Acórdão nº 00722/19.2BEVR-S1 de Tribunal Central Administrativo Norte, 24 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelPaulo Ferreira de Magalhães
Data da Resolução24 de Outubro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I - RELATÓRIO Y. T., S.A.

, inconformada, interpôs recurso jurisdicional da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 29 de Agosto de 2019 nos autos de incidente de Reclamação n.º 722/19.2BEAVR, pela qual foi determinado o pagamento da taxa de justiça de 4 UC, com acréscimo da multa devida.

No âmbito das Alegações por si apresentadas, a Recorrente elencou a final as conclusões que ora se reproduzem: “EM CONCLUSÃO:

  1. A reclamação regulada no artigo 276° do CPPT tem por objecto a reapreciação de uma decisão administrativa que, num determinado processo de execução, tenha violado os direitos ou interesses legítimos do executado ou de terceiros. Tratando-se portanto de um meio processual regido por normas adjectivas, constituindo um incidente do processo executivo.

  2. Daqui decorre que a instauração da reclamação não constitui a introdução em juízo de um processo novo, e por isso não pode ser tratada processualmente como uma petição.

  3. A reclamação não pode ser tributada em taxa de justiça como se de impugnação judicial se tratasse, já que, é inequívoca a estrutural dependência desta reclamação em relação à execução fiscal na qual é praticado o acto potencialmente lesivo reclamável.

  4. O facto de o prazo para a interposição da reclamação ser considerado um prazo judicial e não um prazo de caducidade do direito à acção é mais um elemento interpretativo a considerar no sentido de que a reclamação não é um processo novo, mas sim o início de um novo momento, um incidente, do processo de execução, em que o juiz é chamado a apreciar uma determinada questão.

  5. O regime vigente das custas no processo de execução fiscal não se afigura compatível com as consequências que deveriam resultar de este processo ter, globalmente, natureza judicial.

  6. Dispõe o Regulamento das Custas dos Processos Tributários, no artigo 21º, que a conta será efetuada no tribunal ou na repartição de finanças onde ocorrer o facto que motivou a sua elaboração, ou seja, há lugar à elaboração de várias contas. Temos aquilo que poderemos chamar “custas administrativas”, as quais, acrescidas dos respetivos encargos, são contadas e cobradas pela AT, e temos as contas relativas a cada “fase judicial” do processo (por exemplo, oposição à execução e reclamações), contadas pela secretaria do tribunal. As fases judiciais do processo são, assim, encaradas como incidentes, dando, consequentemente, origem a tributação autónoma e, à obrigação de pagamento de taxa de justiça, o que pode resultar incompreensível se o tribunal não chegar a conhecer da reclamação por ser decidida, favoravelmente ao interessado, pelo órgão de execução.

  7. Tal é incoerente: sendo os incidentes processuais, uma ocorrência estranha ao normal desenvolvimento da lide, qualquer intervenção do juiz tem de ser qualificada como incidente.

  8. Mas a questão ultrapassa simples razões de coerência: o valor das custas administrativas é determinado em função do valor do processo, v. g., do crédito exequendo, por aplicação das regras gerais, ou seja, independentemente do concreto trabalho efetuado pelo órgão exequente. Estamos perante custas e não encargos, ou seja, a compensação pela realização de cada diligência. Esta é a lógica que preside, no essencial, à remuneração dos agentes de execução em processo civil (na qual se inclui também um sucess fee).

  9. Os “incidentes” são tributados segundo o mesmo critério, ou seja, nos processos de execução fiscal em que haja lugar a intervenção do juiz, os encargos a serem suportados pelo executado serão, normalmente, mais gravosos do que os suportados por um executado em processo civil e, mais grave, o número de vezes que o juiz for chamado a intervir determinará o número de vezes que o executado será chamado a pagar custas processuais, calculadas, cada uma delas, a partir da mesma base.

  10. Imagine-se, como termo de comparação, um qualquer processo civil em que o juiz é sistematicamente confrontado com requerimentos (fundados) das partes, sem natureza incidental, que tem de apreciar e decidir. Tal não se reflete no valor das custas a serem calculadas a final.

  11. A própria base de incidência das custas parte do pressuposto (muitíssimo discutível) de que a processos de maior valor corresponde um trabalho mais intenso do juiz (e da secretaria dos tribunais).

