Acórdão nº 00565/18.0BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Junho de 2021
Magistrado Responsável | Helena Ribeiro |
Data da Resolução | 02 de Junho de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO 1.1.
M.
, com domicílio na Rua (…), propôs presente ação administrativa contra a Freguesia (...), com sede na Praceta (…), pedindo a condenação da entidade demandada a pagar-lhe as compensações que reputa de devidas, ao abrigo do disposto na Lei nº 11/96, de 18 de Abril, pelo exercício de funções como secretário de junta de freguesia.
Alega para o efeito, em síntese, que, por sufrágio universal, foi eleito para a Assembleia de Freguesia da Ré, para o período de 2009-2013, tendo sido nomeado como vogal para a Junta de Freguesia e, posteriormente, foi nomeado para a função de secretário, em novembro de 2010.
Mais invoca que cumpriu a totalidade do mandato autárquico na qualidade de membro da Junta de Freguesia, não lhe tendo sido pagas as compensações financeiras previstas para o cargo que ocupou.
Que tendo solicitado à Ré os respetivos pagamentos, a mesma se baseou num parecer da Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE) para arguir não ser responsável pelos mesmos, o que reputa de violador das leis e normas em vigor.
Pugna, a final, pela condenação da Ré a reconhecer que o Autor exerceu, de pleno direito, no período compreendido entre Novembro de 2010 e 2013 a função de secretário na extinta Freguesia de (...) e, bem assim, pela condenação da Ré a regularizar o pagamento das compensações que lhe são devidas, enquanto secretário, no montante global de € 8.105,73, acrescido dos juros legais, a contar desde o fim do mandato até trânsito em julgado da sentença, bem como em custas e demais encargos legais.
1.2. Citada, veio a Ré apresentar contestação, na qual se defende por impugnação, alegando, em síntese, que o Autor é co-responsável pela situação calamitosa a que a Junta de Freguesia chegou.
Invoca que as compensações, senhas de presença e remuneração de eleitos, que não forem pagas no ano económico a que respeitam, não devem transitar para o ano seguinte, uma vez que o Fundo de Financiamento das Freguesias (doravante FFF) e o orçamento do Estado garantem os pagamentos de tais despesas no respetivo ano; Por outro lado, alega que o atual órgão executivo não pode efetuar tais pagamentos por serem os mesmos irregulares e violarem a Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso (doravante LCPA), encontrando-se, assim, precludido, em 2019, qualquer direito que o Autor pudesse ter em relação aos abonos do mandato de 2009-2013.
Pugna, a final, pela total improcedência da ação e pela sua consequente absolvição do pedido.
1.3. Proferiu-se despacho em que, considerando-se que os autos estão dotados dos elementos necessários para que seja proferida uma decisão conscienciosa sobre a regularidade dos pressupostos processuais, bem como sobre o mérito da causa no despacho saneador (artigo 88º, nº 1, alínea b), do CPTA), ouvidas as partes e porque a audiência prévia teria apenas a finalidade prevista na alínea d) do nº 1 do artigo 87º-A do CPTA, dispensou-se a sua realização, nos termos do nº 2 do artigo 87º-B do mesmo diploma legal.
1.4. Fixou-se o valor da ação em € 8.105,73 (oito mil, cento e cinco euros e setenta e três cêntimos).
1.5. Proferiu-se sentença na qual se julgou a presente ação procedente, constando da mesma a seguinte parte dispositiva: “Face ao que vem exposto, julga-se a presente acção totalmente procedente e, em consequência: a) Condena-se a Ré a reconhecer que o Autor exerceu as funções de secretário na extinta Junta de Freguesia de (...), no período compreendido entre 05/07/2010 e 2013; e b) Condena-se a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 8.105,73, a título de abonos pelo exercício das funções secretário, acrescida dos juros vencidos desde o início do incumprimento, até efectivo e integral pagamento, à taxa legal em vigor.
*Custas a cargo da Ré (artigo 527º do Código de Processo Civil; artigo 6º do Regulamento das Custas Processuais, Tabela I).
*Registe e notifique.” 1.6. Inconformada com o assim decidido, a Entidade Demandada interpôs o presente recurso de apelação, em que formula as seguintes conclusões: “1. A recorrente não se conforma com a douta sentença porquanto entende que a mesma faz uma errada interpretação e aplicação da lei aos fatos provados, 2.
Na douta sentença e nos fatos dados como provados alínea (F e H) apenas se refere ao parecer dado pela ANAFRE não dando como provado que foi igualmente solicitado parecer à CCRN e que este foi no mesmo sentido, apesar de a ré aquando da sua contestação ter junto tal como documento, como doc. 1.
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As compensações, senhas de presença e remunerações dos eleitos, que não foram pagas, não deverão transitar para o ano seguinte pois o F.F.F. e o Orçamento de Estado garantiram os pagamentos dessas mesmas despesas nos respetivos anos.
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O órgão executivo atual (entenda-se Ré) não pode efetuar tais pagamentos por serem irregulares e ilegais violando ainda a L.C.P.A. pois nem cabimentos nem compromissos foram efetuados.
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A transferência das verbas necessárias para o pagamento dessas compensações é garantido pelo Fundo de Financiamento das Freguesias- conforme dispõem o n.º 98 do artigo 38 da L.F.L., essas remunerações são pagas via orçamento de estado por intermédio da DGAL.
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Trata-se por isso de uma receita legalmente consignada para aquele efeito e não deve ser usada para outro fim, é uma despesa de satisfação obrigatória, isto é, se durante a execução orçamenta] se verificar insuficiência de datações para esse fim, dever-se-á efectuar, de imediato a correspondente alteração orçamental, o que não foi feito, prejudicando se assim for possíveis utilizações de dotações, dando-se prioridade absoluta às despesas destinadas ao cumprimento das obrigações autárquicas.
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A ilegalidade cometida ao permitir que “as compensações, senhas de presença e remunerações dos eleitos, que não fossem pagas, não deverão transitar para o ano seguinte pois o F.F.F. e o Orçamento de Estado garantiram os pagamentos dessas mesmas despesas nos respetivos anos” foi praticada pela ré na pessoa do Sr. Presidente da Junta e pelo próprio Autor enquanto secretário da mesma 8.
A situação concreta configura um “venire contra factum proprium” que se traduz quando alguém exerce uma posição jurídica em contradição com o comportamento pelo mesmo assumido anteriormente, o que é exatamente o caso em apreço.
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As normas contantes dos artigos 5.º e 9.º da LCPA (lei dos compromissos e pagamentos em atraso) também deveriam ser são aplicáveis às remunerações devidas os membros nas juntas de freguesia.
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À Ré, aqui recorrente, não podia efetuar os pagamentos nos anos posteriores porque não foram efetuados cabimentos nem compromissos para assumir tais pagamentos, e assim sendo estava, como está vedada a ré efetuar os mesmos.
Termos em que, E nos demais e melhores de direito que V.Ex.as doutamente suprirão, deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, e proferido douto acórdão que absolva a ré dos pedidos, assim farão V.Ex.as inteira e Sã JUSTIÇA.” 1.7. Notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 146º, n.º 1 do CPTA, o Ministério Público emitiu parecer, pugnando pela improcedência do recurso.
1.8. Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
*II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.
2.1 Conforme jurisprudência firmada, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, não podendo este Tribunal conhecer de...
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