Acórdão nº 00250/20.3BEMDL-S1 de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelAna Patrocínio
Data da Resolução05 de Maio de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório S..., Lda., pessoa colectiva n.º (…), com sede na Rua (…), interpôs, em separado, recurso jurisdicional do despacho interlocutório proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, em 12/10/2021, que indeferiu a produção da prova requerida no âmbito do processo principal de impugnação judicial n.º 250/20.3BEMDL.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “1. A Recorrente requereu, junto do Tribunal a quo, a produção de prova testemunhal, o que lhe foi indeferido, fundamentado nos artigos 114.º do CPPT e artigo 130.º do CPC, por remissão do artigo 2.º, alínea e), do CPPT, considerando que o então alegado ou não são factos ou, sendo, são demonstráveis, tão só, mediante prova documental.

  1. Tal decisão contende com normas imperativas e Princípios fundamentais de direito, como sejam, entre outros, o acesso ao direito e o direito a que as decisões que limitam direitos sejam devidamente fundamentadas na lei, pelo que, não se conformando com a mesma desta recorre.

  2. A aqui Recorrente foi notificada para indicar os factos da sua PI que pretendia produzir prova testemunhal.

  3. Em cumprimento de tal despacho, indicou os seguintes factos na Petição Inicial com os nºs. 20 a 24º, 26.º a 30.º, 36º,67.º, 74.º, 81.º a 93.º, 94.º, 96.º, 99.º, 100.º ,104.º, 105.º a 110.º ,111.º a 114.º, 115º, 133.º a 135.º, 148.º, 176.º , 180.º e 181.º.

  4. O Tribunal a quo proferiu despacho indeferindo a prova testemunhal requerida.

  5. O despacho proferido mostra-se insuficiente, desprovido de fundamentação, quer de facto, quer de direito, ficando desta forma cerceada no seu direito de demonstrar os factos que alega, sempre por referência às liquidações impugnadas que assentam elas próprias em supostos factos.

  6. Qualquer decisão, para que possa cumprir as funções a que se destina, tem que ser capaz de esclarecer concretamente as razões determinantes do acto, o que só acontece se for clara, congruente e suficiente.

  7. A decisão recorrida não cumpre o dever de fundamentação, por insuficiência ou inexistência, violando nomeadamente o art. 77º da LGT, art. 125.º do CPPT, 154° n.º 1 e art. 615.º, n.º 1, alínea b), do C.P.C, ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPPT, cuja nulidade se arguiu.

  8. Não procedendo e sem prescindir, o Tribunal a quo, ao proferir o despacho como proferiu, incorre em erro de valoração.

  9. O alegado na P.I., e sobre o qual se requereu prova testemunhal constituem factos, enquanto recorte da realidade em discussão nos presentes autos, que subsumíveis no Direito vigente, permitirá uma decisão justa e equitativa.

  10. É por referência aos fundamentos das liquidações tributárias impugnadas que a Recorrente as impugna.

  11. O então alegado descreve, sumariamente, as práticas comerciais desencadeadas junto dos vários fornecedores, formas de pagamento e meios de entrega do produto vendido, cujas práticas foram reproduzidas contabilisticamente.

  12. Ainda que se possa vislumbrar em tal alegação uma vertente conclusiva, na sua essência encontrar-se-á o encadeamento de actos, ocorrências e circunstâncias que se traduzem nos factos que constituem o objecto dos presentes autos.

  13. Neste sentido, defende o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito do Processo n.º 19035/17.8T8PRT.P1.S1, disponível in www.dgsi.pt, que “não pode perder-se de vista que é praticamente impossível formular questões rigorosamente simples, que não tragam em si implicados, o mais das vezes, juízos conclusivos sobre outros elementos de facto; e assim, desde que se trate de realidades apreensíveis e compreensíveis pelos sentidos e pelo intelecto dos homens, não deve aceitar-se que uma pretensa ortodoxia na organização da base instrutória impeça a sua quesitação, sob pena de a resolução judicial dos litígios ir perdendo progressivamente o contacto com a realidade da vida e assentar cada vez mais em abstrações (e subtilezas jurídicas) distantes dos interesses legítimos que o direito e os tribunais têm o dever de proteger” (vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13/11/2007, processo n.º 07A3060, NUNO CAMEIRA).

  14. Mais, os factos psicológicos podem ser alegados e objecto de prova (vide Acórdão do STJ de 17/12/2019, processo n.º 756/13.0TVPRT.P2.S1, GRAÇA TRIGO), pelo que, o vertido nos artigos da PI, nomeadamente nos factos vertidos nos artigos 107.º, 109.º, 180.º e 181ºda P.I. deverão ser sujeitos a prova testemunhal nos moldes requeridos.

  15. Uma expressão genérica e qualificativa não é sinónimo de facto conclusivo.

  16. Em última instância ter-se-á que concluir que os factos em análise e atrás especificados são essenciais para a solução jurídica do litígio, por conseguinte são susceptíveis de serem demonstrados por prova testemunhal.

  17. Incorreu o Julgador em erro de valoração, com a consequente violação do disposto nos artigos 114.º e 118.º, ambos do CPPT.

  18. O Tribunal de 1.ª Instância decidiu ainda que os factos (sem especificar) sobre os quais foi requerida prova testemunhal “são demonstráveis através de prova documental”.

  19. A Recorrente não tem como saber a que factos se refere o Tribunal, pelo que, tal decisão está desprovida de fundamentação.

  20. Os artigos 393.º e 394.º do C.C. definem as situações em que não é admitida a prova testemunhal, desde logo, a propósito dos casos de prova tarifada, o que não se observa in casu.

  21. Os factos invocados não se subsumem nos artigos 393.º e 394.º do C.C., isto é, não estão sujeitos a forma escrita ou provados por prova plena, logo, podem ser demonstrados por outros meios de prova, designadamente por prova testemunhal.

  22. Por conseguinte, o Despacho a quo está ferido de ilegalidade, contendendo com os artigos 393.º, 394.º do C.C.; artigo 114.º do C.P.P.T. e artigo 130.º do C.P.C., o que expressamente se invoca.

Nestes termos e sempre com mui douto suprimento deste Venerando Tribunal, deverá ser revogado o Despacho proferido em 1.ª Instância, com as demais consequências legais, nomeadamente admitindo a produção de prova testemunhal requerida.”****Não foram apresentadas contra-alegações.

****O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso, revogada a decisão recorrida e ser ordenado que os autos regressem ao TAF de Mirandela, com as demais consequências legais, nomeadamente para que seja admitida a produção de prova testemunhal requerida.

****Numa análise perfunctória, este tribunal verificou ser objecto do presente recurso a dispensa da abertura de um período de produção de prova. Não estando esta dispensa de um período de produção de prova, como seja a testemunhal, taxativamente indicada como podendo ser objecto de recurso imediato, a impugnação...

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