  12. Assim sendo, é ostensivo que este regime de custas nos processos tributários está ferido de inconstitucionalidade material por violação do princípio da proporcionalidade das taxas e, também, por constituir uma discriminação no acesso à justiça, na medida em que, objetivamente, penaliza economicamente aqueles que recorrem à “jurisdição tributária” relativamente àqueles que recorrem aos demais tribunais.

  13. Assim, a reclamante não tem que pagar complemento de taxa de justiça, nem multa, uma vez que procedeu ao pagamento da taxa de justiça que é legalmente devida, i.é., a que se mostra fixada na Tabela II do RCP- reclamações, pedidos de rectificação, de esclarecimentos e de reforma da sentença.

  14. A exigência de pagamento de uma taxa de € 408,00 não tem fundamento, é ilegal e nos termos supra expostos e está ferido de inconstitucionalidade material por violação do princípio da proporcionalidade das taxas e, também, por constituir uma discriminação no acesso à justiça, na medida em que, objetivamente, penaliza economicamente aqueles que recorrem à jurisdição tributária relativamente àqueles que recorrem aos demais tribunais.

  15. Não tem suporte legal o entendimento oposto, de que a estrutural dependência da reclamação prevista no art. 276º do CPPT, em relação à execução fiscal na qual é praticado o acto potencialmente lesivo “reclamável”, a tributação daquela reclamação deverá ser feita, não pela Tabela I, mas sim pela Tabela II-A, do Regulamento das Custas Processuais, que prevê expressamente a taxa de justiça na execução.

  16. Entende-se, consequentemente, por remissão para as citadas normas e acórdãos, que a tributação da reclamação não pode ser feita pela Tabela II-A, do Regulamento das Custas Processuais que prevê a taxa de justiça na execução, dependendo do valor da execução (até € 30.000 - 2UC, igual ou superior a € 30,000,01- 4UC) mas na rubrica “Reclamações, pedidos de rectificação, de esclarecimento e de reforma da sentença”.

  17. O despacho recorrido não decidiu em conformidade com a lei, pelo que violou o disposto na Tabela II-A do RCP - rubrica “execuções superior a € 30.000,00, e na Tabela II-A, do RCP, sob a rubrica “Reclamações, pedidos de rectificação, de esclarecimento e de reforma da sentença”.

Nestes termos, deve ser concedido provimento ao recurso e em consequência, revogado o despacho recorrido.

Decidindo de harmonia com as conclusões supra expostas, far-se-á, JUSTIÇA.”*O recurso foi admitido, com subida imediata e em separado [cfr. douto despacho a fls. 35 dos autos em suporte físico] .

**A Recorrida Fazenda Pública, não apresentou Contra-alegações.

**O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer concluindo a final que deve o recurso jurisdicional de improceder.

***Com dispensa dos vistos legais [Cfr. artigos 36.º, n.º 2, do Código de Processo dos Tribunais Administrativos e 657.º, n.º 4, do Código de Processo Civil], cumpre agora apreciar e decidir, visto que nada a tal obsta.

** II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas alegações - Cfr. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5, todos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) –, e que se centram em saber se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento, e consequentemente, se errou na apreciação que fez em quanto aos pressupostos subjacentes à previsão normativa determinante do pagamento de taxa de justiça no âmbito dos processos intentados ao abrigo do artigo 276.º do CPPT.

Ou seja, no caso em análise, a questão a decidir é a de saber qual a Tabela do Regulamento das Custas Processuais (RCP) aplicável às Reclamações a que se reporta o artigo 276.° do CPPT, mais concretamente saber se a decisão recorrida errou ao considerar e decidir que, in casu, é aplicável à determinação da taxa de justiça inicial devida, a Tabela II – coluna A do RCP, que prevê a taxa de justiça no item “Execução” dependendo do seu valor da execução [se inferior ou superior a €30.000.00], ou antes o item “Reclamações, pedidos de rectificação, de esclarecimento e de reforma de sentença”, constante da mesma Tabela II – coluna A do RCP, e também, apreciar e decidir sobre se o regime de custas nos processos tributários está ferido de inconstitucionalidade material, seja por violação do princípio da proporcionalidade das taxas seja também por constituir uma discriminação no acesso à justiça, por como assim sustenta a Recorrente, penalizar económicamente aqueles que recorrem à “jurisdição tributária” relativamente àqueles que recorrem aos demais tribunais.

**III - FUNDAMENTOS III.i - DE FACTO A decisão sob recurso não assentou matéria de facto.

De todo o modo, atenta a motivação expendida na dita decisão, os documentos constantes dos autos por...

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