Acórdão nº 00406/13.5BEVIS-S1 de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelIrene Isabel Gomes das Neves
Data da Resolução11 de Novembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Recurso do despacho interlocutório que admitiu os requerimentos probatórios (admissibilidade de prova testemunhal e prova pericial colegial) 1. RELATÓRIO 1.1. O acima identificado Recorrente (Ministério da Economia), notificados do Despacho Saneador proferido no âmbito da acção administrativa especial em que é Ré, não concordando com o segmento do despacho saneador que a final conheceu dos requerimentos probatórios no sentido da admissão do rol de testemunhas apresentado pela Autora e, bem assim, da admissão da realização de prova colegial, vem apresentar recurso da mesma.

Apresenta as seguintes conclusões: “(…) E) O presente recurso visa, ainda, a revogação do Despacho Saneador de 05.02.2019 na parte em que decide admitir «o rol de testemunhas apresentado pelo A. - artigo 495.2 e seguintes do CPC ex vi artigo 35.2, n.9 2 do CPTA - cfr. Fls. 103 do processo físico» e «determina a realização da prova pericial colegial», notificando o Réu para «querendo, aderir ao objeto da perícia proposto pelo A. ou propor ampliação ou restrição do mesmo, assim como indicar perito».

F) Acontece que a A. veio a requerer prova testemunhal e pericial, tendo o Réu considerado desde o início que tal prova era despicienda neste processo, por inútil, atenta a natureza do ato aqui em causa, proferido ao abrigo de poderes discricionários, não podendo o Tribunal substituir-se à Administração.

G) Assim, omite o Tribunal no douto despacho saneador que o R. não indica testemunhas nem peritos, por deles ter prescindido por entender não poder haver lugar a prova nestes autos, considerando a natureza do ato aqui em causa.

H) Salvo o devido respeito, que é muito, parece-nos que o Tribunal incorre em erro ao admitir a produção de prova, seja testemunhal ou pericial I) Pois, face à relação material controvertida, tal como configurada pelo A. e tendo em conta a matéria de facto invocada, a produção de prova testemunhal e pericial não é necessária, sendo mesmo impossível.

J) Em primeiro lugar, porque os factos relevantes subjacentes ao objeto desta ação, já se encontram todos cabalmente demonstrados nos documentos juntos e no processo instrutor que também se juntou aos autos (relativo ao exercício do ano de 2010, com início em 3 de janeiro de 2012).

K) E, por outro lado, porque os vícios assacados aos atos impugnados de (i) violação de lei por a Comissão não ter reconhecido os projetos apresentados como atividades de I&D, de (ii) falta de fundamentação e de (iii) de injustiça e desproporcionalidade da decisão impugnada, claramente não se verificam pela análise de tudo o que foi junto ao processo em termos documentais.

L) Mas principalmente, porque nem sequer pode haver prova testemunhal ou pericial neste caso.

M) O mérito das decisões desta Comissão Certificadora não pode ser sindicável pelo poder jurisdicional, por justamente serem tomadas com base em critérios exclusivamente técnicos para aferir da existência de atividades de I&D (salvo erro manifesto, que no caso, nem sequer foi alegado pela A.).

N) O Recorrente invocou na sua contestação a "insindicabilidade das decisões da Comissão", o que é de conhecimento oficioso pelo Tribunal, conforme artigo art. 87º/1º) do anterior CPTA, aplicável aos presentes autos, e artigo 578.2 CPC.

O) O Recorrente, ao conceder o crédito fiscal ao abrigo da Lei n.º 4/2005, de 3 de Agosto, em especial à luz do disposto nos artigos 42 e 62 da referida Lei, às empresas que comprovem que tiveram despesas relacionadas com atividades de investigação e desenvolvimento (I&D), não está a atuar no âmbito do exercício de poderes vinculados, mas sim de poderes discricionários.

P) No caso dos autos, e refletindo sobre a natureza da decisão que a Comissão Certificadora, tem de tomar, ao abrigo deste regime legal da concessão de incentivos fiscais às empresas que invistam em atividades de I&D, facilmente se percebe que a referida Comissão atua no domínio da chamada "discricionariedade técnica".

Q) O fundamento da própria discricionariedade na atividade administrativa reside no facto de, na maioria das vezes, o legislador não poder prever todas as situações nas quais a Administração terá que atuar, deixando ao critério dos órgãos decisores, tendo em conta os diferentes contextos e sectores, a tomada das decisões que melhor salvaguardem o interesse público.

R) É também este o fundamento que se encontra na base do regime instituído pela Lei n.º 40/2005, que criou o Sistema de Incentivos Fiscais em Investigação e Desenvolvimento Empresarial, encontrando-nos, por isso, numa área maioritariamente técnica, em que o que se pretende é impulsionar a capacidade tecnológica das empresas e fomentara investigação científica no sector privado.

