Acórdão nº 02493/16.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelLuís Migueis Garcia
Data da Resolução25 de Janeiro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: Município de Gondomar (Praça Manuel Guedes, Gondomar), interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF do Porto, que julgou parcialmente procedente acção administrativa contra si intentada, bem como contra Águas de Gondomar, S.A. (R. 5 de Outubro, n.º 112, Gondomar), por PFMF (R. F…, Gondomar).

*O recorrente conclui: a) O objeto do presente recurso é a sentença proferida pelo Tribunal a quo, a qual julga improcedente a prescrição do direito do autor, condena o réu Município a retirar (ou desativar) do prédio do autor o coletor e a caixa de saneamento de águas residuais aí existente no prazo de 60 dias, e ainda condena o réu Município numa sanção pecuniária compulsória caso não cumpra o prazo atrás referido e com a qual o recorrente não se conforma.

I - Fundamento (Da nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de direito): b) A douta sentença não especifica os fundamentos de direito para justificar a procedência do direito do autor para exigir a retirada do coletor e caixa de saneamento de águas residuais (alínea ii) da decisão), nem para a aplicação da sanção pecuniária compulsória (alínea iii) da decisão) o que é exigível nos termos da alínea b), do n.º 1 do artigo 615.º do CPC.

  1. A responsabilidade contratual do réu Município, tendo subjacente uma situação de cumprimento defeituoso do contrato de compra e venda do terreno onde o autor veio a construir o seu imóvel não é especificada por uma única referência normativa feita ao longo de toda a sentença, designadamente ao artigo 483.º do CC.

  2. Esta nulidade da sentença está relacionada com o princípio da legalidade material que faz recair sobre o Juiz, na elaboração da sentença, o dever de indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes aos factos que considera provados, tal como decorre do n.º 3 do artigo 607.º do CPC.

    II – Fundamento (Da nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de direito e de facto): e) Igual ausência de especificação de fundamentos de direito vale também para parte da decisão que aplica uma sanção pecuniária compulsória ao réu Município (alínea iii) da decisão), ao que acrescerá também uma total ausência de especificação de fundamentos de facto.

  3. A sanção pecuniária compulsória só pode ter lugar quando tal se justifique por razões objetivas que têm de se encontrar fundadas na conduta processual e extraprocessual desenvolvida.

  4. Assim, a ausência de justificação de direito na decisão quanto à alínea ii) e ausência de facto e de direito quanto à alínea iii) da decisão violam o disposto no n.º 3 do artigo 607.º do CPC e constituem uma causa de nulidade da sentença nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do mesmo diploma.

    III – Fundamento (Da nulidade da sentença por falta de pronuncia sobre questões que devesse apreciar): h) Dispõe ainda o n.º 1 do artigo 615.º do CPC, na sua alínea d) que “É nula a sentença quando: (…) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;” i) Das escrituras de compra a venda do lote 3 existentes nos autos, resulta que o réu Município vendeu à imobiliária T..... tal lote livre de ónus e encargos (consta expressamente) e esta imobiliária vendeu ao autor o mesmo lote 3 com base numa escritura onde não consta a expressão “livre de ónus e encargos”, sendo certo que também não faz referência à sua existência.

  5. Assim, e sendo certo que tanto na responsabilidade contratual (como também na extracontratual) são quatro os pressupostos, a saber o facto ilícito, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano, a questão de saber das razões que fizeram cair expressão “livre de ónus ou encargos” mereceria pronúncia pois, se se trata de um facto intencional ou acidental, com base nos pressupostos referidos, poderá afastar ou não a responsabilidade do Município.

    IV - Fundamento (Do erro na subsunção dos factos à norma jurídica aplicável e na indagação da norma ou da sua interpretação): k) Com efeito, perante factos e fundamentos vertidos na douta sentença, nenhuma situação de facto é referida na sentença capaz de gerar responsabilidade contratual do réu Município aqui recorrente.

  6. Assim, dos factos provados nos autos existe apenas um contrato de compra e venda do lote 3 celebrado entre o réu Município e a Imobiliária T..... e, passados 7 anos um outro contrato de compra e venda do mesmo lote celebrado entre a imobiliária T..... e o autor.

  7. A existir responsabilidade civil contratual ela apenas se poderá verificar entre o réu Município e a Imobiliária T..... (que não é parte na presente demanda), ou entre esta Imobiliária e o autor.

  8. Por outro lado, um eventual cenário de responsabilidade civil extracontratual do réu Município resultante da emissão de alvará de loteamento ou licenças de construção, teria forçosamente que determinar a procedência da prescrição do direito do autor na presente demanda.

