Acórdão nº 00348/21.0BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelIrene Isabel Gomes das Neves
Data da Resolução15 de Setembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. A Fazenda Pública (Recorrente), notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, pela qual foi julgada totalmente procedente a presente reclamação judicial apresentada contra o acto de graduação de créditos proferido no âmbito do processo de execução fiscal n.º …… e apensos, em que é executada I... Lda., inconformada vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.

Alegou, formulando as seguintes conclusões: «A.

Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a reclamação de atos do órgão de execução fiscal interposta, nos termos do disposto no art.º 276º do CPPT, contra a decisão de graduação de créditos efetuada no âmbito da execução fiscal instaurada sob o n.º ...14 em que é executada I... Lda.

B.

Considerou a douta sentença que os reclamantes não podem opor os direitos de retenção ao credor hipotecário porquanto aquele não foi parte ou teve intervenção nos autos onde aqueles foram reconhecidos; o credor hipotecário pode impugnar a existência dos créditos reclamados e das garantias associadas, nos termos dos art.º 789.º e ss. do CPC, aplicáveis ex vi n.º 1 do art.º 246.º do CPPT, e na sequência da sua notificação da apresentação das reclamações de créditos.

C.

Concluindo que anula-se a decisão de graduação de créditos proferida pelo órgão de execução fiscal, com as consequências legalmente previstas no art.º 100.º da LGT; Condenam-se nestas a Fazenda Pública e os contrainteressados que apresentaram resposta, recaindo na percentagem de 50% para a primeira e a restante sobre aqueles em partes iguais (cfr. art.os 527.º CPC).

D.

Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim doutamente decidido, porquanto considera existir erro de julgamento quanto à matéria de facto e de direito, nos termos dos artºs 615º e 662º do CPC, 125º do CPPT, por errada valoração dos elementos constantes dos autos de execução, e consequente, erro na aplicação dos dispostos nos art.sº 755, nº. 1 f) C.C., art.ºs 619º. nº. 1, 628º e 673º, todos do C.P.C..

E.

A douta sentença considerou como assente a factualidade elencada nos pontos A. a F.

Dos Factos. Porém, de molde a subsumir a situação real respigada dos autos à boa decisão da causa, o Probatório deverá ser corrigido de acordo com a verdade factual, ao abrigo do disposto no art.º 662º do CPC, pois, entende a Fazenda Pública que, com os factos dados como provados, deveria o tribunal a quo ter mantido a decisão de reclamação e graduação de créditos por os direitos de retenção serem oponíveis ao credor hipotecário, ser reconhecida a sua existência e mesma também decorrer da lei, nos termos do disposto nos artº. 755, nº. 1 f) do C.C., art.ºs 619º. nº. 1, 628º e 673º, todos do C.P.C..

F.

Com a devida vénia, entende ainda a Fazenda Pública que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do art.º 662º do CPC, deverá ser alterada a matéria de facto, acrescentando-se os seguintes pontos aos factos provados: i. o ponto G, com o seguinte conteúdo: «Todos os direitos de retenção foram reconhecidos por sentença transitada em julgado»; ii. o ponto H, com o seguinte conteúdo: «Todos os direitos de retenção foram comprovados pelos Reclamantes»; iii. o ponto I, com o seguinte conteúdo: «Os reclamantes AA e BB e esposa realizaram obras nos ajuizados imóveis, sendo que, por via do não pagamento das mesmas foram também reconhecidos os direitos de retenção.» iv. Deverá ainda ser aditado o ponto Factos não provados: «A Reclamante não logrou provar que não se encontram verificados os requisitos para o reconhecimento dos direitos de retenção, nos termos do art.º 755, nº. 1 al. f) do C.C.» G.

A douta sentença começa por admitir que a oponibilidade das decisões que reconheceram os direitos de retenção se assoma tratar-se de uma matéria não pacífica na jurisprudência, fundando a sua posição no aresto proferido no processo 6906/1.YYLSB-A.L1.S2, de 24/10/2019, que subscreve sem reservas, complementando com os [os arestos do colendo STA proferidos em 22/9/1999 no processo 023434 e de 11/2/2009 no processo n.º 0797/08], H.

concluindo, que as decisões que reconheceram aqueles direitos de retenção não são oponíveis ao credor hipotecário que a elas não foi chamado ou interveio [neste sentido os doutos arestos do colendo STA proferidos em 22/9/1999 no processo 023434 e de 11/2/2009 no processo n.º 0797/08].

I.

No entanto, entende a Fazenda Pública que o douto tribunal errou na análise critica dos factos e no direito, pois, e como bem nota a douta sentença, a jurisprudência não é uniforme quanto a esta questão, e, por conseguinte, aderimos ao louvável entendimento vertido na jurisprudência de que as decisões que reconheceram os direitos de retenção em apreço são oponíveis ao credor hipotecário, ainda que o mesmo não tenha intervindo naquelas ações.

J.