S) É verdade que a Lei menciona quais deverão ser as despesas consideradas elegíveis para efeitos de atribuição do benefício fiscal, que poderá ser deduzido à coleta em sede de IRC - cfr. artigo 39, mas esse elenco esse é meramente enunciativo, pois estipula "desde que se refiram as atividades de investigação e desenvolvimento", fixando a lei conceitos abertos cujo conteúdo deve ser preenchido com interpretações de carácter técnico.

T) Ora, a determinação do conteúdo destes conceitos e bem assim o que se deve entender por atividades de I&D está a cargo da Comissão Certificadora, um órgão administrativo "ad hoc" designado especificamente pela lei para este efeito da emissão das declarações comprovativas, previstas no artigo 6º, n.º 1, com poder decisório próprio, baseado em critérios específicos de avaliação técnico científica e análise das candidaturas.

U) E, nesta medida, a atividade da Comissão desenrola-se no âmbito daquilo que se apelida de discricionariedade técnica, pelo que não deverá o Tribunal sindicar os juízos de valoração técnica feitos pela Administração, estando a intervenção do Tribunal limitada à fiscalização do chamado "erro manifesto", sempre admitido como controle das garantias dos administrados.

V) No caso dos autos, a decisão da Comissão foi no sentido de não se estar perante atividades de I&D e, em consequência, considerar como não elegível as despesas apresentadas pela A. na sua candidatura, pelas razões expostas nas suas deliberações de 07.05.2013 e fê-lo no âmbito da discricionariedade meramente técnica, o que prova à evidência que já não estamos no âmbito do "erro manifesto" apreciável pelo Tribunal! W) Pelo que, não se tratando de erro manifesto - nem a A. o alegou - não deve o Tribunal substituir-se à vontade da Administração, não devendo sindicar os juízos de valoração técnica feitos pela Administração, por se tratar de uma questão de incompetência do Tribunal, tendo em conta o princípio da separação e poderes, face à reserva de administração.

X) Pelo que, à luz do que se deixa dito, impõe-se a procedência do presente recurso e revogação do Despacho Saneador de 05.02.2019, substituindo-se por outro que (…) não admita a produção de prova, seja testemunhal ou pericial.

Termos em que, com o suprimento de V. Ex.ªs, se requer seja dado provimento ao presente recurso, considerando nulo ou revogando-se o Despacho recorrido e substituindo-se por outro (…) que indefira a produção de prova, seja testemunhal ou pericial, como é de Lei e de Justiça! As contra-alegações apresentadas pela Autora – sem conclusões, centram-se na nulidade do despacho saneador, por omissão de pronúncia, alegada em sede de recurso pela Ré, o qual nessa parte viria a ser julgada válida a desistência do recurso. Aquelas contra-alegações extensivas, redundam em considerações doutrinais e jurisprudenciais sobre a impugnabilidade do acto administrativo em crise e paralelamente considerandos pontuais sobre admissão dos meios probatórios.

1.2.

O recurso foi admitido como de apelação, com subida em separado e efeito devolutivo.

1.3.

Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cfr. art. 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.

Questões a decidir: A questão sob recurso e que importa decidir, suscitada e delimitada pelas alegações de recurso e respectivas conclusões: Ø Apreciar se as diligências de prova requeridas (prova testemunhal e perícia colegial) e deferidas são impertinentes e desnecessárias para a descoberta da verdade.

  1. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. Com interesse para a decisão importa elencar as seguintes ocorrências processuais: a) Pela presente ação, pretende a Autora a anulação do despacho datado de 07/05/2013, da Comissão Certificadora para o Sistema de Incentivos Fiscais (SIFIDE), no segmento em que a mesma indeferiu o processo de candidatura da M., S.A. ao SIFIDE respeitante ao exercício económico de 2010, bem como a condenação do Réu à prática do ato devido, de reconhecimento que as despesas incluídas nos projetos em causa são elegíveis para o efeito da concessão dos incentivos fiscais do SIFIDE quanto ao exercício de 2010, ou subsidiariamente, que seja o Réu condenado a emitir nova decisão devidamente fundamentada, com todos os fundamentos de facto e de Direito que a sustentam, devidamente especificados por referência aos concretos projetos e despesas elegíveis em causa; b) “O processo não contém todos os elementos de facto para proferir uma decisão segura e conscienciosa do mérito da causa, segundo as várias soluções plausíveis de direito, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 596.º do CPC, aplicável ex vi do artigo 35.º, n.º 2, do CPTA, se passa a proferir DESPACHO DE IDENTIFICAÇÃO DO OBJETO DO LITÍGIO E ENUNCIAÇÃO DOS TEMAS DA PROVA I. Objeto do Litígio Aferir se as atividades e despesas...

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