquer distinção, nomeadamente a propósito da separação de bens e a união de facto terem de dizer respeito a pessoas distintas.

XIII.

Onde o legislador não distinguiu, não pode o aplicador da lei distinguir, sob pena de subverter o raciocínio do legislador e de proceder a uma interpretação manifestamente praeter e contra legem, absolutamente vedadas pelo nosso ordenamento jurídico.

XIV.

O entendimento adoptado pela Mmª. Juíza da 1ª instância é ainda contrário ao entendimento da jurisprudência nacional, a qual tem admitido a irrelevância do estado civil dos unidos de facto para efeitos de atribuição da pensão de sobrevivência reconhecida pela Lei 7/2001 e à desnecessidade de fazer qualquer prova ou cumprir qualquer requisito adicional que não seja o da existência da união de facto há pelo menos dois anos.

XV.

Salvo o devido respeito, a douta sentença da 1ª instância violou as normas dos arts. 1º/2, 2º/c), 3º/e) e 6º/1 da Lei 7/2001 e 9º do CC, padecendo de notórios erros de julgamentos por insuficiência da matéria de facto provada e por erro nos pressupostos de facto e de direito, impondo-se a respectiva substituição por nova decisão que reconheça a situação jurídica invocada pela A. e o respectivo direito à atribuição das prestações por morte peticionadas".

* Notificadas as alegações, apresentadas pela recorrente, supra referidas, nada disse a entidade recorrida, ISSocial, IP.

* O Digno Magistrado do M.º P.º, notificado nos termos do art.º 146.º, n.º1 do CPTA, emitiu douto Parecer no sentido do provimento do recurso, o qual, notificado às partes, não obteve qualquer pronúncia * Sem vistos, mas com envio prévio do projecto aos Ex.mos Srs. Juízes Desembargadores Adjuntos, foram os autos remetidos à Conferência para julgamento * 2 .

Efectivando a delimitação do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, acima elencadas, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, ns. 3 e 4 e 685.º A, todos do Código de Processo Civil, “ex vi” dos arts.1.º e 140.º, ambos do CPTA.

II FUNDAMENTAÇÃO 1 . MATÉRIA de FACTO A decisão recorrida fixou a seguinte factualidade: A)A Autora, em 14.09.1975, casou com A.... (cf. doc. n.º 1 junto com a petição inicial - fls. 23 e 23/verso do processo físico).

  1. Em 16.12.2009, foi decretada a separação de pessoas e bens entre a Autora e A.... (cf. docs. n.ºs 1 e 2 juntos com a petição inicial - fls. 23 a 25 do processo físico).

  2. Em 21.05.2014, faleceu A.... (cf. doc. n.º 3 junto com a petição inicial - fls. 25/verso do processo físico).

  3. O Presidente da Freguesia de (…), em 23.06.2014, atestou que a Autora “residia em comunhão de mesa e habitação com A...., até à data do falecimento ocorrido em 21 de Maio de 2014” (cf. doc. n.º 6 junto com a petição inicial -...

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