Estribando-se nesta doutrina, a Jurisprudência dos Tribunais Superiores, tem sufragado o entendimento maioritário de que a sentença que reconhece a existência do direito de retenção sobre coisa objeto de hipoteca não causa prejuízo jurídico ao credor hipotecário, uma vez que não afeta a existência, a validade ou a consistência jurídica do seu direito, apesar de lhe causar prejuízo económico e, por isso, essa sentença tem efeitos de caso julgado quanto ao credor hipotecário não interveniente na ação respetiva, pois este é de considerar como terceiro juridicamente indiferente e não como terceiro juridicamente interessado, cf. acórdãos Acórdão do STJ de 16.03.1999, proc. 99B084 (na esteira dos Acs. do STA de 24.03.92 e de 12.01.93 (in BMJ 415, p. 622 e 423 p. 463 respetivamente), Acórdão da Relação de Lisboa de 14.12.2006, proc. 10078/2006-6, Acórdão da Relação do Porto, proferido em 13.01.2015, no processo nº 5729/09.5YYPRT-C.P1, Acórdão da Relação de Guimarães, proferido em 19.05.2016, no processo nº 734/10.1TBPRG-A.G1, Acórdão do TR Lisboa de 10-05¬2018, proc. 1159/11.7TYLSB-B.L1, o STJ, nos Acórdãos de 16/03/1999, in BMJ 485/356 e de 03/06/2003, proc. 03A1432, disponível in www.dgsi.pt/jstj, da Relação do Porto de 21/10/2008, proc. 0822499 e de 26/05/2011, proc. 395/09.0TBSJM-B.P1, disponíveis in www.dgsi.pt/jtrp, o STJ, nos Acórdãos de 16/03/1999, in BMJ 485/356 e de 03/06/2003, proc. 03A1432, disponível in www.dgsi.pt/jstj, da Relação do Porto de 21/10/2008, proc. 0822499 e de 26/05/2011, proc. 395/09.0TBSJM-B.P1, disponíveis in www.dgsi.pt/jtrp.

K.

Tendo as decisões que reconheceram os direitos de retenção transitado em julgado, mais não restava ao órgão de execução fiscal do que acatá-las, pois encontrava-se por força do enunciado artigo 619º do CPC a elas vinculado, e, por conseguinte, impunha-se ao órgão de execução fiscal que graduasse os direitos de retenção com prevalência sobre a hipoteca.

L.

Ademais, entende a FP que a douta sentença errou ao não ter considerado que o direito de retenção, configurando um direito real de garantia que decorre diretamente da lei, não tem, necessariamente, que ser declarado, ou reconhecido, previamente pelo tribunal, podendo ser reconhecido, para efeitos de concurso e graduação de créditos, no processo de execução, cf. sentença proferida no âmbito do proc. nº.461/18.1BEAVR que correu termos pela 2ª Unidade Orgânica do TAF Aveiro [o qual segue a orientação vertida no acórdão acima referido do TR Porto de 13.01.2015, Proc. 5729/09.5YYPRT-C.P1 – 2ª Secção , que por sua vez secundou os Acórdãos do STJ de 24/03/1992, in BMJ 415/622, de 16/03/1999, in BMJ 485/356 e de 03/06/2003, proc. 03A1432, disponível in www.dgsi.pt/jstj, desta Relação do Porto de 21/10/2008, proc. 0822499 e de 26/05/2011, proc. 395/09.0TBSJM-B.P1, disponíveis in www.dgsi.pt/jtrp e da Relação de Évora de 14/06/2012, proc. 3052/10.1TBSTR-C.E1, disponível in www.dgsi.pt/jtre], e ainda o Acórdão STJ 16.05.2019, proc. 61/11.7TBAVV-B.G1.S1.

M.

Não obstante, ficando assente a oponibilidade das sentenças que reconheceram os direitos de crédito bem como a existência destes direitos de retenção, deveria o tribunal a quo ter-se pronunciado acerca da questão do ónus da prova da invocada inexistência desses direitos, que caberia à Recorrida e que a mesma não logrou fazê-lo.

Sem prescindir, N.

Por último, salvo o devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o decidido no tocante à imputação da responsabilidade de custas de parte na proporção de 50ª para a FP e os restantes 50% para os contrainteressados, porquanto em face do estatuído no art.º 527º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, cujo critério de distribuição da responsabilidade pelas custas assenta no princípio da causalidade e, apenas subsidiariamente, no da vantagem ou proveito processual, deverão ser aqueles responsabilizados pelo pagamento das custas na totalidade.

O.

Efetivamente, os contra-interessados estão no processo na qualidade de parte demandada, em situação de litisconsórcio necessário passivo com a «entidade autora do acto impugnado», e gozam do estatuto processual de parte [ver artº10º nº1 do CPTA], assistindo-lhes, por via de regra ou como posição de principio, os mesmos direitos e deveres que a lei reconhece ou impõe àquela – devem, numa outra perspectiva, considerar-se incluídos nas referências que o CPTA faz às partes ou aos demandados, como acontece com os seus arts.95º, 120º nº3 e 121º, e são aqueles a quem a decisão causa prejuízo, nos termos do art.º141, n.º 1, do CPTA (fica vencido aquele que atual, direta e efetivamente fica prejudicado pela decisão recorrida.), sendo que no caso em apreço foram os contrainteressados que ficaram vencidos. Cf. acórdão do STA de 01.03.2011, proc. 0416/10.

P.

Caso assim não se entenda, deverá ser imputada a responsabilidade pelas custas na proporção do prejuízo obtido em simultâneo com aquelas eventuais partes, o que não se concebe que seja superior à igual proporção com cada um dos contrainteressados.

Q.

Face ao acima...

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