  9. Desta forma, e ao contrário do que é referido na sentença, do ponto 8 dos factos provados não pode resultar que o réu Município de Gondomar tenha reconhecido qualquer direito ao autor, ainda que tacitamente, pois os factos não o expressam inequivocamente (Cfr. n.º 2 do artigo 325.º do Código Civil).

  10. Na verdade, o referido ponto 8 apenas dá como provado o envio de uma missiva pelo réu Município ao autor e outra pelo réu Município ao Réu Águas de Gondomar, o que não se contesta, mas deste facto (envio e teor das missivas), não poderá subsumir o mesmo ao disposto no artigo 325.º do Código Civil fazendo-se uma interpretação de reconhecimento do direito do autor.

  11. Não se verificando esta interrupção da prescrição, e sendo certo que pelo menos desde o dia 22 de abril de 2009 que o autor tem conhecimento da existência do coletor e da caixa de saneamento de águas residuais existente no seu prédio e apenas intentou a ação no dia 20 de fevereiro de 2015, o prazo de 3 anos para o exercício do seu direito já prescreveu conforme resulta do disposto no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro com as alterações introduzidas pela Lei n.º 31/2008, de 17 de Julho, que aprova em anexo o regime da responsabilidade civil extracontratual do estado e demais entidades públicas, por remissão para o artigo 483.º do CC.

  12. Subsidiariamente a tudo o supra exposto e mais uma vez no exercício do dever de patrocínio, caso fosse encontrada responsabilidade ao réu Município, a mesma apenas poderia consistir no pagamento de uma indemnização nos termos do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 34.021, de 11/10/1944, quando são estabelecidos, com carácter permanente, os ónus que sejam necessários à captação e condução das águas destinadas a saneamento de aglomerados populacionais, na medida em que causarem efetiva diminuição do valor dos prédios respetivos, matéria esta (de diminuição do valor dos prédios) que a sentença não se pronuncia.

  13. Por tudo o exposto neste fundamento IV, deveria o artigo 483.º invocado na sentença, ter sido interpretado no sentido de não poder ser imputada responsabilidade civil contratual ao réu Município por inexistência de qualquer relação contratual estabelecida entre este e o autor t) Da mesma forma, deveria o Tribunal a norma contida no artigo 325.º do CC, no sentido de determinar a inexistência reconhecimento do direito do autor na retirada ou desativação do coletor e a caixa de saneamento de águas residuais existentes no seu prédio e, consequentemente, verificar-se a procedência da prescrição do direito do autor para efeitos de responsabilidade civil extracontratual do réu Município nos termos do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro com as alterações introduzidas pela Lei n.º 31/2008, de 17 de Julho, por remissão para o artigo 483.º do CC u) Subsidiariamente, verifica-se ainda erro na determinação da norma aplicável pois, à matéria dos autos deverá ser aplicada a norma contida no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 34.021, de 11/10/1944, nos termos da qual a responsabilidade do município apenas se poderá traduzir no pagamento de uma indemnização por terem sido estabelecidos, com carácter permanente, os ónus que são necessários à captação e condução das águas destinadas a saneamento de aglomerados populacionais, na medida em que tenha causado efetiva diminuição do valor do prédio do autor, matéria esta (de diminuição do valor do prédio do autor) que a sentença não se pronunciou.

    *Já o recorrido, conclui: I - Contrariamente ao pretendido pelo Recorrente, os fundamentos de direito para justificar a procedência do direito do autor para exigir a retirada do coletor e caixa de saneamento de águas residuais do seu terreno estão especificados na sentença – “responsabilidade contratual, tendo subjacente uma situação de cumprimento defeituoso do contrato de compra e venda do terreno onde o Autor veio a construir o seu imóvel (licenciado pela Câmara Municipal de Gondomar) por parte da vendedora, que foi precisamente a Câmara Municipal de Gondomar.

    ” (cfr. pág. 35 da sentença).

    II - Também a situação de cumprimento defeituoso do contrato de compra e venda está proficientemente fundamentado na douta sentença. (cfr. págs. 35 a 38).

    III – Pelo que inexiste nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de direito.

    IV - No que concerne à aplicação de uma sanção pecuniária compulsória ao réu, a mesma está justificada pela matéria de facto assente que leva à formulação de um juízo de necessidade da sua aplicação, a qual emerge da sentença, de forma clara, óbvia e lógica.

    V – Com efeito, resulta da matéria de facto assente, nomeadamente dos pontos 6, 8, 9, 10, 11, 12, 15, 16, 17, 18, 19 e 20, que o réu Município, apesar de, pelo menos desde 29 de Abril de 2010 reconhecer o direito do Autor a ter o seu prédio livre e desembaraçado do colector de saneamento, decorridos desde então mais de 8 anos, ainda não procedeu à...

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